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[SENTENÇA] Força normativa do código de ética empresarial

Agenda 26/12/2021 às 13:20

O código de ética empresarial possui uma esfera normativa mínima que vincula, ao menos, o sujeito que voluntariamente criou a regra.

S  E  N  T  E  N  Ç  A

I DO RELATÓRIO

*****, já qualificado, ajuizou reclamação trabalhista em face de ARTHUR LUNDGREN TECIDOS S.A CASAS PERNAMBUCANAS, também já qualificada, pugnando, em síntese, pelo reconhecimento da dispensa sem justa causa e pelo reconhecimento da natureza salarial da ajuda de custo com a condenação da ré nos títulos descritos na peça de ingresso, tudo conforme argumentos já expostos no presente caderno processual. Juntou documentos e requereu os benefícios da justiça gratuita.

Devidamente notificadas, as partes compareceram à audiência, não logrando sucesso a primeira tentativa de acordo. Por frustrada a conciliação, foi recebida a defesa, dando-se seguimento à instrução do feito.

Em sua contestação, em suma, a ré impugnou os pleitos autorais, expondo os argumentos que sustentam a sua tese. Por fim, requereu a extinção ou, sucessivamente, a improcedência da presente reclamação, juntando documentos aos autos.

Após produzida a prova documental e oral, com a concordância das partes, foi encerrada a instrução com oportunidade para os interessados apresentarem razões finais.

É o relatório. Por inconciliados, passo aos fundamentos.

II DOS FUNDAMENTOS

1.   Dos pressupostos processuais e das condições da ação

Tenho por verificados os pressupostos processuais e as condições da ação, inexistindo qualquer obstáculo que gere a conversão do julgamento em diligência ou que redunde na extinção do feito sem resolução do mérito (art. 485 do CPC).

Realmente, encontram-se presentes os requisitos de constituição e validade da relação jurídico processual, pois o Juízo é material e territorialmente competente (arts. 114 da CF e 651 da CLT), sendo regular a citação realizada (arts. 239 do CPC e 841 da CLT). Além disso a peça de ingresso se mostrou apta para veicular a pretensão autoral, atendendo às exigências do art. 840 da CLT, que inclusive demandam leitura compatível com a simplicidade do processo do trabalho, bastando que viabilize o direito de defesa, tal como se deu na hipótese, possibilitando plenamente o exercício do contraditório (art. 5º, LV, da CF).

Ultrapassados tais temas, tampouco vislumbro vício insanável na capacidade e/ou representação das partes, que se mostraram legitimadas a atuar no feito, morm1ente diante da teoria da asserção, sendo patente a necessidade da atuação jurisdicional, dado o princípio da demanda e a ausência de solução do conflito por outros meios. Vale destacar que o rito elegido é adequado, sendo compatível com o valor dado à causa, que inclusive reflete a expressão econômica dos pedidos formulados, os quais se mostraram possíveis, atendendo ao quanto dispõe o art. 292 do CPC.

No tocante aos documentos, observo ter sido respeitada a Resolução n.º 185/2017 do CSJT, que dispensa inclusive a declaração de autenticidade pela parte peticionante. Eventuais irregularidades formais, por certo, não invalidam por si só os meios de prova trazidos à baila, haja vista o princípio da instrumentalidade estatuído pelos arts. 794 da CLT e 277 do CPC, ficando com o interessado o ônus de desconstituir a prova, na forma do artigo 818 da CLT c/c arts. 373 e 436, III, do CPC.

Por fim, observo que não existem razões capazes de obstar, por si sós, a análise das pretensões deduzidas nos autos. Destarte, com espeque no art. 337, § 5º, do CPC, registro desde já que se encontram presentes os pressupostos processuais, as condições da ação e os demais requisitos necessários à análise da matéria de fundo invocada pelas partes.

2.  Da prescrição trabalhista

As pretensões deduzidas nestes autos possuem fato gerador situado fora do marco bienal ou quinquenal previsto pelos artigos 11 da CLT e 7º, XXIX, da Constituição.

Com efeito, em que pese o grande lapso contratual havido entre as partes, o que se postulam são, em síntese, diferenças trabalhistas devidas após a reforma de 2017 ou após a rescisão do contrato, ocorrida em 2021. Desse modo, descabe falar em prescrição, ao menos no presente processo.

3.  Da modalidade rescisória. Verbas devidas

O reclamante alegou ter sido dispensado sem justa causa, porém, de forma escamoteada pelo empregador, que maliciosamente se valeu da maquiagem do art. 484-A da CLT para lhe impingir prejuízo financeiro. Isso porque a ré teria imposto a renúncia a verbas trabalhistas (FGTS, aviso prévio e seguro-desemprego) como condição para obtenção de benefício que já lhe seria devido, tendo em conta o tempo de casa (ID. b69900a - Pág. 3). Esclareceu que havia um código de ética na empresa garantindo a gratificação/prêmio por tempo de serviço aos gerentes com mais de 19 anos e 6 meses de serviço, sendo tal situação reconhecida num livro denominado "Cem Anos de Pernambucanas".

De fato, os TRCTs juntados com a inicial evidenciam que a gratificação em comento vinha sendo concedida normalmente na dispensa sem justa causa dos gerentes com mais de 19 anos de casa e isso sem qualquer prejuízo dos demais direitos trabalhistas devidos (ID. 00bc464). Por sua vez, o documento de ID. f05ddb1, trazido com a defesa, comprova que a ré divulgou publicamente o prêmio de permanência como verdadeiro benefício da empresa (fls. 581), em livreto denominado 100 anos Pernambucanas com a família brasileira.

Deve ser mencionado que o livreto em questão, misto de cultura com propaganda, foi produzido pela própria ré para divulgar sua história, valores e projetos. Utilizando-se da técnica do storytelling, a cia reuniu fotos e textos envolventes para promover a imagem de uma empresa que seria exemplo de civismo e honestidade (fls. 447), que goza da confiança mútua (fls. 537) e que possui até mesmo uma universidade corporativa na qual se leciona a arte de praticar valores (fls. 574). Repleto de frases de efeitos e palavras bonitas, o documento ainda assenta que o jeito Pernambucanas de ser é caracterizado pela "integridade, respeito em todos os níveis, trabalho em equipe, valorização... transparência... e melhoria contínua" (fls. 560). Por fim, destaca que a ré é "fiel ao passado" (fls. 588).

Ora, uma empresa com tais atributos jamais suprimiria um benefício incondicional que ela mesma apregoou ao público para seus funcionários. Aliás, nem mesmo poderia, dada a justa expectativa criada com seu ato, aplicando-se ao caso a inteligência dos arts. 113, 187 e 422 do Código Civil, todos em favor do trabalhador (art. 8º da CLT). Com efeito, se nem mesmo no direito civil se admite a quebra da confiança e o comportamento contraditório, por ofensa ao princípio da boa-fé objetiva, com muito mais razão não se deve aceitá-los em prejuízo do empregado, que goza do princípio da proteção. Em sentido semelhante, menciono a ementa dos seguintes acórdãos:

Segundo o princípio da boa-fé objetiva, que se aplica a todos os contratos, inclusive trabalhistas, previsto nos arts. 113, 187 e 422 do Código Civil, as partes devem agir em conformidade com parâmetros razoáveis de boa-fé, tratando o contratante como parceiro e buscando relação de cooperação. 2. De acordo com as novas diretrizes do Código Civil de 2002, a boa-fé objetiva deve informar todas as fases do contrato. 3. Conclui-se, dessarte, pela competência da Justiça do Trabalho para conhecer e julgar pedido de indenização por danos morais ocorridos nas negociações preliminares, porque decorre de relação de trabalho, ainda que na fase das tratativas. Recurso de Revista conhecido e provido (TST, RR 931/2003-006-07-00.9, 3ª Turma., Rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ 10/02/2006).

A cláusula geral de boa-fé objetiva, prevista no art. 113, do Código Civil, representa regra de valoração da conduta das partes como honesta, correta e leal e induz expectativa legítima nos contratantes, especialmente hipossuficientes. A afirmação do empregador no sentido de que, no futuro, não editará plano de demissão voluntária com condições mais vantajosas induz expectativa legítima nos empregados nesse sentido e, por isso, a ele aderiram. Se, quatro meses após, essa expectativa se rompe com novo plano, mais vantajoso, a atitude do empregador re­presenta violação a esse dever geral de conduta e torna o empregado credor das diferenças decorrentes do novo regramento... (TRT/05, RO 0022200-63.2005.5.05.0033, 2ª Turma, Rel. Des. Cláudio Brandão, DJ 15/08/2006).

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Noutras palavras, se a ré criou uma gratificação, adicional, prêmio ou qualquer outro título pautado no tempo de serviço e se tal direito foi reconhecido de modo público como um benefício ao longo de um século, evidente a adesão da verba ao contrato de trabalho daqueles que cumpriram com o requisito necessário, mostrando-se defesa a retirada ou modificação por elementos menos vantajosos.

Registro, por oportuno, que os documentos acima mencionados rebatem a tese patronal a respeito da liberalidade, já que havia verdadeira regra empresarial garantindo a existência da verba, a qual estava cimentada de tal forma no costume interno, que foi reproduzida como propaganda de boas práticas das Pernambucanas para todo o Brasil ver. E, por óbvio, não faz sentido algum divulgar aos quatro ventos a imagem de uma empresa transparente, íntegra, que valoriza sua equipe e concede tal direito aos seus funcionários se, na rescisão, são suprimidas verbas rescisórias elementares como condição deste mesmo benefício.

A conduta patronal, em síntese, assemelha-se ao bluewashing, isto é, uma prática corporativa na qual uma companhia se autodenomina socialmente responsável para criar a falsa percepção nos consumidores/colaboradores, enquanto, na prática, suprime até mesmo o aviso prévio proporcional ao serviço, direito de índole constitucional. E, se é direito do consumidor se ver protegido em face de propaganda enganosa (art. 6º, IV, 30 e 37 do CDC), com mais razão deve estar protegido o trabalhador, que é justamente o destinatário da gratificação em tela.

Registro, por oportuno que o art. 484-A da CLT foi taxativo ao descrever os direitos que seriam perdidos nesta modalidade rescisória, não havendo espaço para a interpretação ampliativa de preceitos de natureza restritiva. Destaco, ainda, que as inovações trazidas pela Lei 13.467/2017 são de natureza legal, não afetando a permanência das cláusulas contratuais e/ou do costume já estabilizado nos alicerces da empresa.

Tanto é assim que que a reforma trabalhista não derrogou, nem mesmo alterou o caput do art. 468 da CLT, que garante a permanência das cláusulas benéficas aos trabalhadores antigos, sejam tácitas ou expressas, sejam oriundas do próprio pacto ou do regulamento de empresa (Maurício Godinho Delgado, Curso de Direito do Trabalho. LTr: São Paulo, 18ª ed. 2019, p. 238). Entendo, por sinal, que as condições prévias se revelam ainda mais resguardadas quando escoradas em código de ética e campanha publicitária que apregoa por escrito os valores, benefícios e costumes da companhia. É o que se extrai dos preceitos jurídicos mais essenciais de nossa legislação substantiva e adjetiva, resumidos pelos dispositivos abaixo transcritos:

Art. 5º do DL 4.657/42: Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Art. 468 da CLT: Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

Art. 8º do CPC: Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.

Deveras, seja por uma questão moral, seja por uma questão jurídica, impõe-se que a empresa haja em conformidade com as regras que ela mesma criou, mais ainda quando utiliza seus supostos valores como forma de angariar capital social frente a seus clientes e trabalhadores, asseverando se tratar de uma empresa diferenciada frente aos pares, focada na melhoria contínua e, ao mesmo tempo, fiel ao passado, como já dito acima.

Não se olvida que as práticas empresariais mudem ao longo do tempo, mais ainda num cenário de globalização e acirrada competição. Não obstante, deve-se também lembrar que a Declaração sobre os princípios e direitos fundamentais do trabalho da OIT, da qual o Brasil é signatário, prescreve que o crescimento econômico deve se dar alinhado ao progresso social, e não ao esfacelamento das condições já garantidas. E, por uma questão de compliance, entendo que o código de ética empresarial possui uma esfera normativa mínima que vincula, ao menos, o sujeito que voluntariamente criou a regra

Para piorar, observo que o documento juntado pela ré nem mesmo prova a ciência do autor a respeito da supressão dos direitos vindicados nestes autos. Em verdade, a própria ré confessou inicialmente que "não encontrou em seus documentos localizados no RH a carta de mútuo acordo elaborada pelo reclamante" (ID. 5d36da0).

Por sua vez, o documento de ID. 560aa5b somente retrata o direito à gratificação pelo tempo de casa, sem nada mencionar a respeito dos haveres que seriam perdidos. Por sinal, relembro que o documento nem mesmo observa a forma descrita pelo preposto da ré, em depoimento pessoal (resposta 1 de fls. 639), já que não fora redigido de próprio punho pelo reclamante, sendo tão somente por ele subscrita. E, como é cediço, não servem as razões finais para a complementar as provas, mais ainda após já declarada a preclusão dos documentos (ID. 905696b) e ocorrido o encerramento da instrução (ID. 89d3a84).

Ainda que assim não fosse, verifico que a carta não faz alusão a qualquer renúncia específica e nem mesmo se mostrou acompanhada da política de rescisão do contrato de trabalho a que faz referência, militando em favor do autor a presunção de que as informações lhe foram passadas de modo equivocado, tendo em conta o relato da testemunha Sr. EUCLIDES JOSÉ NETO, ao depor que (ID. 89d3a84):

2... foi dispensado sem justa causa, mas não teve opção verbas sem assinar o documento da gratificação;

3... foi apresentada carta de mútuo acordo; indagou que foi garantido para os gerentes mais antigos não teriam prejuízo na rescisão; o mesmo foi passado para o reclamante (...) foi garantido verbalmente aos gerentes antigos que já tinham direito adquirido;

4... foi deixado claro que não abririam mão de nada

Pouco importa, portanto, que o autor tenha MBA na Nasa ou que tenha feito a rescisão de mais de mil funcionários antes de ser dispensado. Afinal, numa empresa que se autointitula um exemplo de transparência, integridade, respeito, civismo e honestidade, espera-se que cumpra, ao menos, com sua prévia palavra. E, no caso, ficou demonstrado pela testemunha da própria ré que esta palavra efetivamente chegou a ser dada, porém, sem ser cumprida (arts. 212, IV, do CCB e 375 do CPC). Isso porque o Sr. RAFAEL VISCARDI, ouvido por este magistrado, reconheceu que o reclamante se insurgiu no momento da homologação, após terem sido pagas as verbas rescisórias inerentes à rescisão por mútuo acordo (resposta 2, in fine fls. 640).

Ora, o fato de o autor ter se surpreendido negativamente com os haveres rescisórios é prova cabal de que ele nem sequer imaginava que teria supressão dos direitos, corroborando toda a narrativa inicial a respeito da matéria (arts. 212, IV, do CCB, 375 do CPC, 239 do CPP e 765 da CLT). Portanto, entendo que, mais do que erro (art. 138 do CCB), houve verdadeiro dolo (art. 145 do CCB) das Casas Pernambucanas ao induzir o trabalhador a realizar a rescisão por mútuo consentimento, dado que o que ocorreu, de fato, foi a dispensa sem justa causa.

Neste cenário, acolho o pedido declaratório e condeno a ré a pagar as diferenças alusivas ao aviso prévio e à multa indenizatória do FGTS, tal como reivindicado. Por outro lado, tenho por indevido o seguro-desemprego, pois o valor auferido pelo reclamante na rescisão (R$ 233.943,44 líquidos) se mostrou suficiente para a constituição de renda apta à manutenção familiar por tempo suficiente para afastar o benefício requerido (art. 3º, III, da Lei 7.998/1990).

Julgo, pois, parcialmente procedente o pedido.

4. Da ajusta de custo. Integração ao salário pós 11.11.17

Restou incontroversa a natureza salarial da ajuda de custo concedida pela ré antes da reforma trabalhista, sendo que, após a vigência da Lei 13.467/2017 (11.11.2017), o empregador passou a conferir natureza indenizatória à parcela.

Ocorre que, por força do art. 468 da CLT, encontra-se o obreiro protegido contra alterações unilaterais do empregador, sendo defesa a modificação in pejus. A natureza legal da inovação não socorre a ré, dada a proteção havida no art. 7º, VI, da Constituição da República, norma de hierarquia superior, que veda a redução salarial.

Após anos recebendo a parcela como parte integrante da remuneração, evidente que acabou aderindo e integrando o patrimônio jurídico do trabalhador para todos os efeitos, criando neste a justa expectativa de permanência ao longo do pacto laboral, inclusive como forma de fazer frente às despesas correntes. Alterar a natureza jurídica de modo abrupto enseja evidente prejuízo, mormente quando enseja a supressão dos reflexos que até então vinham sendo pagos.

Ante o exposto, acolho o pedido declaratório e condeno a ré a pagar a repercussões postuladas em aviso prévio, trezenos, férias com 1/3 e FGTS com multa de 40%, observado o período acima mencionado.

5.   Da justiça gratuita

Tenho por ausentes os pressupostos necessários à concessão das prerrogativas requeridas, pois a declaração de pobreza restou elidida pelo TRCT juntado pelo próprio autor, evidenciando que este, após décadas numa função de gerência que rendia uma remuneração de mais de R$ 12 mil reais, auferiu R$ 325.203,16 brutos três meses antes do ajuizamento da demanda. Tal valor ultrapassa, em muito, o limite previsto pelo art. 790, § 3º, da CLT. Para ser exato, é cinquenta vezes superior ao teto atual da previdência.

Rejeito, pois a justiça gratuita requerida.

6.   Dos honorários advocatícios

Considerando os critérios estabelecidos pelo § 2º do art. 791-A da CLT (natureza e importância da causa, trabalho, lugar do serviço, grau de zelo profissional, qualidade do trabalho, inclusive o realizado no curso da instrução probatória, e tempo exigido do advogado), defiro a verba honorária da seguinte forma:

a) Em prol do advogado da parte autora: no importe de 10% do valor líquido da condenação, na forma da OJ 348 da SDI-1;

b) Em prol do advogado da parte reclamada: no importe de 10% sobre o proveito econômico obtido nestes autos (TST-RR-425-24.2018.5.12.0006, 4ª Turma, Rel. Min. Alexandre Luiz Ramos, J. 16/09/2020), o qual será aferido com base na diferença havida entre o valor da causa (conforme descrito na inicial) e o valor provisoriamente arbitrado nesta sentença à condenação (conforme descrito abaixo), ficando autorizada a dedução do crédito trabalhista para quitação da verba.

Insta mencionar que os honorários de sucumbência não excluem os contratuais, sendo estes devidos sem direito à indenização suplementar (art. 404 do CCB), ante o jus postulandi (Súmula 18 do TRT/SP). Sem embargo, os valores recebidos pelo patrono a título sucumbencial devem ser levados em conta no acerto final com o cliente ou constituinte, na forma do art. 35, § 1º, do Código de Ética da OAB. Dessa maneira, é dever do advogado realizar por conta própria as deduções eventualmente cabíveis com o cliente, de molde a evitar o bis in idem e/ou o enriquecimento sem causa.

Defiro, nestes termos.

7.  Da litigância de má-fé

Em que pesem as assertivas assentadas no caderno processual, não vislumbro a existência de qualquer conduta processual efetivamente maliciosa, a menos a ponto de ensejar à cominação prevista pelos artigos 793-C da CLT e 81 do CPC.

Em verdade, entendo que as manifestações e peças processuais apresentadas apenas buscaram a defesa dos interesses de cada parte, tudo de acordo com o que vaticinam os princípios do amplo acesso ao Judiciário e do devido processo legal (art. 5º, XXXV e LIV, da Constituição da República).

Nesta quadra, ao menos por enquanto, não há multa a ser aplicada.

8.  Da expedição de ofícios

No entender deste juízo, não foram verificadas lesões aptas a ensejar a obrigatória expedição de ofícios a quaisquer órgãos ou entidades. Nada obsta, todavia, que o próprio interessado se valha do direito de petição perante a Administração Pública para comunicar as eventuais irregularidades que reputa existentes.

Rejeito.

9. Dos critérios de liquidação

A liquidação envolve matéria de ordem pública e, portanto, pode ser feita de modo diverso daquele determinado em sentença, desde que atenda à legislação vigente no momento da apuração dos créditos (Súmula 344 do STJ). Sem embargo, a fim de evitar a alegação de nulidade por omissão, esclareço desde logo que a fase de liquidação deverá ser realizada por meio de cálculos que atendam aos critérios da fundamentação sem desrespeitar os limites da petição inicial, haja vista que estes funcionam como balizas da condenação (arts. 141 e 492 do CPC).

Com relação aos juros e correção monetária, deverá a liquidação respeitar o disposto pelo STF na ADC 58 (incidência do IPCA-E mais juros simples pela TR acumulada na fase pré-judicial, seguindo o marco temporal da exigibilidade de cada obrigação, e, após o ajuizamento da ação (fase processual), incidência tão somente da taxa SELIC. No mais, atentem-se para os critérios estabelecidos pela Tabela Única de Atualização e Conversão de Débitos Trabalhistas do CSJT, também vigente na fase de acertamento, aplicando-se a Súmula 07 do TRT/02 na hipótese de diferença de juros, pois cabe ao devedor buscar a rápida satisfação do crédito, sob pena de arcar com os encargos decorrentes da demora processual.

São devidas contribuições previdenciárias (INSS) sobre todas as verbas de natureza salarial, assim consideradas apenas aquelas que se amoldem no conceito de salário-contribuição (art. 28, I, da Lei 8.212/91), não sendo este o caso do aviso prévio indenizado, do FGTS com 40% e das férias indenizadas com 1/3 (STJ, Resp n.º 1.230.957). A apuração e o recolhimento das quotas empregador e empregado porventura cabíveis serão feitos pela parte ré, respeitadas as alíquotas e o limite mensal definido pela legislação vigente (art. 276, § 4º, do Decreto n º 3.048/99 c/c arts. 20, 30, I e 35 da Lei 8.212/91). O cálculo observará o regime de competência e o fato gerador seguirá a orientação descrita nos itens III e IV da Súmula 368 do TST, com atualização a partir do dia 20 do mês subsequente ao efetivo pagamento (art. 30, I, b, da Lei n.° 8.212/91).

Registro que o artigo 33, § 5º, da Lei nº 8.212/91 se direciona ao recolhimento feito no curso do contrato, não se aplicando à condenação fixada em Juízo. Portanto, cumpre a cada contribuinte arcar com sua própria quota-parte, inclusive com a correção pertinente (Súmula 368, II, do TST c/c art. 879, § 4º da CLT). Todavia, para evitar prejuízos ao hipossuficiente, determino que os juros e a multa cabíveis sejam arcados exclusivamente pela demandada (artigo 239 do Decreto 3.048/1999), seguindo a orientação já pacificada pela Corte Suprema Trabalhista (TST, E-RR-1150-73.2012.5.02.0047, Informativo 31 de Execução). Além disso, caberá à parte ré realizar o recolhimento da GPS, comprovando nos autos a consequente informação via GFIP/SEFIP/CNIS, sob pena de execução direta. O recolhimento abrange inclusive as contribuições previdenciárias devidas em razão de seguro de acidente de trabalho (SAT), conforme arts. 11 e 22 da Lei nº 8.212/91 (Súmula 454 do TST), mas não alcança, por outro lado, as contribuições eventualmente devidas a terceiros, dados os limites de competência desta Especializada, consoante traçado pelos arts. 114, 195 e 240 da Constituição (Enunciado 74 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho).

Saliento que eventual isenção ou tratamento previdenciário diferenciado deverá ser demonstrado e/ou apontado pela ré na fase de liquidação, no prazo de apresentação dos cálculos, mediante certificação ou juntada de documentos que atestem a tese patronal para o período da condenação (arts. 179 e 195, I e II, § 7º, da CF c/c art. 22-A da Lei 8.212/91, art. 13, § 3º, da LC 123/2006, art. 24, § 2º, da Lei 12.101/09, art. 7º, VII, da Lei 12.546/11, Parecer Normativo COSIT n.º 25/2013).

As contribuições fiscais somente são cabíveis sobre os rendimentos legalmente sujeitos à incidência do imposto de renda (IRPF), na forma do artigo 36 do Decreto 9.580/2018, sendo isentos os títulos indenizatórios, tais como os honorários e juros de mora, por exemplo (OJ 400 da SDI-1 e Súmula 19 do TRT/SP). O cálculo observará a tabela progressiva e a atualização mês a mês, na forma do art. 12-A da Lei nº 7.713/88, devendo a retenção ser feita em consonância com o artigo 46 da Lei 8.541/92, cumprindo à fonte pagadora comprovar nos autos o recolhimento devido, em até 15 dias da retenção (art. 26 e §§ da IN n.º 1.500/2014 da RFB c/c Súmula 363, II, do TST).

Os abatimentos e/ou deduções eventualmente cabíveis já foram deferidos acima, inexistindo outras compensações a serem realizadas, ao menos no entender desse Juízo, porquanto não demonstradas as hipóteses legais dos arts. 368 do CCB e 767 da CLT c/c Súmula 18 do TST. Em arremate, destaco que a presente sentença tem força de hipoteca (art. 495 do CPC), cabendo ao próprio interessado diligenciar perante os órgãos competentes para realizar o registro, se assim entender necessário.

10.  Da forma de cumprimento de sentença

Com amparo no parágrafo primeiro do artigo 832 da CLT, deixo expresso desde logo que: I) o pagamento das verbas acima descritas deverá ser realizado em até 15 dias da intimação da sentença de liquidação, salvo se esta dispuser expressamente de modo diferente; II) a comprovação dos recolhimentos fiscais/previdenciários porventura cabíveis se dará no mesmo prazo das verbas trabalhistas, observando o que já exposto no capítulo anterior; III) a intimação para pagamento poderá se dar na pessoa do advogado cadastrado no PJe, tal como autoriza o art. 832, § 1º, da CLT em conjunto com o art. 523 do CPC; IV) a ausência de pagamento dentro do prazo estipulado no item I supra implicará imediata execução da parte devedora, na forma do art. 149 e §§ do Provimento GP/CR n.º 13/2006.

Os demais temas atinentes à execução deverão ser debatidos no momento oportuno, na fase de cumprimento de sentença.

11.  Considerações finais

Apenas para evitar a oposição de recurso com escopo procrastinador, consigno que o Juízo não se encontra obrigado a rebater os argumentos contingenciais e/ou as alegações meramente subsidiárias, que, por sua própria natureza, são incapazes de atingir a validade da decisão já proferida (art. 489, § 1º, IV, do CPC c/c art. 15 da IN 39/16 TST). Além disso, anoto que a conclusão não precisa repetir os termos já utilizados pelo magistrado, sendo válido o dispositivo meramente remissivo (TST, E-ED-RR-44900-98.2002.5.04.0701, SBDI-I, rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, DJ 18/05/2017).

Por lealdade processual, impende lembrar que os embargos declaratórios não servem para discutir o conteúdo das provas e tampouco para obter a reforma do julgado, nem mesmo no tocante a eventuais critérios de atualização do débito e/ou reanálise da justiça gratuita, devendo eventuais irresignações serem dirigidas à instância revisora pelo meio impugnativo adequado. Não servem, ainda, para obstar a fluência de qualquer prazo, ressalvada a previsão do art. 897-A, § 3º, da CLT. A oposição de aclaratórios com intuito de criar embaraço poderá ser interpretada como litigância de má-fé e ato atentatório à dignidade da justiça, atraindo a cominação dos artigos 793-C da CLT, 77, § 3º, e 1.026, § 2º, do CPC.

Finalmente, atentem as partes que, em caso de eventual omissão ou nulidade, o próprio Tribunal é competente para complementar e sanear o feito de modo imediato, sem necessidade de baixa dos autos ao primeiro grau (art. 1.013, §§ 1º e 3º, do CPC c/c Súmula 393 do C. TST), que inclusive já encerrou sua função jurisdicional na fase cognitiva, sem qualquer necessidade de pré-questionamentos (Súmula 422 do TST e OJ 118 da SDI-1).

São estas, portanto, as razões de decidir.

III DA CONCLUSÃO

Diante do exposto e nos termos da razão de decidir supra, que integra este dispositivo para todos os efeitos, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ***, em face de ARTHUR LUNDGREN TECIDOS S.A CASAS PERNAMBUCANAS, para o fim de reconhecer a natureza salarial da ajuda de custo e declarar a rescisão sem justa causa, bem assim condenar a ré nas diferenças de trezenos, férias com 1/3, aviso prévio e FGTS com 40%, conforme capítulos 3 e 4 supra (arts. 832 da CLT e 487, I, do CPC).

O valor total efetivamente devido será apurado por simples cálculos, no prazo legal, atentando-se quanto aos juros, correção monetária e contribuições tributárias (IR/INSS) descritos no corpo do julgado. As diferenças de FGTS serão recolhidas à conta vinculada, tal como determina a Lei 8.036/90.

São devidos honorários advocatícios recíprocos, na forma do capítulo 6 supra. Já as custas serão arcadas exclusivamente pela ré, no importe de R$ 3.300,00, calculadas sobre o valor da condenação ora arbitrada em R$ 165.000,00, sujeitas à complementação ao final (art. 789, I, da CLT).

Sentença antecipada. Intimem-se as partes. Com relação à União, observe-se o disposto na Portaria MF nº 582/13, cabendo a intimação na fase de liquidação (art. 879, § 3º, da CLT).

Mogi das Cruzes - SP, 15.12.2021

MATHEUS DE LIMA SAMPAIO

Juiz do Trabalho Substituto

Sobre o autor
Matheus de Lima Sampaio

Formado em direito pelo Largo de São Francisco (USP). Pós graduado em direito penal e processo penal pela UCDB; pós-graduando em direito do trabalho e processo do trabalho pela EPD e em compliance trabalhista pelo IEPREV. Atualmente é juiz substituto da 3ª Vara do Trabalho de Mogi das Cruzes - SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SAMPAIO, Matheus Lima. [SENTENÇA] Força normativa do código de ética empresarial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6752, 26 dez. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/95588. Acesso em: 22 dez. 2024.

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