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Pessoa com deficiência no sistema prisional brasileiro

05/10/2022 às 16:16
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O Estado não enfrenta a realidade do preso com deficiência e as suas condições carcerárias.

Resumo: O presente trabalho procurou trazer de forma crítica, abordagem relacionada ao encarceramento da pessoa com deficiência. Dando ênfase exclusivamente no que tange a pessoa com deficiência que padece por falta de adaptação nos cárceres brasileiro, com número ínfimo de acessibilidade, bem como a ausência do Estado brasileiro com suas políticas públicas para impulsionar melhorias no sistema carcerário. A crítica aqui esboçada é pura e unicamente pela ausência do Estado em enfrentar a realidade do preso com deficiência, bem como das condições carcerárias que os coloca para cumprir sua pena. Assim, o Estado brasileiro hodiernamente, deverá enfrentar esse problema nas instalações existentes nos estabelecimentos carcerários. Finalmente, o que se espera do Estado é uma solução diligente, sem paliativos, que seja eficaz, e, que, permitam aos apenados com deficiência o cumprimento da pena de maneira digna.

Palavras-chaves: Pessoa com Deficiência. Sistema Prisional Brasileiro. Legislação. Projeto de Lei.

Sumário: 1. introdução. 2. A desigualdade do encarcerado com deficiência. 3. A presença do estado em face ao cumprimento da pena pela pessoa com deficiência. 4. A realidade do sistema prisional em face da pessoa com deficiência. 5. Projeto de lei nº 4008 de 2019. 6. Conclusão. 7. Referências.


INTRODUÇÃO

Com o intuito de entender a necessidade de melhorar o sistema prisional brasileiro, que, de forma avassaladora superlota as penitenciárias por todo o Brasil, com ênfase neste estudo, o objetivo é assentir uma consideração sobre as questões que trata da dignidade da pessoa humana, em expecial do direito de cumprir a pena pelas pessoas com deficiência, em igualdade com a população carcerária, dentro da medida de suas necessidades, pois tratar-se de uma análise com olhos para o universo das pessoas com deficiência, das quais estão submetidas a cumprir pena privativa de liberdade.

Pretende-se com o presente estudo, oportunizar um olhar crítico sobre as condições de acessibilidade disponibilizado às pessoas com deficiência nos carceres brasileiro, sendo que, nesse estudo, em momento algum está se buscando a defesa, nem tão pouco a impunidade das pessoas com deficiencia, de forma a aplicar as excludentes de ilicitudes, contudo, visa a demonstração da ausência do Estado em tutoriar o apenado com deficiência.

Nesse sentido, harmonizando as circunstãncias contingenciadas do sistema prisional brasileiro, bem como das pessoas com deficiência inseridas nesse contexto, levando em consideração que a ressocialização ainda permeia pelo campo do imaginário, necessário se faz para tanto, com olhar critico, analisar a situação dessas pessoas com deficiência em relação ao direito fundamental à acessibilidade, haja vista as condições do formato de construção civil do sistema prisional não favorecer o apenado com dificiência para que cumpra a sua pena, sendo que, já está lastreado na Constituição Federal, como instituto jurídico na forma de norma imperativa, do qual obriga o ente público como garantidor desse direito proporcionar o cumprimente integral da pena.

Com a perspectiva de ascender o propósito essencial elaborado para este trabalho, encorpado e consistente na perquirição das condições às quais as pessoas com deficiência são submetidas no contexto do sistema prisional pátrio, bem como na verificação da existência se há garantia do direito à acessibilidade nas condições arquitetônicas, bem como da finalidade de encarar o famigerado assunto problemático que é o cumprimento da pena privativa de liberdade, em especial quando se trata da pessoa com deficiência, com olhos direcionados a observância da dignidade da pessoa humana.


A DESIGUALDADE DO ENCARCERADO COM DEFICIÊNCIA

Mesmo com o avanço considerável na inclusão social das pessoas com deficiência, ainda carece do enfrentamento do legislador em pautar questões que estão no âmbito do sistema prisional brasileiro, pois, para as pessoas com deficiência que estão gozando de sua plena liberdade, cuja liberdade é questionável frente as condições dos projetos urbanísticos na arquitetura das metrópoles, quanto mais as pessoas com deficiência encarcerada no sistema prisional brasileiro.

Assim, nesse sentido, analisando o princípio da igualdade, deduz que as pessoas acomodadas em situações diferentes, sejam tratadas de forma desigual, pois, para o doutrinador Nelson Nery Junior[2] o tratamento isonômico às partes significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades, portanto, a ausência do Estado deixa claro que a pessoa com deficiência está em desigualdade no princípio isonômico. (NERY JUNIOR, 1999, p. 42).

Conforme o escopo é enfrentar esse assunto, vislumbrando a inconsistência das condições do encarceramento dos quais são avassalados subjugados à pena privativa de liberdade no Brasil, no que têm sido apontado como uma das mais diversas do modelo penitenciário brasileiro, decorrência lógica da existência de um desleixo totalmente sub-humano, num formato precário, inexistindo a higiene e saúde, bem como considerando as limitações nas estruturas físicas dos espaços das celas, também das outras dependências e da falta de observância do Estado enquanto Poder Público, com a finalidade de demostrar a polêmica que envolve as inúmeras prisões presentes em todo o Estado Brasileiro.

As mais diversas discussões que permeiam com objetivo de assegurar a reabilitação do encarcerado ao convívio social, acaba caindo por terra, haja vista a falta de aplicação das políticas públicas, que, hipoteticamente são incapazes de reverter o quadro desse casulo insalubre do encarcerado brasileiro, do qual o sistema prisional está fadado a falência incondicional, do qual vem ocorrendo o declínio do modelo prisional e, chega ser impraticável possibilitar a essa pessoa com deficiência encarcerada para que possa retornar ao convício social com dignidade, tendo em vista que, nesses casos ocorre a perda de identidade social, tornando-o insensível, desapiedado, impiedoso, empedernido, estando assim vocacionado ao retorno da prática dos atos ilícitos como dantes.

Com o sentido voltado para o enfrentamento dos problemas que cingem o sistema carcerário brasileiro, ficam mais estarrecedor quando voltado para o aspecto das condições dos cárceres para acomodar as pessoas com deficiência inseridas nas celas dos presídios brasileiro, que, como sempre as condições são de explicita desigualdade em relação aos outros presos, bem como da falta de assistência e acessibilidade, tornando-se afanoso na manutenção do cumprimento da pena, haja vista que, por conta da deficiência, é insuperável quanto aos empecilhos nas locomoções.

Por conta da falta da acessibilidade dentro dos presídios, leciona Simone de Alcântara Savazzoni[3]:

No atual contexto do sistema penitenciário brasileiro, não seria ousado se inferir que em tais instituições não existem condições sequer para a locomoção de tais pessoas, violando um direito fundamental de primeira dimensão, ao impossibilitar o exercício do direito de ir e vir. Não seria visionário, se afirmar que, também, não há condições para o livre exercício do trabalho, inclusive pelo deficiente, fator preponderante para a socialização do indivíduo, através da participação nas oficinas e cursos profissionalizantes que teriam, em tese, direito.

Levando em consideração que somente no final do século XX, é que o legislador, de forma tímida, passou a atender o clamor das classes defensoras dos direitos das pessoas com deficiência, vendo para tanto mudar os conceitos sociais quanto ao tema de tão grande relevância para essas pessoas com deficiência que padecem da atenção das Políticas Públicas, ainda, considerando que esse avanço veio beneficiar significativamente o deslocamento das barreiras que de certa forma impedem a liberdade da pessoa com deficiência, há que falar dessa timidez dos Estado em resolver o problema ora em questão.


A PRESENÇA DO ESTADO EM FACE AO CUMPRIMENTO DA PENA PELA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Na atualidade, as circunstâncias em que se encontram as pessoas com deficiência encarceradas no sistema prisional brasileiro, tem tomado rumos confrontantes com o que é defendido pela Constituição Federal, precisamente no artigo I, inciso III a dignidade da pessoa humana - haja vista, está bandeira ser a defesa de uma sociedade justa e fraterna, contudo, o sistema carcerário brasileiro, na atual conjuntura em que se encontra, escancara o afrontamento deste que é um dos maiores princípios do Direito pátrio[4].

A falta de arquitetura nas instalações prisionais para receber esse grupo de pessoas com deficiência, é o ponto de partida para que o Estado possa por intermédio do Legislador, criar institutos jurídicos que fomente as Políticas Públicas para reverter o cenário atual, motivo pela qual, reivindicam estudos aprofundados da real população carcerária no Brasil que são deficientes, do qual emergirá soluções se não definitiva, então, mitigadora no sentido de aparelhar o apenado de maneira digna nos cárceres brasileiro.

Não obstante, no cenário atual, acha-se um arcabouço de legislações que de certa forma vem com o escopo de dar proteção a pessoa com deficiência, contudo, o que não foi observado pelo Legislador, foi olhar com mais cuidado para os institutos jurídicos que dão sustentabilidade para aplicação da Lei Penal, seja na lei ordinária, ou mesmo nas leis extravagantes, subsídios na acessibilidade para que o apenado com deficiência possa cumprir sua pena com dignidade. Contudo, na omissão do legislador, o sofrimento da pessoa com deficiência em pagar sua pena, acaba por ser duplamente apenada, haja vista o Estado que tem a obrigação de abarcar essas questões, ao contrário, penaliza-os por falta de estrutura.

Nesse liame, Nelson Mandela em seu momento de reflexão sobre o cárcere, foi muito feliz e dizer que Ninguém sabe verdadeiramente o que é uma Nação até que tenha estado dentro de suas prisões. Uma Nação não deve ser julgada pela forma como trata seus cidadãos mais elevados, mas seus menos queridos[5], pois, o sistema prisional brasileiro por meio dos mecanismos de informações do Ministério da Justiça acaba por mostrar como é o acolhimento do apenado, em especial a pessoa com deficiência que não tem condições adequadas para pagar sua pena.

Entretanto, o Legislador pecou e muito ao deixar de tratar da pessoa com deficiência quando da criação de leis que trata do sistema prisional, pois, essa lacuna na legislação, acabou por deixar as interpretações para os tribunais, permitindo que o judiciário legisle por meio das jurisprudências, pois o Judiciário tem que dar uma decisão, nem sempre saem de acordo o esperado, em particularidade, frente a fragilidade do apenado com deficiência.


A REALIDADE DO SISTEMA PRISIONAL EM FACE DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

O Ministério da Justiça e Segurança Pública, através do Departamento Penitenciário Nacional[6], com elementos consubstanciados a respeito das informações penitenciárias, do qual detectou que, no que tange às pessoas com deficiência, o cenário nacional é alarmante, pois as condições são precárias, bem com a falta de acessibilidade para atender essa demanda prisional.

Com base nessas informações, em sentido amplo, a população carcerário no Brasil, com dados atualizados de dezembro de 2019[7], atualmente a População carcerária conta com 748.009 presos, sendo divididos em:

  • Regime fechado = 362.547 48,47%;

  • Semiaberto = 133.408 17,84%;

  • Aberto = 25.137 3,36%;

  • Provisório = 222.558 29,75%;

  • Tratamento ambulatorial = 250 0,05%;

  • Medida de Segurança = 4.109 0,58%.

Transportar esses dados para o quadro das pessoas encarceradas com deficiência, passa a ter a realidade de como o Estado está ausente e, principalmente, despreparado para exigir o cumprimento da pena por essas pessoas que, de certa forma, não está abarcado o princípio da igualdade com os demais encarcerados, por falta de acessibilidade. Neste liame, há de se observar o percentual de prisões com condições de dar ao apenado com deficiência o direito de pagar sua pena, haja vista os dados serem fornecidos pelo site do Ministério da Justiça e Segurança Pública[8] atualizado em 25/06/2020 às 11h e 33min conforme quadro comparativo:

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Condições arquitetônicas dos presídios brasileiro para atender o apenado com deficiência:

  • Unidades adaptadas - 11%

  • Unidades parcialmente adaptadas - 25%

  • Unidades sem nenhuma adaptação - 64%

Observa-se que, em se tratando de acessibilidade, a palavra parcialmente adaptada é o mesmo que sem adaptação, pois somente a pessoa com deficiência pode considerar para si o que é ou não adaptado.

Neste contexto, a realidade demonstra que 89% das prisões não têm celas adaptadas para deficientes, com isso, o Estado que tem a missão de garantidor, tutor direto do apenado, em ter no cárcere uma população de 6.500 encarcerados com deficiência, atende somente 715 (11%) e, obrigando 5.785 (89%) encarcerados com deficiência a pagar duplamente a pena, sendo a primeira pela condenação e, a segunda por não ter acessibilidade no sistema prisional brasileiro.

PROJETO DE LEI Nº 4008 DE 2019

Considerando o Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional, cuja criação se deu em 14 de setembro de 2012 por meio da Lei n° 12.714, que tem por escopo acompanhar a execução das penas no sistema penal brasileiro, em tese poderia contribuir e muito para com os dados e fiscalização das condições de acessibilidade para que a pessoa com deficiência para que pudesse dar o cumprimento da pena com dignidade, lembrando dos índices informados no item 4, fica compreensível a falta de legislação especifica para o caso em tela, pois a analise crítica depreende da data da criação da Lei, para com as necessidades visíveis para a atualidade, haja vista já ter se passado 8 anos de sua criação.

Atualmente tramita no Senado Federal, projeto de Lei nº 4008, de 2019[9], que tem por objetivo atender as pessoas encarceradas com deficiência.

Nesse projeto de Lei, busca a alteração da Lei no 7.210/1984, conhecida como a Lei de Execução Penal, visando que a pessoa com deficiência possa cumprir a sua pena em estabelecimento penal adaptado segundo as condições de sua deficiência. Assim, ficará incluído o artigo 43-A Lei n° 7.120, de 1984, de 11 de julho de 1984 do referido projeto de Lei nº 4008/2019 com a seguinte redação: Art. 43-A. A pessoa com deficiência cumprirá pena em estabelecimento penal adaptado à sua condição peculiar. Parágrafo único. As obras de adaptação dos estabelecimentos penais para atendimento do disposto no caput deste artigo serão custeadas com recursos do Fundo Penitenciário Nacional Fupen.

Como ainda está se tratando de um projeto de Lei, a população carcerária brasileira com deficiência carece do enfrentamento do Estado para que não continue pagando duplamente sua pena.


CONCLUSÃO

Após uma analise crítica do sitema prisional brasileiro, frente a tutela do Estado em dar condições ao apenado com deficiência, proporcionando-lhes acessibilidade arquitetônica, clareou mais o que já é visto pelos índices do sitema de informações do Departamento Penitenciário Nacional. Assim, nesse sentido, o Estado, cuja missão é ser o garantidor e incumbido de cumprir as Leis que abarcam os encarcerados, nesse caso em específico a pessoa com deficiencia, provou que, os cárceres brasileiro não estão dando a devida atenção ao apenado com deficiência, ao passo que deveriam proporcionar-lhes as adaptações necessárias.

Em momento algum, como foi abordado na introdução deste trabalho, busca-se a exclusão do cumprimento da pena pela pessoa com deficiência, pois, ao apenado, independente de ser ou não deficiente, a pena imposta com restrição de liberdade, deverá ser paga em seu tempo determinado em sentença. Porém, procurou-se demonstrar a real condições dos apenados com deficiência no sistema prisional brasileiro, bem como, com isso, o Estado no sentido amplo de seus poderes, demonstrou inápto para dar condições dígnas com acessibidade a pessoa com deficiência, assim, a ressocialização, resta comprometida, ocorrendo a perda de indentidade com o mundo externo ao cárcere, impossibilitando-lhes, serem proporcionados uma reabilitação digna a sua condição de deficiência.

Conclui-se, que, o Estado, de forma capenga, pelo que foi demonstrado, com números baixíssimos de cárceres em condições adaptadas para o apenado com deficiência, carece e muito de legilações pujantes para esse fim, pois, com o projeto de Lei nº 4008/2019, que está tramitando no Senado Federal, com fins específicos para atender a pessoa apenada com deficiência, assim, como uma luz no fim do túnel, começa a despontar.


REFERÊNCIAS

Constituição Federal - http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm - acessado em 17/08/2020 - às 21h e 25min.

https://ponte.org/como-o-brasil-trata-nas-prisoes-seus-cidadaos-menos-queridos - Acessado em 28/08/2020 às 01h e 24min.

Ministério da Justiça e Segurança Pública: https://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/relatorio_2016_junho.pdf - acessado dia 25/08/2020 as 00h e 02min

Ministério da Justiça e Segurança Pública: https://app.powerbi.com/view?r= acessado dia 24/08/2020 as 23h e 53min.

Ministério da Justiça e Segurança Pública: https://app.powerbi.com/view?r= acessado dia 26/08/2020 as 00 e 15min

NERY JÚNIOR, Nélson. Princípios do processo civil à luz da Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999.

SAVAZZONI, Simone de Alcântara. Dignidade da pessoa humana e cumprimento de pena das pessoas com deficiência. Revista Eletrônica da Faculdade de Direito da PUC-SP, v.3, 2010. p. 27

Senado Federal - https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/137754 - acessado em 26/08/2020 às 23h e 28min.

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Sobre o autor
Pedro Batista Marques

- Advogado - Pós Graduado em Direito Civil e Processo Civil - Pós Graduado em Direito Penal e Processo Penal - Pós Graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho - Pós Graduado em Direito Tributário

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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