Capa da publicação Dispensa em massa sob a ótica da responsabilidade civil

Dispensa em massa sob a ótica da responsabilidade civil

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15/12/2024 às 10:53

Resumo:


  • O estudo aborda a despedida em massa de trabalhadores como base para indenização por danos morais, considerando implicações jurídicas e sociais.

  • O marco jurisprudencial estabelecido pelo Tema 638 do STF requer negociação coletiva prévia para dispensas coletivas, discutindo a responsabilidade civil do empregador e limites impostos pela decisão.

  • O estudo destaca a relevância dos danos morais no contexto das relações trabalhistas, preenchendo lacunas jurisprudenciais e propondo avanços na efetivação dos direitos trabalhistas diante das transformações do mercado de trabalho.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3. RELEVÂNCIA DO RE 999.435/SP, OMISSÃO DO STF

Quanto ao tema 638 do Supremo Tribunal Federal, este, aborda a necessidade de intervenção sindical prévia como requisito obrigatório para a realização de dispensas coletivas de trabalhadores. A tese foi fixada no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 999.435/SP, cujo efeito ex nunc tem marco inicial em 2022.

Nesta senda, quanto ao ponto central do tema abordado supra, o “STF” entendeu que, embora as dispensas individuais sejam um direito potestativo do empregador, as dispensas em massa envolvem direitos coletivos e, em decorrência desse aspecto sui generis, demandam negociação prévia com os sindicatos da determinada categoria de Empregados. Tal medida supostamente tem como objetivo proteger os trabalhadores contra arbitrariedades e minimizar os impactos socioeconômicos de decisões empresariais que envolvam a ruptura simultânea de vários contratos de trabalho.

Ato contínuo, o entendimento do Supremo Tribunal Federal, em que pese tenha aprofundado milimetricamente no caso, seja por intermédio de debate filosófico, teleológico e, cujo protagonismo no Acórdão figura mais que evidente, utilizando-se de silogismo quanto aos efeitos do decisum, figurou complacente quanto à inaplicabilidade do direito nos casos de despedida em massa dos empregados que foram desligados antes do julgado, ainda que tenham ajuizado a ação pós julgamento do RE 999.435/SP.

Ressalte-se que a demissão em massa, conduzida sem prévia negociação coletiva, caracteriza ato ilícito, violando os princípios da dignidade da pessoa humana - art. 1º, III, CF, e da função social da empresa - art. 170, III, CF, o que enseja a reparação solidária pelos prejuízos morais causados, eis que a conduta revela titânica negligência em relação ao impacto social e sobretudo individual dos empregados, quanto às dispensas coletivas. Oportuna a ressalva de que a Empresa se beneficiara diretamente do trabalho dos Empregados e, ao negligenciarem os direitos fundamentais do trabalhador, agem de maneira evidentemente ilícita, devendo, dessarte, responder integralmente pela reparação do dano moral sofrido.

Inclusive, aproveitando-se do diapasão supra aduzido, toda a argumentativa dos MM. Ministros, quando dos respectivos votos no referido tema 638, adotam a precípua vertente de que toda a busca processual perpassa em torno da nulidade da dispensa e não se observa que o dano moral reverbera na matéria atinente à dispensa em massa, eis que figuram presente não só o dano propriamente dito, bem como a conduta do Empregador que coaduna incisivo nexo de causalidade direto para reverberar esse dano suportado pelo Empregado e, inclusive, caso este venha a sustentar família, aqueles que dependem financeiramente deste sofreram incisivamente com os efeitos dessa despedida, no caso em tela, todos os familiares dependentes dos Empregados despedidos, o que, evidentemente, agrava titanicamente a omissão do julgado.

Nesta senda, oportuno trazer à tona o entendimento do MM. Ministro Alexandre de Moraes em seu voto. Verbis:

(...) as dispensas coletivas de trabalhadores, substantiva e proporcionalmente distintas das dispensas individuais, não podem ser exercitadas de modo unilateral e potestativo pelo empregador, sendo matéria de Direito Coletivo do Trabalho, devendo ser submetidas a prévia negociação coletiva trabalhista ou, sendo inviável, ao processo judicial de dissídio coletivo, que irá lhe regular os termos e efeitos pertinentes.11

Assim, a fim de dar azo à fundamentação quanto ao cabimento de indenização decorrente da despedida em massa, figura esclarecedor o ministro Marco Aurélio:

O Estado não dá com uma das mãos para tirar com a outra. A assim não se concluir, admitir-se-á, na Carta da República, palavras e expressões inúteis, prevendo-se, no comando do inciso I do artigo 7º, ser a relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária, aquela que, socialmente, não se justifica, ou sem justa causa, isto é, a partir do humor do tomador dos serviços. A garantia é peremptória.12

Portanto, observa-se que o decisum figura brilhantismo quanto ao fundamento de responsabilidade do Empregador, contudo, seu efeito ex nunc protagoniza contrario sensu quanto à vasta gama de casos no Brasil onde constantemente ocorrem “despedidas em massa”.

Vê-se que, da análise do Tema 638, que toda a argumentativa dos Ministros, quando dos respectivos votos no referido, adotam a precípua vertente de que toda a busca processual perpassa em torno da nulidade da dispensa e não se observa a vertente de evidência estelar de que o dano moral reverbera em detrimento do ato de dispensa em massa.

Ato contínuo, a fim de obstaculizar azo à omissão e ampliar o fundamento específico do presente estudo, brilhante foi o entender do Tribunal Superior do Trabalho quando determinou, ipsis litteris: “imprescindível a participação sindical para a dispensa em massa”13, restando inexorável a ressalva de que a lide em discussão no julgado tratava-se de dispensa em massa ocorrida em junho de 2017, ou seja, antes do tema 638, julgamento do RE 999.435/SP, onde aduziu diametralmente com o “TST”, o ministro Marco Aurélio: “(...) no comando do inciso I do artigo 7º, ser a relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária”14.

Portanto, o axioma de que o julgamento do STF dá azo ao prejuízo aos Empregados despedidos sem negociação prévia antes de 2022, trazendo consigo base para o aproveito dos Empregadores que, antes de 2022, vieram a se beneficiar de anos da força laborativa de inúmeros trabalhadores, os desligue simultaneamente sem prévia negociação com o seu respectivo sindicato e, caso estes Empregados venham a propor demanda judicial, terão seu direito indevidamente indeferidos.


CONCLUSÃO

Isto posto, a análise da responsabilidade civil no ordenamento jurídico brasileiro elucida natureza ampla. Esta, que se apresenta envolta nos aspectos patrimoniais quanto extrapatrimoniais, doravante, a doutrina e a legislação pátria, especialmente os artigos 186 e 927 do Código Civil, fundamentam o dever de reparar o dano, destacando a importância do nexo causal e da presença, ou não, de culpa.

Ato contínuo, ciente de que a responsabilidade civil objetiva e subjetiva servem de base à proteção aos direitos do lesado e garantindo a justiça social, no contexto do tema 638 do STF, a decisão de impor a obrigatoriedade de negociação coletiva antes das dispensas em massa traz lastro ao logro na proteção aos direitos dos trabalhadores. Contudo, a omissão quanto a situações anteriores ao julgamento termina por basilar questionamento sobre a efetividade da reparação em casos semelhantes.

Nesse contexto, a coexistência das responsabilidades objetiva e subjetiva reforça a proteção aos direitos dos lesados e contribui para a justiça social, assim, o julgamento do Tema 638 do STF, ao impor obrigatoriedade de negociação coletiva antes das dispensas em massa, representa avanço significativo na proteção dos direitos dos trabalhadores.

Ademais, impera trazer à baila que a ausência de regulamentação para situações anteriores à decisão elucida vertente passível de questionamentos sobre a efetividade da reparação em casos análogos. Inclusive, a ausência de uma abordagem explícita sobre o dano moral nas dispensas coletivas representa uma oportunidade para aprofundar a discussão e fortalecer a jurisprudência. Assim, o reconhecimento da responsabilidade do empregador evidencia o compromisso do ordenamento jurídico com a dignidade da pessoa humana e a função social das relações de trabalho. Ressalte-se, também, que figura imperativa a necessidade de adaptação do Poder Judiciário às demandas de uma sociedade em constante evolução e assegurando o equilíbrio entre a proteção dos direitos dos trabalhadores e a sustentabilidade das relações laborais.

Por derradeiro, o desafio contínuo reside em dar guarida a esses brocardos jurídicos, a fim de que estes sejam aplicados de maneira consistente e efetiva a todos os trabalhadores, sem exceção.


REFERÊNCIAS

MARTINS, Sérgio Pinto. Instituições de direito público e privado. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. 36. ed. São Paulo: 2022.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 11 dez. 2024.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2016. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 28 nov. 2024.

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm. Acesso em: 11 dez. 2024.

BÍBLIA. Novo Testamento. Mateus. In: Bíblia Sagrada. Tradução de Fernando. 3. ed. São Paulo: Editora NVI, 2023.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 2019.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 999.435/SP. Relator: Ministro Marco Aurélio. Redator para o Acórdão: Ministro Edson Fachin. Julgado em 19 de maio de 2021. Disponível em: https://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp. Acesso em: 8 dez. 2024.

SUPERIOR TRIBUNAL DO TRABALHO (TST). Dispensa em massa sem negociação com sindicato é inadmissível, reforça TST. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-jan-26/dispensa-em-massa-sem-negociacao-com-sindicato-e-inadmissivel-reforca-tst. Acesso em: 8 dez. 2024.


Notas

  1. DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil / Maria Helena Diniz – p23, Ed. 36. – São Paulo

  2. Art. 954. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo único do artigo antecedente. (BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139)

  3. BÍBLIA, N. T. Mateus. In: Bíblia Sagrada. Tradução de Fernando. 3ª Edição. São Paulo - SP: Editora NVI, 2023

  4. BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República, [2016]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 28 nov. 2024.

  5. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2022. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm

  6. BRASIL. Lei Nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm

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  7. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed., p. 752, São Paulo: LTr, 2019.

  8. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed., p. 743, São Paulo: LTr, 2019.

  9. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed., p. 745, São Paulo: LTr, 2019.

  10. DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 18. ed., p. 747, São Paulo: LTr, 2019.

  11. BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário 999.435/SP, Relator: Ministro Marco Aurélio, Redator para o Acórdão: Ministro Edson Fachin, julgado em 19 de maio de 2021. Disponível em: https://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp. Acesso em: 8 dez. 2024.

  12. BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário 999.435/SP, Relator: Ministro Marco Aurélio, Redator para o Acórdão: Ministro Edson Fachin, julgado em 19 de maio de 2021. Disponível em: https://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp. Acesso em: 8 dez. 2024.

  13. CONJUR. Dispensa em massa sem negociação com sindicato é inadmissível, reforça TST. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2024-jan-26/dispensa-em-massa-sem-negociacao-com-sindicato-e-inadmissivel-reforca-tst. Acesso em: 8 dez. 2024.

  14. BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário 999.435/SP, Relator: Ministro Marco Aurélio, Redator para o Acórdão: Ministro Edson Fachin, julgado em 19 de maio de 2021. Disponível em: https://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp. Acesso em: 8 dez. 2024.


Mass dismissal from the perspective of Civil Liability

Abstract: The study addresses the mass dismissal of workers as a basis for compensation for moral damages, considering the legal and social implications of this phenomenon. In view of the jurisprudential framework established by Theme 638 of the Federal Supreme Court, which requires prior collective bargaining for collective layoffs, the employer's civil liability and the limits imposed by the decision in relation to events occurring before 2022 are discussed, more precisely, The elements of civil liability are examined, such as damage, conduct and causal link, with an emphasis on the relevance of moral damages in the context of labor relations. The study seeks to fill jurisprudential gaps, highlighting fundamental principles such as the dignity of the human person and the social function of work, proposing advances in the implementation of labor rights in the face of contemporary transformations in the labor market.

Key words : Mass layoff; Civil Liability; Labor Law; Moral Damage; Constitutionalism and Private Law.

Sobre o autor
Ary Maximus Ferreira Ramos

Bacharelando em Direito pela Universidade Salvador; Monitor da Unidade Curricular (UC) Contratos e negócios jurídicos durante período do semestre 2023.2, mediante supervisão do Professor Doutor Fábio Santos; Estagiário do Escritório de Advocacia "Dirceu Noguera Filho"

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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