O indulto natalino é um mecanismo constitucional que tem como objetivo extinguir ou reduzir penas privativas de liberdade, reafirmando princípios de dignidade e ressocialização. Previsto no art. 84, inciso XII, da Constituição Federal, ele é uma prerrogativa exclusiva do Presidente da República, que o concede com base em critérios técnicos e humanitários.
Os decretos de indulto de 2023 e 2024 possuem semelhanças significativas, mas também importantes diferenças, que demonstram mudanças na abordagem do governo em relação à política penal. Este artigo tem como objetivo analisar essas alterações de maneira técnica e comparativa, destacando os impactos práticos para a advocacia criminal.
Semelhanças Técnicas entre os Decretos de 2023 e 2024
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Crimes Impeditivos: Ambos os decretos excluem determinados crimes da possibilidade de indulto ou comutação de penas. Entre eles:
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Crimes hediondos, nos termos da Lei nº 8.072/1990;
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Tortura (Lei nº 9.455/1997);
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Tráfico de drogas, com ressalvas para situações específicas (Lei nº 11.343/2006);
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Corrupção ativa e passiva, com penas superiores a quatro anos;
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Crimes contra o Estado Democrático de Direito (arts. 359-I a 359-R do Código Penal);
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Violência contra mulheres, crianças e adolescentes, especialmente os enquadrados na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006).
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Critérios de Exclusão:
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Pessoas submetidas ao Regime Disciplinar Diferenciado (RDD);
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Presos em penitenciárias de segurança máxima ou integrantes de facções criminosas, especialmente líderes.
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Benefícios à Ressocialização:
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Ambos consideram a participação em programas educacionais, trabalho interno ou externo e justiça restaurativa como elementos positivos para concessão do benefício.
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Cômputo de Tempo Cumprido:
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Períodos em prisão cautelar, domiciliar ou sob monitoramento eletrônico são computados como pena cumprida.
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Diferenças Entre os Decretos: Um Olhar Técnico
A tabela abaixo sintetiza as principais mudanças introduzidas pelo decreto de 2024 em relação ao de 2023:
Aspecto |
Decreto 2023 |
Decreto 2024 |
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Prazo de Cumprimento da Pena |
Exige cumprimento de 1/4 da pena para não reincidentes e 1/3 para reincidentes até 25/12/2023. |
Reduz os lapsos temporais exigidos para idosos, gestantes, mães e outros grupos prioritários. |
Pena de Multa |
Aplicável somente a valores abaixo do mínimo de execução fiscal ou em caso de incapacidade econômica. |
Abrange penas de multa cumuladas com privação de liberdade, mesmo que não quitadas. |
Foco em Mulheres |
Prioriza mães de filhos menores de 18 anos ou com deficiência. |
Amplia o benefício para mães e avós de crianças até 12 anos ou dependentes com deficiência. |
Critérios Educacionais |
Requer no mínimo 12 meses de cursos educacionais nos últimos 3 anos. |
Amplia os benefícios para cursos de menor duração, especialmente para reincidentes. |
Doenças Graves |
Exige laudo médico comprovando incapacidade do sistema prisional para atender ao caso. |
Estabelece presunção de inadequação do sistema para doenças graves como câncer em estágio IV. |
Justiça Restaurativa |
Não mencionada explicitamente. |
Reduz lapsos temporais para quem participa de programas de justiça restaurativa reconhecidos. |
Concessão pelo Juiz |
Permite o benefício mesmo com pendências em recursos de acusação. |
Adiciona a possibilidade de concessão oficiosa pelo magistrado competente. |
Impactos Práticos para a Advocacia Criminal
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Redução de Lapso Temporal: O decreto de 2024 traz significativa ampliação de benefícios para grupos vulneráveis, como idosos e mães, ao reduzir prazos de cumprimento da pena. Isso exige atenção redobrada do advogado ao analisar o perfil do cliente.
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Incorporação da Justiça Restaurativa: A inclusão explícita da justiça restaurativa no decreto de 2024 cria uma nova frente de trabalho para advogados criminais que atuam na ressocialização e mediação de conflitos.
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Doenças Graves e Presunções: A presunção de inadequação do sistema prisional para doenças graves no decreto de 2024 simplifica a prova, reduzindo a necessidade de laudos detalhados para algumas patologias, o que pode agilizar o trâmite processual.
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Expansão do Benefício às Multas: A inclusão de penas de multa cumuladas no decreto de 2024, independentemente de quitação, amplia o universo de pessoas elegíveis para o indulto.
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Atuação Oficiosa do Juiz: A possibilidade de concessão oficiosa pelo magistrado em 2024 reforça a necessidade de acompanhamento próximo da execução penal.
Conclusão
O indulto natalino de 2024 representa um avanço significativo em termos de humanização e inclusão. Ele amplia benefícios para grupos vulneráveis e flexibiliza critérios para doenças graves e penas cumulativas. Contudo, as exclusões rigorosas permanecem como garantia de segurança pública.
Advogados que atuam na execução penal devem atentar para essas mudanças, pois elas representam novas oportunidades de atuação, especialmente para aqueles que lidam com casos de justiça restaurativa, saúde prisional e defesa de mulheres encarceradas.