Capa da publicação Programas de integridade: o que leis municipais podem exigir
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A constitucionalidade da exigência de programas de integridade por leis municipais.

Reflexões à luz do Tema nº 917 do STF e da LINDB

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18/07/2025 às 13:59

Resumo:

- A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, representada pelo Tema 917 da Repercussão Geral, delimita a competência legislativa parlamentar e a reserva de administração, permitindo a criação de despesas e programas que interajam com a Administração Pública, desde que não interfiram na estrutura interna do Executivo.
- A implementação de programas de integridade em municípios enfrenta desafios como a escassez de recursos, a falta de capacitação técnica e a diversidade de portes empresariais, demandando regulamentações sensíveis à realidade local e adaptáveis.
- A formação e capacitação contínua dos atores públicos e privados são essenciais para a eficácia dos programas de integridade, sendo fundamental investir em conhecimento técnico, treinamentos, canais de denúncia, gestão de riscos e controles internos robustos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Conclusão

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, consolidada no Tema 917 da Repercussão Geral, é inequívoca ao delimitar os contornos da iniciativa legislativa parlamentar e da reserva de administração. A criação de despesas ou a instituição de programas que interajam com a Administração Pública não configura, por si só, usurpação de competência do Poder Executivo. A vedação constitucional incide apenas quando há interferência direta na estrutura interna do Executivo, nas atribuições de seus órgãos ou no regime jurídico de seus servidores. Essa interpretação está alicerçada no princípio dos freios e contrapesos, reforçada pelos parâmetros consequencialistas da LINDB, e assegura a atuação legítima do Poder Legislativo em matérias de relevante interesse público, sem comprometer a autonomia gerencial do Executivo.

Esse entendimento harmoniza-se com as Leis Federais nº 12.846/2013 e nº 14.133/2021, bem como com seus decretos regulamentadores, que não apenas admitem, mas incentivam a implementação de programas de integridade. Tratando-se de normas gerais, abrem espaço para que os municípios, no exercício da competência suplementar e de interesse local (art. 30, I e II, da CF), estabeleçam exigências compatíveis com suas realidades. O julgamento do ARE 1.410.340/SP pelo STF é paradigmático nesse sentido: confirma a constitucionalidade de lei municipal de iniciativa parlamentar que exige programas de integridade das empresas contratadas, desde que respeitados os limites materiais da reserva de administração.

Não obstante, a eficácia dessas leis municipais depende da superação de desafios concretos. A escassez de recursos, a insuficiência de capacitação técnica e a diversidade de portes empresariais demandam regulamentações sensíveis à realidade local. Nesse cenário, torna-se imprescindível a adoção de critérios proporcionais e flexíveis, especialmente em relação às micro e pequenas empresas, para que a exigência não se torne um entrave à participação no mercado público.

A Controladoria-Geral da União (CGU), com seus manuais e diretrizes práticas, oferece subsídios relevantes à estruturação de políticas públicas de integridade. Destaca-se a necessidade de que os programas não se limitem ao plano formal, mas sejam efetivamente aplicados e monitorados. Investir na capacitação de agentes públicos e privados revela-se, portanto, medida estratégica para a consolidação de uma cultura institucional voltada à ética, à transparência e ao combate sistêmico da corrupção.

Em conclusão, a exigência de programas de integridade por leis municipais de iniciativa parlamentar é juridicamente viável, constitucionalmente amparada e politicamente recomendável. Representa um importante instrumento de fortalecimento da governança pública e da integridade nas contratações administrativas. No entanto, sua eficácia depende da adoção de uma abordagem estratégica pelos entes municipais, alicerçada na proporcionalidade normativa, na capacitação técnica e na articulação interinstitucional. Somente assim será possível transformar a previsão legal em um mecanismo concreto de promoção da integridade, da eficiência administrativa e da confiança social na gestão pública.


Referências

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Abstract: This article analyzes municipal, state, and district laws that require integrity programs. Disparities among these norms are observed, leading to distinct obligations in the market. The research considers the regulation by general norms of Law No. 14.133/2021. The theoretical framework for the research is Fábio Carvalho's concept of regulation. The article discusses the intended incentives. Subsequently, it analyzes the integrity norms in public procurement. Finally, it studies Law No. 14.133/2021 and discusses the adequacy of its general rules.

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Sobre o autor
Luiz Carlos Nacif Lagrotta

Procurador-Geral do Município de Taboão da Serra, Professor do Centro Universitário UniFECAF, Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Especialista em Compliance pela Fundação Getúlio Vargas-FGV-SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LAGROTTA, Luiz Carlos Nacif. A constitucionalidade da exigência de programas de integridade por leis municipais.: Reflexões à luz do Tema nº 917 do STF e da LINDB. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 8052, 18 jul. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/114198. Acesso em: 5 dez. 2025.

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