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Do direito social de acesso às tecnologias da informação e análise da responsabilidade estatal pela exclusão digital

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4. CONCLUSÕES

O desenvolvimento tecnológico implicou em mudanças profundas em toda a dinâmica social, o problema deixa de ser a exclusão social e passa a ser a exclusão digital, pois está além de ser mais ampla que aquela, é capaz de ampliá-la se não for devidamente sanada.

Através da exclusão digital, é formado um grupo de pessoas digitalmente excluídas do acesso a tecnologias fundamentais para o exercício não só de funções cotidianas, como da própria cidadania e de outros direitos sociais. situação que, se não for interpelada em tempo hábil, agravará a situação dos digitalmente excluídos e contribuirá para a formação de grupo minoritário com monopólio das informações acessíveis por meio de tais recursos.

Diante da imprescindibilidade para a incrementação de políticas públicas de inclusão digital, e seu caráter de direito fundamental, conclui-se que o direito de inclusão digital se comporta como um direito social, portanto de aplicabilidade condicionada a um comportamento positivo do ente estatal.

A mora estatal na incrementação de tais políticas públicas causa dano direto aos cidadãos, pois sonega seu direito social de estar digitalmente incluído e prejudica a realização da cidadania e de outros direitos sociais, ad exemplum: educação e trabalho.

A responsabilidade estatal por sua omissão quanto à incrementação de políticas públicas de combate à exclusão digital é objetiva, conforme o art. 37, §6º da CRFB/88, que embora tenha adotado a teoria do risco administrativo para auferir a responsabilidade estatal, não diferenciou condutas omissivas e comissivas quanto ao regime de responsabilidade, e portanto, não caberia ao intérprete dizer o que a Carta Magna não disse, pois se esta quisesse estabelecer a diferenciação o faria expressamente.

Não é cabível a alegação da “reserva do possível” para elidir a responsabilidade do ente estatal quanto ao seu comportamento inerte na promoção da inclusão digital, diante da necessidade de respeito ao núcleo mínimo irredutível desse direito, que se suprido acaba por repercutir em mais direitos, desafiando a dignidade dos lesados.

O Estado deve responder de modo objetivo por restar inerte em estabelecer políticas públicas de inclusão digital, não só pela magnitude do direito social em baila, como também para a consecução dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil e os princípios fundamentais elencados na Constituição da República Federativa do Brasil.

Diante do exposto, conclui-se que a exclusão digital se configura como uma nova forma de desigualdade social que exige uma resposta urgente e eficaz por parte do Estado. O direito à inclusão digital deve ser reconhecido como um direito social fundamental, e sua efetivação depende de ações concretas do poder público. A omissão estatal prejudica diretamente os cidadãos, pois limita o exercício da cidadania e o acesso a outros direitos essenciais. Portanto, são necessárias políticas públicas que garantam o acesso às tecnologias digitais, não poderia o Estado se escusar do cumprimento de tais políticas com base na teoria da “reserva do possível”, sob pena de violar o núcleo mínimo irredutível do direito em estudo.


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Sobre o autor
João Carlos Ermelindo Bernardo

Aluno da graduação da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BERNARDO, João Carlos Ermelindo. Do direito social de acesso às tecnologias da informação e análise da responsabilidade estatal pela exclusão digital. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 30, n. 8096, 31 ago. 2025. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/115261. Acesso em: 5 dez. 2025.

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