Capa da publicação Da insolvência à recuperação: o caso da Usina Bom Jesus
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O caso da recuperação judicial da Usina Bom Jesus S/A: do ocaso ao soerguimento?

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4. CONCLUSÃO: RAZÕES DA REESTRUTURAÇÃO DA USINA BOM JESUS S/A E O SUCESSO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A Usina Bom Jesus S/A firmou-se no cenário sucroalcooleiro do Estado de PE, desenvolvendo o Nordeste brasileiro, com forte presença na economia de Recife. Ademais, tem modernas técnicas de controle de produção, tem compromisso social, zela pela preservação do meio ambiente, execra o trabalho infantil e realiza outras atividades que favorecem a sociedade, ligadas à área da educação e da saúde.

Outrossim, a Teoria da Empresa foi recepcionada pela CF/88 com temperamentos, pois o art. 170, III, de certa forma, consagra a função social da empresa, logo as decisões dos administradores devem privilegiar o bem comum, e não apenas para o lucro. Nessa senda, o interesse meramente egoístico do empresário não foi o único critério norteador da atuação da Usina Bom Jesus, porquanto essa também preza pelo interesse público primário, que é o bem comum da população. Com efeito, pragmaticamente, a atividade da empresa gera empregos para muitas pessoas, tem preocupação ambiental e busca a erradicação do trabalho infantil.

Até 2008, a Usina estava saudável economicamente, mormente, pois havia procura de energias alternativas ao petróleo, o que deu força ao setor sucroalcooleiro nacional, assim o mercado estimulou as empresas desse setor a angariar recursos, objetivando a expansão de suas indústrias; o que ocorreu com a Usina Bom Jesus, a qual buscou vultosos financiamentos com os bancos, se endividando. Logo, obteve facilmente créditos, pela valorização das commodities e do dólar, todavia, em setembro de 2008, um pacote econômico dos EUA, para proteger o sistema financeiro do país, não foi aceito pelo Congresso norte-americano, alastrando a crise financeira mundialmente e as bolsas de valores ficaram caóticas.

Tal conjuntura nefasta solapou a produção nacional de açúcar, energia e biocombustível, destarte, a queda dos valores das commodities, principalmente do açúcar e do petróleo, somada à retração do crédito, provocaram a maior crise financeira da história da empresa. Nessa senda, a fim de preservar sua existência, realizou pedido de recuperação judicial, doravante, para suplantar a crise, criou minucioso plano de recuperação, elencando as estratégias de seu soerguimento.

O Juízo da 30º Vara Cível da Comarca de São Paulo, processo 583.00.2009.120480-7, assim, diante da função social da empresa, preferiu preservá-la, logo prestigiou o princípio da preservação da empresa, explícito, quando a empresa foi priorizada, malgrado, ao arrepio da literalidade da Lei. Nesse diapasão, no despacho de 05/10/2009, onde foi deferido a homologação judicial do plano de recuperação, o juízo tece críticas à Lei 11.101/2205- que prevê a apresentação de certidões negativas de débitos fiscais como conditio sine qua non para processamento da recuperação judicial- mas, o Juiz afastou tal exigência.

Ademais, a recuperanda também, durante o processo, demonstrou comprometimento com a restauração da sua pujança financeira de outrora. Como medida de destaque, evidencia-se a criação da Sociedade de Propósito Específico (SPE) para intermediar a comercialização dos produtos da recuperanda, fez-se mister tal providência, em face do preconceito existente, com relação às empresas em recuperação judicial.

Portanto, qualquer empresa pode enfrentar crises econômicas, o que pode engendrar a necessidade da recuperação judicial, malgrado ainda ser de difícil uso/aceitação no Brasil, não é impossível, basta o comprometimento do Poder Judiciário, dos credores e, principalmente, do devedor, o qual deve elaborar um plano minucioso e exequível jurídica e faticamente, para tentar amortizar o seu passivo. No caso, o comprometimento da Usina, em se reerguer, e a qualificação do julgador foram os diferenciais.


REFERÊNCIAS

CAMPINHO, Sérgio Murilo Santos. Falência e recuperação de empresa: O novo regime da insolvência empresarial. Rio de Janeiro: Renovar, 2010;

COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: direito de empresa. São Paulo: Saraiva, 2008;

DE SOTO, Jesús Huerta. Moeda, Crédito Bancário e Ciclo Econômicos. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises, 2012;

FORGIONI, Paula Andrea. A evolução do direito comercial brasileiro: da mercancia ao mercado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009;

GLOBO, Pernambuco perde participação no setor sucroalcooleiro. Disponível em: <https://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2014/04/pernambuco-perde-participacao-no-setor-sucroalcooleiro.html>. Acesso em 31 de dezembro de 2015;

RAMOS, André. Direito empresarial esquematizado. São Paulo: Método, 2013;

SALOMÃO, Luis Felipe; SANTOS, Paulo Penalva. Recuperação judicial, extrajudicial e falência: teoria e prática. Rio de Janeiro, 2012;

SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Recuperação e falência. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 704, 9 jun. 2005. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/6835/recuperacao-e-falencia>. Acesso em: 6 dez. 2015.


Nota

1O inteiro teor do referido plano de recuperação judicial encontra-se no processo 0001811-89.2009.8.17.0370.


Abstract: This article , through a qualitative and exploratory methodology, aims to analyze the judicial recovery case of the Bom Jesus S/A Plant. Thus, initially, it was seen how the Commercial Acts Theory changed to the Theory of the Firm, where there is an organized economic activity, demonstrating, in fact, the importance of the social function of the company overlapping the merely egoistic interest of the entrepreneurs. Then, the juncture of the company Usina Bom Jesus S/A was studied, demonstrating its importance for the evelopment of the State of Pernambuco, as well as how it fulfilled its social function. Besides, the legal regime of the sugar and alcohol plants was also seen, which, despite some crises, continues to be active in the Brazilian market. Furthermore, the study investigates the reasons for the crisis installed in the company under study, such as, the global financial crisis that arose at the end of the first decade of the century. In view of this situation, the research proceeds to the judicial recovery procedure of the Usina Bom Jesus S/A, examining the measures taken, such as the novation of debts and the creation of a Specific Purpose Company - SPE. Finally, the work demonstrates how, through a detailed plan and with the resolution of the existing pending issues, the analyzed plant had the judicial recovery filed.

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Key words : Theory of the firm. Judicial Recovery. Usina Bom Jesus.

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Sobre os autores
Eduardo Almeida Pellerin da Silva

Especialista em Processo Civil pela Faculdade Damásio. Analista judiciário-área judiciária do TRT2. 1. Formação acadêmica: graduação em Direito pela Faculdade de Direito do Recife (FDR)/Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) (2016) e especialização em Processo Civil pela Faculdade Damásio (2018); 2. Atuação profissional: advogado proprietário do escritório Eduardo Pellerin Advocacia e Consultoria, o qual atuou com advocacia estratégica e consultiva, em Direito Civil, Consumidor e Administrativo (2020-2021), advocacia estratégica e consultiva, em Direito Civil, Administrativo e Processo Civil para Pequeno e Beltrão Advogados (2020-2021), assistente de Desembargador e servidor público federal do TRT6 (2021), assistente de Juíza e analista judiciário do TRT2 (2022-2024), analista judiciário do TRT6 (2024-atual); 3. Concursos: aprovado em vários, com destaque para o TRF5, TRT6, TRT1, TRT2 e TRT15; 4. Pesquisa e produção: autor do livro "O ativismo judicial entre a ética da convicção e a ética da responsabilidade: a racionalidade da melhor decisão judicial de controle de políticas públicas diante da ineficiência estatal na concretização de direitos fundamentais", pesquisador bolsista do PIBIC UFPE/CNPq - no Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), linha de pesquisa: "A metafísica da doutrina do Direito em Kant: moral, ética e Direito" (2015-2016), publicou capítulo de livro, doze artigos científicos, em revistas jurídicas especializadas, jornais, anais de eventos e apresentou artigos, em congressos científicos; 5. Ensino: foi monitor das cadeiras de Introdução ao Estudo do Direito I, Direito das Coisas e Processo de Execução; 6. Extensão: Serviço de Apoio Jurídico-Universitário (SAJU) e Pesquisa-Ação em Direito (PAD): As relações entre a ficção jurídica e a ficção literária; 7. Formação complementar: fez vários cursos em Direito, Ciência Política, Português e Oratória; 8. Congressos: participou de mais de uma dezena.

Ricardo Russell Brandão Cavalcanti

Pós-Doutorando em Direitos Humanos pela Universidade de Salamanca-Espanha. Doutor em Ciências Jurídicas-Públicas pela Universidade do Minho, Braga, Portugal (subárea: Direito Administrativo) com título reconhecido no Brasil pela Universidade de Marília. Mestre em Direito, Processo e Cidadania pela Universidade Católica de Pernambuco. Especialista em Ciência Política pela Faculdade Prominas. Especialista em Direito Administrativo, Constitucional e Tributário pela ESMAPE/FMN. Especialista em Filosofia e Sociologia pela FAVENI. Especialista em Educação Profissional e Tecnologia pela Faculdade Dom Alberto. Defensor Público Federal. Professor efetivo de Ciências Jurídicas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco - IFPE.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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