O homem deve pensar, pode divergir, mas antes de tudo deve ser tolerante. Das idéias, nem sempre convergentes, brota a imensa variedade de pensamentos que norteiam a humanidade e lhe abrem o caminho da verdade.
Uma justiça tardia violenta os direitos humanos, porque fere, brutalmente, a dignidade e, acima de tudo, sevicia a consciência humana.
Agradeço ao Dr. Vittorio Cassone e à Dra. Dayse Alencar pela apreciação do trabalho e ao servidor do STF, Dirceu Moreira, a gentileza de assistir o autor, na pesquisa.
Agradeço ao Dr. Vittorio Cassone e à Dra. Dayse Alencar pela apreciação do trabalho e ao servidor do STF, Dirceu Moreira, a gentileza de assistir o autor, na pesquisa.
A Constituição Federal não impede que a Fazenda Pública promova a execução de crédito tributário ou não tributário, no âmbito da Administração, com temperamento que julgamos necessário.
Faremos uma breve incursão histórica, apresentando a proposta, que vimos defendendo, há mais de duas décadas, e não encontra barreira no Direito Constitucional. Tem o apoio incondicional de ilustres juristas.
Considerações Históricas - A execução da dívida ativa - Os Procuradores da Fazenda Nacional
Nas Ordenações, todos os créditos fiscais eram abrangidos, prestigiando a ação executiva, na sua cobrança. Os romanos já aplicavam o processo sumaríssimo à cobrança de todas as dívidas, mesmo as oriundas dos contratos.
Juízos privativos existiam na legislação lusitana, segundo as Ordenações [01].
A Carta de Lei, de 22 de dezembro de 1.761, atribuía ao Conselho da Fazenda a jurisdição exclusiva para processar e decidir as execuções das rendas e de todos os direitos e bens da Coroa, de qualquer natureza.
O Alvará de 16.12.1.774 ordenava proceder executivamente contra os devedores na conformidade dos Regimentos da Fazenda e da Lei do Reino, devendo o juiz mandar passar mandados executivos pelas dívidas que liquidamente constassem dos Livros da Alfândega e, depois de feita a penhora, cabia-lhe remeter os autos ao Superintendente - Geral para proceder de forma sumária, verbalmente, e de plano, mas tão somente aqueles meios que necessários fossem para o descobrimento da verdade e defesa das partes, dando apelação e agravo para o Juízo dos Feitos da Fazenda.
A penhora fazia-se administrativamente pela própria administração ativa (a que fiscaliza, autua e impõe as penalidades) e somente depois, na fase recursal, a competência passava para o Juízo.
Modelo semelhante, séculos depois, foi concebido pela Comissão designada pelo Ministro Mário Henrique Simonsen [02], composta dos notáveis juristas, Gilberto de Ulhôa Canto, Geraldo Ataliba e Gustavo Miguez de Mello.
A Lei 242, de 29.11.1.842, instituiu o Juízo dos Feitos da Fazenda Nacional em primeira instância e restabeleceu o privilégio do foro para as causas da Fazenda Nacional, abolido que fora pela Lei de 4 de outubro de 1.831. Instruções e regulamentos foram expedidos, para facilitar a execução dessa lei e, da Diretoria Geral do Contencioso, provieram as Instruções de 31 de janeiro e 10 de abril de 1.851, para uso dos Procuradores dos Feitos da Fazenda, ancestral dos Procuradores da Fazenda Nacional. [03] Este, advogado e representante da Fazenda Nacional, nos juízos de primeira instância, devia proceder no desempenho de seu cargo com toda a civilidade, decência, boa fé e discrição próprias de um perfeito advogado. [04]
No Brasil imperial, com Dom Pedro I, surge o Conselho de Estado, suprimido pelo Ato Adicional de 1.834, e restabelecido por Dom Pedro II, Em 1.831, a Regência criou o Tribunal do Tesouro Nacional, que tinha, entre suas atribuições, a suprema direção e fiscalização da receita e despesa da Nação, inspecionando a arrecadação, distribuição e contabilidade de todas as rendas públicas e decidindo todas as questões administrativas, "que a taes respeitos possão ocorrer [05]". Ao Procurador Fiscal competia, então, promover o contencioso fiscal.
O Brasil republicano, entretanto, espelhado no modelo dos Estados Unidos da América, estabeleceu a Justiça Federal, que absorveu o Contencioso Administrativo.
Não existe, pois, no País, um contencioso administrativo propriamente dito, visto que os conselhos de contribuintes e os conselhos da Previdência, na órbita federal, e os tribunais e conselhos administrativos, nas esferas dos Estados e dos Municípios, não têm poder jurisdicional.
O Decreto 9.885, de 29.2.1.888, expedido em face da autorização concedida pela Lei 3.348, de 20.10.1.887 (artigo 8º, § 5º), tornou sem efeito toda a legislação anterior acerca do processo executivo e visava acelerar a cobrança da dívida ativa, que abrangia a dívida tributária e não tributária.
A legislação revogada fundava-se basicamente na Lei de 22.12.1.761, no Decreto 736, de 20.11.1.850, na Lei 628, de 17.9.1.851, e na Instrução de 31.1.1.851. A execução fiscal obedeceria, desde então, ao citado decreto e às disposições dos Decretos 737, de 1.850, e 9.549, de 1886, no que fossem aplicáveis.
O Decreto - lei 960, de 17.12.38, substituiu esse diploma e perdurou, com algumas modificações, até o advento do Código de Processo Civil de 1.973 (Código Buzaid).
Com esse diploma legal, o executivo fiscal passou a denominar-se execução fiscal ou ação de execução, alterando fundamente o sistema da execução forçada fiscal, visto que o processo comum e o fiscal foram unificados.
Houve várias tentativas de reformulação legislativa, no sentido de dotar o País de uma legislação processual fiscal ágil e moderna. [06]
Os Procuradores da Fazenda Nacional constituem-se em advogados altamente especializados, de inequívoca tradição na defesa dos interesses do Erário e da Nação. Atualmente, compõem a Advocacia-Geral da União, por força da Constituição de 1988.
O Procurador dos Feitos da Coroa, da Fazenda e Fisco, antecessor do atual Procurador da Fazenda Nacional, já na época do Brasil - Colônia, pelo Regimento de 7 de março de 1609, exercia as funções de defensor da Coroa, da Fazenda, do Fisco e também as de Promotor de Justiça.
Durante o Vice - Reinado de Dom José I, cabia ao Procurador da Fazenda promover a execução dos créditos da Fazenda Real [07]. No Império, com a Regência Trina Permanente, o Decreto de 18 de agosto de 1831 disciplinou a cobrança da ação executiva contra os devedores da Fazenda Nacional, atribuindo aos Procuradores da Fazenda Nacional essa incumbência, tanto na Corte, como nas Províncias. No Tribunal do Thesouro Público, o Procurador Fiscal, nomeado pelo Imperador, com o título de Conselheiro, era competente para " vigiar sobre a execução das Leis da Fazenda" e promover o contencioso da Fazenda Pública, e ouvido sempre nas questões de direito. Nas Províncias, o Procurador Fiscal, nomeado pelo referido Tribunal, dentre pessoas de notória inteligência em matéria de legislação fiscal e probidade, promovia o contencioso fiscal perante esse Tribunal e os Procuradores da Fazenda Nacional tinham a faculdade de conceder o parcelamento aos devedores do Fisco. [08]
Restaurado, por Dom Pedro II, o privilégio de foro para as causas da Fazenda Nacional, a representação, perante o Juízo dos Feitos da Fazenda, em Primeira Instância, na Corte, fazia-se, pelo Procurador Especial - o Procurador da Fazenda no Juízo de Primeira Instância. Nas Províncias, "os Procuradores da Fazenda Nacional", ensina Cid Heráclito de Queiroz, "eram os mesmos que fossem Procuradores Fiscais". [09]
Ainda, no Império, em 1850, o Decreto 736 criava a Diretoria - Geral do Contencioso, chefiada pelo Conselheiro Procurador Fiscal do Tesouro Nacional, à qual incumbia organizar os quadros da dívida ativa, promover e dirigir sua cobrança.
Em 1898, pelo Decreto 2807, de 31 de janeiro, as repartições fazendárias eram reorganizadas, somando-se nova competência à Diretoria-Geral, e, em 23 de dezembro de 1909, o Decreto 7751 transformava aquela Diretoria em Procuradoria - Geral da Fazenda Pública, incrustada, no Ministério da Fazenda, chefiada pelo Procurador - Geral da Fazenda Pública, doutor ou bacharel em ciências jurídicas e sociais, com novas e significativas atribuições.
Pelo Decreto 9.957, de 21 de dezembro de 1912, os Procuradores da República deviam enviar trimestralmente à Procuradoria – Geral da Fazenda Pública um mapa das ações propostas contra a União. O Decreto - Lei 426, de 12 de maio de 1.938, que reorganizou o Tribunal de Contas da União, atribuiu aos Procuradores Fiscais o encargo de Ministério Público, perante as Delegacias do Tribunal nos Estados.
Em 1955, é promulgada a primeira lei orgânica, que altera o nome da Procuradoria - Geral da Fazenda Pública, para sua atual denominação - Procuradoria - Geral da Fazenda Nacional, [10] subordinada ao Ministro da Fazenda. Entre suas atribuições, por demais relevantes, destaca-se a de mandar apurar e inscrever a dívida ativa da União.
O Decreto - Lei 147, de 3 de fevereiro de 1967, redefiniu a competência, reestruturou e modernizou o órgão, restaurando-lhe a majestade e dignidade, que se enriqueceram, com a Constituição de 1988, com o apoio inconteste do então Deputado Bernardo Cabral, relator - geral da Constituinte.
A Lei Maior consagrou a Advocacia-Geral da União como instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, e institucionalizou a Procuradoria - Geral da Fazenda Nacional, atribuindo-lhe competência privativa para representar a União, na cobrança da dívida ativa tributária, e, mais, fixou, de imediato, sua competência, para, desde logo, diretamente ou por delegação ao Ministério Público Estadual, representar judicialmente a União, nas causas de natureza fiscal, até a promulgação da lei complementar que se daria, em seguida [11].
Direito Comparado
A doutrina estrangeira proclama, em uníssono, que a competência, para rever os atos administrativo-fiscais, deve caber a juízes ou tribunais especializados, que gozem de total independência das autoridades encarregadas da administração fiscal, como órgãos integrantes do Poder Judiciário ou do Poder Executivo [12].
Assim que, entre os países que não se opõem a esse sistema, distinguem-se o Equador, a Costa Rica, a Argentina, o México, o Chile, a Espanha, a Alemanha, a França e o Japão. [13]
Penhora administrativa
As leis são amostras de comportamento que traduzem a consciência social de uma era e de um povo
A cobrança dos créditos tributários tem despertado tanto os estudiosos quanto a própria comunidade e induzido a debates dos mais oportunos e profícuos, porquanto se, de um lado, a Justiça deve ser ágil e dinâmica, de outro, os direitos fundamentais do homem não podem ser postergados, sob pena de se esmigalharem milhares de anos de fecunda civilização.
Esta é a questão transcendental que se propõe - o dilema maior: garantia e presteza - segurança para o administrado e agilidade para o Estado - fisco.
O Brasil, historicamente, sempre conheceu a tradicional divisão de poderes do Estado, visto que da harmonia destes exsurgia a garantia dos direitos do cidadão e o meio mais seguro de tornar efetivas as garantias constitucionais, sem embargo de, durante o Império, haver surgido, com D. Pedro I, o Conselho de Estado, suprimido pelo Ato Adicional de 1824, e restaurado por D. Pedro II, em 1841.
Não obstante, a República, modelada no figurino norte-americano, instituiu a Justiça Federal, que absorveu o contencioso administrativo. Esta discriminação de poderes, longe de ser estática e esotérica, é mesclada pela interação e vigilância recíprocas, em consonância com os ensinamentos de Montesquieu, porquanto este fosso absoluto não mais se afeiçoa ao Estado moderno, dada a evolução para o Estado social ou, como ensina Lowenstein, as teorias mais modernas projetam novas separações de funções e atividades, de sorte que a absoluta separação não mais existe.
O homem, visando aperfeiçoar os instrumentos ao seu dispor, procura romper certos tabus e assim atingir melhor seu desideratum.
A América Latina, conquanto tenha concebido um Modelo de Código Tributário, apresenta extrema diversidade em matéria processual fiscal, abeberando-se em fontes diversas do continente europeu e dos Estados Unidos da América (Tax Court), destacando-se a alemã, a italiana e a francesa, adotando alguns países o contencioso administrativo com poder jurisdicional, com independência da administração ativa.
Como afirmei alhures, no Brasil, não existe o contencioso administrativo, com poder jurisdicional.
Se a consciência jurídica nacional vem repelindo, com veemência, esta solução - contencioso administrativo com poder jurisdicional - não é menos verdade que ela exige imediata tomada de posição que amenize os efeitos de uma justiça tardia. A criação dos juizados de pequenas causas tem demonstrado que é preciso a vontade política para se resolverem questões aparentemente insolúveis.
A morosidade da justiça é um problema universal, dado o modo nefasto como é tratado nas variadas Constituições, quebrando-se-lhes a autonomia financeira, como argutamente rememorava Giuliani Fonrouge, prejudicial, por isso mesmo, tanto para o Estado, quanto para os súditos, que sofrem conseqüências desastrosas.
Uma das medidas históricas é a previsão constitucional de uma justiça especializada, fincada no Poder Judiciário, à semelhança da Justiça Laboral, sedimentando, assim, a tradição pátria e afastando, de vez, o impasse.
Contudo, não basta a institucionalização de uma justiça especializada, torna-se necessário mais que isto [14].
Aqui se fixa o ponto nevrálgico. No âmbito processual, há que se fazer, também, um remendo na lei vigente, sem romper o sistema, mas complementando-o, com a experiência alienígena, adaptada à realidade brasileira, sem quebrar os laços constitucionais e a tradição histórica, com a realização da penhora administrativa, diferentemente, entretanto, da operada no direito comparado e pretendida por alguns reformadores.
Propusemos, então, a instituição da penhora administrativa [15] realizada, por procuradores das Fazendas Públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas autarquias, visando a descongestionar o Judiciário, afastando deste a realização de atos meramente administrativos, propiciando, assim, maior presteza no trato da cobrança da dívida ativa tributária e não tributária, com benefícios, tanto para o devedor, quanto para a Fazenda Pública. Esse estudo e o anteprojeto serviram de alicerce para apresentação, pelo então Senador Lúcio Alcântara, dos projetos de lei do Senado nº. 174, de 1996 e nº. 608, de 1999.
O Senador Pedro Simon, com base nesse mesmo estudo e no anteprojeto, propôs o Projeto de Lei nº. 10, de 2005, no mesmo teor, e o Deputado Celso Russomanno apresentou o Projeto de Lei nº. 5.615, de 2005, regulando a cobrança administrativa do crédito da Fazenda Pública, calcado em trabalho que elaboramos com o Desembargador Federal, Dr. Antônio Souza Prudente [16].
O artigo 3º do estudo e do projeto de lei do Senado Lúcio Alcântara-Pedro Simon determina que, após a inscrição, como dívida ativa, do crédito tributário ou não tributário, pelo respectivo órgão jurídico da Fazenda Pública, o devedor será notificado para efetuar o pagamento, no prazo de cinco dias, amigavelmente, sob pena de proceder-se a penhora de seus bens, tantos quantos bastem para a garantia da dívida.
O artigo seguinte dispõe que, se o pagamento ocorrer nesta fase, a penhora será imediatamente desfeita, devendo a Procuradoria ou o advogado do Estado tomar as providências cabíveis, no prazo impostergável de quarenta e oito horas, sob pena de responsabilidade. A maior parte das dívidas é liquidada, nesta fase.
Na hipótese de o devedor não efetivar o respectivo pagamento, após a penhora, poderá, se assim o desejar, oferecer embargos, na forma da Lei 6830, de 22 de setembro de 1980 - Lei de Execução Fiscal - perante o juiz que seria competente para a execução judicial da dívida ativa.
Destarte, não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade, com o que concordam juristas do porte de Carlos Mário da Silva Velloso, Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Humberto Gomes de Barros, José Augusto Delgado, Ministros do Superior Tribunal de Justiça, J. M. Arruda Alvim (desembargador aposentado e processualista), Hamilton de Sá (juiz federal), Kiyoshi Harada (tributarista).
Esta proposta tem em vista aperfeiçoar a cobrança da dívida ativa, sem destronar os direitos e garantias fundamentais agasalhados pela Lei Maior e pela consciência jurídica universal, conquanto fugindo do modelo tradicional, que autoriza se faça pela própria administração fiscal ativa.
Isto porque a penhora é um ato administrativo e não jurisdicional, segundo a melhor doutrina, não necessitando realizar-se sob as vistas do juiz, como enfaticamente tem proclamado o eminente Ministro Carlos Mário da Silva Veloso [17].
Seria, entretanto, um contra-senso que o próprio órgão fiscal (administração ativa) que tem a função, das mais relevantes, de autuar, fiscalizar e efetuar o lançamento, também efetivasse a penhora.
Na execução da dívida ativa, a maior parte das execuções exaure-se antes de embargada a execução, isto é, o pagamento dos débitos dá-se antes da penhora e da apresentação dos embargos.
Estes, por sua vez, de acordo com o direito positivo e a melhor doutrina, constituem ação que, no magistério de Liebman, consubstancia uma ação incidente do executado - do devedor - já que o procedimento executório não comporta defesa, visto que não há matéria litigiosa a se discutir e decidir.
O devedor passa a ser o autor e o credor - exeqüente, o réu, com o objetivo de anular ou reduzir a execução ou, ainda, suprimir a eficácia do título.
Desta forma, a Fazenda Pública (União, Estados, Distrito Federal, Municípios e sua autarquias ) poderá optar por promover a execução, antes do ingresso em Juízo, por intermédio da Procuradoria da Fazenda Pública ou Fiscal, até a penhora, calcada na certidão de dívida ativa, que goza da presunção de legitimidade e auto - executoriedade.
A inscrição da dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na opinião da doutrina dominante, deverá ser feita por procurador ou advogado do referido órgão jurídico [18].
A lei vigente - Lei 6.830, de 1980 - já disciplina o processo após a apresentação dos embargos, aplicando-se subsidiariamente o Código de Processo Civil. Nada impede, porém, que a exeqüente escolha a via disciplinada por essa lei.
Daí, conclui-se que nem a Lei de Execução Fiscal estará afetada, nem se subtrai ao Fisco a prerrogativa de eleger a via que melhor lhe convier.
Ao devedor também não fica suprimida a via judicial, expressamente, consagrada na Lei Magna, ou seja, não efetuando o pagamento da dívida, no prazo legal, após a inscrição do crédito como dívida ativa e, se desejar apresentar os embargos, fá-lo-á, de conformidade com o artigo 16 da lei mencionada ou valer-se das demais medidas e ações judiciais, inclusive o mandado de segurança.
Os embargos serão interpostos, perante o juiz competente para a execução judicial da dívida ativa, que requisitará, de oficio, o processo administrativo em que se tiver efetivado a determinação da inscrição e a penhora.
O prazo, para a Procuradoria, ou o órgão jurídico, encaminhar os autos, é de quarenta e oito horas e, não o fazendo, estarão sujeitos às penalidades legais.
O texto legal prevê ainda que, efetuado o pagamento, antes ou durante a penhora, esta será desfeita, imediatamente, cabendo-lhe tomar as providências cabíveis, no prazo improrrogável de quarenta e oito horas, sob pena de responsabilidade de quem se omitir.
Com isto, o direito brasileiro estará inovando, porque a Fazenda Pública, por intermédio do órgão jurídico, poderá executar o seu próprio ato realizando a penhora administrativa, por autoridade competente - o procurador ou o advogado do Poder Público - após a determinação da inscrição da dívida ativa, efetuando previamente o controle da legalidade prevista na legislação própria.
Este ato parece-nos mais legítimo e consentâneo com os cânones constitucionais do que a decretação de indisponibilidade de bens produzida de imediato pela medida cautelar proposta pelo Fisco, antes ou durante a execução fiscal.
Basta o exame superficial da Lei 8.397, de 6.1.92 (artigo 4º), para se duvidar de sua constitucionalidade, em face dos esdrúxulos pressupostos que autorizam sua propositura [19].
Também o artigo 53 da Lei 8.212, de 24.7.91, produziu sérios estragos no sistema legal vigente [20], ao tratar da execução da dívida ativa da União e de suas autarquias e fundações públicas, em sede imprópria, permitindo ao credor-exeqüente indicar bens à penhora, que se fará, concomitantemente, com a citação do devedor, ficando, desde logo, indisponíveis os bens do devedor.
Estas figuras espúrias são mais danosas e ferem frontalmente o Texto Magno, não se harmonizando com o direito moderno, ao contrário da penhora administrativa, se realizada, por órgão jurídico competente.
O tributarista Kiyoshi Harada, em excelente comentário, examina o citado projeto de lei do Senado nº 10/25, de autoria do Senador Pedro Simon, convencido de sua absoluta constitucionalidade. Sugere o casamento entre o estudo e a proposta, que julga revolucionária, e a Lei de Execução Fiscal vigente. Opõe-se frontalmente contra o anteprojeto da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional que institui a execução administrativa e o projeto de lei do Deputado Celso Russomanno, no mesmo sentido.
Aprecia, entre outros dispositivos, o artigo 1º, concordando com a justificativa do projeto, apoiado nos estudos da Associação dos Magistrados Brasileiros e nos subsídios de nosso trabalho, dada a sua versatilidade.
Na sua opinião, a penhora administrativa deve ser adotada obrigatoriamente (e não facultativamente, como sugerimos), como pré-requisito da execução fiscal, no âmbito nacional, com exceção dos Municípios que não tenham quadro de servidores organizados em carreiras, voltados para a administração tributária. De pronto, concordamos com sua proposta.
Com o objetivo de aprimorar o texto, alinhava algumas modificações, sem ferir-lhe a essência, concluindo que: "... Se convertida em lei a proposta aqui apresentada, e aplicada conjugadamente com as disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal, que define os requisitos essenciais na gestão fiscal (art. 11 da LC nº 101/00), impondo sanções institucionais aos entes políticos, e com as disposições da Lei nº 8.429/92, que definem como atos de improbidade administrativa, a negligência na arrecadação tributária e a omissão na prática de ato de ofício (arts. 10, X e 11, II), temos a convicção de que a cobrança judicial da dívida ativa ganhará eficiência e celeridade, sem sacrificar os direitos e garantias fundamentais do contribuinte [21]".
Esta idéia, basicamente, foi absorvida pelo anteprojeto de lei consolidado e aprovado pelo Coordenador-Geral da Justiça Federal, Ministro Gilson Dipp, que será apresentado ao Congresso Nacional, como Anteprojeto de Lei de Execução Fiscal fruto da audiência pública realizada pelo CJF, em 2007. O texto foi elaborado a partir da proposta da comissão formada no âmbito do Conselho da Justiça Federal, coordenada pelo Ministro Teori Zavascki e de idéias contidas no anteprojeto de execução fiscal administrativa idealizado pela PGFN, na pessoa do Procurador-Geral Luiz Inácio Lucena Adams (cf. http://www.pgfn.fazenda.gov.br/noticias/EXPOSICaO_MOTIVOS%20E%20PROJETO%20LEF.pdf, consulta em 7 de abril de 2007).