Conclusão
"PROJETO DE LEI DO SENADO
Nº 10, DE 2005
(Do Senador Pedro Simon)
Institui a penhora administrativa, por órgão jurídico da Fazenda Pública, e dá outras providências.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Fica instituída a penhora administrativa, executada pelas Procuradorias Fiscais ou da Fazenda Nacional da União, do Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas autarquias.
Art. 2º Após a inscrição da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas autarquias, pela respectiva Procuradoria ou pelo órgão jurídico competente, estes poderão optar por executar a Dívida nos moldes da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, ou segundo o disposto nesta lei.
Art. 3º Inscrito o crédito tributário ou não - tributário, a respectiva Procuradoria ou órgão jurídico competente notificará o devedor, para pagá-lo no prazo de cinco dias, amigavelmente, sob pena de proceder à penhora de seus bens, tantos quantos bastem para a garantia da dívida, na forma dos artgs. 7º, IV, 8º, 9º, 10 e 11 da Lei nº 6830, de 1980, no que couber.
Parágrafo único. A penhora será realizada por servidor habilitado, na forma do regulamento.
Art. 4º Em caso de pagamento do crédito para com a Fazenda Pública, a penhora será desfeita, imediatamente, devendo essa tomar providências cabíveis, no prazo impostergável de quarenta e oito horas, sob pena de responsabilidade de quem der causa à omissão.
Art. 5º Realizada a penhora, o devedor poderá oferecer embargos, na forma da Lei nº 6.830, de 1980, perante o juiz competente para a execução judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, o qual requisitará, de ofício, o processo administrativo em que se tiver efetivado a ordem de inscrição e a respectiva penhora administrativa.
Parágrafo único. A Procuradoria ou o órgão jurídico competente deverá encaminhar ao juiz o referido processo, no prazo de quarenta e oito horas, sob as sanções da lei.
Art. 6º Aplicam-se, no que couber, as disposições do Código de Processo Civil e da Lei nº 6.830, de 1980.
Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 8º Revogam-se o art. 53 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, e as disposições em contrário.
Justificação
Este projeto foi idealizado e apresentado pelo nosso ilustríssimo colega, o laborioso e eficiente ex Senador Lúcio Alcântara, hoje grande Governador do Estado do Ceará. A proposição encontrou o amparo da AMB, apesar de a proposição ter sido arquivada, ela faz parte do pacote de projetos que a Associação Brasileira dos Magistrados Brasileiros considera imprescindíveis à reformulação de nosso sistema processual. A proposta da AMB é um conjunto de diversas matérias que, sem exagero, pode ser encarada como a verdadeira reforma da Justiça e do Poder Judiciário. Muitas das propostas eu tive a honra de subscrevê-las e aqui apresentá-las, neste sentido, tomo a liberdade de endossar também este projeto de meu amigo e colega. Concordando em todo o grau com a proposição original, nada mais faço do que aqui reproduzir a justificação que acompanhou o PLS nº 608/99.
"O presente projeto de lei visa o aperfeiçoamento da cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, tanto da União, quanto dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem assim dos respectivos entes autárquicos, sem ferir os direitos fundamentais do cidadão, embora se criem instrumentos eficazes para coibir a evasão fiscal.
Não há dúvida de que o Estado necessita de instrumentos capazes de barrar a desenfreada sonegação e a mais absurda das injustiças praticadas contra o bom contribuinte, que paga em dia seus tributos; sem, entretanto, se esmigalhar o mais sagrado dos direitos fundamentais, consagrado através dos tempos, dos tempos, pelas civilizações modernas: a garantia e a preservação do juiz natural, estatuído em nossa Lei Maior (art. 5º, XXXV) como fundamento da democracia.
Para obviar esses males, a doutrina vem pensando em soluções as mais diversas, destacando-se a introdução do contencioso administrativo, com poder jurisdicional, tal qual existe em diversos países conforme ensinamentos dos Mestres Carlos M. Giuliani Fonrouge e Susana Camila Navarrine (in "Procedimiento Tributário", ed. Depalma, Buenos Aires, 1995) e do Professor Leon Frejda Szklarowsky, Subprocurador - Geral da Fazenda Nacional aposentado(CF. "Execução Fiscal", ed. Ministério da Fazenda, Escola de Administração Fazendária, Brasília, 1984).
O Professor Leon Frejda Szklarowsky, estudando aspectos do Contencioso fiscal e Administrativo no Brasil, enfrenta a questão fisco-contribuinte segundo o axioma garantia e agilidade: segurança para o administrado e presteza para o Estado - Fisco, na cobrança de sua dívida ativa, advogando a instituição da penhora administrativa(cf. "Reforma Tributária", in Arquivos do Ministério da Justiça, ano 39, nº 168, março de 1986, pp.84 a 93), segundo modelo não tradicional, que propõe, e mais consentâneo com a consciência jurídica brasileira.
E, mais recentemente, em seu trabalho "A Justiça Fiscal e a Reforma da Constituição"(in Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, Revistas dos tribunais, vol. 10, ano 03, janeiro - março e 1995, pp. 207 a 210) fortalece a tese da penhora administrativa, sem, contudo, fissurar o princípio do juiz natural, nos seguintes termos:
"Penhora Administrativa
No âmbito processual tributário, há que se fazer também um remendo na lei, sem qualquer fissura no sistema, aproveitando a experiência alienígena e adaptando-a à realidade brasileira, sem romper os liames constitucionais e a tradição histórica do País, permitindo-se a realização da penhora administrativa.
A penhora administrativa não configura atividade jurisdicional e, portanto, não necessita realizar-se sob as vistas do juiz como ressalva enfaticamente o Min. Carlos Velloso.
Na execução judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública, a maior parte das execuções fiscais não é embargada, ou seja, o pagamento dos débitos fiscais faz-se antes da penhora e da apresentação dos embargos, segundo estatísticas das Procuradorias Fiscais.
Os embargos, por sua vez, segundo o direito vigente e a melhor doutrina, constituem ação, que, no magistério de Liebman, consubstancia uma ação incidente do executado, vez que o procedimento executório, propriamente dito, não comporta defesa, já que fundado na idéia fundamental de não haver matéria litigiosa a discutir e decidir.
O executado passa ser o autor, e o exeqüente, o réu, a fim de anular ou reduzir a execução ou suprimir ao título sua eficácia executiva, estando os embargos sujeitos aos requisitos da petição inicial.
O devedor exerce verdadeiro direito de ação.
Destarte, pode a lei assentir que, antes do Ingresso em juízo, a Fazenda Pública através do órgão jurídico competente - Procuradoria Fiscal, ou da Fazenda -, promova a execução forçada até a penhora, alicerçada na certidão de dívida ativa, que goza da presunção de legitimidade e auto - executoriedade.
Contrariamente ao que ocorre no Direito Alemão e Espanhol, que conferem à administração fiscal a prerrogativa de promover a execução forçada do crédito tributário, após o lançamento, propomos que aquele encargo caiba ao Procurador - Advogado do Estado ou da Fazenda Pública, após a inscrição do crédito fiscal como dívida ativa, verificados os pressupostos de sua legitimidade e legalidade, sem quaisquer riscos, para o contribuinte, e somente até a penhora.
Esta por ser ato puramente administrativo e não judicial será executada por funcionário credenciado da Procuradoria, sob supervisão do Procurador no Juízo competente para propor execução fiscal e interpor os embargos à execução.
Em caso de embargos à execução requisitará o juiz o processo administrativo respectivo no qual se efetivou a ordem de inscrição como dívida ativa e de penhora
A Lei de Execução Fiscal - Lei nº 6.830, de 22-09-80 - já disciplina o processo após os embargos devendo uma lei própria regular a atividade do procurador e o processo desde a inscrição da dívida ativa até a penhora administrativa, aplicando-se subsidiariamente, o Código de Processo Civil.
Não obstante, a Fazenda poderá optar por cobrar sua dívida através da via de execução consubstancia na Lei nº 6.830, cit., prescindindo da penhora administrativa.
Como se conclui nem a Lei de Execução Fiscal estará afetada nem se furta da Fazenda Pública a faculdade de efetivar a cobrança pela via elegida.
Observe-se que o devedor não fica suprimida a via judicial, expressamente consagrada no inc. XXXV do art. 5º da Lei Maior, como corolário do princípio constitucional expresso no art. 2º harmonia e independência dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.
Com efeito não efetuado o devedor o pagamento após inscrição do crédito como dívida ativa e respectiva penhora administrativa poderá se o desejar embargar a execução fiscal de conformidade com o art. 16 da Lei 6.830, ou ainda valer-se das demais ações judiciais, inclusive de mandato de segurança.
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Assim, o Direito Brasileiro estará inovando porque permitirá à Fazenda Pública executar seu próprio ato administrativo, efetuando a penhora administrativa, pôr autoridade jurídica competente o Procurador Advogado do Poder Público após determinação da inscrição do crédito fiscal como dívida ativa, efetivando previamente, o controle da legalidade prevista na legislação, que abrigou essa atividade exercitada secularmente pelo Procurador da Fazenda, em caráter privativo.
Isso ocorrerá naturalmente sem desmoronar o princípio do juiz natural."
De fato. afigura-se revolucionária e de bom senso a proposta de penhora administrativa, pôr órgão jurídico da Fazenda Pública, desgarrada da administração ativa alicerçada em garantias legais e constitucionais. Daí, o presente de lei que regula a matéria nos arts. 1º a 7º.
Essa penhora administrativa não se opõe aos cânones constitucionais, porque, na verdade, não suprime nem impede o ingresso do devedor perante o Poder Judiciário, Valendo-se da garantia fundamental que lhe oferece o inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, com assento no princípio básico da separação dos Poderes, inserto no art. 2º da Carta Nacional.
A penhora, por não ser ato judicial, mas, administrativo, independe de se realizar perante o juízo, mesmo porque não está defeso ao devedor valer-se das demais ações judiciais ou do mandado de segurança, como o faz, ordinariamente.
O projeto de lei, por fim, pretende revogar o art. 53 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991(dispõe sobre a organização da seguridade social e institui o plano de custeio).
Esse dispositivo inovou, sem qualquer propósito, na cobrança tributária da União, estabelecendo que, na execução da dívida ativa da União, de suas autarquias e fundações públicas, o exeqüente, isto é, o credor poderá indicar bens à penhora, que se efetivará concomitantemente à citação do devedor, ficando desde logo indisponíveis, o que caracteriza verdadeiro retrocesso, na opinião da melhor doutrina, e inverte, totalmente, o sistema do Código de Processo Civil e da citada Lei de Execução Fiscal (nº 6.830/80), reforçada, aliás, pela Lei nº 8.397, de 06 de janeiro de 1992 (institui medida cautelar fiscal, cuja decretação acarreta a indisponibilidade dos bens do sujeito passivo do crédito tributário ou não - tributário, até o limite da satisfação da obrigação, cf. art.4º).
Impõe-se, pois, a revogação do mencionado art. 53 da Lei nº 8.212, de 1991, por contrariar a lei nacional de execução fiscal, desfigurando, total e inutilmente, o art. 8º da referida Lei nº 6.830, de 1980 - que, adotando sensível evolução doutrinária e jurisprudencial, ampliou, para cinco dias, o prazo dado ao devedor para pagar a dívida ou garantir a execução -, invertendo, desnecessariamente, a prerrogativa de o executado indicar bens à penhora.
Espera-se, portanto, dos ilustres Pares a acolhida e, se possível, o aperfeiçoamento para o presente projeto de lei".
Sala das Sessões, 16 de fevereiro de 2005. - Senador Pedro Simon.
Notas
- Cf. Novel, L. 17, Cap. 17, § 1º..
- Cf. Portaria 254, de 25 de maio de 1.977.Vide comentário do Professor Teofilo Cavalcanti, in Folha de São Paulo, de 28.5.77, pág. 16.
- Cf., de Agostinho Marques Perdigão Malheiro, Manual do Procurador dos Feitos da Fazenda Nacional, 2ª ed., Rio, Ed. Laemmert, 1873; Antonio Herculano de Souza Bandeira, Novo Manual do Procurador dos Feitos da Fazenda, Rio, 1888, e Silvio Meira, Direito Tributário Romano, Ed. Revista dos Tribunais, 1.978. Cf. nosso artigo Procuradores da Fazenda Nacional, publicado no INFORMATIVO CONSULEX, Editora Consulex, Brasília, 14 dezembro 1998 e é capítulo do trabalho A execução fiscal. ..., in Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional, vol. 2, de 1998, Forense; ainda na Revista MEIO JURÍDICO, 38, outubro de 2000).
- Cf. Manual, de Malheiros Perdigão cit., pp. 1 e 7.
- Cf.expressão do texto legal original.
- Cf. nossa Execução Fiscal, ESAF, Ministério da Fazenda, Brasília, 2ª edição, 1980, pp. 13 e segs., com ampla bibliografia.
- Cf. Carta de Lei de 22 de dezembro de 1761.
- Cf. Instrução de 18 de outubro de 1831 do Ministro e Secretário de Estado Dos Negócios da Fazenda e Presidente do Tribunal do Tesouro Nacional, Bernardo de Vasconcellos.
- Cf. Legislação Orgânica - Estrutura - Competência da Procuradoria - Geral da Fazenda Nacional, Coletânea, Rio de Janeiro, GB, 1974, Ministério da Fazenda, página 2. Cf. ainda ops. cits. de Souza Bandeira e Perdigão Malheiro.
- Cf. Lei 2642, de 9 de novembro de 1955.
- Cf. artigos 130 e §§ e 30, § 5º., da ADCT.
- Cf., de Giuliano Fonrouge, Derecho Financiero, Editora DEPALMA,. 4ª. edição. Volume II.
- Cf. nosso Execução Fiscal, Ministério da Fazenda, Escola de Administração Fazendária, Brasília, DF, 1984..
- Defendemos também a possibilidade de solução dos conflitos entre o devedor e o Fisco, por intermédio da arbitragem, com o apoio de tributaristas de renome. (cf. Revista Prática Jurídica, Editora Consulex, 48, de 31 de março de 2.006, e Revista Tributária e de Finanças Públicas, volume 67, RT, de março-abril de 2.006).
- Cf. o Projeto de Lei do Senado 10/2005, do Senador Pedro Simon (antes, fora apresentado pelo ex-Senador Lúcio Alcântara), que encampou a tese, que vimos defendendo, há décadas, sobre a penhora administrativa, publicado no Diário do Senado Federal de 17 de fevereiro de 2005, págs. 415 e segs. Sobre o assunto, consultem-se nosso Penhora Administrativa, publicado em vários repositórios jurídicos, destacando-se o Correio Braziliense - Suplemento Direito e Justiça, de 3.3.97; o Informativo Consulex de 12 de maio de 1997, número 19; Temas de Direito Tributário, coordenado por Kiyoshi Harada, Editora Juarez de Oliveira, 1ª edição. 2000; Revista do TRF 1ª, de julho/set 97, Volume 9, nº. 3; Revista dos Procuradores da Fazenda Nacional vol.2, Forense, 1998; in Direito Tributário Atual nº. 17, Instituto Brasileiro de Direito Tributário, SP, Dialética, 17, 2003, e, ainda, em vários sites da Internet. Este estudo foi fruto da monografia por nós apresentada e aprovada, no Curso de Especialização, lato sensu, de Direito de Estado, na Universidade Gama Filho, em 1985, sob o título Contencioso Administrativo-Fiscal – Penhora Administrativa, enfrentando a questão crucial fisco-contribuinte, segundo o axioma garantia e agilidade: segurança para o contribuinte e presteza para o Estado., na cobrança da dívida ativa. Consulte-se o Projeto de Lei 10/2005 na íntegra, in fine.
- Cf. Execução Administrativa do crédito da Fazenda Pública (cf. site jus navigandi http://jus.com.br/artigos/1322; in Suplemento Direito & Justiça, Correio Braziliense, 27 de novembro de 2000; idem no correioweb.com.br (mesma data). Sobre o assunto, leia-se também artigo de nossa autoria, na Revista CEJ, do Conselho da Justiça Federal, n 13, janeiro-abril de 2001, pp. 50-72.
- Cf. Entrevista do Ministro Carlos Mário Veloso ao Dr,. Nicanor Sena Passos, diretor da Revista Jurídica CONSULEX. Cf. Revista cit. nº 8, de 31 de agosto de 1997. Cf. ainda a citada Revista nº 4, de 30 de abril de 1997, páginas 5 a 8.
- Sobre o assunto, consultem-se nossa obra Execução Fiscal cit., e os artigos Inscrição da Divida Ativa, in Revista de Processo 23/149 e Não inscrição da Dívida Ativa, in Revista cit. 34/299; bem como o artigo dee Geraldo Ataliba e Cleber Giardino, in Revista de Direito Público 66/34. Consulte-se ainda, de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Nery, Código de Processo Civil, Editora dos Tribunais, edição de 1994, p.1366 e segs.
- Cf. também, exemplificativamente, o artigo 185A do CTN, acrescido pela Lei Complementar 118/05.
- Leia-se, de Rogério de Menezes Fialho Moreira, "O plano de custeio da previdência as alterações da penhora na execução fiscal", in RTJE 13/37.
- Cf. A penhora administrativa como pré-requisito da execução fiscal, elaborado em novembro de 2007 (http://jus.com.br/artigos/10729). Consulta realizada em 1º de abril de 2008.
- A Comissão, instituída pelo falecido Ministro Simonsen, compunha-se dos pranteados mestres, doutores Gilberto de Ulhôa Canto, Geraldo Ataliba e do insigne tributarista, Professor Gustavo Miguez.