Capítulo IV A PATOLOGIA DA PUBLICIDADE NA INTERNET
José de Oliveira Ascensão, em obra organizada por Aires José Rover, com precisão, afirma: "Procedeu-se rapidamente à comercialização da Internet" [133].
Por conta da facilidade em difundir informação e propaganda na rede, a grande maioria dos veiculadores de publicidade não são profissionais, mas pessoas que apenas querem fazer com que os internautas tenham conhecimento de determinado produto ou serviço. A falta de profissionalismo resulta em grandes desajustes com a lei, visto que muitas das condutas adotadas perfazem uma verdadeira patologia [134] na internet.
Conforme Jean Jacques Erenberg, as patologias relacionadas ao marketing que podem ser encontradas atualmente na internet podem ser classificadas em: publicidade enganosa e publicidade abusiva [135].
4.1 PUBLICIDADE ENGANOSA
De acordo com Cláudia Lima Marques, a publicidade enganosa tem como principal característica, "ser suscetível de induzir ao erro o consumidor, mesmo através de suas ‘omissões’". Segundo a consumerista, em sua obra Contratos no Código de Defesa do Consumidor, tal norma necessariamente deve ser interpretada de modo amplo, já que "erro" é falsa noção da realidade, que é formada na mente do consumidor por meio da publicidade [136].
A publicidade enganosa [137] contém falsas informações do produto ou do serviço anunciado. Tal publicidade pode se dar sob várias formas [138].
4.1.1 Oferta de produtos ou serviços inexistentes
Neste caso, o anunciante oferece e comercializa produtos ou serviços que jamais entregará ao consumidor [139].
4.1.2 Oferta de produtos ou serviços por meio de informações falsas ou omissão de dados relevantes sobre eles
Trata-se, nesta hipótese, de publicidade enganosa que contraria o princípio da veracidade [140] e o princípio da informação [141], presentes no Código de Defesa do Consumidor [142].
4.1.3 Oferta de produtos ou serviços com preços que não serão respeitados
Tal prática viola o princípio da veracidade existente no § 1º do artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor e é bastante comum. Erenberg cita o exemplo dos sites de leilão, nos quais os potenciais consumidores são freqüentemente iludidos por ofertas que trazem dizeres como "computadores a partir de R$ 1,00". Tais anúncios são falsos, já que as empresas que os elaboram não têm a real intenção de honrar tal preço inicial em uma eventual compra [143].
4.1.4 Associação de palavras
Ricardo Luis Lorenzetti nos dá um exemplo de publicidade enganosa na internet: a associação de palavras. Segundo o autor, é freqüente a publicidade enganosa, tendo como motivação o desejo de atrair o internauta. Freqüente também é a utilização, pelo internauta, das ferramentas de busca [144], para que encontre seja lá o que estiver procurando. Sabendo disso, o arquiteto de determinada página da internet, por vezes, ao elaborar seu conteúdo, nele insere algumas das palavras mais procuradas pelos usuários. Esta prática é chamada de metatag, e é considerada publicidade enganosa frente ao consumidor [145].
4.2 PUBLICIDADE ABUSIVA
De acordo com Cláudia Lima Marques, o Código de Defesa do Consumidor inovou o ordenamento jurídico brasileiro, sendo que "estabelece nos arts. 39, 40 e 41 uma série de práticas comerciais que o legislador considera abusivas e, portanto, vedadas" [146].
Sobre uso abusivo da internet, explica Patrícia Peck Pinheiro:
Não há uma definição exata do que possa ser considerado um uso abusivo da rede. Internamente às empresas e instituições, situações que caracterizam o uso abusivo da rede estão definidas na política de uso aceitável. Na Internet como um todo, os comportamentos listados a seguir são geralmente considerados como uso abusivo: envio de Spam; [...] [147].
A publicidade abusiva é, aqui, dividida em: publicidade intrinsecamente abusiva e publicidade extrinsecamente abusiva. Esta última, que mais nos interessa no presente trabalho, será estudada em tópico separado.
4.2.1 Publicidade intrinsecamente abusiva
A abusividade desta publicidade está em seu conteúdo. Nesta categoria se insere a publicidade de produtos ilícitos ou daqueles que são controlados por órgãos governamentais, sem que, nesse último caso, haja cumprimentos das cautelas estipuladas por leis ou regulamentos [148]. Um exemplo de lei nesse sentindo é a Lei nº. 9.264/96, que dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos de fumo, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas.
A abusividade intrínseca de uma determinada publicidade ou de um certo anúncio pode ser de algumas espécies, cada uma com peculiaridades que infringem o disposto pelo artigo 37, 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Veremos, a seguir alguns exemplos dados por Erenberg.
Os editoriais pagos [149] transmitem uma publicidade com roupagem de notícia ou informação, assumindo uma forma editorial por conta de semelhanças, nos aspectos editorial e gráfico, com um texto que, normalmente, não seria publicitário. Essa técnica, além de gerar a sensação futura, ao usuário, de ter sido enganado, está repleta de abusividade, pois desrespeita o artigo 36 do Código de Defesa do Consumidor [150]:
Art. 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal.
Parágrafo único. O fornecedor, na publicidade de seus produtos, ou serviços, manterá, em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem [151].
A publicidade que oculta dados [152] aos quais o consumidor deve ter acesso é modalidade intrinsecamente abusiva, conforme os artigos 37, § 2º, 31 e 33 do Código de Defesa do Consumidor. Estes últimos relativos ao princípio da informação [153].
A exploração de situações desfavoráveis ao consumidor [154] também são intrinsecamente abusivas, de acordo com o artigo 37, § 2º, do referido diploma legal [155].
A publicidade feita em desconformidade com a moral, com os bons costumes ou com a lei [156] pode incitar violência e crime, e, além de agredir valores pessoais e sociais, violam diversas garantias, tais como autodeterminação, segurança, saúde e proteção econômica. Este é um caso de abusividade mista: tanto intrínseca como extrínseca [157].
4.3 PUBLICIDADE EXTRINSECAMENTE ABUSIVA
É a publicidade que nos interessa no presente trabalho. É a publicidade invasiva, abusiva quanto à forma de abordagem do destinatário [158], e que ganha forças com a utilização da internet para veicular anúncios. Veremos a seguir como funciona sua prática, conforme explanação de Jean Jacques Erenberg.
4.3.1 Alguns exemplos
É exemplo de publicidade extrinsecamente abusiva a mensagem publicitária que se impõe ao usuário [159], numa conduta inoportuna e extremamente invasiva, que configura publicidade extrinsecamente abusiva, nos termos do artigo 37, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor: ela lesa a garantia constitucional de autodeterminação [160].
Outra forma de o publicitário mal intencionado obter a atenção do internauta é utilizar-se da obstrução de saída [161]. Igualmente à mensagem publicitária que se impõe na tela do computador, tal conduta fere a autodeterminação do usuário e vai de encontro ao texto do artigo 37, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor [162].
O link [163] que não é sincero [164], quando conduz a uma página não querida pelo usuário, que contenha publicidade, é instrumento de publicidade tanto intrínseca como extrínseca. Tal publicidade desrespeita o princípio da identificação da mensagem publicitária e, conseqüentemente, o disposto no artigo 36 do Código de Defesa do Consumidor [165].
Uma outra forma de publicidade extrinsecamente abusiva é a realização de truncamento do fluxo normal de navegação ou leitura inerentes ao computador utilizado pelo internauta [166]. Tal modalidade também fere o princípio da autodeterminação do usuário, bem como o artigo 37, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor [167].
Quanto aos banners, já vistos neste trabalho, conforme Manoel J. Pereira dos Santos, são "as modalidades de publicidade em websites mais comuns". Trata-se, segundo esse autor, de "propaganda em forma de imagem gráfica animada utilizada na página da Internet, que normalmente possui um link direcionando para um site promocional ou com mais informações sobre o produto" [168].
Existem vários meios de publicidade na Internet. Os banners são os mais comuns. E também os mais problemáticos para quem anuncia. Sua eficiência é cada vez mais contestada, porque um clique num banner normalmente significa um desvio de rota, o que é pouco desejável pelo usuário [169].
Podemos citar José de Oliveira Ascensão, que, escrevendo sobre contratos de publicidade na internet, lembra das empresas que projetam ferramentas de busca on-line:
Asseguram assim que, quando se busquem certos setores, as páginas visitadas venham enquadradas pela publicidade das empresas com quem contratam [...] Os contratos podem ter por objeto justamente os nomes ou marcas dos concorrentes. É elucidativo o que se passou com a firma Estée Lauder: quando era visitada, a página era enquadrada por publicidade dum concorrente, Fragrance Counter, vendedora de perfumes on-line [170].
Neste último caso, uma empresa que comercializa produtos de um determinado ramo contrata com um site de busca no sentido de que, sempre que um internauta faça uma pesquisa neste site para encontrar informações de produtos de concorrente da empresa contratante, o site de pesquisa mostre ao internauta uma página com publicidade da empresa que lhe contratou para tal prática.
A partir deste ponto, passaremos a expor outras formas de publicidade abusiva veiculadas pela internet. Tais formas podem ser mais preocupantes e mais juridicamente relevantes dos que as apontadas acima.
4.3.2 Spams
Conforme Patrícia Peck Pinheiro, spams [171] são:
e-mails não solicitados, que geralmente são enviados para um grande número de pessoas. Quando o conteúdo é exclusivamente comercial, esse tipo de mensagem também é referenciada como UCE (do inglês Unsolicited Commercial E-mail) [172].
De acordo com Sidney Guerra:
É comum que o usuário da internet ao verificar sua caixa de correio eletrônico, se depare com uma grande surpresa, qual seja, uma quantidade enorme de mensagens de pessoas e empresas que nunca ouviu falar. Trata-se, portanto, do spam, isto é, a correspondência comercial eletrônica que não foi solicitada pelo usuário [173].
Infelizmente, abrir a caixa de entrada do e-mail e se deparar com mensagens comerciais não solicitadas, hoje em dia, não é mais nenhuma "grande surpresa". Uma reportagem datada de julho de 2007 afirma:
Em uma simulação realizada com dez microcomputadores conectados em banda larga, o Projeto SpamPots, realizado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI..br), através da Comissão de Trabalho Anti-Spam (CT-Spam), detectou mais de 370 milhões de mensagens indesejadas, em 325 dias no Brasil [174].
Acerca do assunto, escreve Luis Carlos Cancellier de Olivo, em obra organizada por Aires José Rover:
Além de ser uma estratégia de marketing considerada ineficiente, principalmente por irritar os consumidores, a prática de spam pode ser entendida como atentatória aos direitos do consumidor, que ao lado de ter sua privacidade invadida, consome tempo em deletar as mensagens, ou seja, é obrigado a permanecer mais tempo conectado à rede, o que significa mais impulsos telefônicos e uma conta a pagar maior no final de cada mês [175].
Tratando do tema em apreço, José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro, em obra organizada por Ronaldo Lemos da Silva Junior e Ivo Waisberg, escreve:
Os spams são as mensagens não solicitadas enviadas à nossa caixa postal, e geralmente oferecem produtos e serviços, tanto na forma individual como na coletiva, ou seja, mala-direta, lista de notícias, correntes de dinheiro ou simpatias [176].
Sobre a prática de spam, assevera Roberto Senise Lisboa, em obra coordenada por Newton De Lucca e Adalberto Simão Filho:
O encaminhamento de e-mails sem a anterior autorização do usuário importa em violação da sua intimidade, ainda mais quando o seu conteúdo for meramente publicitário, com o objetivo de se vender algum produto ou serviço [177].
Assim, tornam-se claros os motivos de o spam ser considerado publicidade abusiva e de ser tão indesejado pelo usuário.
O spam foi o responsável pelo primeiro problema de grandes proporções no campo da publicidade veiculada na internet. É publicidade comercial não solicitada [178].
Pode-se dizer que o spam é uma espécie de lixo virtual; possui, ou não, objetivos comerciais; pode se referir a propaganda, "correntes" supersticiosas, manifestações políticas, etc.; caracteriza uma prática invasiva, que merece ser analisada sob o âmbito da responsabilidade civil, já que, ao contrário de uma correspondência convencional, impressa, recebida pelo correio, implica em gastos financeiros por parte do usuário, que paga a tarifa telefônica e gasta tempo de acesso para baixá-lo da sua caixa postal virtual [179].
Erenberg assim classifica a atividade de spamming:
Remessa indiscriminada e massificada de mensagens para endereços eletrônicos. [...] Essa prática publicitária abusiva consiste em enviar mensagens via correio eletrônico, lista de distribuição ou newsgroup, indiscriminadamente e em grande quantidade, com o objetivo de divulgar publicidade, propaganda correntes, pirâmides, pedidos de donativos, boatos e esquemas "infalíveis" para ganhar dinheiro [180].
Também é assustadora a atividade do spammer adotada para obter endereços de e-mails válidos para o envio de sua propaganda. O passo inicial é a coleta de um número enorme de milhares ou mesmo milhões de endereços eletrônicos, sem a adoção de quaisquer critérios para tal angariação. Após, todos os endereços obtidos são reunidos em uma ou mais listas que serão comercializadas na internet a preços muito acessíveis. Dessa forma, torna-se possível e remessa de milhões de mensagens contendo propaganda em um curto período de tempo e a baixo custo [181].
Assim, o chamado spammer pode vir a ser responsabilizado civilmente por suas práticas. Sua atividade é ilícita, pois invade a privacidade do usuário e lhe causa prejuízos. O spammer é assim caracterizado por Amaro Moraes e Silva Neto: "o vendedor que liga a cobrar para vender o que não queremos comprar" [182].
4.3.2.1 Tentativas de dissimulação da natureza de spam
Muitas vezes, a mensagem que envia o spam chega à caixa de entrada do e-mail do destinatário sem o título, numa tentativa de confundi-lo e de impossibilitar que o usuário que recebe a mensagem configure o sistema de bloqueio de mensagens indesejadas (sistema anti-spam) [183].
Há outras práticas adotadas para enganar o destinatário, como a inserção, no campo do título ou no corpo da mensagem eletrônica, de falsas justificativas, tais como: "seu amigo lhe recomendou este endereço", "você está recebendo esta mensagem por ser cadastrado em nosso site", etc. Ocorrem, também, casos em que o remetente pede desculpas antecipadas: "obtivemos seu endereço eletrônico na internet, se não queria receber esta mensagem, desculpe-nos". Muitas vezes, o spammer tenta dar à mensagem publicitária uma roupagem de resposta a anterior solicitação, inserindo em seu título frases como: "conforme vossa solicitação", "resultado de sua pesquisa", "em atendimento a seu pedido", etc [184].
Em outros casos, tenta-se tornar pessoal a aparência da mensagem. Faz-se, para tanto, uso de frases do tipo: "sobre aquele produto que você pediu para procurar, só encontrei no site...", "veja a oferta que encontrei", "há quanto tempo". Obviamente, tal maquiagem também pode constar do corpo da mensagem.
4.3.2.2 Sistemas opt out e opt in
Com relação à proteção da privacidade do consumidor na internet, temos duas linhas de procedimento, em âmbito mundial [185].
4.3.2.2.1 Opt out
A linha de procedimentos estadunidense se baseia no princípio da negative option, já que a utilização de uma lista de endereços eletrônicos presume-se consentida até que o consumidor se manifeste de maneira contrária. Assim, nos Estados Unidos, em cada peça publicitária enviada sem prévio consentimento ou autorização do consumidor deve constar um campo onde ele assinala sua opção de continuar ou não recebendo o informativo ou, ainda, se seu nome pode ser divulgado a outras empresas.
4.3.2.2.2 Opt in
Trata-se da linha de procedimento adotada na Europa, que se funda em legislação mais restritiva e que impõe às empresas o dever de informar previamente os tipos de dados coletados, o uso que se pretende dar a tais dados, as escolhas e meios de o consumidor limitar a cessão desses dados a terceiros e a permissão do acesso do consumidor às informações detalhadas sobre sua pessoa que constam do banco de dados da empresa coletora.
De acordo com o sistema opt in, é necessária a prévia anuência do consumidor ao envio publicitário.
4.3.2.2.3 Linha de pensamento no Brasil
No Brasil, não há legislação que especifique a proteção da privacidade frente à publicidade. Porém, de acordo com a proteção almejada por Projetos de Lei, há de se entender que o Brasil visa um sistema misto, como veremos no Capítulo V.
4.3.3 Cookies
Na explicação precisa de Patrícia Peck Pinheiro, são eles:
Absorventes de textos com informações sobre o comportamento dos usuários na rede. Permitem que servidores gravem informações de seu interesse em outro microcomputador remoto. Podem ou não ser configurados no browser [186].
Sidney Guerra compartilha desse entendimento:
Os responsáveis pelo armazenamento de dados dos usuários da internet são os cookies, introduzidos por meio do browser de programas de navegação (Netscape, Explorer etc) e tendo o propósito de possibilitar que um servidor controlasse um cliente por meio de vários pedidos de http [187].
Na enorme maioria das vezes em que cookies são instalados no computador do internauta, este sequer imagina que, sem seu consentimento, está sendo realizada uma invasão à sua privacidade. Ao acessar um site que utiliza cookies, o computador do usuário sofrerá a instalação de programas discretos, que terão a função de informar ao remetente os passos do internauta na rede: um flagrante abuso.
Omir Kaminski afirma que "uma das práticas mais comuns de violação da privacidade pode se dar pela utilização de cookies". O autor explica didaticamente a natureza e o funcionamento do cookie:
Cookie é um pequeno bit de informação que um web site coloca no computador do usuário quando este acessa o site. Ao retornar a esse mesmo web site, em outra oportunidade, o navegador remete as informações de volta ao site. Normalmente, o cookie é projetado para lembrar e dizer ao site algumas informações úteis sobre o consumidor [188].
E vai além:
Esta atividade é invisível ao internauta e, a não ser que o navegador esteja configurado para alertar quando um cookie será armazenado no computador, o consumidor não saberá sobre a existência de tal cookie. Quando o consumidor retorna ao site, igualmente não saberá que o cookie está sendo lido e analisado [189].
Aprofundando no problema do cookie, continua:
Cookies podem ser utilizados para fornecer minhas informações a pessoas não autorizadas? Cookies normalmente são inofensivos, não podendo em tese obter informações sobre você (a não ser que você as autorize ou as forneça). Mas muitos serviços utilizam-se dos cookies para criar um perfil de interesses baseado nos sites visitados, e quais ações foram adotadas nesses sites. Anunciantes dos sites conveniados poderão, então, veicular propagandas on-line baseadas diretamente nos interesses e hábitos de compra [190].
Note-se que a utilização de cookies pode ser útil para ambas as partes (consumidor/internauta e fornecedor/anunciante), pois agiliza o atendimento on-line, fazendo com que o site visitado ofereça ao usuário produtos ou serviços mais utilizados por pessoas com o seu perfil, ou, ainda, produtos ou serviços semelhantes aos que ele eventualmente tenha adquirido em visita anterior.
Ocorre que pouco sabemos sobre o que os anunciantes fazem com as informações dos consumidores obtidas por meio da utilização de cookies. Como afirma Amaro Moraes e Silva Neto, "quando sabemos quem as detém – o que é raro –, não sabemos para que fins as detém" [191].
Os cookies ferem flagrantemente o direito constitucional ao sigilo. Assim escreve Rosângelo Rodrigues de Lima:
O direito ao sigilo fundamenta-se, dentre outras, na faculdade da (sic) manter segredo sobre as comunicações privadas; no direito de reserva de dados informatizados referentes à vida particular do indivíduo; (cf. ambos no inciso XII do art. 5º), e no direito de resistir ao devassamento de informações alheias confiadas a si, cujo conteúdo está resguardado pelo dever profissional (inciso XIV do art. 5º) [192].
Jean Jacques Erenberg lista condutas que podem ser consideradas publicidade patológica. Entre elas, o autor cita a utilização de cookies, afirmando que a abusividade reside em sua implantação "sem autorização e conhecimento do usuário, e na ausência de comunicação formal de que tais dados foram colhidos e qual o seu efetivo teor, por violar o direito à privacidade" [193].
4.3.3.1 A política de privacidade
Alguns sites disponibilizam ao visitante uma página onde expõe sua política de privacidade. Normalmente, o que se vê em tais páginas são textos que explicam ao internauta pontos tais como: se o site ora visitado utiliza cookies para colher informações do usuário; qual a destinação dos dados coletados, seja por meio de cookies, seja por meio de preenchimento de cadastros presentes no site; para quê o site requer que o internauta digite o endereço de e-mail para, então, o deixar usufruir de determinado serviço existente na página virtual.
Obviamente, o fato de um site admitir que se utiliza de cookies para colher informações do usuário durante sua navegação pela internet não tira o caráter abusivo e invasivo de tal conduta.
4.3.4 Spywares
São programas de computador muito similares aos cookies, dos quais se distinguem pelos fatos de os spywares serem plantados no computador utilizado pelo internauta por um programa freeware [194] e de serem mais "agressivos". O programa spyware é "um verdadeiro Cavalo de Tróia que, uma vez instalado em seu computador, passa a rastrear suas informações para, na seqüência, noticiá-las ao fabricante (ou patrocinador) do gracioso freeware" [195].
Afirma Amaro Moraes e Silva Neto:
O irônico é que, via de regra, o cidadão/usuário é quem autoriza essa intromissão quando pressiona a tecla ACEITO (ACEPT) sem ter lido, por provável, aquele extenso contrato normalmente apresentado em inglês... [...] ¿Mas essa aceitação é válida? Entendemos que não, haja vista que em decorrência da própria natureza da Internet, basicamente, todos os contratos celebrados neste etéreo espaço são de adesão – o que permite a não aceitação de cláusulas a posteriori. Além disso, as cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão (artigo 54 § 4º, do Código de Defesa do Consumidor), o que não ocorre [196].
4.3.5 Outras formas de publicidade extrinsecamente abusiva
A lista de condutas publicitárias realizadas em âmbito da internet é muito extensa, e não taxativa. As técnicas e artifícios de propagação de publicidade estão sempre em mudança, mas podemos citar aqui alguns métodos clássicos, que também são considerados extrinsecamente abusivos.
A publicidade subliminar e o merchandising [197] também estão presentes na internet. Normalmente, tais anúncios ferem o disposto nos artigos 31 e 37, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor – princípios da autodeterminação e da informação, respectivamente [198].
Publicidade subliminar é aquela que se utiliza de uma mensagem que é colocada à nossa vista por uma fração de segundo. Fica visível por um período de tempo tão curto que diz-se que o destinatário não a capta, mas seu cérebro sim.
Desta forma:
estabeleceu-se a proibição da publicidade clandestina e subliminar, assim como o merchandising, que consistem, de forma ampla e simplificada, em anúncios publicitários "camuflados", muitas vezes veiculados em novelas e filmes integrando ao roteiro uma situação de uso ou consumo normal de um produto com a exposição de sua marca ou fatores de identificação que, efetivamente, influenciam, de forma consciente ou subconsciente (como pode ocorrer na publicidade subliminar) no comportamento dos consumidores, atentando, assim, contra o princípio da identificação, pois, a mensagem publicitária não é transmitida de forma ostensiva, não permitindo a imediata e fácil percepção pelo consumidor. Vale registrar aqui um interessante ocorrido envolvendo a publicidade subliminar, que atua diretamente no estado subconsciente da mente, onde os estímulos são tão fracos e de duração efêmera, que escapariam à percepção da consciência, mas suficientemente poderosos para influenciar o comportamento, foi o que ocorreu em 1.957 nos Estados Unidos, ocasião em que na exibição de um filme, em um cinema, foram inseridas mensagens de estímulo ao consumo de Coca-cola e de pipoca, de modo que o consumo de tais produtos, durante a exibição, aumentou muito [199].
É tecnicamente possível a utilização de publicidade subliminar na internet. Basta inserir comandos em um banner para que este exiba subliminarmente sinais que influenciem o internauta à compra de determinado produto ou à contratação de certo serviço.
Também há a questão da publicação de mensagem publicitária em ambiente indevido [200]. Esta é forma extrinsecamente abusiva de espelhar propagandas pela internet, vez que esta possui locais avessos à anunciação de produtos comerciais. A veiculação de propagandas em ambientes inadequados constitui publicidade abusiva, pois desrespeita os artigos 31, 36 e 37, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, violando os princípios da autodeterminação, da privacidade, da informação e, eventualmente, da identificação da mensagem publicitária [201].
Outra publicidade extrinsecamente abusiva é aquela feita por oportunismo diante do erro [202]. Neste caso, a abusividade é patente, pois a conduta do anunciante contraria claramente o disposto no § 2º do artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor [203].
Existem casos em que a publicidade figura indevidamente em instrumentos de busca. Para figurar em um mecanismo de busca, há duas opções: o cadastramento [204] e o uso de metatags. Neste caso, a conduta é abusiva por ferir os artigos 31, 36 e 37, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor [205].