RESUMO – Palavras-chave
Introdução.1.Considerações iniciais.2. Concurso de preferências. Conclusão.Referência Bibliográficas. Notas.INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objeto a identificação e o exame do tema relativo ao concurso de preferências entre credores do devedor comum, assim entendido a disputa que se passa por ocasião da satisfação de créditos frente ao patrimônio penhorado do devedor sem declaração de insolvência.
Conquanto não se trate de tema novo, é certo que ostenta importância ímpar no ordenamento, de grande interesse prático, que suscita questões tormentosas, mas, apesar disso, mostra-se um tema muito pouco refletido em sede doutrinária.
Falar-se-á, também, algo sobre o concurso de pretendentes na adjudicação, em razão da ligação existente entre os assuntos e por conta de alteração recente na legislação respectiva. De igual modo, mostra-se um tema rico em detalhes e dificuldades, pouco explorado e importante na seara prática das execuções.
1.CONSIDERAÇÕES INICIAIS
1.1.Localização do tema
Dentre as funções principais dos Estados modernos encontram-se as tarefas legislativa, administrativa e jurisdicional, as quais são exercidas em prol do bem comum, com o fito de conservar e desenvolver a vida em sociedade.
Interessa-nos a função jurisdicional, nesse momento, dado que por intermédio dela o Estado atua, após instado a tanto, substituindo-se aos particulares e considerando o produto legislado, para imparcialmente dirimir conflitos de interesses e pacificar o convívio social.
Esta pacificação, vale dizer, só existe quando efetivamente há atuação do conteúdo das leis e a tutela jurisdicional se converte em resultados práticos concretos, ou seja, é preciso que haja a respectiva implementação da função jurisdicional exercida em favor daquele que obteve a tutela do Estado perante o conflito examinado.
Viabiliza-se via processo esta tarefa de implementação, bem assim quanto ao momento em que se faz a análise das situações conflituosas com vistas ao acertamento do direito. Processo é, pois, o instrumento por intermédio do qual a jurisdição atua a vontade concreta da lei.
Nos termos de clássica doutrina, insta lembrar a classificação dos processos em processo de conhecimento, de execução e cautelar. Em termos bastante básicos, o primeiro serve para fixar a regra concreta e individual solucionadora do caso analisado. No processo de execução ocorre a já mencionada realização prática de direito previamente reconhecido, e, por fim, o processo cautelar se destina a assegurar o resultado útil dos dois processos anteriores face a situações que colocam em risco a efetividade deles.
O tema a ser tratado no presente artigo se localiza, classicamente, no âmbito do processo de execução, mas sob a ótica da atual legislação processual, não necessariamente esta localização se revela nestes termos, tendo em vista a realidade do chamado processo sincrético, em que se tem a fusão de processos, figurando a execução como etapa do processo de conhecimento, em certos casos.
1.2.Linhas gerais da Execução
Como já restou afirmado, a execução tanto pode integrar uma etapa posterior ao processo de conhecimento, no bojo do atual processo sincrético, quanto pode ensejar processo de execução autônomo, nos moldes da clássica sistematização da legislação codificada.
Seja como for, seu objetivo é o de proporcionar ao titular de um direito consubstanciado em título executivo a efetivação prática igual ou equivalente ao que esse titular alcançaria caso houvesse cumprimento espontâneo por parte de quem está obrigado frente a ele.
A atuação estatal se faz necessária justamente porque inexistiu esse cumprimento espontâneo, observado que não é dado aos particulares realizarem justiça senão por intermédio dos órgãos estatais legitimados a tanto, em regra. Ao agir, o Estado coagirá o obrigado à satisfação devida, valendo-se dos meios executivos em desfavor deste.
LUIZ GUILHERME MARINONI assim se pronuncia acerca disso:
Acontece que a suposição de que a ação condenatória é suficiente em si mesma é desmentida pelo entendimento de que a condenação é apenas uma fase para a integral prestação da tutela jurisdicional e, especialmente, pela nova fisionomia que o Estado assumiu na sociedade contemporânea.
Se o Estado possui dever de proteção e, assim, dever de prestar a tutela jurisdicional efetiva, ele não pode tratar a execução como algo que não lhe diz respeito, deixando-a a livre disposição daquele que obteve a sentença. Ora, diante das novas funções do Estado, não se pode pensar que a sua tarefa jurisdicional termina, quando o direito depende de atuação na realidade, no momento em que a sentença é proferida.
Não foi por outra razão que os arts. 461 e 461-A do CPC e o art. 84 do CDC deram ao juiz o poder de atuar de ofício, mesmo depois de transitada em julgado a sentença, para estabelecer multa, alterar o seu valor, ou ainda modificar a medida executiva já instituída, libertando o juiz das amarras do legislador, mas não o deixando, como é óbvio, sem controle algum, uma vez que esse passou a ser feito pela regra da proporcionalidade.
Ou melhor, a necessidade do juiz se vincular à execução, podendo agir de ofício para conceder a medida executiva que lhe parecer adequada ao caso concreto, é que levou a concentração da execução com o conhecimento, dando ao juiz o poder de exercer atividade executiva ainda que sem a propositura de ação de execução. Ou melhor: a dispensa da ação de execução tem nítida intenção de conferir ao juiz que proferiu a sentença a possibilidade de determinar a medida executiva adequada ao caso concreto, mesmo que não expressamente tipificada na lei.
Com relação a esses meio executivos, costuma-se classificá-los em meios de coação e meios de sub-rogação. Aqueles são os meios com os quais se alcança o resultado pretendido via participação forçada do obrigado, que presta o que deve após ter sua vontade influenciada pela postura estatal (execução indireta). Já com os meios de sub-rogação o Estado alcança tal resultado independentemente da vontade do obrigado (execução direta).
A título exemplificativo, mencionem-se a multa pecuniária e a prisão civil como meios de coação. Por essas vias compele-se o obrigado a atuar no sentido de cumprir o devido. De outro lado, são exemplos de meios de sub-rogação a entrega forçada de coisa certa ao credor, o desfazimento de obra ou serviço e os meios executivos de expropriação.
LUIZ GUILHERME MARINONI assim expõe o assunto:
A coerção indireta pode ser pessoal (prisão civil) ou patrimonial (multa). É dita indireta porque não conduz diretamente à tutela do direito, limitando-se a incidir sobre a vontade do réu para que a tutela do direito seja prestada.
A coerção indireta é fundamental em relação às obrigações infungíveis, uma vez que, em relação a elas, a execução direta não possui efetividade. Nada impede, porém, como já foi amplamente demonstrado, que a multa possa ser utilizada diante de obrigações fungíveis.
Ao lado da execução indireta ou da coerção indireta se coloca a execução direta, que é aquela que permite que o direito seja realizado independentemente da vontade do demandado. Porém, em relação à execução direta, é preciso distinguir entre os meios executivos que substituem uma prestação da parte e os meios executivos que atuam quando essa prestação não existe. No primeiro caso, em que a execução substitui a prestação da parte, há sub-rogação, enquanto que, no segundo, quando a atividade executiva não substitui a prestação devida (pois essa não existe), há coerção direta.
Pois bem. Esses meios de coerção são utilizados pelo Estado-juiz com vistas a efetivar a satisfação devida ao credor, o que se dá no bojo do respectivo processo.
Na execução por quantia certa contra devedor solvente (artigos 646 a 731 do Código de Processo Civil), após protocolizada a petição inicial, que deverá obedecer ao preceituado nos artigos 282, 614 e 615 do Código de Processo Civil, o devedor será citado para, no prazo de 3 (três) dias, pagar ou nomear bens à penhora (artigo 652 do CPC), observada a ordem preferencial legal do artigo 655, também do Código de Processo Civil.
Se o devedor for citado e permanecer inerte, o Oficial de Justiça penhorar-lhe-á tantos bens quantos bastem para o pagamento do principal, juros, custas e honorários advocatícios, conforme preceituado no artigo 659, do Código de Processo Civil.
A penhora é o primeiro ato por intermédio do qual o Estado busca a concretização executiva. A penhora tem a função de individualizar o bem, ou os bens, sobre os quais o ofício executivo deverá atuar para dar satisfação ao credor e submetê-los materialmente à transferência coativa.
Formaliza-se a penhora em um documento denominado auto de penhora, que deve ser lavrado pelo Oficial de Justiça encarregado do cumprimento do mandado de citação e penhora, na forma do artigo 665 do Código de processo Civil. Quando a devedor indica bens à penhora e o credor os aceita, ou quando é deferida pelo juiz a nomeação de bens feita pelo exeqüente, a formalização da penhora se dá por ato do Escrivão, mediante a lavratura de termo.
A respeito, vejam-se as colocações de JOSÉ MIGUEL GARCIA MEDINA:
"Com a penhora, particulariza-se, entre os bens que compõem o patrimônio do executado, aquele sobre o qual recairão os atos de expropriação, realizados com a finalidade de satisfazer o direito do exequente. Nisto reside, a nosso ver, a essência da penhora."
Superada a fase da penhora e decididos os embargos, caso tenham sido opostos, passa-se à fase da avaliação dos bens constritos, de modo a se preparar futuro ato de expropriação. Tal avaliação pode ser dispensada em duas hipóteses conforme previsto no artigo 684 do CPC, a saber: quando: a) o exeqüente aceitar a estimativa feita pelo executado (art. 668, parágrafo único, inciso V, do CPC); b) se tratar de títulos ou mercadorias que tenham cotação em bolsa, comprovada por publicação oficial.
É possível que o valor da avaliação indique a necessidade de reforço da penhora, na situação em que o valor dos bens penhorados seja inferior ao valor da dívida. Em caso contrário, procede-se à redução da garantia.
1.3.Meios expropriatórios
Após todo esse trâmite procedimental, chega-se ao momento em que se encontra aparelhada a execução, o que a torna apta a atingir a fase de expropriação dos bens constritos.
Os meios expropriatórios consistem em atos de invasão forçada no patrimônio do obrigado, de modo que lhe são retirados bens suficientes, e transformados em dinheiro, para que ocorra o cumprimento da obrigação inadimplida de pagar quantia certa.
Segundo HUMBERTO THEODORO JUNIOR,
"Expropriar é o mesmo que desapropriar e consiste no ato de autoridade pública por meio do qual se retira da propriedade ou posse de alguém o bem necessário e útil a uma função desempenhada em nome do interesse público. (...) No processo executivo, a expropriação dá-se por via da alienação forçada do bem que se seleciona no patrimônio do devedor para servir de instrumento à satisfação do crédito exeqüendo."
Nos termos do artigo 647 do Código de Processo Civil, a satisfação do crédito será feita pela transferência da propriedade de bem do devedor ao credor ou entrega de dinheiro, o que se viabiliza pelos meios expropriatórios da adjudicação, alienação por iniciativa particular, alienação em hasta pública ou usufruto de bem móvel ou imóvel, nesta ordem de prevalência.
A respeito dessa nova ordem, SÉRGIO SHIMURA observa o seguinte:
"Com a reforma trazida pela Lei 11.382/2006, inverteu-se a ordem de expropriação. A adjudicação, que consistia na última alternativa de alienação judicial, foi alçada ao primeiro lugar. Priorizou-se a adjudicação, como forma mais eficaz, econômica e menos burocrática que a hasta pública."
O pagamento ao credor em dinheiro é a forma mais autêntica de concluir a execução por quantia certa. Equivale exatamente ao que ocorreria caso houvesse cumprimento espontâneo da obrigação por parte do devedor. Assim, trata-se de forma de efetivação do direito do credor que independe de sua anuência, e pressupõe expropriação, penhora sobre dinheiro ou depósito feito do devedor.
As demais formas de satisfação, por sua vez, dependem da aquiescência do credor, que por elas precisa manifestar opção. Assim se passa com a adjudicação, em que se transfere o próprio bem penhorado ao patrimônio do credor, como via de satisfação de seu direito.
RITA QUARTIERI assim conceitua o instituto:
"A adjudicação é tida como forma indireta de expropriação, uma vez que nela a satisfação se dá com a transferência direta da propriedade dos bens penhorados ao exeqüente ou às demais pessoas indicadas na lei.
Por refletir resultado diverso daquele buscado com a tutela específica (o pagamento de soma), a adjudicação só podia ser pleiteada após o insucesso da hasta pública."
Dentre todas as maneiras possíveis, é certo que pode haver manipulação das modalidades de expropriação conforme a necessidade da situação concreta apresentada, com vistas a alcançar um provimento jurisdicional mais célere e efetivo.
Nesse sentido, menciona a Autora que há uma flexibilidade dos meios de expropriação. Em suas palavras:
O direito fundamental à tutela executiva impõe o ajustamento do meio à situação que reclama satisfação, e, por conta disso, os meios de expropriação previstos pelo ordenamento podem ser livremente manuseados.
(...) E essa flexibilização guarda compatibilidade com a tendência que inspirou a reforma, de uma atuação jurisdicional mais célere, efetiva e engenhosa, como forma de cumprir o desígnio constitucional de outorga do ´justo processo´."
Feitas, pois, essas considerações gerais e introdutórias, convém analisar o tema do concurso de preferências.
2. CONCURSO DE PREFERÊNCIAS
2.1.Da penhora
Já restou mencionada a função da penhora, linhas atrás, quando foi exposto seu conceito. Com efeito, é com a penhora que se obtém a individualização do bem do devedor, na universalidade de seu patrimônio, para fins de incidência da execução.
A par disso, também com a penhora surgem outras conseqüências, quais sejam, a de evitar a alienação eficaz do bem para terceiros e a de criar preferência para o exequente caso haja posteriores constrições sobre o mesmo bem.
Confira-se a seguinte passagem de RODRIGO BENEVIDES DE CARVALHO:
"Não obstante a natureza jurídica da penhora, é forçoso se reconhecer que, de sua análise, três efeitos podem ser inferidos: (i) individualizar e afetar os bens do executado ao processo de execução; (ii) conservar ditos bens, evitando sua deterioração ou desvio; e (iii) criar a preferência para o exequente, sem prejuízo dos privilégios, decorrentes de direito material, estabelecidos anteriormente."
E mais adiante, ao tratar da eficácia da penhora, expõe que:
"A eficácia da penhora produz efeitos perante o credor, perante o devedor e perante terceiros. No que diz respeito ao credor, a penhora especifica os bens do devedor sobre os quais irá exercer o direito de realizar seu crédito, provocando, em face dos demais quirografários, um especial direito de preferência e seqüela. Com relação ao devedor, a eficácia da penhora implica a imediata limitação da livre disponibilidade dos bens sobre os quais aquela recaiu, que ficarão vinculados à execução, ensejando em alguns casos igualmente a perda de sua posse direta. Acerca dos terceiros, o efeito geral e erga omnes da penhora faz com que todo e qualquer terceiro tenha que se abster de negociar com o executado em torno do domínio do bem penhorado, sob pena de ineficácia da aquisição perante o processo e permanência do vínculo executivo sobre o bem, mesmo que passe a integrar o patrimônio do adquirente."
Interessa-nos, neste trabalho, o efeito relativo à preferência para o exequente, sem prejuízo dos privilégios, decorrentes de direito material, estabelecidos anteriormente.
A existência de penhora sobre determinado bem não impede que outras penhoras sejam efetuadas, afinal o devedor, em razão desta constrição, não perde a propriedade do bem. Tampouco se torna impenhorável este bem tão-só com a efetivação do ato de penhora.
No Código de Processo Civil de 1939, vale mencionar, a incidência de mais de uma penhora sobre os mesmos bens acarretava a instauração automática de concurso de credores em lugar das execuções ajuizadas.
Atualmente, tal não se dá; sequer se faz possível concluir acerca da existência da situação de insolvência do devedor perante a multiplicidade de penhoras. É que a insolvência apenas surge com a decisão judicial que a reconhece, o que exige específica iniciativa de algum dos credores, presente a situação de insolvabilidade, nos termos do artigo 751, inciso III, do CPC.
Por outro lado, o fato de o bem ser gravado com garantia real em favor de terceiros também não representa óbice à penhora, ante a inexistência de outros bens livres do devedor capazes de sustentar a constrição. É que, de igual modo, não constam do rol de bens impenhoráveis aqueles gravados com hipoteca, penhor, anticrese e usufruto.
2.2.Regras acerca do concurso de preferências
Os bens afetados por penhora, como já se disse, destinam-se à satisfação do credor. Isso se materializa por vários modos. Pode o credor receber em pagamento o próprio bem penhorado (adjudicação), ou fruir dos respectivos rendimentos, por dado tempo (usufruto de bem móvel ou imóvel).
Comumente, porém, o bem penhorado é objeto de arrematação ou alienação (por iniciativa particular ou em hasta pública) no bojo do procedimento executivo, e o produto destas operações é revertido em prol do credor, para satisfação de seu direito.
Confira-se a seguinte passagem:
"A satisfação do crédito realiza-se pela adjudicação dos bens penhorados, ou, eventualmente, pela entrega do dinheiro produzido com a alienação dos bens (por iniciativa particular ou em hasta pública), ou, ainda, pelo usufruto de bem móvel ou imóvel. Pode também ocorrer a satisfação do crédito, por simples levantamento do credor, quando a penhora tenha inicialmente recaído sobre dinheiro, ou quando o devedor tenha efetuado, no curso do processo, o depósito da quantia correspondente à dívida exeqüenda."
Exatamente sobre o produto do bem penhorado é que recai eventual concurso de preferências entre os credores, nos casos em que inexiste, repita-se, declaração de insolvência ou falência do devedor e outros bens livres deste. Define-se, ao cabo disso, com qual credor exequente ficará o produto do bem penhorado (caso não baste à satisfação do crédito deste credor), ou com quais ficará esse produto (caso baste à satisfação de mais de um crédito) e em que quantidade.
Perceba-se, desde logo, que não se procede a rateio entre os credores, como se estivessem em igualdade de condições frente ao ativo do devedor. Alguns credores, portanto, têm primazia face a outros, sendo certo, também, que deste concurso não participam aqueles credores que não tenham ajuizado execução contra o devedor comum.
As possibilidades de concorrência entre credores giram em torno de dois grupos, basicamente. Ou são credores cuja preferência vai ser determinada estritamente em razão da ordem de precedência das penhoras, ou também haverá credores que ostentam primazia por força de regra do direito material.
No primeiro caso, vale a regra prior tempore, potior jure; satisfaz-se com prioridade o credor que obtiver por primeiro a penhora. São irrelevantes, pois, quaisquer outros dados, como as datas de ajuizamento das execuções, ou as datas de registro imobiliário das respectivas penhoras. Importa apenas a cronologia das penhoras, o que se afere com a análise das datas constantes dos autos de penhora ou arresto, ou termo lavrado em cartório do Juízo.
Para o caso de coincidência de datas entre duas penhoras, impõe-se aplicar a solução da paridade entre os respectivos credores, dada a equivalência dos direitos sobre o bem penhorado.
Tendo havido arresto anteriormente à penhora, seja o mencionado no artigo 653 do CPC, seja o que configura objeto da ação cautelar de mesmo nome, nos termos do artigo 818 do mesmo código, vale a data desta medida para fins de aferição da preferência. Desse sentir, confira-se a posição de RODRIGO BENEVIDES DE CARVALHO, conforme exposto no seguinte trecho:
"Conclui-se, portanto, da análise da questão sob todos os ângulos, que, para fins de concurso particular de credores, tendo a penhora incidido sobre bens anteriormente arrestados, a verificação de preferência em favor do credor deverá averiguar e levar em conta a data de efetivação do arresto, e não de sua conversão posterior em penhora."
Noutro giro, insta considerar a situação em que se fazem presentes credores com preferência emanada do direito material. Segundo o Código Civil, os privilégios podem ser reais ou pessoais (especiais ou gerais). Integram aqueles os direitos reais de garantia sobre coisa alheia, ou seja, penhor, hipoteca ou anticrese. Os privilégios pessoais vêm previstos nos artigos 964 e 965 do Código Civil.
Ainda devem ser considerados, nesse passo, os créditos trabalhistas e de acidente de trabalho, bem assim os tributários, nesta ordem, e todos com preferência àqueles anteriormente mencionados.
Pois bem, concorrendo credores quirografários com credor munido de garantia real sobre o bem penhorado, é com este que fica o produto do bem excutido até o montante que equivale ao seu crédito. Satisfeito este credor, eventual remanescente do produto do bem será direcionado aos demais credores, segundo a ordem de preferência das penhoras efetivadas, conforme visto anteriormente.
Sobre a necessidade de prévio manejo de execução e existência de penhora em favor destes credores preferenciais em razão do direito material, diverge a doutrina. Há quem entenda necessário, e há quem admita a efetivação da preferência sobre credores quirografários apenas via protesto do direito, no bojo de execução alheia.
HUMBERTO THEODORO JUNIOR esposa esse segundo entendimento:
"As preferências, entre credores quirografários, dependem da ordem das penhoras. Já as que decorrem de garantias reais, são respeitadas no concurso particular independentemente de penhora em favor do titular do ius in re."
RODRIGO BENEVIDES DE CARVALHO, por sua vez, adota o primeiro:
"De fato, parece-nos inviável que sem execução e penhora possa o credor hipotecário ser satisfeito com preferência aos demais credores. O direito de seqüela, repita-se, configura justamente a possibilidade de o credor hipotecário penhorar o bem, seja quem for seu detentor, por qualquer título. Tal penhora, por óbvio, depende da iniciativa do credor hipotecário, através da execução."
Em outra passagem, esse Autor salienta essa posição, para dizer que:
"O credor trabalhista, fiscal ou qualquer outro credor cuja preferência é emanada de lei material (privilégio geral ou especial) só poderá exercer esse benefício através de sua execução e desde que a esta afete o bem pelo qual pretende concorrer, efetivando a respectiva penhora."
A propósito, cumpre observar que em sede jurisprudencial trabalhista o que se constata, mais comumente, é a postura conforme a qual não se exige prévia penhora.
Pode ocorrer, também, disputa entre credores com igual preferência emanada do direito material. Nesse caso, a primazia recai sobre aquele que obteve anteriormente o correlato direito. Exemplifique-se com a existência de dois credores hipotecários; a primazia, por óbvio, é daquele que obteve a hipoteca há mais tempo frente ao outro.
"Como se sabe, um imóvel pode ser hipotecado mais de uma vez ao mesmo credor ou a outro. A segunda hipoteca (bem como a terceira, e, assim, sucessivamente) só interessa se o valor do bem for superior ao da dívida que garante. Não obstante essa permissão, a pluralidade de hipotecas, por óbvio, configura maiores vantagens ao primeiro credor, uma vez que os outros só exercerão o direito de preferência após ter o primeiro credor recebido a dívida. Paga a primeira dívida hipotecária, o segundo credor sucede na ordem de preferência e assim por diante."
No que tange à legislação falimentar, entendemos que a ordem preferencial entre credores nela prevista não se aplica ao tema sob enfoque, ante a flagrante diferenciação entre os sujeitos passivos envolvidos. Fica, portanto, estabelecida a ordem conforme exposto anteriormente, e ao sujeito passivo empresarial se aplicam as normas que lhe são exclusivamente endereçadas.
Mencione-se, por fim, a controvérsia acerca da posição dos créditos relativos a honorários advocatícios em tema de preferências de créditos. Entende-se que gozam de preferência diante dos demais créditos, exceções feitas aos tributários e aos decorrentes de relação trabalhista.