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Poder de polícia e atribuições das Guardas Municipais

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14/10/2010 às 16:11

Resumo:


  • A Lei 10.826/2003 e suas alterações estabelecem condições para o porte de arma de fogo por guardas municipais, variando conforme o tamanho da população do município.

  • As guardas municipais têm como função primordial proteger os bens, serviços e instalações municipais, podendo atuar preventivamente e repressivamente diante de ilícitos.

  • A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece a legitimidade da atuação das guardas municipais na prisão em flagrante e na apreensão de objetos ligados ao crime, mesmo em municípios com populações inferiores a 500.000 habitantes.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Resumo: O presente artigo visa estudar as atribuições das guardas municipais e os limites do seu poder de polícia, cotejando suas competências em matéria de segurança pública com a dos demais órgãos encarregados desse mister, e as competências materiais e legislativas dos entes federativos, previstas na Constituição Federal. Analisa-se a missão constitucional das guardas (proteção dos bens, serviços e instalações dos Municípios). Aborda-se também a questão do porte de arma de fogo por integrantes das guardas municipais diante da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento) e alterações da Medida Provisória 157/2003.

Sumário: 1. Introdução – 2.Competências constitucionais dos órgãos de segurança pública 3. Repartição de competências constitucionais materiais e legislativas em matéria de segurança pública 4.Proteção dos bens, serviços e instalações municipais 4.1 Bens e instalações municipais 4.2 Serviços do município 4.3 Proteção do meio ambiente e do patrimônio histórico, artístico e cultural do município 5. Limites da atuação das guardas municipais. 6. Guardas municipais e policiamento preventivo 7. Poder de polícia e guardas municipais 8. Armas de fogo e seu uso e porte por guardas municipais 9. Conclusões.

Palavras-Chave: Direito ConstitucionalDireito AdministrativoDireito Penal - Direito Processual Penal - Segurança Pública – Competências constitucionais – Guarda Municipal - Polícia Militar – Armas de fogo – Estatuto do Desarmamento – Bens do Município – Serviços municipais – Instalações municipais – Poder de Polícia – Prisão – Prisão em flagrante.


1. Introdução

O presente artigo visa analisar os limites do poder de polícia e as atribuições das guardas municipais à luz da Constituição Federal de 1988.

Há disposição específica sobre as guardas no texto constitucional vigente. Encontra-se no Título V (DA DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIÇÕES DEMOCRÁTICAS), Capítulo III (DA SEGURANÇA PÚBLICA), artigo 144, par. 8º, que reza:

"Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações , conforme dispuser a lei."

Diante do justo anseio da sociedade por um efetivo combate à criminalidade, propostas das mais diversas surgem sobre a missão das instituições relacionadas à manutenção da ordem pública. E, nesse contexto, faz-se oportuna uma discussão sobre as guardas municipais, seus papéis e limites de sua atuação.

Segundo estudo do IBGE [01] (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2004, 950 municípios tinham guarda municipal no Brasil. Em São Paulo, dos 645 municípios, 194 dispunham desse órgão de segurança. Do total, 139 (14,6%) utilizam armas de fogo. O estado de São Paulo possui 85 municípios em que as guardas são armadas (43,8%).

Ainda segundo tal pesquisa, em muitas cidades as guardas desenvolvem atividades diretamente ligadas à segurança pública. Além de sua missão constitucional, em 815 municípios elas efetuam ronda escolar e em 638, auxiliam as polícias militares.

Ressalte-se ainda a importância das guardas, reconhecida pelo legislador federal, como integrante do sistema de segurança pública, conforme prevista na Lei 10.201/2001, alterada pela Lei 10.746/2003, que criou o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP). Neste diploma legal se prevê que o Fundo apoiará projetos na área destinados inclusive ao reequipamento, treinamento e qualificação das guardas municipais (art. 4º, inciso I), e que terão acesso aos recursos do FNSP os Municípios que mantenham guarda municipal (art. 4º, §3º, I).

Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88) as guardas por vezes são desvirtuadas de seus fins. Em alguns municípios elas são alvo de tentativas de transformação em polícias municipais, dotadas erroneamente de poderes de policiamento ostensivo e do dever de manter a ordem pública, o que nem de longe era o objetivo dos constituintes.

Agrava-se essa situação com a própria omissão do legislador federal, passados mais de 17 anos desde a promulgação da CF/88, em editar a lei que deveria tratar das guardas municipais, conforme previsto em seu próprio texto.


2. Competências Constitucionais dos órgãos de segurança pública

O art. 144, caput, da CF/88, dispõe que a segurança pública é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

"I – polícia federal

II – polícia rodoviária federal

III – polícia ferroviária federal

IV – polícias civis

V – polícias militares e corpos de bombeiros militares"

As guardas municipais não são previstas expressamente no artigo acima transcrito. Tal poderia levar a crer que elas não fariam parte do sistema constitucional de segurança pública. Mas, numa análise sistemática da Carta Magna, o entendimento contrário se impõe.

Façamos um paralelo simples. O art.145 da CF/88, dentro do capítulo I (DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL) do Título VI (DA TRIBUTAÇÃO E DO ORÇAMENTO), autoriza à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a criação de tributos divididos em três espécies: impostos, taxas e contribuições de melhoria. Entretanto, nenhum estudioso de direito tributário negaria a existência de outras espécies de tributos previstos no texto constitucional, mas fora do rol do citado artigo, como os empréstimos compulsórios e as contribuições sociais.

Embora não figurem no art. 144, as guardas municipais integram o sistema de segurança pública da CF/88. Mas a própria ausência de menção no referido artigo nos dá uma pista de que as guardas não possuem as mesmas responsabilidades dos demais órgãos e o mesmo status constitucional. Tampouco podem transformar-se num órgão policial dos Municípios.

O professor José Afonso da Silva ensina:

" Os constituintes recusaram várias propostas no sentido de instituir alguma forma de polícia municipal. Com isso, os Municípios não ficaram com nenhuma específica responsabilidade pela segurança pública. Ficaram com a responsabilidade por ela na medida em que sendo entidade estatal não poderiam eximir-se de ajudar os Estados no cumprimento dessa função. Contudo, não se lhes autorizou a instituição de órgão policial de segurança e menos ainda de polícia judiciária. [02]"

Ousaríamos dizer que as guardas municipais têm uma competência específica (proteger os bens, serviços e instalações dos Municípios), limitada esta pelas próprias competências específicas dos demais órgãos responsáveis pela segurança pública previstos no art. 144 da CF/88.

E as funções das guardas devem ser por bem entendidas em cotejo com as competências materiais e legislativas da União, Estados-membros e Municípios previstas tanto na CF/88, como nas Constituições Estaduais, conforme analisaremos adiante.

Cabe menção, en passant, das competências dos órgãos de segurança pública do art. 144 da CF/88. Ao final do rol saberemos que poderes as guardas municipais NÃO possuem.

Conforme o art. 144, par. 1º da CF/88, a polícia federal destina-se a:

"I – apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme (...).

II – prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho (...)

III – exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União."

Por sua vez, a polícia rodoviária federal e a polícia ferroviária federal possuem a tarefa de promover o patrulhamento ostensivo das rodovias federais e das ferrovias federais, respectivamente (art. 144, par. 2º e par. 3º, CF/88).

Pelo art. 144, par. 4º da CF/88, às polícias civis incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

"Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil." Essa é a transcrição do art. 144, par. 5º, da CF/88.

Não olvidemos a menção ao art. 142, caput, da CF/88, referente à missão das Forças Armadas ("....destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem."). Estas ainda seguirão as regras que lhe são próprias no que concerne à defesa de seu patrimônio e polícia judiciária (Decreto-Lei 1.002/1969).

A Câmara dos Deputados (art. 51, IV) e o Senado Federal (art. 52, XIII), segundo a CF/88, possuem cada qual polícia própria encarregada da sua segurança e da manutenção da ordem em seus recintos.

Em suma, as guardas municipais não podem exercer nenhuma das funções expressas como exclusivas das instituições mencionadas no art. 144, caput, da Carta Magna, e as previstas como sendo atribuição de outros órgãos, conforme exposto acima.

Os integrantes das guardas municipais que exercerem indevidamente alguma dessas funções exclusivas de outros órgãos de segurança estará em tese exercendo indevidamente uma função pública, estando sujeitos ao indiciamento nos crimes de usurpação de função pública (art. 328 do código Penal) e abuso de autoridade nos termos da Lei 4.898/65.

A questão é diferenciar e identificar as situações fronteiriças de atentados à ordem pública cometidos nos territórios municipais que poderão ser objeto de atuação das guardas. Voltaremos adiante ao assunto.


3. Repartição de competências constitucionais materiais e legislativas em matéria de segurança pública

Cabe aqui um estudo sobre as competências constitucionais materiais e legislativas da União, dos Estados-membros e dos Municípios no que concerne a segurança pública.

Competência, na definição de José Afonso Silva [03], é a "faculdade juridicamente atribuída a uma entidade, órgão ou agente do Poder Público para emitir decisões. Competências são as diversas modalidades de poder de que se servem os órgãos ou entidades estatais para realizar suas funções".

A predominância do interesse é o princípio geral que orienta a repartição de competências num Estado Federal. Conforme Alexandre de Moraes [04], à União caberá aquelas matérias e questões de predominância do interesse geral. Os Estados, por sua vez, se referirão às matérias de predominante interesse regional e aos Municípios tocam os assuntos de interesse local.

Exceção é feita ao Distrito Federal (CF, art. 32, par. 1º), que acumula em regra as competências estaduais e municipais, ressalvas feitas por sua vez à previsão do art. 22, XVII, da Constituição (organização judiciária, do Ministério Público e da Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios, bem como organização administrativa destes).

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É de se mencionar as competências de cada ente integrante da Federação que concernem à segurança pública, exceção feita às relativas a relações exteriores, ameaças externas e defesa do território nacional, todas de incumbência da União.

À União cabem as competências administrativas previstas no art. 21 da Constituição. No que interessa ao tema, são: I - organizar e manter a polícia civil, a polícia militar e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal (inciso XIV); II – planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e inundações (inciso XVIII); III – executar os serviços de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras (inciso XXII).

Aos Estados-membros são reservadas privativamente as competências administrativas que não pertencerem nem à União nem aos Municípios (CF, art. 30), e as comuns (CF, art. 23). É a competência remanescente.

A Constituição do Estado de São Paulo prevê nos arts. 139 e ss., no capítulo sobre segurança pública, a estrutura de proteção da ordem no Estado e as competências das instituições de Polícia, sem fugir dos parâmetros da Constituição Federal.

Aos Municípios cabe, em se tratando de ordem pública, conforme entendimento do art. 30 da CF, sempre tendo em vista o interesse local ( e podendo legislar sobre esses assuntos, conforme o inciso I), controlar o uso, o parcelamento e a ocupação do solo urbano e promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Relativo à algumas das competências administrativas comum, prevista no art. 23 da Constituição, a todos os entes federativos cabe, segundo os seguintes incisos:

"I – conservar o patrimônio público;

III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural;

VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

VII – proteger as florestas, a fauna e a flora.

XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios".

Tratemos das competências legislativas. Nesse tópico as competências privativas da União são previstas no art. 22 da CF, ao qual nos reportamos (destacando os incisos I, XXI, XXII e XXVIII). Estas podem ser delegadas aos Estados-Membros (par. único)

O art. 24 da CF prevê as regras de competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal. As que interessam nosso estudo são: I – direito penitenciário; II – conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais e proteção do meio ambiente; III – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico.

Já sobre as competências legislativas dos municípios, como mencionado, predomina o interesse local (art. 30, I, CF), tendo tudo o mais que for expresso no art. 30 como baliza desse interesse. Chamamos especial atenção para os incisos VIII e IX do artigo em tela, já que referem-se a competências relativas à proteção ambiental já previstas em artigos acima estudados.

Da leitura das competências constitucionais de cada ente federativo se conclui que os municípios, no que se refere à segurança pública, tem como finalidade principal a proteção do interesse local, sendo este a proteção do próprio patrimônio , do meio ambiente e do patrimônio histórico-cultural local, do solo urbano e dos munícipes. O município, sendo um ente autônomo, nos termos do art. 18 da CF, tem direito a preservar essa autonomia, e tal pressupõe a capacidade de se defender, incluídas aí suas instituições, que necessitam de locais e bens para funcionar (patrimônio), a prestação de seus serviços e o população que habita seu território.

Não obstante essa autorização para sua própria proteção e de seu povo, o Município não tem autorização para constituir uma força policial própria. As guardas municipais exercerão um papel específico em segurança pública, mas não será o de polícia ostensiva ou de repressão.


4. Proteção dos bens, serviços e instalações municipais

4.1 Bens e instalações municipais

Cumpre aqui recorrer ao Código Civil Brasileiro (Lei 10.406/2002) a fim de obter uma definição de bens. E, diante do conceito, traçar um limite para a atuação das guardas municipais, dentro do estipulado pela Constituição ("...destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações...").

Bens, conforme Clóvis Beviláqua, "...são valores materiais ou imateriais que servem de objeto a uma relação jurídica [05]"

Não é qualquer bem que será alvo da proteção das guardas municipais, mas sim os pertencentes ao município. E, dentro dessa categoria, os públicos.

O art. 98 do Código Civil de 2002 define: "São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem".

A seu turno, o art. 99 e seu par. único do mesmo diploma legal dizem:

"São bens públicos:

I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças;

II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias;

III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades.

Parágrafo único. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado".

A missão principal das guardas consistirá em dar proteção a esse patrimônio municipal, bem como aos seus serviços.

Por lógico, devemos entender que quaisquer dos bens contidos no art. 99 do Código Civil, pertencentes aos municípios, podem ser objeto de proteção das guardas municipais. Ressalte-se, para que se espanque eventuais dúvidas: ruas, praças, edifícios em que funcionem as repartições municipais, escolas municipais, qualquer imóvel sede de serviço prestado pelo município (seja ou não de propriedade do município, inclusive os alugados ou cedidos às Prefeituras a qualquer título) e outros bens móveis ou imóveis dos municípios, tais como veículos, semáforos, radares, tampas de bueiros, postes, equipamento de prevenção de enchentes, etc., enfim, tudo o que for de propriedade dos municípios e de suas autarquias ou fundações, ou que estiver sendo por estes entes utilizados para suas finalidades.

Tal vai de encontro ao disposto no art. 23, I, da CF/88, já que aos Municípios cabe a conservação do patrimônio público. Razão pela qual as guardas municipais estão legitimadas a atuar a fim de reprimir atentados ao patrimônio municipal.

À guisa de exemplo, os guardas municipais tem o poder de coibir a depredação e a conspurcação de bens públicos, efetuadas por vândalos e pichadores. Essa proteção em especial pode em tese estender-se para outros bens não apenas do Município, mas sitos neste, pois a poluição visual é forma de poluição, com a incumbência de ser pelos Municípios combatida (art. 23, VI, CF/88).

4.2 Serviços do município

Ao falarmos em serviços do município, por óbvio falamos de serviços públicos. A Prof. Maria Sylvia Zanella de Pietro define serviço público como: "toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público. [06]"

As guardas municipais tem como uma de suas funções a proteção dos serviços do município. Tal não significa que devam elas executar esses serviços, mas sim assegurar que aos municípios seja dada a oportunidade de prestá-los, garantindo a segurança dos locais de prestação contra distúrbios e atividade criminosa tendente a impedi-los.

Nesse mister inclui-se a proteção dos servidores municipais encarregados de prestá-los. Os serviços públicos são prestados por pessoas, e não por entes abstratos. Tal pode ser interpretado com a elasticidade necessária a fim de que, com essa proteção, efetivamente haja a atuação de certos servidores cujas ações possam envolver risco pessoal, sendo objeto de oposição por quem tenha um interesse contrariado. Tal engloba o apoio a atividades como fiscalização tributária, vigilância sanitária, desocupação ou demolição de construções irregulares e a preservação do meio ambiente

Entendemos perfeitamente legítimo o uso da guarda municipal como uma força de garantia da Municipalidade para que essa efetue determinados serviços. Não será inconstitucional qualquer disposição em Leis Orgânicas ou leis municipais que atribuam à Guarda Municipal a incumbência de garantir a execução de serviços como os exemplificados. Com tal previsão, agindo a Municipalidade nos limites da legalidade em sua atuação, não é necessário que o servidor municipal recorra ao Judiciário ou às polícias para o exercício de seu mister, podendo recorrer à guarda municipal.

Ocorrência comum é a apreensão de produtos contrabandeados em notórios entrepostos da informalidade, ou da mão de vendedores informais ("camelôs"), em diligências efetuadas por guardas municipais. Nada há de irregular nisto, pois há aqui violação à legislação tributária do município, lesado no seu direito de arrecadar impostos. No caso se apresenta também um atentado ao comércio regular e às leis de zoneamento, com mercancia realizada por vezes em áreas residenciais. Só a atuação de fiscais municipais de tributos, desarmados, não seria suficiente para coibir a atividade criminosa. E tratando-se de crimes de contrabando e descaminho, permanentes e ensejando o flagrante a qualquer momento, as guardas estão autorizadas a agir como qualquer do povo.

Outras hipóteses em que é legitimada a atuação das guardas incluem proteção aos servidores municipais encarregados de fiscalizar a ocupação irregular do solo e de efetuar a demolição de construções irregulares (art. 30, VIII, CF/88).

A proteção das guardas pode naturalmente estender-se para a proteção de serviços concedidos ou permitidos dos municípios, como o transporte coletivo. Em que pese o serviço estar a cargo de uma concessionária ou permissionária, ainda é um serviço municipal. Em hipóteses de depredações de ônibus, por exemplo, sendo cada vez mais comum ocorrer o seu incêndio por arruaceiros, as guardas não precisam aguardar ordem ou autorização para agir.

A efetuação de rondas escolares também não é vedada às guardas, pois trata-se da proteção tanto de um serviço (ensino), como do patrimônio municipal (as escolas).

Enfim, as guardas estão legitimadas a atuar de forma a que os municípios prestem seus serviços. Estes tem não só o dever de prestá-los, mas também o direito. E as guardas podem tomar as medidas cabíveis a fim de preservar esse direito.

4.3 – Proteção do meio ambiente e do patrimônio histórico, artístico e cultural do município

Ao estudarmos as competências constitucionais dos municípios, vimos que estes possuem sua parcela de responsabilidade na preservação do meio ambiente e do patrimônio histórico, artístico e cultural (art. 23, incisos III, IV, VI, VII, XI, e art. 30, incisos VIII e IX, CF/88).

Ressalvando-se o que seja de atribuição das polícias, as guardas municipais terão atuação na preservação dos bens naturais do município, bem como dos bens que tiverem intrínseco valor representativo da história, arte e da cultura, sitos em seu território.

Legitima-se, destarte, a vigilância efetuada pelas guardas nos parques municipais, áreas de preservação de mananciais, imóveis tombados por qualquer dos entes federativos, florestas, margens de rios, praias e sítios arqueológicos, a fim de preservar sua integralidade.

Já exemplificamos no texto o combate que as guardas devem dar aos pichadores e vândalos. Sendo a pichação ou grafitação um crime ambiental previsto no art. 65 da Lei 9.605/98, é dever dos guardas municipais prender em flagrante delito quem seja encontrado conspurcando qualquer edificação ou monumento situado no Município, seja ou não de propriedade municipal.

A atuação das guardas municipais se estende a qualquer crime ambiental previsto na Lei 9.605/98.

De outra forma não se poderia entender a existência de uma competência comum aos entes federativos, previstas no art. 23 da Carta Magna, e que incluem os municípios, se estes não pudessem tomar as medidas necessárias para preservar o que é de sua incumbência.

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Sobre o autor
Luiz Augusto Módolo de Paula

Procurador do Município de São Paulo, ex-procurador federal, advogado, bacharel e mestre em Direito Internacional pela USP

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULA, Luiz Augusto Módolo. Poder de polícia e atribuições das Guardas Municipais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2661, 14 out. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17604. Acesso em: 23 dez. 2024.

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