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A confissão no Direito Tributário

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5.Evolução na jurisprudência

A jurisprudência vem sabiamente acatando a possibilidade de discussão de crédito tributário objeto de parcelamento fiscal, seja por de tribunais regionais, e até mesmo pelos Tribunais Superiores.

A título exemplificativo, citamos alguns acórdãos.

PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO – TRIBUTÁRIO – DÉBITOS ADMINISTRADOS PELO INSS – TERMO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA FISCAL – ATO JURIDICO PERFEITO – TRIBUTO DECLARADO INCONSTITUCIONAL COM EFEITOS ERGA OMNES – POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO ATO, ANTE A EXISTÊNCIA DE VÍCIO - O prequestionamento ocorre com a manifestação judicial sobre o tema em discussão, não se exigindo a indicação explícita dos dispositivos constitucionais e legais atinentes à matéria examinada. - A confissão de dívida firmada nos moldes do art. 38 da Lei nº 8.212/91 é ato jurídico perfeito que não pode ser desconstituído sem a comprovação de existência de vícios na sua formação. - A declaração de inconstitucionalidade de tributo, com efeitos erga omnes e ex tunc, autoriza a revisão do ato, constituído sobre a presunção de constitucionalidade de lei posteriormente extirpada do ordenamento jurídico. - Embargos de declaração parcialmente providos. (BRASIL – E: 2010)

No Superior Tribunal de Justiça a matéria também já se encontra pacificada:

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II E AO ART. 458, II, DO CPC NÃO CONFIGURADA. CONFISSÃO DE DÍVIDA. REVISÃO JUDICIAL. LIMITES. VIOLAÇÃO AO ART. 267, VI, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA.

1. Não viola os artigos 535 e 458, II do CPC, nem importa negativa de prestação jurisdicional, o acórdão que adotou fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia posta.

2. A ausência de debate, na instância recorrida, sobre os dispositivos legais cuja violação se alega no recurso especial atrai, por analogia, a incidência da Súmula 282 do STF.

3. A confissão da dívida não inibe o questionamento judicial da obrigação tributária, no que se refere aos seus aspectos jurídicos. Todavia, no que se refere à matéria de fato, a confissão do contribuinte somente pode ser invalidada quando presente defeito causador de nulidade do ato jurídico.

4.Não viola o art. 267, VI, do CPC o acórdão que extingue o processo com julgamento do mérito, pela improcedência do pedido.

5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. (BRASIL – C: 2010)

Em voto proferido nos autos do RECURSO ESPECIAL Nº 927.097 - RS (2006/0180123-6), o Nobre Relator, Ministro Teori Albino Zavascki, consolida e fundamenta o entendimento de que é sim possível a discussão de débito tributário objeto de parcelamento fiscal:

Não se está com isso afirmando a absoluta inviabilidade de questionar as dívidas tributárias objeto de confissão ou de parcelamento. Conforme anotou Leandro Paulsen, com base em significativa resenha jurisprudencial e doutrinária, "a confissão não inibe o questionamento da relação jurídico-tributária". Todavia, "isso não significa que a confissão seja desprovida de valor. Terá valor, sim, mas quanto aos fatos, que não poderão ser infirmados por simples reconsideração do contribuinte, mas apenas se demonstrado vício de vontade. A irrevogabilidade e a irretratabilidade terá apenas essa dimensão. Assim, e.g., se confessada dívida relativamente a contribuição sobre o faturamento, será irrevogável e irretratável no que diz respeito ao fato de que houve, efetivamente, o faturamento no montante consignado; entretanto, se a multa era ou não devida, se a legislação era ou não válida, são questões que poderão ser discutidas" (PAULEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência, Livraria do Advogado, 9ª ed. p. 608). Realmente, considerando a natureza institucional (e não contratual) da obrigação tributária, não se pode certamente admitir a hipótese de sua criação por simples ato de vontade das partes. A legitimidade das fontes normativas que disciplinam a sua instituição é, por isso mesmo, passível de controle pelo Poder Judiciário. Todavia, no que se refere às circunstâncias fáticas sobre as quais incidem as normas tributárias, essas certamente são colhidas pela força vinculante da confissão de dívida e da cláusula de irretratabilidade. Não fosse assim, não teriam eficácia alguma as inúmeras disposições da legislação tributária, freqüentes na esfera federal, estadual e municipal, prevendo essa espécie de confissão como condição indispensável para que o contribuinte possa usufruir de moratória ou de outros benefícios de natureza fiscal. No caso, ao afirmar a impossibilidade de revisão da dívida confessada, o acórdão não desbordou desses limites. Conforme se percebe das razões recursais, a causa de pedir a revisão do parcelamento não é a validade ou a invalidade da norma de incidência, mas sim a alegada não-configuração do fato gerador do tributo (fls.5/6), matéria que está coberta pela cláusula da irretratabilidade. (BRASIL – C: 2010)

Arrematando a questão jurisprudencial acerca da matéria, o Supremo Tribunal Federal, há tempos atrás, quando de sua competência, também já fincou entendimento sobre a possibilidade de discussão judicial dos referidos débitos:

EMENTA

Imunidade tributária. Instituição de educação. Reconhecendo o julgado o implemento dos requisitos legais para o seu reconhecimento, escapa ao crivo do recurso extraordinário o reexame pretendido para demonstrar a inocorrência dos pressupostos da imunidade. Reconhecida a imunidade tributária, não prevalece o princípio da confissão irretratável de dívida, art. 63, §2º do decreto-lei nº 147/67. Recurso extraordinário não conhecido. (BRASIL – D: 2010).


6. Conclusão

A confissão de dívida no ordenamento jurídico pátrio comporta retratação e revisão. Diferente, portanto, não poderia ser no Direito Tributário.

Muito embora a existência de norma contendo disposição em contrário, a saber, as leis que versam sobre parcelamento de débitos tributário, não pode o contribuinte ver-se compelido a acatar os termos nela previstos, dispondo assim de direito considerados indisponíveis pelo ordenamento.

Mister faz-se ratificar que a confissão só pode existir mediante manifestação livre de vontade, fato este que não ocorre na assinatura do "Termo de Confissão de Dívida" em sede de adesão a parcelamento de débitos tributários.

Ao condicionar a concessão do parcelamento à renuncia de direitos indisponíveis por parte do contribuinte, o legislador fere por ilegalidade a norma por ele produzida, ao passo que retira a liberdade da vontade expressada pelo contribuinte.

Devemos considerar, portanto, que a confissão de dívida tributária restringe-se tão somente ao ato de o contribuinte criar um fato perante a administração tributária, não podendo a mesma jamais ser capaz de criar tributo.

A confissão em direito tributário não constitui, portanto, prova única para a constituição do crédito tributário, devendo, além dela, serem observadas as demais provas necessárias para tanto referentes à realização concreta da norma geral e abstrata contida na hipótese de incidência tributária, sendo assim capaz de fazer nascer a obrigação tributária da qual resultará aquele crédito.

Pelas afirmações aqui postas chegamos à conclusão, ainda, de que é plenamente possível de discussão, seja por via administrativa, seja por via judicial, de débito tributário objeto de parcelamento de débitos, uma vez que é plenamente possível a revogação de confissão em virtude da prova da existência de erro sob a constituição do fato por ela originado.


Referências

AMARAL, Paulo Adyr Dias do. Confissão em matéria tributária: Seu verdadeiro significado. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/14227>. Acesso em: 18 jan. 2010.

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Sobre a autora
Ana Cecília Rocha Bahia Menezes

Advogada. Graduada pela UNIFACS - Universidade Salvador. Pós-Graduada em Direito Tributário pelo IBET - Instituto Brasileiro de Estudos Tributários.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MENEZES, Ana Cecília Rocha Bahia. A confissão no Direito Tributário . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2700, 22 nov. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17870. Acesso em: 26 abr. 2024.

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