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Venda de navios: uma perspectiva luso-brasileira e internacional

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11/12/2010 às 09:59
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O art. 468 do Código Comercial permite expressamente a alienação de navio brasileiro destinado à navegação em alto mar, realizada por escritura pública.

SUMÁRIO: 1.O Navio. 1.1 Conceito. 1.2. Natureza jurídica.1.3 Modos de individualização do navio; 1.3.1 Nome; 1.3.2 Nacionalidade e Bandeira; 1.3.3 Registros nacionais; 1.3.1.1 Registro abertos; A. Segundos registros; B. Bandeiras de conveniência; 1.4 Modos de aquisição da propriedade do navio; 2. Venda de navio em Direito Material; 2.1. Compra e venda de navio; 2.1.1 No ordenamento brasileiro; 2.1.1.2 No ordenamento português; 2.2 A transferência da propriedade; 2.2.1 No ordenamento brasileiro; 2.2.2 No ordenamento português; 3. Venda de navio no tráfico Jurídico; 3.1 Compra e venda de navios na prática negocial marítima; 3.2 Valor dos negócios preparatórios; 3.2.1 Carta de intenção; 3.2.2 Contrato preliminar ou pré-contrato; 3.3 Contratos-tipo de venda de navios; 3.3.1 Saleform; 3.3.2 Nipponsale; 3.3.3 Cláusulas de arbitragem; 4. Determinação do Direito aplicável; 4.1 Direito de conflitos no ordenamento brasileiro; 4.2 Direito de conflitos no ordenamento português; 4.3 Direito aplicável à arbitragem; 4.4 Direito aplicável à transferência de propriedade; Considerações finais; Referências.


1.O Navio

1.1.Conceito

O conceito de navio possui basilar importância no âmbito do Direito Marítimo, uma vez que constitui o objeto central da sua regulação. É indubitável que sem a existência do navio, não existiria o Direito Marítimo. Inexiste na doutrina, entretanto, uma noção pacífica pois, existem diversas interpretações acerca do seu conceito [01], tanto no âmbito gramatical como no âmbito legal.

O ordenamento jurídico brasileiro ampara o entendimento de que navio é toda construção flutuante, capaz de navegar em quaisquer águas, assinalando, por conseguinte, o navio como veículo de transporte no mar ou em outro meio aquático. Assim, pode-se afirmar que os fatores navegabilidade e flutuabilidade acham-se inerentes ao conceito.

Ainda relativamente ao ordenamento brasileiro, a definição de navio não foi integrada ao Código Comercial, além de que o Diploma evidencia uma certa inexatidão terminológica, ao mencionar os termos navio, barco e embarcação, indistintamente [02] em vários artigos, utilizando-as de maneira aleatória. [03] Entretanto, existe entendimento doutrinário [04] no sentido de visualizar o navio como uma espécie do gênero embarcação.

Levando-se em consideração para a definição de navio, o porte da embarcação, pode-se afirmar que navio é toda a embarcação de grande porte cujo objeto [05] é o transporte de pessoas e/ ou mercadorias, por vias navegáveis, fluviais, lacustres ou marítimas.

Na seara legislativa brasileira, pode-se mencionar a definição exposta pelo DL 15.788/22, de 08 de Novembro, referente à hipoteca naval, que em seu art. 3º define navio como sendo "toda construção náutica, destinada à navegação de longo curso, de grande e pequena cabotagem, apropriada ao transporte marítimo ou fluvial". Já no ordenamento português, o DL 201/ 98, referente ao Estatuto legal do navio, oferece no n.1 do seu art.1º a seguinte definição: "Para efeitos do disposto no presente diploma navio é o engenho flutuante destinado à navegação por água".

Levando em consideração todos os fatores relativos à uma embarcação, pode-se afirmar que navio é toda embarcação, reservada à navegação lacustre, fluvial ou marítima, provida ou não de propulsão própria, mas que execute o trajeto sobre as águas, conduzindo, com qualquer finalidade, pessoas ou mercadorias. [06]

1.2.Natureza jurídica

A classificação jurídica dos bens vem se modificando, constantemente, em virtude de critérios econômicos. A enorme importância que bens como navios, aeronaves, etc., foram conquistando provocou a diferenciação civilista entre bens imóveis, móveis e móveis sujeitos a matrícula.

No âmbito da natureza jurídica do navio, surgem dois elementos fundamentais, a saber: o enquadramento de bem móvel de natureza sui generis e a configuração de res conexa, um todo composto de várias partes e diversos acessórios, assinalando assim, que a sua natureza jurídica é complexa.

O navio é uma coisa composta, integrada por partes ou elementos passíveis de individualização ou separação e, simultaneamente, está provido de unidade orgânica. Além de coisa composta, o navio é bem móvel ainda que passível de hipoteca. E além de tudo, a natureza especial do navio faz com que seja suscetível de matrícula, registro e embandeiramento.

No ordenamento brasileiro, dimana da análise do art. 82 [07] do Código Civil a conclusão de que o navio deve figurar entre os bens móveis. Inclusive, pode-se afirmar que, em decorrência da sua própria função e estrutura, o navio não pode ser considerado um bem imóvel, tendo em vista que o navio flutua e desloca-se de um local para o outro, evidenciando todas as características dos bens móveis.

Entretanto, não obstante a sua caracterização como bem móvel, por vezes o navio adquire todo o caráter distintivo dos bens imóveis [08], em determinadas circunstâncias impostas legalmente, como no caso da hipoteca naval [09], na hipótese da venda judicial [10] e ainda relativamente aos trâmites concernentes ao registro e à transferência de propriedade do navio [11]. Assim, possui uma natureza especial, o que leva a alguns autores a classificá-lo como coisa móvel sui generis. [12]

1.3.Modos de individualização do navio

Os navios individualizam-se pela sua identidade, ou seja, nome, tonelagem, arqueação, porto de inscrição, e também pelos papéis de bordo, classe e nacionalidade. As peculiaridades de identificação do navio fizeram emergir na doutrina (em especial, a anglo-saxônica) uma comparação entre o navio e uma pessoa, no sentido de atribuí-lo personalidade. [13] Os que perfilham desse juízo, argumentam que se individualiza o navio pelo nome, da mesma maneira que ocorre com as pessoas. Sustentam, ainda, que existiria uma certa similitude entre o estado civil das pessoas e o registro dos navios.

Entretanto é entendimento majoritário que, apesar de tais semelhanças, não se deve proceder, no âmbito jurídico, a tal comparação, uma vez que, para todos os efeitos jurídicos, o regime do navio é de um bem e não de um indivíduo. Desta forma, o navio deve ser considerado como objeto de direito e não sujeito de direitos. [14]

1.3.1.Nome

O nome, como já mencionado anteriormente, é um dos elementos de individualização do navio, uma das suas características de identificação. De acordo com o ordenamento brasileiro, deverá o nome estar marcado na proa nos dois bordos (bombordo e estibordo) e na popa, juntamente com o porto de inscrição.

O nome do navio deverá estar presente em todos os documentos do navio, que lhe são conferidos em virtude do registro ou da aquisição. Alguns territórios exigem, ainda, que figure na referida documentação e sejam marcados no casco os sinais de identificação, que são utilizados para chamada radiotelegráfica e radiotelefônica.

1.3.2.Nacionalidade e bandeira

O registro da Propriedade de um navio delimita a sua nacionalidade. [15] Levado a efeito o registro, o navio estará apto a ostentar o pavilhão do país de registro, além de ter a proteção no alto-mar e de vantagens intrínsecas à nacionalidade. Em território brasileiro, a prova da nacionalidade efetua-se pela Provisão do Registro de Propriedade Marítima (PRPM), que faz parte da documentação de bordo obrigatória.

A aquisição da nacionalidade por um navio está subordinada a certos requisitos estabelecidos em lei, que podem variar, de acordo com o Estado em questão. São apreciados três critérios para a outorga da nacionalidade, a saber: o local de construção do navio; a nacionalidade do ou dos proprietários; a composição da equipagem.

No Brasil, o critério é misto. Assim, para ostentar a bandeira brasileira, os requisitos são que o navio: seja de propriedade de armador ou empresa brasileira; [16] Ter comandante e chefe de máquinas brasileiro; e no mínimo, dois terços dos tripulantes deverão ser nacionais. Esta é a forma de se evidenciar o forte elo de ligação entre o Estado do pavilhão e o navio, cuja exigência emana da Convenção Internacional sobre Direito do Mar, de Montego Bay, Jamaica.

Assim, ao arvorar o pavilhão de uma nação, o navio passa a ser parte integrante do território da mesma, nele imperando as leis do referido Estado e as convenções internacionais, ratificadas pelo Estado do pavilhão.

O navio que ostentar mais de uma bandeira é considerado um navio sem nacionalidade. É possível encontrar, atualmente, navios apátridas [17], que não tem registro em parte alguma. São os "navios piratas", [18] em versão hodierna, que aparecem, em especial, no sudeste asiático,com o objetivo de perseguir e assaltar navios comerciais.

Não obstante se tratar de uma raridade, é possível deparar-se com o caso de um navio com dupla nacionalidade, como na ocorrência de um navio registrado em um Estado e afretado a casco nu a companhia de outro país. O Estado da companhia afretadora pode autorizar o uso de seu pavilhão, desde que não haja incompatibilidade de leis entre o país de origem e o país da empresa afretadora. No Brasil, existe essa possibilidade de segundo registro condicionado à suspensão provisória de pavilhão no país de origem. Alguns Estados concedem tal prerrogativa independente de exigências, como Portugal, na Ilha da Madeira, o Panamá, a Libéria, a Nigéria e a Alemanha.

1.3.3.Registro

Considerando os critérios e os requisitos adotados pelos diversos Estados, os registros de navios podem ser classificado em Registros Nacionais e Registros Abertos. Nos Registros Nacionais, o país que concede a bandeira mantém um efetivo controle sobre os navios nele registrados, mantendo-os vinculados à sua legislação. Os Registros Abertos subdividem-se em Segundos Registros e Registros de Bandeira de Conveniência. [19]

1.3.3.1.Registros Nacionais

Os procedimentos relativos ao registro, variam de Estado para Estado. Entretanto, de acordo com os termos da Convenção de Montego Bay, em decorrência do princípio da nacionalidade, se faz necessária uma efetiva relação [20] entre o país e o navio que arvora o seu pavilhão. Tal laço não pode ser meramente formal, devendo envolver, por parte do Estado que permite o uso de sua bandeira, exercício efetivo de sua jurisdição e controle em todos nos âmbitos administrativos, técnicos, laborais, dentre outros, de acordo com o dever formulado pelo n. 1 do art. 94 da Convenção, e substantificado pelo n.2 do mesmo artigo. [21]

Dentre as funções do Registro, pode-se incluir: a atribuição do navio a um Estado específico e a sua submissão a uma jurisdição única, nos aspectos, por exemplo, de regulamentação de segurança, etc; a concessão do direito de arvorar a bandeira desse Estado; o direito de ter proteção diplomática e assistência consular do Estado do pavilhão; o direito de ter proteção naval desse Estado do pavilhão; o direito de participar em certas atividades dentro das águas territoriais desse Estado (como por exemplo, pesca costeira ou comércio entre portos do Estado da bandeira (cabotagem)); no caso de guerra, a possibilidade de serem aplicadas regras de guerra e neutralidade ao navio. Já na seara privada, as funções do registro são as de proteção do título do proprietário registrado e proteção do título e a preservação de prioridades entre pessoas detentoras títulos, como a hipoteca. [22]

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Como já referido anteriormente, os critérios mais utilizados pelas legislações na determinação da nacionalidade do navio são os critérios da construção [23], da propriedade, da composição da equipagem e do sistema misto. O critério misto é o adotado pelo Brasil, uma vez que para a concessão da bandeira, se faz necessário que se preencha diversos requisitos, já explicitados anteriormente.

13.3.4.Registros Abertos

A. Segundos Registros

Uma das espécies de Registro Aberto, como já referido anteriormente é o Segundo Registro (Off Shore Register, Second Register, Registro Especial), instituídos numa tentativa de obstar a evasão da frota nacional para as bandeiras de conveniência. Por meio dos segundos registros, os governos destes Estados, oferecendo uma série de vantagens existentes nas bandeiras de conveniência, além da própria reputação de seu pavilhão (tendo em vista que os navios, referentemente à segurança, ficam submetidos à mesma normativa aplicada ao registro nacional), esperam robustecer suas marinhas mercantes e aspiram, inclusive, o retorno de navios registrados em bandeiras de conveniência. Entretanto, mister ressaltar que os segundos registros não dão ocasião a financiamentos favoráveis ou a outros meios de proteção e incentivos concedidos pelo Estado, como o de cargas reservadas, por exemplo.

O primeiro segundo registro a emergir foi o da Noruega, denominado Registro de Navio Internacional Norueguês (NIS). Posteriormente vieram os segundos registros dinamarquês, o inglês, o alemão e o português, através da Ilha da Madeira (Madeira Register of Ships – MAR). As regulamentações variam de Estado para Estado, como também acontece com as bandeiras de conveniência.

O MAR surgiu no ano de 1989 e é aberto a proprietários de navios de qualquer nacionalidade, assim como aceita navios de qualquer tipo ou tonelagem. O registro provisório pode ser efetuado em qualquer consulado português, e os navios registrados no MAR passam a arvorar o pavilhão português. Embora o requisito básico seja que o capitão do navio e metade da tripulação [24] seja de cidadãos da União Européia, isenções podem ser concedidas.

Relativamente ao Brasil, a marinha mercante passou a ter uma atuação mais competitiva a partir do Registro Especial Brasileiro (REB), regulamentado em 1997. Entretanto, não obstante as suas normas representem vantagens de natureza fiscal, não ofertam avanço algum na relação trabalho/capital.

O REB aplica-se aos navios alienígenas afretados a casco nu, com suspensão temporária do pavilhão, cujo afretador deseje registrá-lo no REB.Importante relembrar que Navios com segundos registros cuja propriedade não origina nenhum vínculo com o Estado do pavilhão devem ser designados como navios de bandeira de conveniência. [25]

B. Bandeiras de Conveniência

Os Pavilhões ou Bandeiras de Conveniência nada mais são do que a concessão da nacionalidade de um país a navios alienígenas. Tais navios, sendo de propriedade de indivíduos de um país, são matriculados em outro, em virtude dos benefícios [26] alcançados com a normativa dos mesmos.

Destarte, assinalam-se por oferecerem uma grande facilidade para registro, incentivos fiscais, redução de custos no âmbito trabalhista e a não exigência de vínculo entre o país de registro e o navio. Tais Estados não exigem e nem fiscalizam com a necessária severidade, o cumprimento e a admissão das leis e regulamentos nacionais ou internacionais sobre os navios neles registrados. Atualmente, cerca de 40% da frota mundial está registrada em bandeiras de conveniência.

De maneira geral, as companhias de navegação transferem os registros de seus navios para países que ofereçam bandeiras de conveniência com o intuito de diminuir os custos operacionais das suas frotas. Hodiernamente, cerca de 30 Estados "alugam" suas bandeiras para armadores de qualquer nacionalidade, assegurando sigilo e a desnecessidade de requisitos e documentações legais.

Pode-se dizer que a oposição ao sistema das bandeiras de conveniência encontra sustentáculo em três aspectos basilares: segurança, trabalho e desequilíbrio econômico. Assim, possível citar como aspectos negativos os altos índices de acidentes marítimos envolvendo navios que arvoram Bandeiras de Conveniência, as condições precárias de trabalho da tripulação, a evasão de divisas dos países que concedem Registros Nacionais e a ocorrência do que se denomina tráfego de terceira bandeira. [27]

1.4Modos de aquisição de propriedade do navio

A aquisição da propriedade de navios efetua-se por intermédio de meios relativos ao Direito comum ou por meios privativos do Direito Marítimo. Assim, tal aquisição pode ser feita pela construção ou outro meio regular em direito permitido. [28] As formas de aquisição dissociam-se em duas variantes: formas originárias [29] ou derivadas. As formas originárias decorrem da inexistência de propriedade anterior. Nas formas derivados, pressupõe-se a ligação entre o adquirente e o indivíduo que tinha anteriormente a propriedade.

Nas modalidades derivadas, decorrentes de atos inter vivos, pode-se citar a compra e venda, a troca, a dação em pagamento, doação. Decorrentes da causa mortis, a sucessão legítima ou testamentária. Nas formas peculiares ao Direito Marítimo, enquadram-se a presa, confisco, salvamento e abandono.

Importante destacar a divergência relativa à classificação do usucapião ou prescrição aquisitiva entre os modos de aquisição. Uma parte da doutrina entende como sendo o usucapião modo originário, outra fração prefere incluí-lo nos comuns às demais coisas e finalmente outra parte conserva-no em destaque. [30]


2.Venda de Navio em Direito Material

2.1 Compra e venda de navio

2.1.1No ordenamento brasileiro

Como se trata de um bem patrimonial, o navio pode ser objeto de compra e venda. No ordenamento jurídico brasileiro, o art. 468 do Código Comercial permite expressamente a alienação de navio brasileiro destinado à navegação em alto mar, realizada por escritura pública (que deve ser registrada no Tribunal Marítimo e inscrita em uma Capitania dos Portos, Delegacia ou Agência), onde deverá figurar a Provisão de Registro, com todos os detalhes que nele houver.

A venda do navio pode ser voluntária ou judicial. No caso de venda voluntária, ou seja, na qual predomina a vontade do vendedor em proceder a venda, o contrato de compra e venda reger-se-á pelas normas contidas nos arts. 481 a 518 do Código Civil.

A prova de propriedade imprescindível para o registro do navio é feita mediante a exibição dos documentos a saber: nota fiscal; declaração do proprietário registrado em cartório; instrumento público de compra e venda (escritura pública ou recibo particular transcrito em cartório de títulos e documentos) ou recibo particular com reconhecimento em cartório das firmas dos contratantes onde deverá estar descrito o navio e registrados a compra, o valor, o vendedor e o comprador. Se a compra se efetuou em território alienígena, além do comprovante de regularização da importação perante o órgão competente, deverá ser exibido o instrumento de compra e venda, nos moldes da legislação do país onde a transação foi realizada.

2.1.2.No ordenamento português

No âmbito do Direito uniforme, importa destacar que a compra e venda de navios está excluída do âmbito de aplicação da Convenção de Viena de 1980. Em Portugal, o Estatuto Legal do navio está previsto no Decreto Lei n. 201/98 de 10 de Julho. Seu art. 10º, dispõe que, os contratos que impliquem a constituição, modificação, transmissão ou extinção de direitos reais sobre o navio devem ser celebrados por escrito, com reconhecimento presencial da assinatura dos outorgantes. Afirma ainda, em seu art. 11º, que as questões relacionadas com os direitos reais sobre os navios serão reguladas pela lei da nacionalidade que este tiver ao tempo da constituição, modificação, transmissão ou extinção do direito em causa. O MAR (Registo Internacional de Navios da Madeira) possui um regime especial: a venda de navios por declaração de venda (Bill of sale) .

2.2.A transferência da propriedade

2.2.1No ordenamento brasileiro

No ordenamento brasileiro, a translatividade dominial se aperfeiçoa apenas pela tradição [31], em se tratando de um bem móvel ou pelo registro, se estiver em causa um bem imóvel. Em se tratando de uma venda internacional, e sendo o navio um bem móvel sui generis, ou seja, sujeito a registro, surge a dúvida se a propriedade do mesmo se transfere com a tradição, com o registro do mesmo ou, ainda, com a mera celebração do contrato.

No caso de Brasil, assim como de Portugal, a lei do pavilhão do navio irá governar a aquisição, transferência e perda da propriedade do referido bem. Destarte, em se tratando, por exemplo, de navio que arvore bandeira brasileira, a transferência da propriedade se dará de acordo com o disposto com o Diploma Civil brasileiro, ou seja, com a tradição ou o respectivo registro.

2.2.2.No ordenamento português

Em Portugal, relativamente aos navios, também está determinado que a lei aplicável à transferência da propriedade será a do pavilhão do navio. Em sendo o Direito português o aplicável, o art. 408º do Código Civil dispõe em seu n. 1 que, "a constituição ou transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se por mero efeito do contrato, salvas as exceções previstas na lei". Assim, por força do disposto no n. 1 do art. 408º, a transferência da propriedade da coisa é efeito do contrato de alienação e não da entrega da coisa.

Existe o entendimento doutrinário [32] de que a regra de que a transferência da propriedade se produz por mero efeito da celebração do contrato de compra e vendaencontra-se fundada no n.1 do art. 408º. A possibilidade de divergir convencionalmente o efeito translativo, por meio de um pacto de reserva de propriedade, é admitida como exceção àquela regra, de acordo com o n. 1 do art. 409º. É admitida de modo tão vasto, que se pode afirmar que a regra, é afinal, a da disposição convencional do momento da transferência da propriedade. [33]

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHAVES, Marianna. Venda de navios: uma perspectiva luso-brasileira e internacional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2719, 11 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/17983. Acesso em: 29 mar. 2024.

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