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A cognição judicial no processo civil brasileiro

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14/12/2010 às 06:34

Resumo:


  • A cognição judicial é o método pelo qual o juiz forma juízo de valor sobre os pressupostos autorizadores do julgamento de mérito e sobre as pretensões apresentadas no processo, utilizando-se das provas e alegações produzidas pelas partes.

  • As condições da ação, como possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade, são requisitos imprescindíveis para a obtenção de uma decisão de mérito e, portanto, compõem o objeto da cognição.

  • O mérito da causa, entendido como a pretensão deduzida em juízo, é o objeto principal do processo e sobre ele incide a cognição judicial, podendo ser analisado sob diferentes perspectivas doutrinárias.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

3A cognição judicial nas tutelas antecipatórias e no artigo 285-A do Código de Processo Civil.

3.1Cognição na tutela antecipatória concedida com respaldo no fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação

A tutela antecipatória possui várias particularidades. Para os efeitos do presente estudo serão feitas algumas digressões superficiais acerca do tema, vez que o intuito é demonstrar as feições que a cognição judicial pode assumir nesta técnica de decisão judicial.

A tutela antecipatória visa antecipar ao interessado os efeitos que ele somente obteria com a decisão final de mérito. É uma importante técnica para combater os efeitos deletérios que a duração exacerbada do processo pode ocasionar às partes.

Os professores Nelson Nery JÚNIOR e Rosa Maria de Andrade NERY sintetizam a noção de tutela antecipatória no seguinte excerto:

Tutela antecipatória dos efeitos da sentença de mérito é providência que tem natureza jurídica mandamental, que se efetiva mediante execução latu sensu, com o objetivo de entregar ao autor, total ou parcialmente, a própria pretensão deduzida em juízo ou os seus efeitos. É tutela satisfativa no plano dos fatos, já que realiza o direito, dando ao requerente o bem da vida por ele pretendido com a ação de conhecimento. [82]

É sabido que o processo precisa de um tempo de maturação, ou tempo fisiológico, para desenvolver-se e alcançar a maturidade necessária para a prolação de uma decisão acertada. Nada obstante, há também o chamado tempo patológico. Este decorre da delonga prejudicial à tutela efetiva dos direitos deduzidos em juízo. A tutela antecipatória foi idealizada justamente para permitir a prestação de uma tutela jurisdicional efetiva, a despeito do fator tempo. Surgiu do embate entre a efetividade da tutela jurisdicional e a segurança jurídica que deve nortear as decisões jurídicas [83]. Isto porque concede ao interessado, dês que preenchidos os requisitos legais, a possibilidade de usufruir do bem da vida que ele almeja logo no início do processo (quando a tutela antecipatória é concedida inaldita altera pars, por exemplo).

O artigo 273 do Código de Processo Civil é expresso ao mencionar que a tutela antecipatória somente será cabível mediante requerimento do interessado. Não é cabível tutela antecipatória de ofício. Ao juiz é permitido, ainda, antecipar total ou parcialmente a pretensão formulada pela parte. Para fazê-lo, todavia, deverá o interessado apresentar prova inequívoca [84] para convencer o julgador da verossimilhança de sua alegação e, também, comprovar qualquer uma das seguintes situações: a) fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou b) abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (artigo 273, I, II, do Código de Processo Civil).

Ao fazer menção ao juízo de verossimilhança o legislador assumiu uma postura quanto à cognição do julgador. Admitiu, quando a tutela antecipatória for concedida inaldita altera pars, que a cognição judicial é superficial. Superficial porque calcada apenas nas alegações e provas feitas pela parte interessada. Não há contraditório imediato, mas sim postecipado. A análise do magistrado para aferir a verossimilhança dos argumentos apresentados pelo postulando é muito fugaz. Pressupõe que a parte aja com lisura e lealdade processual ao apresentar seus argumentos, porque serão eles que embasarão a decisão judicial. Qualquer tergiversação da situação fática poderá resultar numa decisão dissociada da realidade.

Neste momento decisório o julgador perquire se os apontamentos feitos pelo requerente parecem verdade. O que robustece esse juízo de valor é a necessidade de que o requerente tenha apresentado prova inequívoca das alegações que fez. Essa inequivocidade da prova, conquanto criticável pela doutrina [85], permite ao julgador vislumbrar a viabilidade, ou não, de concessão da tutela antecipatória.

Sob outro viés, a circunstância de ser a tutela antecipatória concedida total ou parcialmente não deve ser confundida com a classificação da cognição sob o plano horizontal (limitada ou plena). Isto é, o simples fato de a tutela antecipatória ter sido parcialmente deferida não significa que a cognição do juiz tenha sido limitada (ou parcial). Assim, numa determinada pretensão em que a cognição do juiz é plena, ou seja, ele analisou e sopesou todas as alegações feitas pelo requerente, é possível que os efeitos sejam parcial ou totalmente deferidos ou, inclusive, que nada seja antecipado.

A plenitude da cognição judicial convive normalmente com a possibilidade de concessão parcial da tutela antecipatória.

O mesmo se dá quando a cognição do julgador é parcial. É lícito ao julgador deferir no todo ou em parte a tutela antecipatória postulada, desde que respeitada a limitação horizontal que restringe o âmbito decisório do julgador (o que ele pode julgar, dentro de quais parâmetros).

Um dado importante que merece anotação é o que decorre do artigo 273, § 4º, do Código de Processo Civil. O juiz pode revogar ou modificar a tutela antecipatória a qualquer momento por meio de decisão fundamentada. À medida que o contraditório se instaura e novas provas são produzidas, é lícito ao julgador rever a decisão concessiva de antecipação dos efeitos da tutela, seja para revogá-la ou restringi-la. O aprofundamento da cognição no plano vertical legitima tal postura porque o processo e a tutela jurisdicional devem ter por escopo a verdade, ainda que formal para os autores tradicionais.

A propósito, a lição de Luiz Rodrigues WAMBIER, et alli:

Parece, todavia, que se deve entender que esta modificação só pode ter lugar se a situação de fato subjacente ao processo também se alterar e fizer com que, por exemplo, desapareçam os pressupostos da manutenção da medida concedida ou surjam os pressupostos que determinem a sua concessão.

Assim, e mais rigorosamente, não se poderá dizer que a decisão terá sido propriamente alterada, mas o que terá havido terá sido a prolação de outra decisão, para outra situação.

(...).

Alterados os fatos e o quadro probatório em que se terá embasado a decisão anteriormente proferida, outra deverá ser prolatada em seu lugar. [86]

O que não pode ocorrer, em nosso sentir, é a alteração da decisão concessiva ou denegatória da antecipação dos efeitos da sentença apenas porque o juiz refletiu mais sobre o caso e resolveu mudar de idéia. É necessária a alteração dos fatos e/ou do quadro probatório. A decisão deve estar calcada em dados objetivos e não apenas no subjetivismo do julgador.

É sabido que a tutela antecipatória pressupõe a existência de fumus boni iuris. Isto significa que deve haver uma aparência de direito que chancele, respalde, demonstre o direito alegado pelo requerente. Segundo Humberto Theodoro JÚNIOR: "Pelo fumus boni iuris, reclama-se do requerente a demonstração de aparência de um direito subjetivo envolvido no litígio." [87] O ônus de fazer prova deste direito incumbe ao autor, que deve instruir sua petição inicial como todos os elementos probatórios aptos a autorizar um juízo de verossimilhança hábil à análise do segundo requisito, a saber, o periculum in mora.

Quando a lei faz menção ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (perigo da demora), impõe-se ao julgador a necessidade de aferir se sua decisão, caso concedida apenas ao final do processo, será ineficaz à tutela do direito deduzido em juízo. O juiz deve perquirir se a não concessão da tutela antecipatória trará danos futuros irreparáveis ao postulante, vez que há situações que demandam uma tutela imediata. A propósito, novamente, esclarece Humberto Theodoro JÚNIOR:

(...) pelo periculum in mora entende-se o risco de um dano grave e de difícil reparação, suportado pelo mesmo direito, caso se tenha de aguardar o desfecho definitivo do processo. Disso decorre um perigo de inutilização do próprio processo, já que, afinal, o provimento em prol do direito subjetivo da parte, depois de consumada a lesão, cairia no vazio, tornando-se uma inutilidade prática. O remédio processual perseguido e deferido à parte não teria eficácia para cumprir sua função tutelar perante a situação jurídica material deduzida em juízo. [88]

O juízo de valor (cognição judicial) sobre estes requisitos terá por lastro, principalmente, as alegações do requerente. Disto decorre a importância que se deve atribuir à documentação que instrui a exordial, vez que qualquer omissão pode comprometer a análise judicial e redundar no indeferimento do pedido.

Há, outrossim, situações em que os requisitos são mais facilmente aferíveis pelo julgador. É o que ocorre, por exemplo, num pleito de tutela antecipatória em que se postule que um plano de saúde custeie uma cirurgia indispensável à imediata salvaguarda da vida de uma pessoa. Demonstrado que o plano recusa-se a fazê-lo e que a intervenção médica é indispensável ao resguardo da vida do paciente, restam evidentes o fumus boni iuris e o periculum in mora para o deferimento da tutela antecipatória. [89] Se ulteriormente restar demonstrado que o plano de saúde não tinha o dever de custear a realização daquela cirurgia, a discussão converter-se-á em perdas e danos.

O exemplo mencionado permite afirmar, pois, que a cognição judicial nas tutelas antecipatórias concedidas com respaldo na fumaça do direito e no perigo da demora (artigo 273, I, do Código de Processo Civil) é sumária e plena. Diz-se plena porque o julgador não tem amarras no plano horizontal, e reputa-se sumária porque é possível que o requerido demonstre, ao longo do iter processual, que o requerente não fazia jus ao bem da vida pretendido, a despeito de inicialmente concedido (o que só foi possível com o exaurimento da cognição).

3.2Cognição na tutela antecipatória concedida com respaldo no abuso do direito de defesa

O Código de Processo Civil também prevê a possibilidade de concessão de tutela antecipatória em caso de abuso do direito de defesa (artigo 273, II).

Não é tarefa fácil delimitar o que se deva entender por defesa abusiva. É sabido que a Constituição Federal assegura, com status de direito fundamental, a todos os litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

O professor Humberto Theodoro JÚNIOR procura esclarecer as situações em se verifica a ocorrência do abuso no direito de defesa:

Esse abuso do direito de defesa ocorre quando o réu apresenta resistência a pretensão do autor, totalmente infundada ou contra direito expresso e, ainda, quando emprega meio ilícitos ou escusos para forjar sua defesa. Esse abuso tanto pode ocorrer na contestação como em atos anteriores à propositura da ação, como notificação, interpelações, protestos ou troca de correspondências entre os litigantes. [90]

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No mesmo sentido escreve José Joaquim Calmon de PASSOS:

Talvez a melhor maneira de definir o abuso de direito seja dizer-se que ele ocorre quando se exercita, além do limite necessário, o direito que se tem, ou quando esse exercício objetiva não alcançar a tutela que a ele se associa e é devida a seu titular, mas sim outro fim, mesmo lícito que seja ou moralmente justificável. Todo desvio de finalidade é um abuso...A defesa carece de consistência quando são inconsistentes as alegações de fato ou alegações de direito, isto é, incapazes de tornar o fato controvertido (objeto de prova) ou representativa, em matéria de direito, daquele erro inescusável a que já nos referimos. [91]

A análise deste fundamento para a concessão da tutela antecipatória permite aferir que ela não poderá ser deferida inaldita altera pars. O julgador somente concederá tutela antecipatória sob este fundamento após ter analisado a defesa do requerido. Tal análise é antecedente lógico à consequente aferição acerca do eventual abuso no direito de defesa. Por isso, superado o juízo de possibilidade que norteia a cognição superficial.

Nestas circunstâncias, a cognição judicial, no plano vertical, é sumária. Trata-se de um juízo de verossimilhança. O juiz extrairá do abuso do direito de defesa do requerido a justificativa para antecipar ao autor os efeitos da tutela pretendida. Isso não desonera, todavia, o requerente de demonstrar os fundamentos fáticos e jurídicos de seu direito.

É importante frisar que o mero abuso no direito de defesa, conquanto criticável, não autoriza, por si só, a concessão da tutela antecipatória. É imprescindível que o autor faça do fumus boni iuris.

A propósito, o escólio de Luiz Rodrigues WAMBIER, et alli:

O juiz, pois, para conceder ou não o pedido formulado pelo autor no sentido de que sejam antecipados os efeitos da tutela pretendida, ou alguns deles, deve verificar se os requisitos previstos no art. 273 e em seus incisos, ou só num deles, estão presentes na situação.

Trata-se de uma inovação corajosa, em que o legislador assumiu o risco de permitir que o juiz profira decisão com base em prova não exauriente.

O conceito de prova não exauriente (fumus boni iuris ou prova quantum satis) é correlato ao de cognição sumária ou superficial. Nestas hipóteses, o juiz tem uma forte impressão de que o autor tem razão mas não certeza absoluta, como ocorre na cognição exauriente.

Exige-se, para a antecipação de tutela, uma veemente aparência de bom direito, somada, no caso do art. 273, I, ao periculum in mora, ou seja, ao perigo de que, não sendo concedida a medida, venha a decisão final a ser ineficaz, ou haja grande risco de isto ocorrer. No caso do art. 273, II, exige-se, ao lado do fumus boni iuris, que haja defesa protelatória ou abuso do direito de defesa. Trata-se de uma quase inexorabilidade diante da situação de uma real prova inequívoca da verossimilhança do direito. [92]

No plano horizontal, a cognição judicial pode ser parcial ou plena, a depender da natureza da pretensão deduzida em juízo, vez que é esta natureza que norteia a cognição neste plano e não a profundidade com que as matérias são analisadas.

3.3Cognição na tutela antecipatória concedida com fundamento na parte incontroversa do pedido

Outro enfoque que precisa ser analisado concerne à cognição quando a antecipação dos efeitos da tutela fundamenta-se na parte incontroversa do pedido.

O artigo 273, § 6.º, do Código de Processo Civil, dispõe que a tutela antecipada também poderá ser concedida quando um ou mais dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.

Diz-se que o pedido é incontroverso quando afirmado por uma parte e aceito pela outra. Quando o requerido, em sua defesa, argúi que o requerente tem direito ao que postula, mas não em sua totalidade, pode-se dizer que a parcela não impugnada do pedido tornou-se incontroversa. É possível, pois, que os efeitos desse reconhecimento parcial sejam antecipados.

Luiz Guilherme MARINONI sustenta que a incontrovérsia do direito transmuda-o num direito evidente. Assim, a tutela antecipatória da parte incontroversa do pedido seria, em verdade, a tutela antecipatória de um direito evidente. Reputa incontroverso "(...) o direito que se torna evidente no curso do processo, exigindo, em razão disso, imediata tutela. É nesse sentido que se diz que o parágrafo 6.º do artigo 273 é a base para a tutela dos direitos evidentes." [93]

A decisão que defere a tutela antecipatória com fulcro na parte incontroversa do pedido encerra um julgamento parcial da lide. Porque proferida no início poder-se-ia pensar ser a cognição judicial, nesta decisão, sumária. Tal posição, entretanto, não soa mais adequada.

A partir do momento em que as partes diretamente interessadas e cujas esferas de direito serão atingidas não dissentem quanto à existência do direito do autor, mas apenas quanto à sua amplitude, é inegável que a parcela incontroversa não será mais objeto de discussão.

As alegações circunscrever-se-ão àquilo que exceder a parte não aceita pelo requerido. Ao juiz não caberá fazer mais análise alguma acerca daquilo que é incontroverso. Sua cognição, quanto à parcela reconhecida, é exauriente e parcial.

Parcial porque o julgador somente poderá conceder a antecipação dos efeitos da parcela cujo reconhecimento foi feito pelo requerido. Não lhe é permitido, ao menos não com respaldo no artigo 273, § 6.º, do Código de Processo Civil, deferir a tutela antecipatória além do que foi aceito pelo demandado.

Exauriente porque não há que se falar sequer em juízo de probabilidade, mas sim num juízo de certeza. É certo que o juízo de certeza (verdade) real é uma utopia. Nada obstante, quando o próprio requerido assere que parte do pleito do autor é efetivamente devida, outro não pode ser o entendimento senão o de que a decisão do julgador é calcada num juízo de certeza quando da antecipação dos efeitos dessa parcela incontroversa.

A propósito, esclarece Leonardo José Carneiro da CUNHA:

Havendo incontrovérsia ou confissão, prescinde-se da produção de provas. E isso porque exsurge, em relação aos fatos confessados ou incontroversos, uma certeza do juiz. Ante a existência de certeza, já estará o magistrado habilitado a proferir pronunciamento definitivo acerca da lide posta ao seu crivo. E a certeza somente é obtida após o exercício de cognição exauriente que produza coisa julgada material. [94]

Rogéria Dotti DÓRIA perfilha a mesma linha de raciocínio:

Importante destacar que esta apreciação é feita com base em cognição exauriente pois não havendo mais nenhum elemento de prova a ser colhido, nem tampouco nenhuma fase do contraditório a ser superada, o órgão julgador analisa a questão em toda a sua profundidade, deixando de exarar um convencimento a respeito da probabilidade do direito, para proferir decisão a respeito da própria existência ou inexistência desse direito. [95]

3.4Cognição na tutela antecipatória concedida na sentença

A discussão a respeito da tutela antecipatória do pedido incontroverso da demanda traz ínsita outro questionamento: a concessão de antecipação dos efeitos da sentença na própria sentença, como capítulo da mesma.

Antes, porém, de imiscuir-se por esta seara é preciso perscrutar o revigorado conceito de sentença. [96]

A sentença sempre foi o ato processual mais importante. Todos os demais atos processuais são praticados para possibilitar a elaboração daquela. Esta a razão pela qual Luiz Fernando BELLINETTI intitulou-a de ato jurisdicional magno. [97]

Enrico Tullio LIEBMAN, por sua vez, apresentou a seguinte definição para sentença:

La sentenza.

- Con la sentenza culmina e si conclude il processo di cognizione: è l'atto del giudizio e contiene l'enunciazione formale e solenne della regola giuridica concreta destinata a disciplinare il caso sottoposto al giudice dalle parti. Essa è pertanto l'atto giurisdizionale per eccellenza, l'atto a cui tende e con cui si compie il procedimento, l'atto alla cui pronuncia tutti gli atti del processo sono preordenati. Con la pronuncia della sentenza, lo Stato adimpie nella sua forma più importante e più delicata (il processo di cognizione) la funzione giurisdizionale, rendendo giustizia tra i consociati e attuando nei loro confronti la tutela giuridica. [98] (destaques nossos)

Inspirada nessa ideologia do professor peninsular, o legislador de 1973 definiu a sentença sob o enfoque formal-processual: sentença é o ato que põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa.

Várias críticas foram apresentadas e novas teorias surgiram. Dentre estas, merece destaque o posicionamento da professora Teresa Arruda Alvim PINTO, que defende que a sentença deveria ser definida pelo seu conteúdo. Propõe que:

Como se disse há pouco, há que dar voltas à tautologia, a que dá azo a própria lei e, certamente, o único elemento por meio do qual se podem identificar as sentenças é seu conteúdo. (...). Essa é a impressão que se pode ter à primeira vista, se não se leva em conta uma circunstância: o legislador especificou quais são os conteúdos que fazem com que se possa identificar um pronunciamento judicial como sentença. (...). Cremos, portanto, ser esta a nota marcante das sentenças, ou seja, é o seu conteúdo, preestabelecido por lei de forma expressa e taxativa, que as distingue dos demais pronunciamentos do juiz. [99]

Esta tese foi agasalhada pela Lei n.º 11.232/2005 que alterou a definição de sentença para o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos artigos 267 e 269 do Código de Processo Civil.

A sentença, pois, é definida por seu conteúdo. Não importaria mais, a princípio, sua localização topográfica. [100]

Feitas tais considerações e voltando os olhos para a tutela antecipatória concedida na sentença, pode-se afirmar que ela será fruto de cognição exauriente e plena (ou parcial, a depender do conflito de interesses deduzido em juízo).

A se considerar a possibilidade de prolação de sentenças no curso do processo, pode-se asseverar que a cognição poderá ser tanto sumária quanto exauriente, a depender do iter instrutório já percorrido.

3.5A cognição no artigo 285-A do Código de Processo Civil.

O artigo 285-A do Código de Processo Civil é uma das mais recentes modificações do Código de Processo Civil. Trata-se de uma técnica de aceleração processual que visa evitar o desenrolar desnecessário de uma demanda cuja decisão já foi proferida em reiteradas causas semelhantes julgadas pelo juízo. Nos dizeres de Eduardo CAMBI:

O artigo 285-A do CPC se insere na busca da criação de técnicas processuais voltadas a dar maior celeridade ao processo, concretizando o disposto no artigo 5º, inciso LXXVIII, da CF, introduzido pela Emenda Constitucional n. 45, de 2004, pelo que prevê o direito fundamental à razoável duração do processo, devendo o legislador infra-constitucional assegurar meios que garantam a celeridade da tramitação processual. [101]

Assim, quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo há houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada. [102]

O legislador criou uma técnica de aceleração processual. Ao invés de permitir o amplo desenvolvimento da pretensão deduzida em juízo o julgador, prima facie, resolve o conflito de interesses contrapostos, dispensando, inclusive, a citação do requerido.

Por legitimar esse julgamento antecipadíssimo do mérito questionou-se a constitucionalidade do dispositivo sob o fundamento de ofensa ao contraditório e à ampla defesa. A despeito dos argumentos pela inconstitucionalidade, soa mais razoável a tese do professor Luiz Guilherme MARINONI que, além de basear-se num critério pragmático, preocupa-se com a coerência do sistema jurídico:

A multiplicação de ações repetitivas desacredita o Poder Judiciário, expondo a racionalidade do sistema judicial. Portanto, é lamentável que se chegue a pensar na inconstitucionalidade do art. 285-A. Somente muita desatenção pode permitir imaginar que esta norma fere o direito de defesa. Por isto mesmo, parece que a afirmação de inconstitucionalidade do art. 285-A tem mais a ver com a intenção de garantir alguma reserva de mercado, já que é sabidamente interessante, do ponto de vista financeiro, reproduzir, através de máquinas, petições e recursos absolutamente iguais. [103]

Superada a fase da inconstitucionalidade, tem-se que a aplicação da regra do artigo 285-A, do Código de Processo Civil, pressupõe: a) matéria controvertida unicamente de direito; b) sentença anterior de total improcedência proferida no juízo; c) casos idênticos.

Quanto ao primeiro requisito faz-se, inicialmente, uma ressalva. A matéria somente torna-se controvertida no processo civil após a citação do requerido e eventual contestação da mesma em defesa. Caso contrário, seria uma impropriedade falar-se em matéria controvertida. Ter-se-ia, na verdade, quando se trata da regra do artigo 285-A, do Código de Processo Civil, um ponto nos dizeres carnelutianos. Haveria matéria apenas de direito quando "(...) não pesa qualquer dúvida ‘quanto à sua existência, seus contornos e seus limites’, sendo apenas relevante ‘saber qual o direito aplicável sobre aqueles fatos que não geram dúvidas, que não geram controvérsia entre as partes e perante o juiz." [104]

O segundo requisito limita a aplicação do artigo em exame apenas aos casos de sentença de improcedência. A expressão "no juízo" é a que traz algumas complicações. Apesar de sustentar-se que esta expressão deve ser interpretada de forma ampla, entendendo-se por juízo toda a Comarca ou Seção Judiciária [105], o que possibilitaria a um juiz utilizar-se de sentença proferida por outro julgador da mesma Comarca para julgar um caso com que se deparou e que se seja idêntico àquele decidido por outro magistrado, tem predominado na doutrina que a expressão juízo compreende apenas a Vara. Fernando da Fonseca GAJARDONI é taxativo ao sustentar que "(...) exige-se para o julgamento antecipadíssimo da lide que as decisões paradigmas tenham sido proferidas no mesmo juízo, isto é, na mesma Vara onde tramite a ação." [106]

Por fim, a expressão casos idênticos não exige a coincidência entre as partes, o pedido e a causa de pedir. Se assim o fosse o legislador teria dito litispendência, em razão da tríplice identidade, ou então coisa julgada. Nos dizeres de Eduardo CAMBI: "Para haver casos idênticos basta que os fundamentos fáticos e jurídicos integrantes das causas de pedir e do pedido sejam os mesmos, porque tais argumentos é que estarão presentes na motivação e no dispositivo da sentença que será copiada pelo magistrado." [107]

Presentes todos esses requisitos o juiz pode, sem sequer determinar a citação do requerido, reproduzir sentença proferida em caso anterior e julgar improcedente a pretensão deduzida em juízo.

Após esse breve esboço acerca do artigo 285-A, do Código de Processo Civil, pode-se dizer que a cognição que se observa nesta técnica de julgamento é exauriente no plano vertical.

Isto se dá porque o julgador, ao proferir sua sentença, abrange todas as pretensões deduzidas em juízo. O que contribui para a cognição possuir tal característica é a natureza das matérias discutidas. O próprio legislador limitou a utilização da técnica estudada às hipóteses de matérias exclusivamente de direito. Não há, pois, qualquer necessidade de debruçar-se sobre aspectos fáticos. O âmbito de conhecimento judicial circunscreve-se à verificação de qual é o direito aplicável à situação apresentada.

Já no plano horizontal a cognição é parcial, isto porque ao julgador somente é admissível o conhecimento de matérias exclusivamente de direito. Qualquer discussão que transcenda para o plano fático está fora do campo cognitivo do julgador e obsta, inclusive, a aplicação desta técnica de aceleração processual. Se houver a necessidade de imiscuir-se em aspectos fáticos o juiz não poderá aplicar esta modalidade de julgamento antecipadíssimo do mérito e deverá, pois, determinar a citação do requerido para o regular trâmite processual.

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Sobre o autor
Murilo Carrara Guedes

Escrivão Criminal, especialista em Direito Processual Civil pela ABDCONST - Associação Brasileira de Direito Constitucional

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUEDES, Murilo Carrara. A cognição judicial no processo civil brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 15, n. 2722, 14 dez. 2010. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18025. Acesso em: 22 dez. 2024.

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