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O papel da mediação e da psicanálise para o Direito de Família

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Utiliza-se da interdisciplinaridade do direito e da psicanálise, como forma de resolução dos conflitos familiares, por meio de consultas jurídicas extrajudiciais e preventivas

RESUMO

Este artigo tem o objetivo de fazer uma análise da importância da mediação e da psicanálise para o direito de família brasileiro. Sabe-se que a tendência natural das pessoas é de tentar resolver o problema por si mesmo, sem o auxílio de terceiros. Contudo, por vezes, tal estratégia acaba por tornar o conflito ainda mais intenso e afastar a solução que não pôde ser enxergada pelas partes dado o seu envolvimento emocional. Não se pretende aqui limitar o direito constitucional de acesso ao Judiciário, mesmo porque a mediação é uma das espécies de acesso à justiça. Quer se mostrar que através da mediação também se pode clamar pelo justo direito. Para tanto, utiliza-se da interdisciplinaridade do direito e da psicanálise, como forma de resolução dos conflitos familiares, por meio de consultas jurídicas extrajudiciais e preventivas. A pacificação dos conflitos por um método dialógico de compreensão e cooperação entre as partes é a proposta da mediação.

SUMÁRIO:1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS. 2 – A PSICANÁLISE E O DIREITO DE FAMÍLIA. 3 – A MEDIAÇÃO. 4 – PRINCÍPIOS QUE FUNDAMENTAM A MEDIAÇÃO. 5 - A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO NA DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL. 6 - A DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL E A GUARDA DOS FILHOS. 7 - CONSIDERAÇOES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS:

A relação entre Direito e Psicanálise tem como principal aspecto a busca incessante pela efetivação da Dignidade da Pessoa Humana. A ciência jurídica sempre procurou agregar conhecimento e embasamento filosófico, histórico, sociológico, político etc., na tentativa de compreender seus próprios institutos.

É na interseção com a Psicologia e a Psicanálise que o Direito busca avançar ainda mais no desenvolvimento de nossa sociedade cada vez mais plural, dinâmica e que necessita incessantemente de respeito às diferenças. O surgimento da Psicanálise e o estudo do inconsciente tiveram particular influência nas ciências sociais e humanas e o Direito não poderia ficar ileso.

Rodrigo da Cunha Pereira afirma: O inconsciente produz efeitos e é exatamente a partir desses efeitos que ele é reconhecido - lapso, ato falho... Efeitos que, embora inconscientes, repercutem no Direito (PEREIRA, 2004).

Sabe-se que o Direito de Família é essencialmente permeado pela afetividade humana, e a técnica de escuta e o diálogo são extremamente apropriadas para a resolução de conflitos, devendo ser valorizados pelas partes, advogados, juízes, promotores, bem como pelos aplicadores do direito em geral.


2 – A PSICANÁLISE E O DIREITO DE FAMÍLIA

Direito é a norma de conduta imposta por autoridade coatora. Isto porque a relação entre os indivíduos de uma comunidade deve se basear no princípio da justiça.

Norberto Bobbio define o direito como sendo:

o conjunto de normas de conduta e de organização, constituindo uma unidade e tendo por conteúdo a regulamentação das relações fundamentais para a convivência e sobrevivência do grupo social, tais como as relações familiares, relações econômicas, as relações superiores de poder, e ainda a regulamentação dos modos e formas através das quais o grupo social reage à violação das normas. (BOBBIO, 1997, p. 349)

Já a psicanálise é método de investigação teórica da psicologia, desenvolvido por Sigmund Freud, médico neurologista, que se propõe à compreensão e análise do homem, compreendido enquanto sujeito do inconsciente. Ou seja, ciência que estuda o comportamento e os processos mentais dos indivíduos.

Afirmam os doutrinadores que a Psicanálise tem por objeto a personalidade normal e a personalidade anormal, sendo na realidade o estudo da alma humana.

A teoria psicanalítica criou uma revolução tanto na concepção como no tratamento dos problemas afetivos. Há um grande interesse pela motivação inconsciente, pela personalidade, pelo comportamento anormal e pelo desenvolvimento infantil.

Na verdade, direito e psicanálise estão presentes em todos os momentos da vida do homem. O Direito atua diante do fato gerado pelos atos do homem e sua repercussão na sociedade. A Psicanálise procura desvendar os impulsos que antecedem aos atos para chegar à razão que deu origem aos mesmos.

Para Groeninga, "cabe aos psicanalistas sensibilizar os que lidam com o Direito para as questões de família, permitindo uma compreensão mais ampla dos conflitos e do sofrimento". (GROENINGA, 2004, p.144)

Freqüentemente, o indivíduo traz uma demanda jurídica com pedidos objetivos, tais como: o divórcio consensual ou litigioso, a pensão alimentícia, a guarda dos filhos, as visitas, a divisão de bens e cabe ao judiciário encontrar uma saída para regulamentar a convivência familiar. A psicanálise, neste contexto, proporciona um tipo de escuta que leva o sujeito a refletir sobre suas queixas, e a se responsabilizar por elas, deixando de remeter ao outro muitas vezes aquilo que é seu.

O direito não enxerga o sujeito da mesma forma que a psicanálise. Ambos lidam de forma diferente com o mal-estar. De acordo com Souza, o sujeito jurídico é visto como aquele provido de razão, detentor do livre arbítrio, aquele que tem consciência de seus atos e pode controlar suas vontades, capaz de discernir o que é proibido do que não é, assumindo as punições que lhe são cabíveis, servindo para os outros como modelo, já que nem todos os desejos são permitidos. (SOUZA, 2004)

Certo é que para se viver em sociedade os homens têm que se submeter às leis, que geram restrições, porém algo sobra, ou escapa, o que causa um mal-estar. As leis foram impostas em nossa sociedade com a finalidade de estabelecer normas para uma boa convivência com as pessoas que nos rodeiam. Entretanto na grande maioria das vezes acabamos por nos tornar dependentes e submissos a ela. Se existe a lei é porque existe o desejo.

Encontros e desencontros fazem parte da vida do sujeito. Em algum momento ele encontra aquele outro idealizado, que o completa, o faz falta e passa a dar sentido a sua vida, mas muitas vezes esta mesma realidade pode levar o sujeito a um sofrimento de perda diante de uma situação expressa em uma separação.

A mediação surge como uma nova forma de ajudar a resolver as questões judiciais familiares, divórcio, guarda de filhos, partilha de bens. É o mediador que possibilita que o sujeito perceba sua subjetividade, promovendo a sua reconstrução frente à vida, para que ele veja saídas nele próprio e não no "outro", ou seja, o sujeito vai buscar soluções para seus conflitos de uma forma singular.

Outro aspecto importante é que a dissolução da sociedade conjugal também pode gerar obstáculos à constituição da criança. Isso quando esta é objeto de disputa dos pais, que se esquecem ou não assumem o papel definitivo de pai e mãe, e se preocupam apenas com seus ressentimentos. Nesses casos, os casais são convidados a trabalhar e buscar alternativas para que consigam conduzir a vida após o divórcio; e este processo é conduzido pelo mediador, que prepara o caminho e têm como objetivo resgatar o respeito e propiciar um espaço onde o diálogo possa existir.

Sabe-se que tanto o direito quanto a psicanálise privilegiam o discurso e é através da mediação que o profissional pode utilizar-se da Psicanálise para chegar até o sujeito. A mediação perpassa pelo discurso, que solicita uma intervenção ao nível do real dos grupos, dos parceiros e não ao nível de um "problema social". O mediador sabe que existe o conflito, mas não o enfatiza como uma guerra e sim como melhor resolvê-lo. Esse é o desafio, conjugar a psicanálise o direto. Aqueles que estão implicados nesta abordagem encontram-se numa posição de produzir saídas aos impasses apresentados, ou seja, "conjugar norma jurídica e subjetividade para o Direito e inconsciente e responsabilidade do sujeito para a Psicanálise". (BARROS, 1997, p. 832).

Assim, a Psicanálise, na área do contexto Judiciário, pode ser utilizada amplamente, promovendo discussões com a possibilidade de uma intervenção na estrutura familiar e social do sujeito.


3 - MEDIAÇÃO

O termo mediação se origina do latim mediare, que significa intervir, mediar. Consiste em um meio não-jurisdicional de solução de litígios. Lília Maia de Morais Sales conceitua-a como:

[...] procedimento consensual de solução de conflitos por meio do qual uma

terceira pessoal imparcial – escolhida ou aceita pelas partes – age no sentido de encorajar e facilitar a resolução de uma divergência. As pessoas envolvidas nesse conflito são as responsáveis pela decisão que melhor satisfaça. A mediação representa um mecanismo de solução de conflitos utilizado pelas próprias partes que, motivadas pelo diálogo, encontram uma alternativa ponderada, eficaz e satisfatória. O mediador é a pessoa que auxilia na construção desse diálogo. (SALES, 2007, p. 23)

A Mediação é uma técnica de solução consensual de conflitos que visa à facilitação do diálogo entre as partes, para que melhor administrem seus problemas, e consigam, por si só, alcançar uma solução.

Maria Nazareth Serpa define mediação: "processo informal, voluntário, onde um terceiro interventor, neutro, assiste os disputantes na resolução de suas questões, pautado na autodeterminação das partes" (SERPA, 1999, p.90).

O papel desse interventor seria de ajudar as partes em conflito, utilizando-se da comunicação e da neutralização de emoções, para encontrar opções que possibilitem o acordo. Tal técnica perpassa inicialmente pela escuta atenta, qualificada, compreensiva dos fatos e das condutas narradas. Mediar é se comportar neutro diante das partes envolvidas, mas com vigor suficiente para transmitir aos litigantes o quanto importante são as sessões direcionadas à solução do conflito.

Ainda na perspectiva conceitual, Roberto Portugal Bacellar define mediação como uma:

"técnica lato senso que se destina a aproximar pessoas interessadas na resolução de um conflito a induzi-las a encontrar, por meio de uma conversa, soluções criativas, com ganhos mútuos e que preservem o relacionamento entre elas" (BACELLAR, 2003, p.174).

Outra abrangente definição é a de Tânia Almeida (apud BREITMAN E PORTO, 2001, p.45):

A mediação é um processo orientado a conferir às pessoas nele envolvidas a autoria de suas próprias decisões, convidando-as a reflexão e ampliando as alternativas. É um processo não adversarial dirigido à desconstrução de impasses que imobilizam a negociação, transformando um contexto de confronto em contexto colaborativo. É um processo confidencial e voluntário no qual um terceiro imparcial facilita a negociação entre duas ou mais partes onde um acordo mutuamente aceitável pode ser um dos desfechos possíveis.

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Importa salientar que para a devida aplicação desse método alternativo de solução de conflitos é necessária uma mudança de mentalidade de muitos aplicadores do direito que ainda consideram a mediação como mera ferramenta sem força executiva ou coercitiva, trata-se de um grande equívoco.

Entende-se, perfeitamente, que não se pode exigir uma modificação intensa de comportamento jurídico-intelectual quando o que se está em questão é a cultura de se levar todo e qualquer desentendimento ao crivo do Estado-Juiz.

Não se quer afastar as partes da Jurisdição, apenas sugere-se o deslocamento da solução do conflito do Poder Judiciário para as próprias pessoas envolvidas no litígio, tendo como fundamentos a cultura da pacificação, a democracia constitucional-deliberativa e os modernos postulados da intervenção mínima do Estado e da máxima cooperação entre as partes.

O mediador não sugere solução, não induz e nem tão-pouco decide. A sua função é propiciar uma maior e melhor escuta das partes, para que a compreensão seja introduzida na seqüência dos fatos narrados, levando os litigantes ao exercício da tolerância recíproca.

O avanço da utilização de mecanismos extrajudiciais de prevenção e solução de controvérsias no âmbito brasileiro é notório. Embora semelhantes, por objetivarem a autocomposição, a conciliação, a negociação e a mediação, são institutos jurídicos que se diferenciam.

Há divergências entre os doutrinadores, no que diz respeito à classificação da mediação, uma vez que uns a classificam como um meio de autocomposição, enquanto outros, como um meio de heterocomposição. Contudo, entende-se que a mediação é um meio autocompositivo, uma vez que as partes, por si só, solucionam seus conflitos apesar da presença de um terceiro.

Na conciliação o que se busca é o fim da controvérsia através de concessões mútuas, ou seja, caso não ocorra um acordo ela considera-se fracassada. Neste ponto diferencia-se da mediação, pois nesta o ajuste pode ser uma conseqüência natural do restabelecimento do diálogo entre as partes, e será bem sucedida se despertar a capacidade dos envolvidos de se entenderem sozinhos. Já no que tange ao conciliador, este atua de forma a sugerir ou induzir comportamentos ou decisões, buscando para as partes uma melhor solução, emitindo opinião sobre o caso. O mediador, diferentemente, visa facilitar a comunicação entre as partes, para que elas próprias administrem seus problemas, construindo saídas para desatar o "nó" conflitivo.

Quanto ao vínculo, a conciliação é uma atividade inerente ao Poder Judiciário, sendo realizada por juiz togado, por juiz leigo ou por alguém que exerça a função específica de conciliador. Por outro lado, a mediação trata-se de atividade privada, livre de qualquer vínculo, não fazendo parte da estrutura de qualquer dos Poderes Públicos. Até a mediação paraprocessual mantém a característica privada, apenas estabelecendo que o mediador se registre no tribunal para que possa ser indicado a atuar nos conflitos levados à Justiça.

Luiz Antunes Caetano define conciliação como:

[...] meio ou modo de acordo do conflito entre partes adversas, desavindas em seus interesses ou direitos, pela atuação de um terceiro. A conciliação também é um dos modos alternativos de solução extrajudicial de conflitos.

Em casas específicas, por força de Lei, está sendo aplicada pelos órgão do Poder Judiciário. (CAETANO, 2002, p. 17)

Eligio brilhantemente explicita: "a conciliação desmancha a lide, a decompõe nos seus conteúdos conflituosos, avizinhando os conflitantes que, portanto, perdem a sua identidade construída antagonicamente." (RESTA, 2004, p. 119).

A negociação se distingue das demais, pois não há a participação de um terceiro, seja imparcial ou não, neste caso a resolução do problema surge de uma autocomposição pura e simples. Pode haver ou não a participação de representantes, entendidos aqui por advogados.

José Maria Rossani Garcez afirma que:

a mediação terá lugar quando, devido à natureza do impasse, quer seja por suas características ou pelo nível de envolvimento emocional das partes, fica bloqueada a negociação, que assim, na prática, permanece inibida ou impedida de se realizar. (GARCEZ, 2003, p. 35)

Finalmente, a arbitragem, regulada pela Lei 9.307/96, considerada como um mecanismo de heterocomposição, é o método alternativo de pacificação social pelo qual as partes submetem a solução de seus litígios a um terceiro, que decidirá de acordo com a lei ou com a equidade. Ou seja, na arbitragem ocorre a intervenção de um terceiro, o árbitro, com poderes decisórios para julgar o conflito e impor a sua decisão, que deverá ser acatada pelas partes. O laudo arbitral tem força de titulo executivo judicial, sendo irrecorrível, passível de apreciação pelo Judiciário apenas nos casos de nulidade previsto na lei de arbitragem.

Todas essas formas consensuais de solução de conflitos possuem diferenças entre si e cada qual possui características que as tornam mais adequadas a este ou aquele caso concreto.

Entende-se que a partir da mediação, as partes sintam uma satisfação bem mais eficaz em relação à solução do conflito, em comparação a sentenças impostas pelo juiz e fundamentadas pelo direito. Isto porque o acordo proveniente da mediação é construído pelas partes e as decisões judiciais são vazias de compreensão psicofamiliar. Dessa forma, a superficialidade das soluções judiciais muitas vezes acaba por perpetuar o conflito. Em geral, as partes logo retornam aos fóruns e às salas de audiência, ou aos tribunais com inúteis recursos.

Como o acordo da mediação é fruto de consenso, há maior segurança e efetividade em relação ao seu cumprimento, vez que as partes estão convencidas que foi a melhor solução.

Neste caso, ambas as partes perdem, mas apenas perdem o mínimo necessário para a realização do acordo, fazendo com que ao final todos ganhem. Apesar de parecer contraditório, é necessário que ambos percam, para que ambos possam igualmente ganhar.

Como se sabe a comunicação é a base nuclear da Mediação. Aguida Arruda Barbosa nos informa:

(...)na França, toda a construção teórica da mediação vem fundamentada em Habermas, filósofo contemporâneo, cuja contribuição filosófica é que tudo se constrói pela comunicação, pela necessidade do diálogo, pela humanidade; enfim, pela ética da discussão. (BARBOSA, 2005, p.63).

O discurso (racionalidade comunicativa) e a participação são os elementos que tornam possível a adoção de mecanismos de pacificação dos conflitos, cujo foco principal encontra-se na vontade das partes. Analisando sob este prisma, a mediação nitidamente seria mais participativa e dialógica do que a jurisdição. A sentença judicial, apesar de solucionar a lide, muitas vezes não resolve a problemática subjacente de pacificação social, surgindo uma parte vencedora e outra vencida, ambas certas de serem detentoras de um direito subjetivo.

Em regra, a mediação é um procedimento extrajudicial. Contudo, nada impede que as partes, já tendo iniciado a etapa jurisdicional, resolvam retroceder em suas posições e tentem mais uma vez a via conciliatória.

Não custa enfatizar que o mais interessante seria que as partes a procurassem à solução consensual, antes de ingressarem com a demanda judicial, eis que este comportamento poderia evitar a movimentação da máquina judiciária de modo desnecessário.

Considera-se ainda, que as partes deveriam ter a obrigação de demonstrar ao Juízo que tentaram, de alguma forma, buscar uma solução consensual para o conflito. Não obstante, sabermos que não há necessidade de uma instância prévia formal extrajudicial. Seria apenas uma forma de economia processual, uma forma de racionalizar a prestação jurisdicional e evitar a procura desnecessária pelo Poder Judiciário, promovendo-se, ademais, uma ampliação de métodos mais democráticos, participativos e até mesmo mais efetivos de solução dos conflitos.

É preciso dizer que a mediação está largamente difundida no Brasil e já é exercida inclusive dentro dos órgãos do Poder Judiciário, na medida em que se funda na livre manifestação de vontade das partes e na escolha por um instrumento mais profundo de solução do conflito.

A mediação incidental ou judicial já pode ser feita hoje em nosso ordenamento, em duas hipóteses: ou o juiz, ele próprio, conduz o processo, funcionando como um conciliador ou designando um auxiliar para tal finalidade (artigos 331 e 447 do CPC); ou as partes solicitam ao juiz a suspensão do processo, pelo prazo máximo de seis meses, para a efetivação das tratativas de conciliação fora do juízo (artigo 265, inciso II, c/c § 3º, também do CPC).

Porém, como já explicitado, comunga-se com a posição de que a mediação deveria ser tentada antes da procura jurisdicional.

Três são os elementos básicos para se ter um processo de mediação: a existência de partes em conflito, uma clara contraposição de interesses e um terceiro neutro capacitado a facilitar a busca pelo acordo.

Nuria Belloso Martín explicita que a mediação se caracteriza pelos seguintes elementos:

a) voluntariedade; b) eleição do mediador; c) aspecto privado; d) cooperação entre as partes; e) conhecimentos específicos (habilidade) do mediador; f) reuniões programadas pelas partes; g) informalidade; h) acordo mútuo; i) ausência de sentimento de vitória ou derrota. (MARTÍN, 2005).

A credibilidade da mediação, como processo eficaz para solução de controvérsias, está diretamente relacionada com o desempenho do mediador, que deverá pautar seu trabalho na qualidade técnica, seguindo os princípios éticos que regem sua atuação: a imparcialidade, a credibilidade, o sigilo ou a confidencialidade, a competência, a diligência e a flexibilidade.

Com relação às partes, podem ser elas pessoas físicas ou jurídicas ou entes despersonalizados, desde que se possa identificar seu representante ou gestor. Podem ser ainda menores, desde que devidamente assistidos ou representados por seus pais.

Além disso, é preciso deixar claro que a mediação não se confunde com um processo terapêutico ou de acompanhamento psicológico ou psiquiátrico, embora seja extremamente desejável que o profissional da mediação tenha conhecimentos em psicologia e, sobretudo, prática em lidar com as relações humanas e sociais.

O mediador deve ser neutro, eqüidistante das pessoas envolvidas no litígio e que goze de boa credibilidade. Deve ser alguém apto a interagir com elas, mostrar-se confiável e disposto a auxiliar concretamente no processo de solução daquele conflito.

Observa-se que a profissão de mediador está para além da sua formação de base (Direito ou Psicologia, por ex.), já que o principal pré-requisito é a competência técnica para auxiliar as partes a restabelecer a comunicação, auxiliando-as a desenvolver opções criativas e exeqüíveis com vistas a resolver seus problemas. Na mediação, a solução do conflito é criada e encontrada pelas partes, e não pelo mediador, sendo assim, qualquer cidadão devidamente capacitado será apto para desenvolver este trabalho, independente da natureza da sua formação acadêmica. Contudo, o advogado é um instrumento importante na orientação prévia ou na condução de uma Mediação, por todos os aspectos legais que devem ser observados.

Existem entidades como o Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (CONIMA), voltadas ao desenvolvimento dos meios alternativos de solução de conflitos, que dispõe de cursos de capacitação, bem como de Regulamento Modelo e Código de Ética, destinados a qualificar os profissionais e a preservar a ética e credibilidade da Mediação.

Por fim, ao final das sessões de Mediação, a solução indicada pelas partes, será reduzida a termo, intitulada "Termo de Mediação" ou "Termo de Acordo", que não precisa, necessariamente, ser homologado judicialmente.

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Sobre a autora
Cláudia Mara de Almeida Rabelo Viegas

Coordenadora do Curso de Direito da Faculdade Del Rey – Uniesp - Professora de Direito da PUC MINAS e Faculdades Del Rey – UNIESP. Professora-tutora do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Servidora Pública Federal do TRT MG – Assistente do Desembargador Corregedor. Doutora e Mestre em Direito Privado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Especialista em Educação à distância pela PUC Minas. Especialista em Direito Público – Ciências Criminais pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus. Bacharel em Administração de Empresas e Direito pela Universidade FUMEC.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIEGAS, Cláudia Mara Almeida Rabelo. O papel da mediação e da psicanálise para o Direito de Família. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2824, 26 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18747. Acesso em: 23 abr. 2024.

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