CONCLUSÃO
Tal qual se verificou nas colônias estabelecidas na América, o sistema escravagista brasileiro assentou-se na contradição que enxerga o escravo como coisa (ou propriedade) e ser humano, concomitantemente - representando capital e trabalho ao mesmo tempo. O acúmulo dessa propriedade conferia "status" não só econômico como político e social, aos senhores.
O trabalho escravo serviu como sustentáculo econômico, social e político da elite dominante representada pelos grandes proprietários de terras e, por isso, demorou a ser abolido no Brasil, apesar da incompatibilidade desse tipo de trabalho com o capitalismo moderno e com a burguesia em ascensão.
No longo processo iniciado pelas primeiras tentativas de extinção do tráfico de negros da África, pressionadas pela Inglaterra, rumo à abolição, predominaram os interesses patrimoniais dessa elite herdada de Portugal e personificada nos conservadores, em detrimento do direito à igualdade e à liberdade dos servos. Esses interesses suplantaram até os ideais iluministas e o discurso liberal, optando-se por conciliar situações antagônicas, representadas pelo liberalismo abraçado desde a Independência, concomitante à manutenção do regime escravista.
O processo de abolição transcorreu, conforme a tradição brasileira, de modo lento e gradual, operando-se pela via legislativa-progressiva, sem rupturas revolucionárias, passando por etapas demarcadas, primeiramente, pela extinção da importação de escravos (Lei Euzébio de Queiroz), seguindo-se a Lei do Ventre do Livre e a Lei dos Sexagenários, até a Lei Áurea, demorando-se quase sessenta anos entre a primeira tentativa de abolição do tráfico e a emancipação total dos escravos.
Apesar de constituir a abolição da escravatura um item do programa do partido liberal, os maiores passos rumo à emancipação dos escravos foram dados pela Coroa e no governo dos conservadores, que também souberam perceber, premidos pelas vozes abolicionistas oriundas dos liberais e mesmo de conservadores contrários ao regime servil, a insustentabilidade da situação gerada pela escravidão.
O trabalho escravo deixou marcas indeléveis na formação social, cultural e política do Brasil, e, especialmente, nas relações de trabalho, observando-se que uma das atividades antes reservadas aos cativos - o trabalho doméstico - sobejou para o Brasil do trabalho livre com forte carga de discriminação decorrente da natureza da atividade e, também, contra as próprias pessoas que a exercem - negros e mulheres, na sua maioria.
O pensamento constitucional brasileiro detectado à época - impregnado de cautela, aversão a mudanças ríspidas, longos debates de ideias e implementação das inovações mediante lei, bem como a preocupação com a situação econômica do tomador dos serviços em detrimento do direito à igualdade do trabalhador - projetou-se e reflete no Brasil pós 1888. Constata-se isso pela demora no reconhecimento legislativo da categoria do trabalhador doméstico e no processo de igualação de seus direitos trabalhistas aos trabalhadores em geral, inclusive na Constituição de 1988 - nessa parte injusta para com os domésticos.
REFERÊNCIAS
AQUINO, Rubim Santos Leão de; VIEIRA, Fernando Antonio da Costa; AGOSTINHO, Carlos Gilberto Werneck e ROEDEL, Hiran. Sociedade Brasileira: uma história através dos movimentos sociais. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.
BRASIL. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Disponível em: <https://www2.camara.gov.br/>. Acesso em 28 Mai. 2009.
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Brasília: Senado Federal, 2008.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Trabalho Doméstico: Direitos e Deveres. Brasília: Secretaria de Inspeção do Trabalho, 2007.
BRASIL. Presidência da República. Disponível em: <https://www.presidencia.gov.br/legislacao/>. Acesso em: 25 maio 2009.
BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio. Raízes do Brasil. 26. ed., 20. reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem: a elite política imperial. Teatro das sombras: a política imperial. 4. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
CASAGRANDE, Cássio. Trabalho Doméstico e Discriminação. Disponível em: <https://www.anpt.org.br/site/index.php?view=article&catid=45%3Aar
tigos&id=319%3Atrabalho-domestico-e-discriminacao&option=com_content&
Itemid=63>. Acesso em: 25 maio 2009.
COSTA, Emília Viotti da. A Abolição - História Popular. 4. ed. São Paulo: Global, 1988.
_______. Da Senzala à Colônia. 4. ed., 1. reimpressão. São Paulo: Unesp, 1998.
_______. Da Monarquia à República: Momentos Decisivos. 7. ed., 2. reimpressão. SãoPaulo: Unesp, 1999.
DE ROURE, Agenor. Formação Constitucional do Brazil. Rio de Janeiro: Typ. do Jornal do Commercio, 1914.
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Barão de. O Espírito das Leis. Tradução de Cristina Murachco. 2. ed., 2. tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
NOGUEIRA, Octaciano. Constituições Brasileiras - 1824. Brasília: Senado Federal, 2001.
PRADO, Maria Emília. Ordem Liberal, Escravidão e Patriarcalismo: As Ambiguidades do Império do Brasil. In GUIMARÃES, Maria Paschoal e PRADO, Maria Emília (Org.). O Liberalismo no Brasil Imperial - origens, conceitos e prática. Rio de Janeiro: Revan, 2001.
VALLADÃO, Haroldo. História do Direito Especialmente do Direito Brasileiro. 3. ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1977.
Notas
MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Barão de. O Espírito das Leis. Tradução de Cristina Murachco. 2. ed., 2. tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 253.
Id. Ibid., p. 254.
Id. Ibid., p. 257.
-
AQUINO, Rubim Santos Leão de; VIEIRA, Fernando Antonio da Costa; AGOSTINHO, Carlos Gilberto Werneck e ROEDEL, Hiran. Sociedade Brasileira: uma história através dos movimentos sociais. 4. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001, p. 115-116.
Id. Ibid., p. 119.
BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio. Raízes do Brasil. 26. ed., 20. reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p. 75.
VALLADÃO, Haroldo. História do Direito Especialmente do Direito Brasileiro. 3. ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1977, p. 156.
BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio. Op. cit., p. 73.
Id. Ibid., p. 74.
Id. Ibid., p. 73.
PRADO, Maria Emília. Ordem Liberal, Escravidão e Patriarcalismo: As Ambiguidades do Império do Brasil. In GUIMARÃES, Maria Paschoal e PRADO, Maria Emília (Org.). O Liberalismo no Brasil Imperial - origens, conceitos e prática. Rio de Janeiro: Revan, 2001, p. 174.
BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio. Op. cit., p. 82.
AQUINO, Rubim Santos Leão de. et al. Op. cit., p. 436.
Id. Ibid., p. 121.
CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem: a elite política imperial. Teatro das sombras: a política imperial. 4. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p. 293.
PRADO, Maria Emília. Op. cit., p. 172.
COSTA, Emília Viotti da. A Abolição - História Popular. 4. ed. São Paulo: Global, 1988, p. 18.
Id. Ibid., p. 18.
PRADO, Maria Emília. Op. cit., p. 177.
Id., Ibid., p. 169-170.
DE ROURE, Agenor. Formação Constitucional do Brazil. Rio de Janeiro: Typ. do Jornal do Commercio, 1914, p. 118-119.
Id. Ibid., p. 119.
Id. Ibid., p. 119.
Id. Ibid., p. 119.
Id. Ibid., p. 119.
COSTA, Emília Viotti da. A Abolição - História Popular, p. 19.
Excetuadas referências indiretas ao tratar dos libertos, como cidadãos brasileiros, no artigo 6º, I, e como capacitados a votar, no artigo 94, II.
COSTA, Emília Viotti da. A Abolição - História Popular, p. 19.
NOGUEIRA, Octaciano. Constituições Brasileiras - 1824. Brasília: Senado Federal, 2001, p. 14.
PRADO, Maria Emília. Op. cit., p. 165.
Id. Ibid., p. 168.
COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: Momentos Decisivos. 7. ed., 2. reimpressão. São Paulo: Unesp, 1999, p. 358.
VALLADÃO, Haroldo. Op. cit., p. 155.
AQUINO, Rubim Santos Leão de. et al. Op. cit., p. 128.
COSTA, Emília Viotti da. A Abolição - História Popular, p. 83.
Id. Ibid., p. 83.
CARVALHO, José Murilo de. Op. cit., p. 293.
Id. Ibid., p. 294.
Id. Ibid., p. 294.
Id. Ibid., p. 295.
Id. Ibid., p. 297.
Id. Ibid., p. 298.
VALLADÃO, Haroldo. Ob. cit., p. 157.
Id. Ibid., p. 158-159.
Id. Ibid., p. 159.
Id. Ibid., p. 160-161.
Id. Ibid., p. 161.
CARVALHO, José Murilo de. Op. cit., p. 293.
Id. Ibid., p. 312.
VALLADÃO, Haroldo. Op. cit., p. 163.
Id. Ibid., p. 164.
CARVALHO, José Murilo de. Op. cit., p. 318.
Id. Ibid., p. 318.
VALLADÃO, Haroldo. Op. cit., p. 164.
-
Id. Ibid., p.164.
Id. Ibid., p.165.
Id. Ibid., p.155.
AQUINO, Rubim Santos Leão de. et al. Op. cit., p. 129.
COSTA, Emília Viotti da. Da Senzala à Colônia. 4. ed., 1. reimpressão. São Paulo: Unesp, 1998, p. 280.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Trabalho Doméstico: Direitos e Deveres. Brasília: Secretaria de Inspeção do Trabalho, 2007, p. 6.
Id. Ibid., 2007, p. 6.
Id. Ibid., 2007, p. 6.
BRASIL. Presidência da República. Disponível em: <https://www.presidencia.gov.br/legislacao/>. Acesso em: 25 Mai. 2009.
CASAGRANDE, Cássio. Trabalho Doméstico e Discriminação. Disponível em: <https://www.anpt.org.br/site/index.php?view=article&catid=45%3Aartigos&id=319%3Atrabalho-domestico-e-discriminacao&option=com_content&Itemid=63>. Acesso em 25 Mai. 2009.
BRASIL. Presidência da República.
BRASIL. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Brasília: Senado Federal, 2008.
Esse direito, na verdade, ainda não foi regulamentado para nenhuma categoria obreira.
Isso significa que o doméstico não tem direito à remuneração de horas extras.
CASAGRANDE, Cássio. op. cit.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Id. Ibid.
Entre os Projetos de Lei que tramitam no Legislativo Federal cita-se, pela amplitude do conteúdo tendente à igualação total de direitos do doméstico com os demais trabalhadores, o mais antigo, PL n. 1626/1989, de autoria da então Deputada Benedita da Silva, e o PL n. 4.787/2009, da Deputada Luciana Costa, cuja finalidade é substituir a denominação empregado doméstico por "funcionário do lar", considerada a discriminação que pesa sobre a primeira. Confira-se em BRASIL. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Disponível em: <https://www2.camara.gov.br/>. Acesso em 28 Mai. 2009.