Capa da publicação ADI 1.923-DF e limites do fomento público ao terceiro setor
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A ADI 1.923-DF e os limites do fomento público ao terceiro setor à luz da Constituição da República

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19/04/2011 às 08:16

Resumo:


  • A Constituição Federal de 1988 estabelece a intervenção estatal nos domínios econômico e social, visando à realização da Justiça Social e à maior participação da sociedade na consecução dos interesses públicos.

  • A atividade administrativa de fomento no domínio social é legitimada pela Constituição, desde que assuma um caráter complementar à atuação do Estado e não substitutivo, incentivando atividades de particulares que indiretamente satisfaçam o interesse público.

  • A Lei nº 9.637/98, que criou as Organizações Sociais (OS), e a Lei nº 8.666/93, ao preverem a transferência de recursos e bens públicos para OS sem licitação, podem violar princípios constitucionais como o da isonomia e da obrigatoriedade de licitação, sendo questionadas quanto à sua constitucionalidade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Notas

  1. De acordo com o extrato de Acompanhamento Processual no sítio da Corte Suprema na internet, já consta nos autos Parecer da lavra do Exmo. Procurador-Geral da República e o Relatório elaborado pelo Exmo. Ministro Relator Ayres Brito, bem como pedido de preferência formulado pelo Exmo. Presidente da República, ante a relevância da matéria. Consta ainda pedido de sustentação oral formulado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, admitida no feito como amicus curiae.
  2. Dissertação intitulada "A responsabilidade civil do Estado em face da atividade administrativa de fomento no domínio social e a do agente fomentado à luz da Constituição Federal de 1.988", aprovada pela Banca Examinadora composta pelos Prof. Drs. Silvio Luís Ferreira da Rocha, Márcio Cammarosano e Toshio Mukai.
  3. A expressão será utilizada ao longo do presente trabalho para designar as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos integrantes do denominado Terceiro Setor que, embora não integrem a Administração Pública Direta ou Indireta, tenham por objetivo social a consecução de interesses públicos, considerados relevantes para a coletividade e por isso acolhidos pelo ordenamento jurídico positivo pátrio. É dizer, adotar-se-á aqui uma acepção estrita, levando-se em consideração apenas aqueles entes que revelem "fins públicos" nos seus objetivos sociais, ou seja, que desenvolvam atividades sem fins econômicos, com o intuito de trazer benefícios para a sociedade como um todo. Isso porque numa acepção ampla de "Terceiro Setor" podem ser enquadradas sob tal rótulo diversas entidades, como por exemplo, os entes de benefícios mútuos (clubes, caixas, fundos de pensão); associações de defesa de determinados grupos (dentre outros, associações de bairro, de mutuários), as cooperativas, os entes de caráter corporativo (sindicatos, federações, confederações, centrais de empregados e empregadores, associação de classe), partidos políticos, organizações religiosas etc. Ressalte-se que o conteúdo da dita expressão na doutrina e na jurisprudência pátria não é unívoco, o que justifica identificar a acepção aqui adotada.
  4. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. São Paulo: Malheiros Editores, 2003.
  5. Nesse aspecto, ressalta Odete Medauar: "Tendo em vista que a Administração Pública integra a organização estatal, evidente que o modo de ser e de atuar do Estado e os seus valores repercutem na configuração dos conceitos e institutos do direito administrativo. Assim, uma das chaves para a melhor compreensão desse ramo do direito está no conhecimento dos aspectos fundamentais do Estado em geral e do Estado tal como vem caracterizado na Constituição do País". MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 11ªed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 23.
  6. FERNANDES, Luciana de Medeiros. Subsidiariedade e parceria: o Terceiro Setor (as organizações da sociedade civil). Revista ESMAFE, Recife,n. 6, 2004.
  7. TORRES, Silvia Faber. O princípio da subsidiariedade no direito público contemporâneo. São Paulo; Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 42.
  8. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização e outras formas. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 27-8.
  9. GORDILLO, Agustín A. Introducción al derecho administrativo. 2. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1996. p. 54.
  10. Tradução livre de: "En realidad, si tomamos la noción tradicional de Estado de Derecho parecería tal vez que ha sido sustituida por la de Estado de bienestar; pero ello no sería verdaderamente exacto. A nuestro juicio la noción de Estado de bienestar ha venido a operar como un correctivo para la noción clásica de Estado de Derecho, revitalizándola y actualizándola, pero en modo alguno suprimiéndola o sustituyéndola".
  11. REGULES, Luis Eduardo Patrone. Terceiro Setor: regime jurídico das OSCIPs. São Paulo: Método, 2006. p. 24-5.
  12. Releva anotar que o Brasil, smj, ainda não conseguiu implementar um efetivo Estado Social, tal como adotado pelo Texto Constitucional, mediante a proteção e efetividade dos direitos sociais ali arrolados.
  13. Em virtude desse caráter de complementação e não de substituição/superação dessas classes de direitos, muitos estudiosos preferem adotar o termo "dimensão" ao invés de "geração".
  14. O Professor Paulo Bonavides aponta ainda a formação de uma quarta geração de direitos, compreendida pelo direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo (BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 21. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 571-2).
  15. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 1997. p. 119.
  16. Como bem pontua a professora Weida Zancaner: "O Brasil é um Estado Social e Democrático de Direito, muito embora esteja consignado no artigo 1° da Lei Maior tão só que a "República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel, dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constituí-se em Estado democrático de direito".O Brasil, por determinação constitucional, deve se constituir em Estado Social e Democrático de Direito, em razão do que dispõem entre outras, as normas contidas nos artigos 1°, III, 3°, I e III e IV, 5° LV, LXIX , LXXIII, LXXIV, LXXVI, 6°,7°, I, II,III, IV, VI, X, XI, XII; 23, 170, II, III, VII e VIII. O Estado Social é aquele que além dos direitos individuais assegura os direitos sociais, sendo obrigado a ações positivas para realizar o desenvolvimento e a justiça social, como bem observa Carlos Ari Sundfeld." In ZANCANER, Weida. "Razoabilidade e moralidade: princípios concretizadores do perfil constitucional do Estado Social e Democrático de Direito". Revista Diálogo Jurídico. nº.9. Salvador, Centro de Atualização Jurídica – CAJ, dez. 2001. <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 11/08/2008. Na feliz síntese de Luis Eduardo Patrone Regules, são elementos característicos e decorrentes do Estado Social e Democrático de Direito, comuns ao nosso sistema constitucional: a) a supremacia da Constituição e a superioridade das leis; b) a independência dos órgãos do Estado a fim de assegurar o controle do poder (Estado de Direito); c) o exercício do poder assegurado aos seus destinatários (Estado Democrático); d) a promoção do intervencionismo em prol da concretização de condições sociais dignas para todos os cidadãos (Estado Social); d1) o dever do Estado em promover os objetivos sociais delineados no direito posto; d2) a outorga do direito de exigir a consecução destes objetivos fundamentais pelos indivíduos; e) a garantia dos direitos individuais (Estado de Direito) e dos direitos sociais e coletivos (Estado Social). REGULES, Luis Eduardo Patrone. Terceiro Setor - Regime Jurídico das OSCIPs. São Paulo: Método, 2006. p.30.
  17. BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio de subsidiariedade: conceito e evolução. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 40, 48-9.
  18. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 800-4.
  19. REGULES, op. cit., p. 70-1.
  20. PALASÍ, José Luis Villar. Las Técnicas Administrativas de Fomento Y de Apoio al Precio Político. <http://www.cepc.es/rap/Publicaciones/Revistas/1/1954_014_011.PDF>. Acesso em: 03/03/2008. p.9-10.
  21. DELACROIX, José Maria Barbé. "Actividad administrativa de fomento, concepto". In: AROZTEGUI, Cesar I.; BACARINI, Pablo L.; BARBÉ, José et. al. Regimen administrativo de la actividad privada. Montevideo: Fundación de Cultura Universitária, 1990. p.20.
  22. ALCÁZAR, Baena. Sobre El concepto de fomento. <http://www.cepc.es/rap/ Publicaciones/Revistas/1/1967_054_043.PDF>. Acesso em: 21/02/2008.
  23. Os honoríficos compreendem as distinções e recompensas que se outorgam como reconhecimento público ou proclamação de um ato ou de uma conduta exemplar. Embora possam ser em determinadas ocasiões consideradas também vantagens econômicas ou jurídicas, estas se mostram acessórias, uma vez que o principal é o enaltecimento social do beneficiado. Cita como principais meios: as condecorações, tratamentos, títulos, uso de emblemas ou símbolos determinados, troféus, diplomas etc. Os econômicos são todos aqueles que determinam uma percepção de quantidade ou a dispensa de um pagamento obrigatório. Nessa categoria estão incluídas as subvenções, os prêmios em dinheiro, as isenções e demais privilégios de caráter fiscal. Por fim, os jurídicos, os quais se caracterizam pela outorga de uma condição privilegiada que, de modo indireto, representa vantagens econômicas.
  24. ESCOLA, Hector Jorge. Compendio de Derecho Administrativo. vol.II. Buenos Aires: Ediciones Depalma, 1990. p.859.
  25. DROMI, Roberto. Derecho Administrativo. 4ªed. Buenos Aires, 1995. p.655.
  26. PARADA, Ramón. Derecho Administrativo I – Parte Geral. 15ªed. Madrid, Barcelona: Marcial Pons Ediciones Jurídicas Y Sociales S/A, 2004.
  27. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. São Paulo: Malheiros Editores, 2003.
  28. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 25ªed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008. p.800-4.
  29. OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p.513-39.
  30. A propósito, oportuno registrar o posicionamento do eminente professor Eros Grau, para quem a atividade econômica em sentido amplo é gênero, das quais são espécies: o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988 (interpretação e crítica). 12ªed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. p.103-4.
  31. A elaboração de grupo de objetos em uma determinada classe é ato que necessita a escolha de critérios por aquele que irá realizar uma classificação. Nessa direção, o professor Roque Antonio Carrazza anota que "classificar é o procedimento lógico de dividir um conjunto de seres (de objetos, de coisas) em categorias, segundo critérios preestabelecidos" (CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros Editores, 1999. p.346). Esse procedimento é adotado pelo homem com o intuito de reduzir as dificuldades de compreensão acerca dos objetos que estão sob o seu exame, agrupando-os a partir de critérios previamente fixados. Assim, não existem classificações certas ou erradas, mas sim classificações mais úteis e menos úteis aos fins a que se destinam. Especificamente no que diz respeito à classificação jurídica, esta deve ser feita com apoio em dados jurídicos. Por outro lado, conforme nos ensina o professor José Artur Lima Gonçalves (GONÇALVES, José Artur Lima. "A Imunidade Tributária do Livro". In: MACHADO, Hugo de Brito (coord.). Imunidade Tributária do Livro Eletrônico. 2ªed. São Paulo: Atlas, 2003. p.139-63), o intérprete, com o intuito de facilitar a compreensão do objeto, elabora um sistema, entendido como um conjunto harmônico de elementos organizados a partir de um critério unificador. Os sistemas possuem um repertório, composto pelos elementos que o integram (no caso do ordenamento jurídico – as normas jurídicas válidas) e uma estrutura, representada pela forma de organização e relacionamento de seus elementos (no sistema jurídico organizada pelo critério de escalonamento hierárquico das normas). Desse modo, a classificação jurídica deve levar em consideração não somente os dados jurídicos – in casu as normas constitucionais, mas o exame do sistema ou dos subsistemas nos quais estes dados encontram-se inseridos. Com isto, quer-se apenas deixar registrado que, embora a ordem econômica e social sejam subsistemas constitucionais inseridos nos Títulos VII e VIII da Constituição da República, a interpretação desses dados jurídicos para o fim de identificar o plexo de normas que possam revelar distintas classes – atividade econômica e serviço público (ou ainda uma terceira classe), não pode se apartar das demais normas e princípios albergados no Sistema Constitucional. É dizer, há que se ter em mente a necessidade de uma interpretação sistemática e harmônica do Texto Constitucional.
  32. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2008. p.756.
  33. No que tange, especificamente, à disciplina constitucional do serviço público, serão acolhidos aqui os precisos ensinamentos do eminente professor Celso Antônio Bandeira de Mello, que constam de seu "Curso de Direito Administrativo", editado pela Malheiros.
  34. Conforme observa Bandeira de Mello: "A enumeração dos serviços que o Texto Constitucional considera públicos não é exaustiva." E mais adiante ensina: "É realmente o Estado, por meio do Poder Legislativo, que erige ou não em serviço público tal ou qual atividade, desde que respeite os limites constitucionais. Afora os serviços públicos mencionados na Carta Constitucional, outros podem ser assim qualificados, contanto que não sejam ultrapassadas as fronteiras constituídas pelas normas relativas à ordem econômica, as quais são garantidoras da livre iniciativa. É que a exploração da atividade econômica, o desempenho de ‘serviços’ pertinentes a esta esfera, assiste aos particulares e não ao Estado. Este apenas em caráter excepcional poderá desempenhar-se empresarialmente nesta órbita. Sem embargo, o fato é que o Texto Constitucional, compreensivelmente, não define o que sejam ‘atividades econômicas’. Em consequência, remanesce ao legislador ordinário um certo campo para qualificar determinadas atividades como ‘serviços públicos’, no que, indiretamente, gizará, por exclusão, a área configurada como das ‘atividades econômicas’. É lógico, entretanto, que, em despeito desta margem de liberdade, não há, para o legislador, liberdade absoluta. À falta de uma definição constitucional, há de se entender que o constituinte se remeteu ao sentido comum da expressão, isto é, ao prevalente ao lume dos padrões de cultura de uma época, das convicções predominantes na Sociedade." BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2006. p.657, 662.
  35. GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Op. cit., 2003. p.103-5.
  36. Para os fins do presente trabalho, far-se-á a divisão da atividade econômica em sentido stricto sensu, desenvolvida com finalidade lucrativa pelos particulares, e em sentido lato sensu, destinada ao exercício de atividade econômica sem almejar o lucro. Assim, acolhe-se aqui, inicialmente, a divisão proposta por Bandeira de Mello: serviço público de um lado e atividade econômica de outro. No entanto, no que toca a esta última, entende-se relevante desmembrá-la em atividade econômica em sentido estrito, reservadas às pessoas jurídicas de direito privado com finalidade lucrativa e atividade econômica em sentido amplo, destinada às pessoas jurídicas de direito privado sem finalidade econômica.
  37. Essa a precisa lição de Bandeira de Mello, com exceção da subdivisão da espécie atividade econômica proposta na nota de rodapé 141: "Dentre o total de atividades ou serviços suscetíveis de serem desenvolvidos em uma sociedade, alguns são públicos e outros privados. Para separar uns dos outros, identificando aqueles que o Estado pode colocar debaixo do regime de direito público (serviços públicos), temos que nos valer de duas ordens de indicações contidas no Texto Constitucional. A primeira delas é a de que certas atividades, como já foi exposto (ns. 17 a 20) a própria Carta Constitucional definiu como serviço público: alguns deles em todo e qualquer caso e outros deles apenas quando prestados pelo Estado. Estes últimos, de conseguinte, não serão serviços públicos quando desempenhados por particulares, uma vez que a Carta Magna não limitou a prestação deles ao Estado ou a quem lhe faça as vezes. Segue-se que o Estado jamais poderia pretender outorgá-los em concessão a alguém, sob pena de ferir os direitos de prestá-los que assistem às demais pessoas que preencham os requisitos legais necessários à comprovação de suas habilitações. A segunda ordem de indicações residente no Texto Constitucional é a que consta do art. 173. De acordo com ele, ressalvados os casos de monopólio estatal estabelecidos na própria Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só é admitida quando suscitada por imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, como tais definidos em lei. Logo, é correto concluir que os serviços correspondentes à exploração de atividade econômica são serviços privados, atividades privadas, e não serviços públicos (excetuados o caso dos serviços de educação e saúde, que, como se acaba de ver, embora também assistam no campo da atividade econômica, serão serviços públicos quando prestados pelo Estado). Assim se verifica que os serviços correspondentes à exploração de atividade econômica não são serviços públicos porque não competem ao Poder Público, a não ser supletivamente, e mesmo assim basicamente sob a regência do Direito Privado, circunstâncias que os apartam irremissivelmente da categoria de serviços públicos. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2006. p.663-4.
  38. Em síntese, ainda de acordo com o eminente jurista, podem ser distinguidas as seguintes hipóteses: a) Serviços de prestação obrigatória e exclusiva do Estado (serviço postal e correio aéreo nacional – art. 21, X, CF/88); b) Serviços que o Estado tem obrigação de prestar e obrigação de conceder (serviços de radiofusão sonora (rádio) ou de sons e imagens (televisão) art. 223 da CF/88); c) Serviços que o Estado tem obrigação de prestar, mas sem exclusividade (educação; saúde; previdência social; assistência social e radiofusão sonora e de sons e imagens; d) Serviços que o Estado não é obrigado a prestar, mas, não os prestandos, terá de promover-lhes a prestação mediante concessão ou permissão (todos os demais serviços públicos, notadamente o artigo 21, XI, CF). Ibidem. p.659-60.
  39. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2006. p.664.
  40. POZAS, Jordana de. Ensayo de una Teoria del Fomento en el Derecho Administrativo. Disponível em: <http://www.cepc.es/rap/Publicaciones/Revistas/2/REP_048_040.pdf>. Acesso em: 02/06/2008.
  41. GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 12ª edição. São Paulo: Malheiros Editores. 2007. p.101.
  42. "Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
  43. I - soberania nacional;

    II - propriedade privada;

    III - função social da propriedade;

    IV - livre concorrência;

    V - defesa do consumidor;

    VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;       

    VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

    VIII - busca do pleno emprego;

    IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

    Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei."

    "Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

    § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:

    I - [...]

    II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários."

  44. Cumpre anotar, no entanto, que as empresas de sociedade de economia mista e empresas públicas, quando desenvolvem atividade econômica, a par da sujeição ao regime jurídico própria das empresas privadas, no que tange aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários, também sofrem o influxo de regras publicísticas, haja vista integrarem a Administração Indireta do Estado. Assim também ocorre com as organizações do Terceiro Setor, quando atuam em vínculos de parceria com o Estado (termos de parceria, convênios, contratos de gestão), vale dizer, embora sujeitas ao regime de Direito Privado, por exercerem atividade econômica e não serviço público, sofrem influxos de regras publicísticas, ante a gestão de recursos públicos.
  45. BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 1994. p.253.
  46. ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vida Serrano. Curso de Direito Constitucional. 11ªed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.464.
  47. Ibidem. p.465.
  48. CARDINALI, Adriana Laporta. Direito Administrativo da ordem econômica na Constituição Federal de 1988 – A intervenção indireta do Estado no domínio econômico. São Paulo, no prelo. p.100-1.
  49. Pode-se dizer que o conceito de "atividade econômica", assim como o de serviço público é um conceito jurídico-positivo. Nas lições do saudoso professor Geraldo Ataliba sobre o conceito de tributo como jurídico-positivo, assim asseverava: "O conceito de tributo é nitidamente um conceito jurídico-positivo. Há de ser formulado, hoje, de modo diverso, relativamente ao passado. Sofreu evolução. Pode desaparecer. Aquele, aqui vigente, pode não ser extensível a todos os sistemas atuais. Sua compreensão é maior ou menor aqui e alhures. Como todo conceito jurídico-positivo, é cambiante. Efetivamente, nele se compreenderam, no passado, as corvéias e bens outros que não o dinheiro. Há sistemas atuais que o formulam de modo mais amplo que o nosso. No Brasil, hoje, o seu termo de referência é o dinheiro. Não se sabe como será no futuro. Enfim, é conceito contingente, ao contrário dos conceitos lógico-jurídicos, que são necessários." ATALIBA, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária. São Paulo: Malheiros Editores, 1994. p.33.
  50. No Brasil, a Constituição de 1934 foi a primeira a contemplar normas e princípios sobre a ordem econômica e social, inspirada na Constituição alemã de Weimar, seguida por todas as cartas constitucionais seguintes.
  51. A Constituição de 1988 traz um capítulo próprio dos direitos sociais (cap. II do tít. II) e, bem distanciado deste, um título especial sobre a ordem social (tít. VIII), mas não ocorre uma separação radical, como se os direitos sociais não fossem algo ínsito na ordem social.
  52. Conforme bem observa Sarlet: "Num primeiro momento – convém frisá-lo – a qualificação da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental traduz a certeza de que o art. 1º, inc. III, de nossa Lei Fundamental não contém apenas (embora também e acima de tudo) uma declaração de conteúdo ético e moral, mas que constitui norma jurídico-positiva dotada, em sua plenitude, de status constitucional formal e material e, como tal, inequivocamente carregado de eficácia, alcançando, portanto – tal como sinalou Benda – a condição de valor jurídico fundamental da comunidade. Importa considerar, neste contexto, que na qualidade de princípio fundamental, a dignidade da pessoa humana constitui valor-guia não apenas dos direitos fundamentais, mas de toda a ordem jurídica (constitucional e infraconstitucional), razão pela qual, para muitos, se justifica plenamente sua caracterização como princípio constitucional de maior hierarquia axiológico-valorativa." SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p 71-2.
  53. A propósito, oportuno registrar o posicionamento do eminente professor Eros Grau, para quem a atividade econômica em sentido amplo é gênero, das quais são espécies: o serviço público e a atividade econômica em sentido estrito. GRAU, Eros Roberto. Op. cit., 2007. p.103.
  54. Ibidem. p.148-9.
  55. A intervenção do Estado no domínio econômico por meio da atividade administrativa de fomento não será objeto de exame neste trabalho, senão pelas breves considerações já tecidas, haja vista o objetivo fixado e o intuito de não se desviar as atenções ao tema que se propôs estudar.
  56. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio de. Op. cit., 2006.
  57. ZOCKUN, Carolina Zancaner. Op. cit., no prelo. p.203.
  58. VIOLIN, Tarso Cabral. "Estado, Ordem Social e Privatização. As terceirizações ilícitas da Administração Pública por meio das Organizações Sociais, OSCIPs e demais entidades do Terceiro Setor". RERE - Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado. nº.12. Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, dez/jan/fev 2008. Disponível em: <www.direitodoestado.com.br>. Acesso em: 05/02/2009.
  59. OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p.531.
  60. A elaboração de um conceito para cada uma das funções estatais – legislativa, administrativa ou executiva e judiciária, com critérios que permitam exprimir com segurança a abrangência de cada uma delas é tarefa que tem demandado esforços dos estudiosos do Direito Administrativo. É que no "sistema do checks and balance" ou "sistema de freios e contrapesos", adotado com reconhecido sucesso como meio de contenção do poder, embora exista uma separação de funções, esta não é absoluta. Em outras palavras, todos esses poderes exercem atividades típicas consoante a competência que lhes fora fixada pela Constituição, como também tarefas dos outros poderes, estas últimas, de forma atípica, para o seu regular funcionamento. Assim, o Judiciário, por exemplo, que atua tipicamente ao compor os conflitos a ele submetidos e de forma atípica ao praticar atos administrativos dentro da sua esfera de atuação, tais como nomear servidor, realizar licitações etc e atos legislativos, ao editar seus regimentos internos. De igual modo, o Legislativo, que no exercício da função típica é incumbido de elaborar leis e nem por isso deixa de praticar funções inerentes aos outros poderes, tais como o julgamento de alguns agentes políticos por crime de responsabilidade e prática de atos administrativos consubstanciados em concessão de férias, licenças, licitações etc. Por fim, o Executivo também desenvolve além das funções típicas, aquelas denominadas atípicas, como por exemplo, quando edita medida provisória com força de lei. Daí porque, observa-se alguma divergência conceitual entre os doutrinadores, a partir dos critérios eleitos para apartar as funções executiva ou administrativa, legislativa e jurisdicional do Estado. Para fins do presente trabalho, adota-se o conceito de função administrativa formulado pela professora Lucia Valle Figueiredo, que "consiste no dever de o Estado, ou de quem aja em seu nome, dar cumprimento fiel, no caso concreto, aos comandos normativos, de maneira geral ou individual, para a realização dos fins públicos, sob regime prevalecente de direito público, por meio de atos e comportamentos controláveis internamente, bem como externamente pelo Legislativo (com o auxílio dos Tribunais de Contas), atos, estes, revisíveis pelo Judiciário". FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Op. cit., 2006. p.33.
  61. Os princípios são normas dotadas de elevada carga axiológica, capaz de orientar a interpretação e a aplicação das demais normas do sistema jurídico, integrando-as. Daí a sua hierarquia em relação às demais normas-regras do sistema jurídico, posto que assumem a condição de pilares do ordenamento jurídico. Consoante lição do professor Roque Carraza: "Princípio jurídico é um enunciado lógico, implícito ou explícito, que, por sua grande generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do direito e, por isso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam." CARRAZA, Roque Antonio. Op. cit., 1999. p.31.
  62. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2006. p.110.
  63. Op. cit., 2006. p.117-8.
  64. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p.27-9.
  65. OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Op. cit., 2006. p.519-20.
  66. No entendimento da professora Weida Zancaner: "O conceito de moralidade, símile ao que ocorre com o da razoabilidade, constitui conceito de experiência ou de valor. Esses conceitos, quando utilizados pelo direito, são denominados, pela Ciência Jurídica, conceitos jurídicos indeterminados. A indeterminação deste tipo de conceito não impede sua compreensão nem impede sua aplicação. Aliás, os conceitos jurídicos indeterminados ao invés de baralhar, promovem a comunicação jurídica. O conceito de moralidade deve ser sacado do próprio conceito de moralidade vigente em uma determinada sociedade em uma determinada época. Entretanto, é bom que se esclareça que este conceito não deve ter por parâmetro a conduta social das pessoas, mas o que elas entendem como moralmente correto, o que dizem ser correto como valor que exprime o consenso social e os valores albergados pelo sistema jurídico positivo. A compreensão que temos acerca do tema, nos induz a concluir que a moralidade é recepcionada pelo sistema jurídico positivo como um todo e não uma pontualização de tópicos onde deva ser tida como vigente. A moralidade ao ser absorvida pelo direito posto, se espraia por todo o sistema normativo, não se alocando, necessariamente, na norma ‘A’ ou ‘B’. Entretanto, muito embora permeie o sistema, é autônoma no sentido de que não pode ser objetivada puntualmente em cada uma das normas jurídicas, e, portanto, diluída simplesmente no mero enunciado do princípio da legalidade. O princípio da moralidade tem sua essência captada com precisão por Marçal Justen Filho quando se refere a este como um ‘princípio jurídico ‘em branco’, o que significa que seu conteúdo não se exaure em comando concretos e definidos, explícita ou implicitamente previstos no Direito legislado. O princípio da moralidade pública contempla a determinação jurídica da observância de preceitos éticos produzidos pela sociedade, variáveis segundo as circunstâncias de cada caso’. Em síntese, podemos dizer que o administrador afrontará o princípio da moralidade todas as vezes que agir visando interesses pessoais, com o fito de tirar proveito para si ou amigos, ou quando editar atos maliciosos ou desleais, ou ainda, atos caprichosos, atos exarados com o intuito de perseguir inimigos ou desafetos políticos, quando afrontar a probidade administrativa, quando agir com má-fé ou de maneira desleal. Mister ainda frisar, que os atos afrontosos ao princípio da moralidade são atos portadores de vício de desvio de poder, pois o agente usa sua competência para atingir finalidade alheia à própria do ato praticado e (no mais das vezes) imbuído de um móvel considerado reprovável do ponto de vista moral. O princípio da moralidade encartada em inúmeros artigos da Constituição Federal, consiste, em ultima ratio, regra de civilidade essencial à sobrevivência das instituições democráticas. Esta posição, isto é, a compreensão do princípio da moralidade com um ‘plus’ ao princípio da legalidade, inclusive enquanto autônomo em relação a este, é a aceitação de valores éticos e morais pelo sistema jurídico, valores que se espraiam por todo sistema porque ajudaram a compor o perfil constitucional do Estado adotado por uma determinada sociedade em uma determinada época." ZANCANER, Weida. Op. cit., dez. 2001.
  67. CAMMAROSANO, Márcio. O princípio constitucional da moralidade e o exercício da função administrativa. Belo Horizonte: Fórum, 2006. p.113-4.
  68. Conforme já se anotou linhas atrás, acolhe-se no presente trabalho a posição, entre outros, de Garrido Falla, Roberto Dromi, Diogo de Figueiredo Moreira Neto e Célia Cunha Mello, que admitem a possibilidade de tal atividade ter como destinatário outro ente do aparelho administrativo. Entende-se que nada obsta o legislador estabelecer incentivo por parte de uma pessoa política, por exemplo, a União Federal, em face de outros entes públicos menores, como uma sociedade de economia mista do Estado. Aliás, no campo do fomento econômico, são fartos os exemplos de incentivos fiscais, concedidos a título de fomento, que alcançam tanto os particulares como entes públicos.
  69. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Op. cit., 2003. p.33-4.
  70. Ibidem. p.85.
  71. ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Op. cit., 2003. p.117.
  72. Ibidem. p.117-20.
  73. BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Op. cit., 2006. p.229-30.
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Sobre o autor
Alberto Shinji Higa

Mestre em Direito do Estado e Especialista em Direito Tributário pela PUC/SP. Especialista em Direito Empresarial e Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Procurador Jurídico do Município de Jundiaí (atualmente cedido ao Ministério Público Federal para o desempenho da função de Assessor Jurídico de Procurador Regional da República). Professor de Direito Administrativo e Teoria Geral do Estado da Universidade Padre Anchieta, em Jundiaí/SP (Licenciado). Professor Convidado do Programa de Pós-Graduação em Direito Tributário da UNIP/SP e Professor Orientador de TCC da rede de ensino LFG/ANHANGUERA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HIGA, Alberto Shinji. A ADI 1.923-DF e os limites do fomento público ao terceiro setor à luz da Constituição da República. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2848, 19 abr. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18937. Acesso em: 19 dez. 2024.

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