Artigo Destaque dos editores

Corinthians, incentivos fiscais e financeiros e Copa do Mundo

30/06/2011 às 14:47
Leia nesta página:

Antes de iniciar este artigo, preciso deixar claro que sou corintiano e que acompanho atentamente a todos os acontecimentos do clube, merecendo destaque o seu centenário e o anúncio do tão sonhado estádio, que, ao que tudo indica, será o palco da abertura da Copa do Mundo de 2014.

Ademais, também é necessário traçar um pequeno histórico para se compreender o contexto atual do time e a perspectiva de que ele construa o estádio paulista para a abertura do já mencionado torneio.

No ano de 2005, o Corinthians sagrou-se tetracampeão do Campeonato Brasileiro, título este conquistado por jogadores como Tévez, Masquerano, Nilmar, Roger e Carlos Alberto, que puderam ser contratados em decorrência da parceria firmada entre o time e a MSI.

Pode-se dizer que o Corinthians foi do céu ao inferno, pois em 2006, a parceria com a MSI foi desfeita, fazendo com que o time fosse "desmanchado", culminando em uma crise sem precedentes, ensejando no rebaixamento do clube para a Série B do Campeonato Brasileiro no final do ano 2007.

Ainda em 2007, o então presidente do clube Alberto Dualib foi substituído pelo atual presidente Andrés Sanchez, que assumiu o cargo acompanhado por Luis Paulo Rosemberg, que prometeram realizar uma revolução administrativa.

Essa revolução já pôde começar a ser sentida em 2008, primeiro ano da nova administração, ano em que o Corinthians sagrou-se vice-campeão da Copa do Brasil e campeão do Campeonato Brasileiro da Série B, com a melhor campanha na história da competição.

Nesse mesmo ano, o Andrés Sanchez e Luis Paulo Rosemberg realizaram a maior jogada de marketing da história do clube. Contrataram Ronaldo "o Fenômeno" como o principal nome para o temporada de 2009. Já estava sendo plantada a semente da pretensão de conquista da Taça Libertadores da América do ano de 2010, ano em que o Corinthians completou o seu centenário.

O atleta foi peça fundamental no clube, ajudando na conquista do Campeonato Paulista (invicto) e da Copa do Brasil, ambos de 2009, garantindo, assim, a participação do time na Taça Libertadores da América de 2010.

Fatidicamente, o Corinthians foi eliminado pelo Flamengo do torneio continental, ainda nas oitavas-de-final, frustrando parte das comemorações para o ano do centenário, pois a conquista da América era um projeto que já vinha sendo planejado desde o ano de 2008.

No entanto, a conquista da Taça Libertadores da América não era o único presente reservado para o clube e para a sua torcida, o presidente Andrés Sanchez ainda guardava uma grande surpresa: a construção do estádio do Corinthians em Itaquera, anunciada oficialmente no dia 27.08.2010.

Antes de adentrar nas ponderações centrais deste artigo, gostaria de opinar acerca de como deve chamado o estádio. Acredito que ele deve se chamar Vicente Matheus Bathe, em homenagem ao emblemático cartola que dedicou uma grande parte da sua vida ao clube. Popularmente, ele deve ser conhecido como Arena Itaquera, pois considero que Itaquerão soa um tanto pejorativo para o bairro paulistano e Fielzão prestigiaria apenas uma das grandes torcidas corintianas.

A idéia da "Arena Itaquera" ganhou força com a tentativa frustrada do time do Parque São Jorge arrendar o estádio do Pacaembu, uma vez que a ela foi rechaçada pela Câmara dos Vereadores de São Paulo, sem contar o eterno sonho do clube possuir um estádio que atendesse às suas necessidades, haja vista possuir uma das maiores torcidas do Brasil.

Diante disso, foi realizado um estudo de viabilidade da construção, chegando-se à conclusão de que o estádio "Vicente Matheus Bathe" era a melhor opção econômica e financeira para o Corinthians, indo de encontro com os anseios de todos os seus torcedores.

Antes mesmo do anúncio do estádio corintiano, no primeiro semestre do ano de 2010, o estádio do Morumbi vinha sendo reiteradamente rejeitado pela FIFA como palco paulista para a Copa do Mundo de 2014, uma vez que não se apresentava nenhum projeto que atendesse as exigências para o torneio, especialmente no que diz respeito aos arredores do estádio, que não poderia ter a infra-estrutura necessária para atender a um evento do porte da Copa do Mundo. Quem já foi ao Morumbi conhece muito bem esse problema.

No dia 17.06.2010, o Morumbi foi definitivamente rejeitado pela FIFA, gerando a especulação de que o Estado de São Paulo não teria estádio apto para receber a Copa do Mundo.

Como alternativa ao Morumbi, o Estado de São Paulo chegou a aventar a possibilidade da construção de uma arena em Pirituba ou a utilização da Arena Palestra Itália, cujo projeto já está sendo executado desde o final de maio de 2010, alternativas que não apresentaram a viabilidade necessária para serem devidamente apresentadas para o Comitê Organizador da Copa.

Independentemente deste cenário, no dia 27.08.2010 foi anunciada oficialmente a construção do estádio "Vicente Matheus Bathe", com capacidade para 48.000 (quarenta e oito mil) espectadores, sendo 16.000 (dezesseis mil) cadeiras cobertas; 225 (duzentos e vinte e cinco) camarotes; e 2.100 (duas mil e cem) vagas de estacionamento; com custo estimado entre R$ 320.000.000,00 (trezentos e vinte milhões de reais) e R$ 350.000.000,00 (trezentos e cinqüenta milhões de reais).

O anúncio da construção do referido estádio resolveria parcialmente o problema do Estado de São Paulo, pois o Estado passaria a dispor de local apto para receber os jogos da Copa do Mundo de 2014, no entanto, não a abertura do torneio.

Vejam, até então se tratava de uma obra privada para atender os interesses particulares do Corinthians e os interesses públicos inerentes a ela, mas que foi absurdamente encarecida em razão da pretensão do Estado de São Paulo em abrigar a abertura da Copa do Mundo de 2014.

O Timão teve que alterar o projeto originário do estádio, atendendo as exigências da FIFA, o que fez com que os custos da obra atingissem o montante de R$ 1.000.000.000,00 (hum bilhão de reais), ou seja, no mínimo R$ 650.000.000,00 (seiscentos e cinqüenta milhões de reais) mais caro do que o projeto anunciado em agosto do ano passado.

Na prática, foi imposto ao time-alvinegro um custo que ele não pode arcar e que não é da sua responsabilidade, motivo pelo qual a FIFA exige dos países que sediam Copas do Mundo incentivos fiscais. Não se trata de uma liberalidade da União, Estados e Municípios, mas sim uma exigência da federação de futebol, a exemplo do que ocorreu na Alemanha em 2006 e na África do Sul em 2010.

No âmbito Federal foi editada a Medida Provisória n.º 497/2010, convertida na Lei n.º 12.350/2010, que criou o Regime Especial de Tributação para Construção, Ampliação, Reforma ou Modernização de Estádios de Futebol para a Copa das Confederações em 2013 e para a Copa do Mundo em 2014 (RECOPA).

Por meio deste Regime Especial de Tributação "as vendas no mercado interno efetuadas para pessoas jurídicas beneficiárias do RECOPA, relativas a máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos novos e de materiais de construção para utilização ou incorporação no estádio de futebol, serão com suspensão do PIS/PASEP, COFINS e IPI. Caso estes mesmos produtos sejam importados pela pessoa jurídica beneficiária do RECOPA, sobre a importação haverá a suspensão do PIS/PASEP – Importação, COFINS – Importação, IPI e Imposto de Importação. [01]", sendo que neste regime existe a suspensão da cobrança dos referidos tributos, suspensão que pode ser convertida em alíquota zero na hipótese de serem atendidas as exigência existentes na lei.

"Na esfera estadual, vigoram os Convênios ICMS 108/08, 133/08 e 39/09. Em linhas gerais, autorizam os Estados e o Distrito Federal a conceder isenção do ICMS nas operações com mercadorias e bens destinados à construção, ampliação, reforma ou modernização de estádios a serem utilizados na Copa de 2014, bem como conceder isenção do ICMS nas operações com produtos nacionais e estrangeiros (aparelhos, máquinas, equipamentos etc.) destinados aos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016." [02]

Antes mesmo de se analisar o PL n.º 288/2011 que concede "incentivos fiscais para a construção de estádio que venha a ser aprovado pela Federação Internacional de Futebol Associado – FIFA como apto a ser sede do jogo de abertura da Copa do Mundo de Futebol de 2014", importante observar os aspectos econômicos que acompanham a realização de um evento deste porte.

Não se trata de um projeto de lei em prol de uma determinada agremiação ou uma determinada empresa, mas sim em benefício do povo do Estado e do Município de São Paulo, entes federados mais ricos do país, assim como da própria nação brasileira.

A Copa do Mundo de 2014 prevê investimentos públicos e privados em montantes próximos a de R$ 100.000.000.000,00 (cem bilhões de reais), com previsão de movimentar mais de R$ 200.000.000.000,00 (duzentos bilhões de reais), ou seja, mais do que 5% do PIB brasileiro.

Isso representa investimentos e empregos!

Considerando somente a construção da "Arena Itaquera", na qual serão investidos R$ 1.000.000.000,00 (hum bilhão de reais), serão gerados aproximadamente 2.000 (dois mil) empregos diretos.

Existem muitas outras obras decorrentes da realização da abertura da Copa do Mundo de 2014 no Estado de São Paulo, tais como a ampliação/modernização dos aeroportos de Congonhas, Cumbica e Viracopos; construção do sistema viário na região da arena; modernização do porto de Santos; ampliação/modernização das linhas do Metrô e da CPTM; ampliação da rede hoteleira; entre outras; além do investimento maciço em segurança pública, o gerando dezenas de milhares de empregos e investimentos de dezenas de bilhões de reais, criando um circulo virtuoso.

Isso significa crescimento econômico e também é uma forma de se resolverem diversos gargalos infra-estruturais no Estado de São Paulo.

Vejam que isso somente pode ocorrer em decorrência de incentivos fiscais que podem chegar a aproximadamente R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais) e financiamento de parte da obra por meio de linhas de crédito do BNDES.

Cabe questionar se os benefícios fiscais que se oferecem são justificáveis frente ao retorno que ele podem trazer. Tenho certeza que sim!

Ademais, também cumpre ressaltar que o PL n.º 288/2011 tem como finalidade clara levar o desenvolvimento urbano e social para a Zona Leste da capital paulista, uma vez que exige que o estádio para a abertura da Copa do Mundo de 2014 seja localizado naquela região, que é reconhecidamente a região mais carente da cidade.

O referido Projeto de Lei assegurará incentivos ficais e financeiros para a construção da "Arena Itaquera", da seguinte forma:

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

"I - Incentivo Fiscal

O incentivo fiscal consiste em isentar do ISS os serviços de construção do estádio. Esta isenção, na verdade, é concedida aos serviços de construção (ou reforma) pelas 12 cidades-sede da Copa do Mundo, inclusive Porto Alegre e Curitiba, nas quais os titulares dos estádios são privados (Internacional e Atlético Paranaense, respectivamente). Isentar do ISS os serviços de construção foi um compromisso assumido pelas 12 cidades-sede perante a FIFA, em documento chamado "Matriz de Responsabilidades", que conjuga uma série de obrigações impostas pela FIFA, em todas as Copas do Mundo, como condição a todas as cidades (e Estados) que pretendem sediar o evento.

Portanto, ao isentar a construção de ISS, São Paulo está apenas cumprindo a obrigação assumida pelo Município perante a FIFA.

Aliás, quando a Matriz de Responsabilidades foi assinada por São Paulo, em 13 de janeiro de 2010, o estádio paulistano que gozaria da isenção de ISS em sua reforma era outro (por coincidência, também particular).

II - Incentivo Financeiro

1 - E o que são os tais "R$ 420 milhões" ?

Na verdade, são um incentivo financeiro (e não fiscal) ao desenvolvimento da Zona Leste, a menos desenvolvida de São Paulo, e não apenas ao estádio do Corinthians. Os Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento (CIDs) existem na legislação de São Paulo desde 2005 (Lei nº 14.096, de 8 de dezembro de 2005, alterada pela Lei nº 14.256, de 29 de dezembro de 2006), quando foram criados como mecanismo ao desenvolvimento da Região da Luz (anos antes, portanto, da própria confirmação da realização da Copa do Mundo no Brasil).

Especificamente na Zona Leste, na área onde está sendo construído o novo estádio, os CIDs existem desde 2007, por ocasião da edição da Lei nº 14.654, de 20 de dezembro de 2007.

Portanto, o Corinthians não será o primeiro e nem o último beneficiário dos CIDs: qualquer empresa disposta a investir na região da Luz ou na Zona Leste fará jus aos CIDs. Qualquer outro clube de futebol que queira construir um estádio na Zona Leste fará jus aos CIDs. O próprio Corinthians, independentemente da aprovação do PL, já faria jus aos CIDs, nos termos da legislação atualmente em vigor (Lei nº 14.654, de 2007, alterada pela Lei nº 14.888, de 19 de janeiro de 2009, dependendo apenas da regulamentação pelo Executivo Municipal da Lei já vigente).

Os CIDs são certificados emitidos pela Prefeitura em favor do investidor, no valor de até 60% dos investimentos, desde que comprovadamente realizados e auditados pela Prefeitura.

Tais certificados podem ser cedidos pelo investidor a terceiros, que por sua vez os utilizarão para pagamento de ISS e IPTU por eles devidos ao Município. [03]

Quanto à constitucionalidade/legalidade da concessão de todos esses incentivos fiscais por parte da União, Estados e Municípios, entendo não haver qualquer forma de irregularidade, pois eles estão auxiliando no desenvolvimento nacional equilibrado, assim como no desenvolvimento urbano, incentivando a atividade econômica, além de fomentar práticas esportivas, tudo isso sem ferir o princípio da isonomia assegurado constitucionalmente.

Portanto, resta evidente que os benefícios fiscais e financeiros que se pretende conceder para a construção do "Estádio Vicente Matheus Bathe" / "Arena Itaquera" não têm como finalidade beneficiar o Sport Club Corinthians Paulista ou determinada construtora, mas sim a sociedade brasileira como um todo, tendo-se em vista os investimento em infra-estrutura e a geração de empregos, que serão sentidos no dia-a-dia dos cidadãos brasileiros por muitos e muitos anos.

"Salve o Corinthians"!


Notas

  1. http://www.escobaradvocacia.com.br/biblioteca/artigoDetalhe.php?artigoId=66
  2. http://www.copa2014.org.br/noticias/3297/ASPECTOS+TRIBUTARIOS+DA+COPA+DO+MUNDO+E+JOGOS+OLIMPICOS.html
  3. http://www.corinthians.com.br/portal/noticias/2011/06/21/10h18-id12121-o+estadio+de+itaquera++esclarecendo+os+fatos+.shtml
Assuntos relacionados
Sobre o autor
Carlos Eduardo Ortega

Advogado. Especializando em Direito Processual Civil Contemporâneo na Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ORTEGA, Carlos Eduardo. Corinthians, incentivos fiscais e financeiros e Copa do Mundo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2920, 30 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19447. Acesso em: 25 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos