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A Súmula Vinculante nº 9 diante da nova redação do artigo 127 da Lei de Execuções Penais (LEP) dada pela Lei nº 12.433/11

Leia nesta página:

1. Introdução: A Lei 12. 433/2011

A Lei nº 12.433, de 29 de junho de 2011, alterou a Lei de Execuções Penais (LEP) para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho.

O artigo 2º da lei estabelece que ela entrará em vigor na data de sua publicação (29 de junho de 2011); logo, nos termos do artigo 8º da Lei Complementar 95/1998, as modificações passam a ser vigentes a partir do dia 30 de junho de 2011.

Em síntese, as modificações introduzidas foram: regulamentação detalhada da remição pelo estudo (artigo 126); imposição de regras referentes a perda dos dias remidos (artigo 127); e estabelecimento de que o tempo remido será computado como pena cumprida para todos os efeitos (artigo 128).

Há tempos a comunidade jurídica reclamava sobre a possibilidade de remição pelo estudo. Neste anseio, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula de n.º 341, de 27/06/2007 (publicada dia 13/08/2007), com a seguinte redação: "A freqüência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semi-aberto."

Esta lei, então, veio positivar aquilo que a jurisprudência já havia reconhecido: a remição pelo estudo. Mas a lei foi mais longe e disciplinou de modo mais detalhado essa possibilidade.

Mas o que nos cabe aqui é investigar as consequências que a nova redação dada ao artigo 127 traz ao que dispõe a Súmula Vinculante n.º 9 do Supremo Tribunal Federal. Vamos seguir com essa missão.


2. O Instituto da Remição:

Para entendermos o que prevê o artigo 127 (perda dos dias remidos), temos que saber o que se trata o instituto da "remição" prevista na LEP, artigo 126.

Frisamos, de início, que se trata de remição com "ç" (com cedilha sob a letra 'cê'), logo tem o sentido de resgate.

Segundo ANDREUCCI, remição "é um direito do condenado, que pode reduzir, pelo trabalho no interior do sistema prisional, o tempo de duração da pena privativa de liberdade cumprida em regime fechado ou semiaberto". [01]

Apenas acrescentamos ao conceito, de modo a atualizá-lo com a nova redação do artigo 126 da LEP, que a remição pode ser também pelo estudo.

Assim, preenchidos os requisitos legais poderá o condenado reduzir o tempo de duração da pena privativa de liberdade nas proporções de: 1 (um dia) de pena a cada 12 (doze) horas de freqüência escolar, e de 1 (um) dia de pena a cada (três) dias de trabalho.


3. A Súmula Vinculante n.º 9 diante da nova redação do artigo 127 da LEP:

A antiga redação do artigo 127 da LEP previa a regra segundo a qual o condenado perderia o direito ao tempo remido caso cometesse falta grave.

Ou seja, trata-se da possibilidade da perda do direito à remição. Ainda em outras palavras, a perda do direito de remir de sua pena privativa de liberdade os dias que conquistou com o seu merecimento, pelo trabalho ou pelo estudo, em razão do cometimento de falta grave.

Lembremos que as faltas graves estão previstas no artigo 50 da LEP.

Como vimos, o condenado com o seu trabalhado (ou, atualmente, também a frequência escolar) tem direito à remição da pena, então, algumas vozes da doutrina passaram a defender a tese segundo a qual o condenado tinha direito adquirido sobre os dias já reconhecidos. Nas palavras de NUCCI: "(...) uma vez reconhecida a remição de parte da pena, cometida a falta grave não se poderia perder o que já foi conquistado (...)" [02]

Ao argumentarem se tratar de direito adquirido do preso, concluíam que essa possibilidade de perda afrontava a artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal ("a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada") e feriria, ainda, o princípio da individualização da pena.

Contudo, esse entendimento foi rechaçado pelo Supremo Tribunal Federal. Ilustra bem essa passagem o Habeas Corpus n.º 94.667/RS, de relatoria do Min. JOAQUIM BARBOSA, de 28/09/2010, cuja ementa é:

Habeas Corpus. Execução penal. Falta grave. Reinício da contagem do prazo para a obtenção de benefícios executórios. Consequência do art. 127 da Lei de Execuções Penais. Súmula Vinculante nº 09 desta Corte. Ordem denegada. É entendimento reiterado desta Corte que o cometimento de falta grave durante o cumprimento de pena privativa de liberdade implica a perda dos dias remidos e a necessidade de reinício da contagem do prazo para obtenção de benefícios executórios, sem que isso signifique violação a qualquer direito adquirido ou garantia constitucional. Ordem denegada. (grifo nosso)

Diante das reiteradas decisões, o STF editou a Súmula Vinculante n.º 9 fixando de vez o entendimento segundo o qual o citado artigo 127 estava em sintonia com a Constituição de 1988.

Mas a referida súmula continua, e completa: não se aplicando o limite temporal de 30 (trinta) dias – previsto para os casos de isolamento, suspensão e restrição de direitos do condenado (artigo 58 da LEP) – para a perda do direito ao tempo remido. Ou seja, tal perda não estava submetida a nenhum limite temporal.

É o texto da referida súmula:

"O disposto no artigo 127 da Lei 7.210/84 foi recebido pela ordem constitucional vigente e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58".

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Já a nova redação, contudo, do artigo 127 da LEP, estabelece que em caso de falta grave o tempo a ser perdido (ou revogado como diz a nova redação) pode ser de até 1/3 (um terço) do tempo remido.

Vamos então fragmentar as regras contidas no enunciado da Súmula Vinculante n.º 9, são elas: (a) é constitucional a possibilidade de perda do direito ao tempo remido; (b) bem como, é constitucional a previsão de perda total do direito ao tempo remido; e (c) não é aplicável o limite de 30 (trinta) dias referente aos casos de isolamento, suspensão e restrição de direitos do condenado.

Fixadas essas três regras, podemos enfrentar a questão.

Com a nova redação do artigo 127 da LEP as duas últimas regras estão superadas, pois: a LEP não prevê mais a perda total dos dias remidos, logo, essa regra perdeu sua razão de ser (b); e o limite agora é de 1/3 (um terço) do direito ao tempo remido (c).

Assim, apenas a primeira regra ainda se impõe, de modo que, é possível – é constitucional – a perda do direito ao tempo remido em razão de falta grave, mas desde que se observe o limite agora expressamente estabelecido pela Lei 12.433/2011, qual seja, o limite de 1/3 (um terço).

Podemos então afirmar que houve no caso o chamado overriding, que é uma superação parcial do enunciado da súmula. Não se podendo falar em overruling que é a superação/cancelamento total.

Nesse sentido leciona DIDIER:

"Há overriding quando o tribunal apenas limita o âmbito de incidência de um precedente, em função da superveniência de uma regra ou princípio legal. No overriding, portanto, não há superação total do precedente, mas apenas uma superação parcial. É uma espécie de revogação parcial". [03]

DIDIER afirma que o overruling e o overriding são técnicas de superação de precedentes, o primeiro pela superação (ou substituição) total do precedente, e o segundo superação parcial.

O mesma autor ensina ainda que a teoria dos precedentes judiciais é aplicada no Brasil, sendo que os precedentes podem exercer três tipos de efeitos: vinculante (ou obrigatório); obstativo de revisão das decisões (por exemplo, artigo 475, § 3º do CPC); ou simplesmente persuasivo.

Assim, diante desse quadro passa ser importante para a doutrina nacional o estudo dos institutos do overrule e também do distinguishing como formas de superação dos precedentes com força vinculante.

Com isso, concluímos: a nova redação do artigo 127 da LEP apenas diminuiu o alcance da Súmula Vinculante n.º 9, permanecendo a incidir somente a regra que estabelece ser constitucional a possibilidade de perda dos dias remidos, mas superadas as regras segundo as quais: é constitucional a perda total dos dias remidos, bem como não se aplica o limite de 30 (trinta) dias do artigo 58 da LEP, havendo, assim, o chamado overriding.


Notas

  1. ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação Penal Especial. 7ª ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p. 330.
  2. NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 3ª ed., São Paulo: RT, 2008, p. 511.

03.DIDIER JR., Fredie. Curso de Processo Civil: teoria da prova direito probatório, teoria do precedente judicial, decisão judicial, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela. Vol. 2, 5ª edição, Salvador: JusPodivum, 2010, p. 397.

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Sobre o autor
José Ourismar Barros de Oliveira

Professor, especilista em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, José Ourismar Barros. A Súmula Vinculante nº 9 diante da nova redação do artigo 127 da Lei de Execuções Penais (LEP) dada pela Lei nº 12.433/11. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2945, 25 jul. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19624. Acesso em: 23 nov. 2024.

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