A possibilidade da responsabilização criminal dos infratores
Não é despiciendo, ainda, lembrar que além das penalidades administrativas (multas, embargos, etc.) que podem ser aplicadas aos infratores em face do indevido lançamento dos resíduos acima tratados, também é cabível a sua responsabilização criminal quando correlacionado o efetivo risco à saúde decorrente da disposição inadequada.
De fato, em casos extremos, os infratores podem ser responsabilizados criminalmente com base nas disposições dos artigos 132 (Crime de Perigo para a vida ou saúde de outrem) e 268 (Infração de medida sanitária preventiva), tipificados no Código Penal brasileiro, com seguinte teor:
"Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente: Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave".
"Art. 268 - Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa: Pena - detenção, de um mês a um ano, e multa".
Para tal, os agentes fiscais de meio ambiente, de posturas ou sanitários, constatando a existência de vestígios de larvas, reservatórios, insetos ou outros agentes patogênicos capazes de provocar danos à saúde humana nos resíduos indevidamente lançados, verificando a inércia dos responsáveis em promover as ações de limpeza determinadas em notificação para sanear o problema devem acionar a Polícia e a Perícia oficial para a materialização das provas do ilícito, de modo a viabilizar a persecução penal em Juízo.
Considerações finais
Conforme se observa, a inércia dos municípios em cumprir suas competências locais de organizar, implementar e fiscalizar adequadamente as atividades privadas e serviços públicos que guardam relação com limpeza da cidade contribui significativamente para a proliferação de depósitos inadequados de resíduos sólidos e constitui séria deficiência no manejo ambiental imprescindível à prevenção da saúde pública, favorecendo a multiplicação de casos doenças infecciosas e zoonoses.
Pouca eficácia haverá no combate às infestações se não houver um total entrosamento das ações específicas de vigilância em saúde com ações preventivas e corretivas de manejo ambiental, ou seja, a associação dos esforços dos agentes municipais no controle da poluição por resíduos sólidos com foco na prevenção de doenças.
Na esteira das disposições da nova Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010), um sistema de coleta e destinação de resíduos sólidos eficiente perpassa pela profissionalização da gestão dos resíduos sólidos nos municípios, com a implantação da coleta seletiva, incentivos às associações e cooperativas de catadores, implantação de eco pontos bem distribuídos pelas cidades para a disposição de resíduos de pequenos geradores (construção civil e galhadas), além de um rígido controle dos grandes geradores e transportadores.
Como se vê, quando mais precária a gestão municipal de resíduos sólidos, em função da ineficiência dos órgãos encarregados da execução e controle da limpeza pública e da disposição de resíduos em locais inadequados, maiores dificuldades haverão para que tenha sucesso nas ações de prevenção dos riscos à saúde por doenças infecciosas e zoonoses associadas ao manejo ambiental.
A realização de ações conjuntas pelos órgãos encarregados da proteção ambiental e de prevenção à saúde são imprescindíveis para a redução dos riscos à saúde da população decorrentes do inadequado manejo ambiental de resíduos sólidos no âmbito local.
Dentre outras medidas, deve ser implantado pelos Municípios um sistema permanente de fiscalização em toda a cidade, com foco nas pessoas físicas e jurídicas responsáveis, associado a um serviço de disque-denúncia e campanhas educativas alertando a população sobre os riscos à saúde associados, para coibir o lançamento indevido dos resíduos sólidos de construção civil, galhadas e restos de podas e quaisquer outros, indevidamente depositados em logradouros, passeios e áreas públicas, aplicando-se aos infratores as penalidades administrativas correspondentes.
Outro aspecto, que pode colaborar sensivelmente com a redução do problema, é a regulamentação dos serviços de transporte de resíduos, com o cadastramento das pessoas jurídicas e físicas (autônomos) formalmente autorizadas a fazê-lo, bem como dos veículos a serem utilizados e locais de destinação, possibilitando o efetivo controle da atividade pelo Poder Público municipal.
Por fim, para as situações em que não se possa responsabilizar diretamente o agente da disposição inadequada dos resíduos, deve o Município manter um serviço de rotina de limpeza destes pontos de lançamento, evitando assim a acumulação de mais resíduos nestes locais, que georreferenciados devem ser objeto de regular monitoramento pela fiscalização, como medida também coibidora da prática indevida.
Como se viu, são inúmeros os instrumentos legais postos à disposição das autoridades municipais para o tratamento da disposição inadequada de resíduos em seu território. São necessárias, portanto, a efetiva tomada de medidas concretas para o controle do indevido lançamento de resíduos sólidos pela cidade, via de ações fiscalizatórias, de monitoramento e de limpeza dos pontos de lançamento, aliadas à conscientização da população sobre seu papel na colaboração com as estratégias e políticas públicas de prevenção dos riscos à saúde associados ao manejo ambiental do lixo gerado.
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