Apesar do aprofundamento nos debates e da crescente pressão para a adoção das boas práticas de governança empresarial, o Brasil ainda se caracteriza como um país em que tais práticas são adotadas, sobretudo, por empresas listadas em bolsa (ou seja, por S.A.s de capital aberto, a exemplo de Gerdau, Saraiva e Natura) e, mesmo assim, ainda existe uma alta concentração do controle acionário, baixa efetividade dos conselhos de administração e alta sobreposição entre propriedade e gestão. Isso demonstra existir um vasto campo para o incentivo ao conhecimento, ações e divulgação dos preceitos da governança empresarial tanto para as companhias de capital aberto quanto para todos os demais tipos de sociedades.
Contudo, poucos empresários brasileiros sabem que a Governança Empresarial não se limita às sociedades listadas em bolsa. A justificativa para isso é que o Brasil ainda enfrenta um grave problema cultural: os empresários tratam suas empresas como sendo unicamente suas, achando que inexiste a necessidade de introdução de métodos de gestão calcados na transparência de seus negócios.
Esse equivocado pensamento egocêntrico-feudal – "a empresa sou eu" – afasta parcerias nacionais e internacionais, pois em não sendo a empresa transparente, torna-se difícil medir o risco do negócio.
Aliado a isso, está o fato de, no Brasil, também se cultuar o mito da "esperteza alicerçada na informalidade", ou seja, da atuação empresarial à margem da lei, sendo comum que os empresários utilizem a velha desculpa de que a alta carga tributária, atualmente na casa dos 35,13% do PIB[1], é empecilho ao sucesso de seus negócios e, por isso, existiria uma suposta necessidade de sonegação tributária. Esse equivocado paradigma vem sendo, ano a ano, quebrado pelo próprio fisco que, com o incremento e desenvolvimento de técnicas de fiscalização, a exemplo da substituição tributária e inserção de obrigações acessórias eletrônicas (nota fiscal eletrônica, SPED etc.), diminuiu os índices de sonegação fiscal e, nem por isso, houve um aumento no número de empresas decretando falência ou requerendo recuperação judicial.
A sonegação, ademais, é antagônica à eficiência empresarial, pois inibe ferramentas de controles financeiros, de estoques, de recebíveis e patrimoniais.
Na outra ponta do equivocado mito empresarial de que "minha empresa não sobreviverá se deixar de sonegar tributos", encontra-se a atual exigência de padrões legais de eficiência empresarial, verificando-se que a padronização das demonstrações financeiras aos modelos internacionais tem contribuído para a melhora da gestão empresarial. Interessante notar, nesse ponto, que, com relação específica ao tratamento das questões contábeis, o governo brasileiro instituiu a obrigatoriedade da adoção do padrão internacional das normas contábeis a todos os tipos societários, por meio da edição das Leis 11.638/2007 e 11.941/2009, que alteraram substancialmente a Lei 6.404/76 (Lei das S.A.), como forma de forçar as sociedades brasileiras a introduzirem práticas de governança empresarial. Tal padronização tem por finalidade garantir a transparência das demonstrações financeiras das sociedades brasileiras, tal como feito em nível internacional por meio da utilização das IFRS – International Financial Reporting Standards. Contudo, ainda são poucas as empresas que já se adaptaram a essa nova padronização, a qual, no universo das pequenas e médias empresas ainda é escassamente explorada, senão totalmente desconhecida, ainda que obrigatória.
As questões tributárias também merecem especial tratamento no âmbito da governança. Ressalta-se, assim, a existência da governança tributária, que nada mais é do que o conceito de governança empresarial aplicado a todos os assuntos de ordem tributária, visando a coordenação, controle e revisão de todos os procedimentos tributários, inclusive os de natureza elisiva (planejamentos tributários), adotados pela sociedade, de forma a garantir sua transparência e reduzir os riscos fiscais do negócio.[2] Pode ser ainda citada a governança sócio-ambiental como uma outra importante faceta da governança empresarial, mas no que diz respeito aos procedimentos relativos à responsabilidade social e ambiental (compreendendo-se a prestação de contas aos funcionários, à mídia, ao governo, ao setor não-governamental e ambiental e às comunidades com quem a empresa opera).
Verifica-se, assim, ser muito importante que haja uma ruptura aos antigos – mas ainda existentes – mitos empresariais calcados na falta de transparência e ética nos negócios. O empresário brasileiro deve passar a sempre ter em mente a clara distinção entre custo, despesa, investimento e "DJF" – ou seja, "Dinheiro Jogado Fora" –, pois supostas "economias" de valores, propiciadas pela informalidade e sonegação mostram-se extremamente caras quando comparadas aos resultados primordiais de excelência que devem ser buscados por qualquer empresa: organização, retorno no investimento, maximização de lucros e diminuição de riscos.
Ademais, considerando-se o bom cenário econômico brasileiro atual, bem como a promessa de um maior crescimento sócio-econômico do país nos próximos anos, é importante que haja um rompimento em definitivo com os antigos mitos empresariais, aqui referidos, para que a governança empresarial entre em definitivo na pauta do empresariado, em especial do pequeno e do médio empresário que almeje expandir seus negócios, inclusive para o exterior.
Conclui-se, portanto, que o tema governança empresarial é de especial importância para as empresas brasileiras, principalmente para aquelas que almejam crescimento contínuo, já que, quando se tratam de investidores ou potenciais parceiros para tais sociedades – sejam brasileiros, sejam estrangeiros –, eles sempre focarão em empresas, especialmente as de pequeno e médio porte, com alto valor agregado, que tenham os melhores níveis de governança empresarial, nela compreendidas as governanças: jurídica, tributária e sócio-ambiental.
Notas
[1] Conforme http://www.ibpt.com.br/home/publicacao.view.php?publicacao_id=13983&PHPSESSID= d99f43de7a67c6102f3dbd330f484a2a, acesso em 05 de junho de 2011.
[2] Maiores explicações acerca da Governança Tributária, seus princípios e práticas podem ser encontrados em AMARAL VIGGIANO, Letícia Mary Fernandes do. Governança Tributária: princípios e prática. Direito Tributário Atual, v. 22, p. 258-266,
2008, bem como na Revista Governança Tributária, edição comemorativa aos 19 anos do IBPT – Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, 2011, disponível em http://www.governancatributaria.com.br/, acesso em 27/06/2011.