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Liberdade sindical e a taxa negocial

12/12/2011 às 15:12
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Se é contestável a legalidade da imposição de contribuições aos empregados não associados ao sindicato da categoria, o que dizer das contribuições exigidas de entidade patronal, que sequer é representada pela entidade sindical?

A liberdade sindical é instituto tido em todo mundo não só como direito fundamental, mas consagrada como liberdade pública e de direitos humanos.

Não foi por outro motivo que a Constituição Federal de 1988 tratou de consagrar em seu art. 8º a liberdade sindical, vedando inclusive a ingerência do Estado na criação, organização ou direção dos Sindicatos, ressalvando apenas o registro no órgão competente.

No âmbito mundial, a Organização Internacional do Trabalho debateu intensamente o assunto, resultando na edição da Convenção nº 87, que consagra em seu bojo a ampla liberdade sindical, entendendo-se esta como a liberdade de os trabalhadores e entidades patronais constituírem organizações de sua escolha, independente de autorização prévia, elaborar seus estatutos e regulamentos, eleger seus representantes e ainda de filiarem-se ou optarem por não se filiarem a tais organizações.

Observa-se que a questão da liberdade sindical é tratada classicamente como o direito de trabalhadores e entidades patronais criarem, organizarem e filiarem-se ou não a associações de classe. Entretanto, este é uma faceta da questão, mas não a única.

De fato, a liberdade sindical passa necessariamente também pelo campo dos atos anti-sindicais e sob esse enfoque também deve ser estudada.

Nas palavras do professor Roberto Parahyba de Arruda Pinto: "A liberdade sindical e a proteção contra atos anti-sindicais são conceitos interdependentes, sendo impossível compreender um sem considerar o outro. Mais do que isso, sem a efetiva proteção dos atos anti-sindicais, por meio de mecanismos eficazes, a liberdade sindical redunda em letra morta. Não basta a mera proclamação formal ou solene de direitos. É fundamental assegurar sua efetiva aplicação prática [01]".

Garantir, que os trabalhadores possam se organizar livremente em associações sindicais, sem contudo impedir que estes sofram atitudes que indiretamente interfiram em suas associações é conceder aos trabalhadores liberdade apenas aparente, limitada. A liberdade sindical plena só é alcançada ao se garantir, concomitantemente ao direito de livre associação, que as organizações sindicais não sofram com atitudes anti-sindicais, mesmo estando tais atos disfarçados sob o a forma de outros institutos, legais ou ilegais.

Nesse sentido são as palavras de Oscar Ermida Uriarte: "o sistema de proteção da atividade sindical em seu conjunto não é outra coisa, definitivamente, senão a ‘redução’ ou ‘concreação’ da noção abstrata da liberdade sindical ao meio concreto e real em que deve ser exercida". [02]

No panorama do direito sindical brasileiro atual, podemos observar que os atos anti-sindicais se manifestam não somente da parte do empregador em relação ao empregado, mas também através da interferência do Estado em relação ao direito de livre associação do trabalhador e até mesmo por meio de atitudes anti-sindicais provenientes do próprio ente sindical em relação aos trabalhadores da categoria que representa.

Com relação à primeira modalidade, atitudes anti-sindicais do empregador em relação aos empregados, não há necessidade de se aprofundar muito, uma vez que o tema é bastante conhecido e estudado. Não é segredo para ninguém que muitas vezes os empregadores muitas vezes dificultam a associação sindical de seus funcionários, através de ameaça de represálias, perseguições e atitudes afim.

Inclusive, a legislação trabalhista tratou de assegurar aos dirigentes sindicais o livre exercício do mister, conferindo garantia de emprego aos funcionários eleitos para dirigir a entidade sindical, desde o registro da candidatura até um ano após o término do mandato. Tal garantia, apesar de ter caráter pessoal, em última análise garante também um interesse coletivo, qual seja, o da liberdade de atuação da entidade sindical. Nesse ponto, há proibição expressa, no art. 543, § 6º da CLT que a empresa procure impedir que o empregado exerça seu direito de livre associação.

Pode-se também cogitar que o modelo sindical eleito no Brasil também afronta a liberdade sindical. O fato de a legislação brasileira vedar a criação de mais de um sindicato da mesma categoria na mesma base territorial e prever a contribuição sindical compulsória pode ser reputado como afronta à liberdade sindical, ainda que prevista em lei.

De fato, pelo modelo sindical escolhido pelo Brasil, a liberdade sindical não é totalmente plena, uma vez que o trabalhador não pode escolher o Sindicato ao qual irá se filiar, já que em sua base territorial, fatalmente terá apenas um Sindicato que poderá representá-lo. Não tem o trabalhador oportunidade de escolher a entidade sindical por afinidade, atuação ou outros critérios. A única escolha possível é se irá ou não se filiar à entidade sindical atuante em sua base territorial.

Também pode ser considerada como ato anti-sindical a contribuição sindical compulsória, obrigatória mesmo para os trabalhadores que não são associados ao Sindicato. Tal contribuição é prevista na legislação, sendo portanto legal. O que não significa que é legítima. A contribuição compulsória limita a possibilidade de o empregado escolher se quer ou não apoiar financeiramente a entidade sindical, o que não deixa de ser uma forma de associação. E tal afronta à liberdade sindical é promovida pelo próprio Estado.

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Por último, há ainda as atitudes que podem ser consideradas como anti-sindicais que são exercidas pelo próprio Sindicato em relação à categoria que representa. Me refiro às contribuições confederativas, assistenciais e afins, que as entidades sindicais insistentemente criam e impõem a todos os trabalhadores da categoria, quando o correto seria instituir apenas para os trabalhadores filiados ao Sindicato. Pelo mesmo motivo exposto anteriormente, a imposição de contribuições a trabalhadores não filiados nitidamente afronta a liberdade sindical.

Entretanto, observamos nos dias atuais uma nova modalidade de atitude anti-sindical: a do Sindicato que se subordina financeiramente ao empregador, através da estipulação da chamada "taxa negocial".

Não estamos tratando aqui da hipótese de entidades Sindicais destinadas a tutelar interesse dos trabalhadores, mas que não verdade foram criadas e são controladas por estes, em flagrante fraude.

Trata-se na verdade de entidades sindicais que, embora seja regular e legitimamente constituída, resolve se submeter à entidade patronal através do recebimento de recursos financeiros pagos por este.

Quando se fala em liberdade sindical, não se fala apenas em liberdade de constituição, organização e direção. Liberdade também significa independência. Vale dizer que a entidade sindical deve zelar pela sua independência em relação aos interesses patronais. E pergunta-se: que independência pode existir quando uma entidade é parcialmente sustentada pela parte contrária?

Pelo modelo sindical originariamente planejado, os sindicatos seriam sustentados pela contribuição sindical compulsória e pelas mensalidades pagas por seus associados.

Não obstante, os sindicatos passaram a impor contribuições indiscriminadamente, a associados ou não, designadas pelos mais variados nomes: confederativa, assistencial, negocial, etc.

Porém, em mais um arroubo arrecadatório, passou-se a instituir contribuições devidas também pela entidade patronal.

Ora, se é contestável a legalidade da imposição de contribuições aos empregados não associados ao sindicato da categoria, o que dizer sobre as contribuições exigidas de entidade patronal, que sequer é representada pela entidade sindical?

Tal situação, que contamina a legitimidade da atuação do ente sindical, vem se alastrando no meio sindical brasileiro, a ponto de o Ministério Público do Trabalho ter criado comissão específica para combater tal prática.

A Justiça Trabalhista também vem se manifestando contrariamente à taxa negocial, sendo que decisões proibitivas já foram emanadas pela Justiça do Trabalho de Botucatu, Araraquara, Porto Ferreira, dentre outras.

E não poderia ser diferente. A dependência financeira gerada pela taxa negocial põe em risco a atuação independente do Sindicato, criando a possibilidade de os empregadores manipularem a entidade sindical ainda que de forma indireta, em completo desrespeito à Convenção nº 98 da OIT, ratificada pelo Brasil.

Somente a independência total, sem qualquer vínculo com a parte contrária, pode garantir que o Sindicato dos empregados negociem com isenção, defendendo apenas os interesses dos trabalhadores.

Dessa forma, conclui-se ser imperioso combater a prática da instituição da chamada "taxa negocial", que cria dependência financeira do Sindicato dos trabalhadores com as entidades empregadoras, contaminando a lisura das negociações e da atuação do Sindicato, afrontando a liberdade sindical, abarcada pelo Brasil através do art. 8º da Constituição Federal e da ratificação da Convenção nº 98 da OIT.


Notas

  1. "Pela aprovação da Convenção nº 87 da OIT, pelo congresso Nacional, nos termos do artigo 5º, 3º, da Constituição Federal.", Revista do Advogado, Ano XXVIII, nº 97, Maio de 2008, p. 185.
  2. "Visão histórica da liberdade sindical", Revista LTR, março de 2006, p. 366.
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Sobre o autor
Eduardo Barbosa Sebenelli

Advogado. Graduado pela Faculdade de Direito de Itu. Especialista em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SEBENELLI, Eduardo Barbosa. Liberdade sindical e a taxa negocial . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3085, 12 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20644. Acesso em: 2 nov. 2024.

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