RESUMO: com o intuito de ampliar o diálogo em torno das implicações jurídicas do tráfico de seres humanos no Direito Penal e na Disciplina Internacional, seja para venda ilegal de órgãos ou, principalmente, para a prostituição internacional, este artigo científico aborda diversas questões teóricas acerca da prostituição como fenômeno social e jurídico no Direito Comparado, indica casos concretos em que se violam flagrantemente as normas internacionais na prática literal de sequestro para fins de escravidão sexual em outros países, e apresenta possíveis soluções para tão lamentável problemática.
Palavras-Chave: Direito, Prostituição, Internacional, Penal, Crime.
RESUME: with the view to intensified the dialogue in the judicial implications of the human being traffic in the Criminal Law and International Discipline, for illegal sell of human parts or, especially, for international prostitution, this scientific article presents many theoretical questions above the prostitution as a social and judicial phenomenon in Comparative Law, indicates real cases when the violation of international law is clearly seen, in the literal practice of kidnap for sexual slavery in another countries, and also presents possible solutions for such lamentable problem.
Key Words: Law, Prostitution, International, Criminal, Crime.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho científico elencou como matéria principal assunto de extrema relevância na Sociedade Internacional Contemporânea, que desperta rico interesse entre as autoridades doutrinárias, os órgãos de segurança e a Função Judiciária. Sua temática diz respeito à questão do Tráfico Internacional de Seres Humanos, com especial ênfase na problemática da exploração internacional da prostituição e escravidão sexual. Este estudo possuirá como base fontes históricas, entrevistas escolhidas através de pesquisa em meios de informação e mídia de massa (mass media), e se norteará pela disciplina do Direito Internacional (notadamente o DIP), fonte sempre utilizada tanto para fundamentar a apresentação de legislação específica envolvendo o tráfico ilegal de seres humanos, quanto para desenvolver a abordagem da situação jurídica dos indivíduos submetidos ao regime de escravidão por dívidas no mercado do sexo e propor sanções a serem aplicadas aos praticantes de tão horrendo delito.
O estudo se iniciará com uma pequena reminiscência histórica acerca da temática da escravidão e do tráfico internacional de seres humanos, na qual serão destacados os fundamentos sociológicos para tal espécie deformada de relacionamento humano, e também onde serão abordadas as subdivisões do tráfico ilegal de pessoas. Desde a Antiguidade até a atualidade, narraremos uma breve história da escravidão, este terrível mal que aflige parcela da sociedade humana.
Após, iniciaremos a abordagem do específico ponto de nosso trabalho: a exploração da prostituição alheia, ou Rufianismo. Serão fundamentadas preliminares noções sobre o desenvolvimento da exploração da prostituição no cenário internacional, destacando-se as três principais posições adotadas pelos países em matéria legislativa acerca do tema.
Também serão descritos os métodos utilizados pelos aliciadores do tráfico internacional de pessoas no recrutamento de suas vítimas, dentro da realidade brasileira. Mostraremos alguns dos mais significativos focos geográficos da prática deste crime no Brasil, onde são recrutadas mulheres pretensamente para trabalharem como garçonetes ou atendentes de casas noturnas no exterior, as quais são ludibriadas para acreditar nessa versão, quando na verdade estão sendo iniciadas em um processo de escravidão por dívidas, e se transformarão nas mais novas vítimas do tráfico internacional de seres humanos.
Logo após, abordaremos a situação jurídica do “escravo moderno” frente aos seus recrutadores, ao Estado onde se encontra, ao seu país de origem e quais são as atitudes que a vítima de escravidão por dívidas deve tomar a fim de se desvencilhar do mal que a persegue, qual seja, os chefões do tráfico internacional de pessoas. Muitas das vítimas acreditam piamente que, caso paguem a quantia que devem, serão libertadas; ou que, caso tentem fugir, mesmo que escapem dos capangas do rufião internacional, serão presas pelas autoridades do Estado em que se encontram, por não possuírem passaporte ou documentos que as identifiquem (pois estes são detidos pela quadrilha de traficantes). Será provada a esta parte do estudo que esses pensamentos são errôneos do ponto de vista do Direito Internacional Público, e que as vítimas estarão muito mais protegidas e seus direitos fundamentais resguardados caso fujam de seu cárcere com vida.
Depois de discorrer sobre a situação jurídica da vítima do tráfico internacional de seres humanos, explicaremos uma série de medidas sancionadoras que já existem para punir os praticantes do crime de tráfico de pessoas, além de propor soluções para a problemática analisada, em todas as suas esferas e especificamente no que tange à exploração internacional da prostituição através do recrutamento de “escravos sexuais”. Segundo nossas concepções, com medidas de conscientização das famílias de baixo nível socioeconômico nas áreas de recrutamento (como o estado do Pará, por exemplo), intensa fiscalização nos aeroportos e fronteiras internacionais no Brasil e uma política de repressão aos indivíduos que cometem o delito do tráfico ilegal de seres humanos com a celebração de acordos e tratados multilaterais com os demais Estados da Sociedade Internacional, poderá ser possível em médio prazo uma reversão do atual e crítico cenário da prática desse desprezível crime.
Por fim, concluiremos o trabalho com um resumo de nossas ideias, demonstrando de que forma podemos combater o tráfico internacional de pessoas, através do auxílio do Estado e da sociedade civil. Temos em mente que este é um antigo fenômeno, existente em várias partes do mundo e em diferentes sociedades. Desde os primórdios da história humana a escravidão assombra a mente dos estadistas mais sensíveis à promoção dos Direitos e Garantias Fundamentais (estabelecidos pelo artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil - CRFB). Entretanto, é hora de empreender maiores esforços e agir mais frente a essa horrenda prática, e pôr efetividade no texto constitucional através de uma política de celebração de tratados com os Estados que recepcionam (infelizmente) as vítimas do tráfico internacional de seres humanos. Provaremos que a união de esforços entre os vários países da sociedade internacional constitui-se em atitude fundamental para desestabilizar as quadrilhas organizadas que atuam na execução desse crime que vai diretamente de encontro com os primordiais valores estabelecidos na Constituição Brasileira de 1988, e nos diversos tratados celebrados perante a Organização das Nações Unidas (ONU).
O tráfico de pessoas é a terceira espécie mais rentável do planeta, apenas sucumbindo para o tráfico de drogas e de armas. Entretanto, de longe é o mais rentável, uma vez que a mercadoria comercializada nesse tipo de negócio escuso é utilizada ininterruptamente, até seu colapso total (e, como estamos discorrendo sobre seres humanos, considera-se para isso sua morte ou loucura). O grande transtorno decorrente dessa lamentável prática se constitui no Direito Internacional Público em instabilidade nas relações políticas entre dois Estados: onde se encontram os criminosos e no qual nasceram e foram capturadas as vítimas. Logo, o assunto em análise possui extrema importância nos campos institucional, político, jurídico, acadêmico e social, e atualmente encontra-se em voga em diversos meios midiáticos, sendo desmerecidamente ignorados pelas obras e pesquisas desenvolvidas por estudiosos do Direito, muito mais pelo preconceito e subestimação existentes no tema da prostituição e do tráfico de órgãos em países “subdesenvolvidos” (nomenclatura atualmente incorreta, mas adequada para a exposição em questão) do que por uma falta de relevantes resultados nas pesquisas sobre tal temática, os quais, pelo contrário, são latentes e extremamente significativos.
2. O FENÕMENO DO TRÁFICO DE SERES HUMANOS: NOTÍCIA HISTÓRICA
Antes de uma análise histórica do fenômeno do tráfico de seres humanos, são necessárias algumas remissões a doutrinadores de diversos campos do saber humano para nos indicar o que leva determinados grupos de homens a buscar obter lucros financeiros com a exploração dos corpos alheios, sob diferentes matizes. Michel Foucault, em sua clássica obra “O Sujeito e o Poder”, nos descreve que em todos os agrupamentos humanos existem relações de poder entre os indivíduos que os compõem, de diversas formas: desde a organização militar de uma civilização até mesmo a organização profissional de uma empresa atual, verificamos diferentes e intrincadas relações de poder entre as pessoas. Podemos, de forma rudimentar mas plausível, transferir estas relações de poder para as organizações criminosas e mesmo suas vítimas, em alguns casos. No que tange ao tráfico de órgãos humanos, os grupos criminosos valem-se da situação financeira de suas vítimas para retirar-lhes ilegalmente os órgãos com o intuito de revendê-los a uma coletividade de indivíduos que possui poder aquisitivo superior para adquirir a ilícita mercadoria. Nas relações de meretrício, isso se estabelece de forma mais intensa: a prostituta sente-se aprisionada e submetida ao rufião, que em muitos casos (notadamente nos que envolvem o tráfico internacional de mulheres), detém poder sobre sua vida ou morte, caso tente escapar da casa de prostituição onde se encontra encarcerada. Muitas vezes, mesmo na prática interna a cada país de tal crime, mulheres prostituem-se e oferecem parcela de sua renda para os rufiões de forma voluntária, uma vez que acreditam ter a “proteção” do agente.
De forma semelhante, verificamos nos estudos do renomado Francisco Rezek[1], que os Estados da Sociedade Internacional regem-se sob três primas normativos: do Costume Internacional, da Moral Internacional e da Norma Internacional (esta personificada pelos Tratados). A Moral é vista entre os Estados de forma bastante significativa, e se constitui como elemento fundamental para um bom relacionamento entre eles. Caso um determinado país verifique que nacionais seus são especiais vítimas de grupos criminosos localizados em outro Estado, e que as autoridades deste nada realizam para impedir a ocorrência do ilícito, o relacionamento internacional entre os dois Estados poderá cessar por decorrência ao desrespeito aos preceitos de Moral Internacional, e poderá inclusive se intensificar caso haja Tratado que envolva o auxílio mútuo entre eles em setores jurídico-penais.
O tráfico de pessoas, para os mais diversos fins, é uma das práticas mais antigas da humanidade. Durante milênios, essa prática se conjugou com uma instituição basilar em diversas civilizações antigas e modernas: a escravidão. Relatos do tráfico de sudaneses para trabalhar nas obras da antiga civilização egípcia como escravos são registros que remontam há milênios, e denotam quão intrínseca é esta problemática na sociedade humana.
Por diversos motivos, a escravidão como instituição nas civilizações ocidentais teve seu término por volta do século XIX. Dentre eles, o período histórico conhecido como Revolução Industrial ofereceu novo sentido à questão da mão-de-obra. Já não era mais lucrativa a escravidão, uma vez que o trabalhador e operário livre e assalariado poderia ser bem mais produtivo que um escravo, até mesmo por se caracterizar como parcela do mercado consumidor da maioria dos produtos que ele mesmo auxiliava a desenvolver.
Entretanto, o tráfico de pessoas ainda se mantém nas civilizações contemporâneas. Por que tal anacrônico e primitivo fenômeno permanece a assombrar a sociedade humana? Ora, as atuais necessidades são outras. Algumas são motivadas pelo avanço científico da humanidade (principalmente no que tange ao tráfico de pessoas com finalidade de transplante ilegal de órgãos); no entanto, determinadas práticas que remontam à barbárie humana ainda são utilizadas como subsídio para o tráfico de pessoas (vide o tráfico de mulheres e a prostituição internacional escrava).
Embora existam casos de real escravidão moderna (no sentido de trabalhadores submetidos à condição análoga a de escravos), no âmbito do Direito Internacional esse fenômeno ainda não possui a amplitude que existe dentro do cenário interno de cada Estado. Por exemplo, é notório o regime de escravidão a que diversos trabalhadores são submetidos na região Norte do Brasil, tendo o Ministério Público do Trabalho empreendido diversas iniciativas na citada região a fim de diminuir a incidência desse crime na região (veremos mais adiante cada um dos dispositivos legais que disciplinam as sanções referentes às práticas de crimes relativos à escravidão moderna). No cenário internacional, no entanto, é mais comum o tráfico de seres humanos para atuar em outras realidades, tais como serem mortos a fim de que seus órgãos sejam retirados para venda ilegal; ou no caso de atuarem compulsoriamente na prostituição em países estrangeiros (notadamente no Leste Europeu, como veremos a seguir), em condição de escravidão e correndo riscos para sua integridade física caso tentem fugir.
No que se trata de uma notícia histórica, focaremos o fenômeno do tráfico internacional de mulheres para a prostituição escrava, ou seja, primeiramente apontaremos algumas informações referentes à prostituição como instituição social humana, e logo após retomaremos o raciocínio do crime cometido nesse cenário de mentiras e sequestros, normalmente mascarado por um regime de escravidão por dívidas entre as vítimas e o rufião.
A gênese da prostituição perde-se nos tempos, pois desde a Antiguidade eram conhecidas as práticas ritualísticas de prostituição entre a civilização da Babilônia e a prostituição hospitaleira entre povos do Oriente Médio, na qual oferecia-se uma das filhas para os forasteiros que se hospedavam na casa d’algum morador de cidade como forma de agradar a visita e mostrar hospitalidade. No entanto, os primeiros relatos sobre alienação do prazer corporal datam da antiga civilização Grega. Porné era a nomenclatura dada às escravas que se prostituíam em troca de dinheiro para seus senhores, chamados Pornoboskoi. Sabe-se que os atenienses foram os primeiros a legalizar formalmente a prática e exploração da prostituição, cobrando inclusive tributos das casas de prazer, denominados Pornokontelas. Sólon, famoso legislador ateniense, mandou construir uma casa de prazeres com o intuito de “satisfazer as necessidades do povo”.
No período de dominação do Império Romano, os Edis Curis, governantes das cidades, possuíam registros das meretrizes locais e reprimiam as que tentavam levar a vida clandestinamente. Chamavam-se, de acordo com o local onde realizavam o comércio, suas preferências e nível social: Alicariae, Casoritae, Copae, Dilatrolae, Porariae, Libtidae, Noctunigitae, Prosedae, Pregrinae, Putae, Quadrantariae, Seratiae, Scrotae, Vagae, etc. Eram obrigadas por lei a utilizar uma toga viril, com mitra e véus amarelos, para que fossem distinguidas na sociedade.
Durante o período medieval, após a queda do Império Romano Ocidental, a Igreja Católica tomou as rédeas no controle social e econômico do rufianismo, com o pretexto de resguardar esse setor da sociedade e impedir sua expansão. Foi o papa Bento IX o primeiro a construir um Lupanar (Casa de Prostituição) pontifical, administrado pelos clérigos. Conhecidos eram os conventos como casas ocultas de prazeres e locais onde moravam as principais amantes dos poderosos nobres europeus da Idade Média. Popular na época era o boato que cercava a vida do conhecido escritor Petrarca: possuía ele uma bela irmã, de nome Selvaggia, a qual era imensamente desejada pelo papa Bento XII, o qual prometeu o cardinalato ao poeta caso liberasse sua irmã para visitar os aposentos do pontífice. Proposta recusada, Petrarca acabou sendo denunciado ao Tribunal da Inquisição, o que o fez fugir de Roma e deixar sua irmã aos cuidados de seu irmão Gerardo, o qual, menos escrupuloso que Petrarca, entregou em uma madrugada Selvaggia ao velho clérigo, que acabou por deflorá-la. Roma na época era muito mal vista pela quantidade massiva de lupanares administrados por padres, cujos frequentadores eram o próprio povo e membros do clero, os quais quebravam sistematicamente seus votos de castidade e sucumbiam às femininas tentações das meretrizes.
Entretanto, principalmente após a Reforma Protestante, a Contrarreforma Católica e outros movimentos de moralização das instituições da sociedade europeia nos séculos subsequentes, a prostituição passou a ser extremamente mal quista pela civilização ocidental, e notadamente após o século XIX, terminou por cair nas sombras e no ostracismo da sociedade, em diversos continentes (pois com a colonização europeia vieram seus costumes, estereótipos e preconceitos, principalmente no continente americano).
Atualmente, diversos Estados divergem sobre como tratar da temática da prostituição em suas legislações internas (como veremos adiante, existem três correntes acerca da legalização do meretrício). Isso faz com que não haja consenso em diversos assuntos, como no tráfico ilegal de mulheres, pois cada país adota uma posição diferente sobre como tratar a prostituição. O que podemos afirmar é que, no que tange a um estímulo dos governos ao respeito da sociedade pela condição em que as prostitutas sobrevivem e formas de evitar que mulheres sucumbam a essa atividade, muito pouco ainda foi realizado, o que torna cada vez mais intrincada, complexa e organizada a rede mundial de exploração e tráfico de mulheres, principalmente na Europa, e notadamente em relação ao caso brasileiro no país vizinho do Suriname.
Quanto ao tráfico de órgãos, trata-se de uma prática desenvolvida ao longo do século XX, sendo bastante recente (ressalte-se que o estudo da anatomia humana teve efetivo início no século XVIII, e o transplante de órgãos é inovação do século passado), mas não menos grave e significativa quanto o tráfico de mulheres. Com o avanço científico da medicina, principalmente no que tange às cirurgias de transplante de órgãos, a procura pelos mesmos por diversos indivíduos aumenta a cada dia, principalmente pelos crescentes casos de câncer motivados pela baixa qualidade de vida das sociedades atuais. Isso faz com que muitos grupos pratiquem raptos de pessoas saudáveis, a fim de assassiná-las para assim retirar seus órgãos e vendê-los pelos mais variados preços no mercado negro internacional de órgãos. Trata-se de uma vertente mais violenta do tráfico de pessoas, em que não há uma motivação em manter a vítima viva, pois o interesse é puramente físico (os órgãos do sujeito).
3. A PROBLEMÁTICA DA PROSTITUIÇÃO NO CENÁRIO INTERNACIONAL
Como abordado anteriormente, o tráfico de pessoas é realizado por diversas sociedades ao redor do mundo. Desde as mais remotas épocas, a escravidão e o tráfico de seres humanos são praticados, para os mais diferentes propósitos. Também foi dito que nosso trabalho se destina especialmente à infeliz realidade da prostituição internacional, na qual em diversos casos mulheres são submetidas a um regime de escravidão por dívidas, muitas destas criadas e expandidas intencionalmente com o objetivo de manter a vítima enredada na maléfica trama desenvolvida pelas quadrilhas do tráfico internacional de pessoas. Embora tenham sido empreendidos intensivos esforços a fim de evitar o fenômeno do tráfico de seres humanos e a prostituição no cenário global, estas duas práticas longe estão de serem erradicadas, muito mais por se tratarem de verdadeiras instituições na sociedade ocidental (a prostituição, especialmente, é uma realidade cômoda demais para que determinados governos possuam vontade política necessária para erradicá-la). Nesta parte de nosso trabalho, abordaremos a problemática da mesma no âmbito da Sociedade Internacional: como os Estados tratam de fenômeno tão arraigado no cotidiano da sociedade?
Em diversos Estados, notadamente naqueles que não estão em um patamar de desenvolvimento socioeconômico satisfatório (países em desenvolvimento), a prostituição constitui-se como uma válvula de escape para as dificuldades financeiras em que se encontram os indivíduos de baixa renda. Trata-se, pois, de uma estrutura tipicamente ligada ao papel social de cada sujeito na sociedade, pois dificilmente observaremos a prática da prostituição nas classes mais favorecidas (embora a mesma seja existente com um reduzido grupo de “prostitutas de luxo” denominadas Escort Girls). Logo, em diversos países, a prostituição é encarada como um ato não relacionado com os preceitos morais, porém lícito (no Brasil, por exemplo, apenas a exploração da prostituição alheia – rufianismo – é crime previsto no Código Penal Brasileiro). Isso nos leva a expor uma conhecida classificação científica envolvendo a licitude da prática de prostituição:
· Legislações Reguladoras ou Liberatórias: alguns países, notadamente os europeus (como a Holanda), permitem a prática e exploração da prostituição em seu território, e tratam-na como um empreendimento empresarial qualquer, cobrando inclusive taxas e outros tipos de tributos sobre o funcionamento de estabelecimentos que exploram a prostituição alheia;
· Legislações Repressivas ou Proibitivas: outros países, a maioria localizada no Oriente Médio, proíbem a prática e exploração da prostituição, comumente prescrevendo pesadas sanções para os criminosos que realizam o ilícito (a pena da morte é comum em diversos desses Estados para aqueles que praticam a prostituição). Curioso notar que existem exemplos de países ocidentais que também adotam essa vertente legislativa sobre o trato da prostituição na esfera jurídica: os Estados Unidos da América (EUA), por exemplo, dispõem como crime a prática e exploração da prostituição, detendo indivíduos que infringem essa norma penal.
·Legislações Permissivas: a maioria dos Estados da Sociedade Internacional adota essa vertente legislativa acerca do trato jurídico da prostituição: sua prática não constitui crime, mas a exploração da prostituição alheia (Rufianismo) é considerado um ilícito penal, sendo proibida a existência de casas e estabelecimentos que promovam, incitem ou explorem diretamente a prostituição alheia.
Entretanto, a análise acima se relaciona com a realidade interna de cada Estado no âmbito da Sociedade Internacional, considerando a prática da prostituição única e exclusivamente para os sujeitos com capacidade de exercício civil (no caso brasileiro, os maiores de 18 anos com plena sanidade mental). Proíbe-se terminantemente a prostituição de menores e incapazes, na esmagadora maioria dos países. Trata-se de um consenso global o repúdio à prostituição infantil, e como veremos mais à frente, existem diversas disposições jurídicas internacionais sobre o tema, também no que concerne ao tráfico de crianças e adolescentes para a prostituição internacional.
O que se verifica, pois, é um esforço das organizações internacionais no sentido de ao menos tentar regulamentar certas práticas aberrantes envolvendo a prostituição, enquanto se permite a realização da mesma, com determinadas condições. Através da celebração de acordos e tratados (os quais serão vistos mais adiante), tenciona-se diminuir a prática de crimes envolvendo essa esfera na realidade global. Entretanto, em diversos países em desenvolvimento (especialmente asiáticos e latino-americanos), ainda se configura em um trabalho deveras complexo desmanchar as redes criminosas do tráfico internacional de seres humanos e da prostituição infantil, pois se sabe que os dois ilícitos complementam-se no cenário internacional, pois uma significativa parcela das vítimas do tráfico de pessoas encontram-se em baixas faixas etárias, e muitas ainda são adolescentes ou mesmo crianças.
Incentiva-se também que no âmbito interno de cada Estado sejam implementadas medidas de fiscalização e conscientização da sociedade no tocante ao repúdio da prostituição ilegal (no Brasil, notadamente o Ministério Público Federal tem atuado de forma intensa no que tange à conscientização através de palestras educativas em instituições de ensino e pesquisa nacionais; enquanto os Ministérios Públicos de cada estado empreendem esforços para fiscalizar e atuar de forma direta na repressão à prostituição infantil, com o auxílio das instituições policiais, como as divisões de Delegacias de Proteção à Criança e ao Adolescente – DPCA’s – da Polícia Civil estadual).