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Processo judicial de reparação de dano em acidente de trabalho (indenizatória acidentária)

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20/03/2012 às 15:48
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10. Requisitos complementares para indenização: incapacidade laboral e culpa do empregador

Além do nexo causal, vital, para o empregador ser condenado em uma demanda indenizatória acidentária, que reste confirmada a incapacidade do trabalhador (dano a sua saúde, que repercuta na sua capacidade laboral). Sem incapacidade para as hodiernas atividades laborais que vinha desempenhando, mesmo que em grau mínimo, não há dano, e, portanto, não há indenização a ser concedida[51].

Conforme já havíamos revelado linhas acima, o magistrado trabalhista utiliza muito o auxílio da Tabela DPVAT para fins de quantificar essa perda. Por isso, cabe especialmente ao perito oficial auxiliar o juiz nessa tarefa, trazendo dados técnicos capazes de apontar com maior clareza para a devida utilização dessa Tabela.

Questiona-se, no entanto, o uso da Tabela nos casos em que obreiro já se encontra aposentado por invalidez pelo INSS, mormente em decorrência de decisão judicial transitada em julgado no cível[52]. Ora, se o mesmo foi considerado totalmente incapacitado para atividades laborais que possam lhe garantir a subsistência, nos termos dos arts. 42-44 da Lei 8.213/91, haveria necessidade de aplicação da Tabela DPVAT? Entendemos que não, já que há suficiente demonstração de que o obreiro lesionado encontra-se 100% incapacitado.

Em outro extremo, se o juiz não está adstrito ao laudo oficial, como resolver uma demanda em que deixa o magistrado de se valer do laudo, já que entende o Estado-juiz que há incapacidade laboral, não obstante a posição do expert apontar 0% DPVAT? Ora, justamente o magistrado pode arbitrar adequado percentual de incapacidade laboral, diante dos demais elementos de prova que isolam o laudo oficial – sendo valioso o registro jurisprudencial de que “a fixação dos critérios para delimitação da pensão encontra-se dentro da esfera de discricionariedade do Julgador”[53]. Nesse caso, os peritos assistentes podem auxiliar na fixação dessa incapacidade, inclusive estabelecendo o percentual DPVAT apropriado.

Agora, e se a incapacidade constatada pela prova judicializada é de caráter provisório, não tendo o perito oficial convicção de que há invalidez permanente, também não existindo previsão para o obreiro retornar ao mercado de trabalho (estando mantido por prazo indeterminado o benefício provisório auxílio-doença): há indenização por danos materiais (pensão mensal) a ser paga ao trabalhador? Firme jurisprudência vem entendendo que não é o caso de deferimento do pensionamento vitalício, dada a não constatação de invalidez permanente, mas entende razoável a condenação do empregador em pensão provisória, a ser paga até o momento do retorno do trabalhador ao ambiente de trabalho (quando então restaria cessada a incapacidade)[54].

Sendo fixado o grau de incapacidade do trabalhador, será determinada então a pensão mensal vitalícia (ou excepcionalmente provisória) devida, podendo o magistrado fazer expressa referência de que o empregador poderá futuramente, em lide distinta, discutir eventual melhora do quadro de saúde, a ponto de reduzir ou mesmo suspender o pagamento do pensionamento – com base no art. 471 do CPC, a dispor que em se tratando de relação jurídica continuativa (em que há trato sucessivo entre os seus participantes e que necessariamente se estendem no tempo), pode ser proposta ação de revisão do estatuído em sentença, caso haja modificação do estado de fato[55].

Além do nexo causal e da incapacidade (dano), caberá ainda ao magistrado tratar do requisito culpa da empresa, a fim de autorizar a indenização acidentária pleiteada pelo empregado lesionado. Se defendemos que a matéria possui cunho civilista e envolve responsabilidade civil por ato ilícito, por certo não poderíamos prescindir de examinar um dos requisitos importantes nesse contexto que é o elemento culpa.

O mais ajustado posicionamento, jurisprudencial e doutrinário[56], a respeito vai no sentido de exigir a culpa da empresa dependendo da natureza do evento infortunístico que acometeu o trabalhador –  já que, devemos convir, não se pode equiparar, por exemplo, a culpa da empresa em um acidente in itinere com a sua culpa em razão de doença ocupacional decorrente do risco que envolvia a atividade profissional.

Assim, por regra deve se fazer presente o elemento culpa diante dos acidentes de trabalho que não envolvem risco da atividade profissional – já que somente nesse último restrito caso a empresa, em razão de sua lucrativa atividade econômica, deve arcar com os riscos do empreendimento, indenizando o empregado lesionado pela simples circunstância de restar caracterizado o nexo causal (além de não restar demonstrada a culpa exclusiva da vítima).

Defendemos, portanto, a teoria da responsabilidade subjetiva para o empregador nos casos de acidentes de trabalho, salvo diante de casos de acidentes ou doenças de origem profissional bem caracterizadas, em que cabível aplicação da responsabilidade objetiva – seria o caso de empregado que sofre amputação de membros em máquina de serra onde labora por toda a jornada de trabalho em empresa madeireira; ou doença ocupacional decorrente da própria atividade profissional, como mecânico de empresa de manutenção de aeronaves que progressivamente vem perdendo capacidade auditiva.

De qualquer sorte, nos demais casos em que necessária a comprovação de culpa da empresa, razoável ser estabelecido, pelo juízo trabalhista, que compete ao empregador fazer a devida prova de que não agiu com dolo ou culpa. É a aplicação da teoria da responsabilidade subjetiva, com inversão do ônus da prova – em razão de melhores condições técnicas e econômicas do empregador diante da fragilidade do empregado lesionado. Ainda, nesse sentido, é de se reconhecer a plena vigência das inúmeras disposições normativas, que impõe a adoção de medidas preventivas pelas empresas, conforme Normas Regulamentares (NRs) atreladas à Portaria 3214, de 1978[57] – razão pela qual fica mais fácil, para a própria instrução, que o empregador traga aos autos a devida comprovação de que vem agindo, nos estritos contornos da lei, cumprindo as medidas de segurança e medicina do trabalho[58].

Confirma-se, por derradeiro, que se é facilitada a indenização por acidente de trabalho nos casos de acidentes típicos e doenças ocupacionais que envolvem risco profissional[59], é extremamente difícil, e por isso mesmo raro, o deferimento do pleito relacionado aos acidentes in itinere[60].

Por regra, infortúnios de ordem física e mental, decorrentes de eventos ocorridos no deslocamento da empresa para o domicílio ou vice-versa, nada tem a ver com culpa da empresa, razão pela qual descaberia a indenização acidentária. Exceções a regra, confirmadas por Sebastião Geraldo de Oliveira, giram em torno especialmente da hipótese de o empregador oferecer meio de deslocamento aos funcionários e ocorrer alguma lesão em virtude de culpa (desídia) da empresa em relação a cuidados no transporte de seu empregado[61] – situação que, mesmo assim, admitiria, em tese, ação regressiva do empregador em desfavor de eventual terceiro diretamente responsável pelo infortúnio (motorista e/ou empresa terceirizada responsável pelo deslocamento dos empregados).


Conclusão

Em suma, a demanda indenizatória acidentária é oportunidade processual necessária e peculiar para o empregado lesionado discutir, perante a Justiça Laboral, uma compensação financeira em decorrência de acidente ou doença laboral – nada obstante poder, em razão do mesmo quadro de incapacidade, propor paralelamente outras demandas no cível, em desfavor do órgão previdenciário (seguradora pública) e da própria seguradora privada com quem mantida apólice de seguro (seguro de acidentes pessoais).

Tendo competência trabalhista desde a Emenda 45, de 2004, a aludida demanda possui natureza civilista, em razão do seu objeto, qual seja, responsabilidade civil por ato ilícito do empregador – razão pela qual defendemos a aplicação do prazo prescricional civil de três anos, com a fixação do marco prescricional a partir da prova inequívoca do dano, conforme súmula 278 do STJ.

Com a superação de eventuais matérias preliminares ou prejudiciais apontadas pelo empregador, e não sendo o caso de acordo já na audiência inicial (o qual poderia envolver matéria não posta em juízo), o feito deve prosseguir para a complementação da prova documental, bem como para a produção de prova pericial e oral – exigindo-se do julgador vigorosa fundamentação sentencial, diante especialmente da densa carga fática que ordinariamente compõe esses processos.

A perícia oficial faz-se praticamente indispensável nessas lides especializadas, mesmo que possa o julgador afastar o laudo oficial diante do conjunto de provas em sentido contrário (preponderância de provas). De qualquer forma, cabe ao expert, quando chamado, confirmar o nexo causal (relação do quadro de incapacidade com o ambiente de labor) e apontar a extensão da incapacidade (geralmente utilizando a Tabela DPVAT para fins de fixação do grau do déficit funcional), como também deve se posicionar o médico nomeado a respeito da natureza definitiva ou provisória do infortúnio.

Em existindo o nexo causal (admitida a teoria das concausalidades), a demonstração de redução de capacidade laboral (dano, de caráter definitivo ou excepcionalmente provisório) e sendo estabelecida a culpa da empresa (responsabilidade subjetiva, com inversão do ônus da prova), salvo nos casos em que admitida a responsabilidade objetiva em virtude do risco da atividade profissional desenvolvida, cabível a indenização por danos morais e materiais (especialmente pensionamento mensal, quando exigida a aplicação da Tabela DPVAT), com o estabelecimento dos demais corolários, como a constituição do monte capital, a fixação de juros e correção monetária – não obstante ser usual a exclusão da condenação em honorários sucumbenciais.

Confirma-se, por derradeiro, determinadas facilidades concedidas ao hipossuficiente lesionado para litigar em juízo trabalhista, já que geralmente terá o abrigo da AJG (bastando declaração de próprio punho reconhecendo o seu estado de miserabilidade jurídica); como também não terá maiores preocupações quanto a eventual retenção fiscal e de contribuição previdenciária sobre o montante indenizatório obtido (já que os rendimentos percebidos pelas pessoas físicas em razão de indenizações acidentárias, justamente pela natureza indenizatória do pleito, não estão sujeitos à imposto de renda e contribuição para o INSS).


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Sobre o autor
Fernando Rubin

Advogado do Escritório de Direito Social, Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica. Mestre em processo civil pela UFRGS. Professor da Graduação e Pós-graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – UNIRITTER, Laureate International Universities. Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul – CETRA/Imed. Professor colaborador da Escola Superior da Advocacia – ESA/RS. Instrutor Lex Magister São Paulo. Professor convidado de cursos de Pós graduação latu sensu. Articulista de revistas especializadas em processo civil, previdenciário e trabalhista. Parecerista.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RUBIN, Fernando. Processo judicial de reparação de dano em acidente de trabalho (indenizatória acidentária). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3184, 20 mar. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/21322. Acesso em: 23 dez. 2024.

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