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Impeachment e CPI

01/10/2001 às 00:00
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A política brasileira tem peculiaridades circenses (sem querer ofender aos integrantes de tão divertida e antiga arte), basta verificar que as famigeradas Comissões Parlamentares de Inquérito são instauradas não visando, propriamente, preservar a moralidade e o respeito à coisa pública. Interesses outros, uns mais claros e outros tantos obscuros, são os responsáveis pela grande quantidade de cpi’s produzidas após o advento da Constituição de 1988.

A maioria dessas comissões nada apurou de concreto e ficaram conhecidas pela denominação nada alvissareira de que "acabaram em pizza", ou seja, comédia pastelão, divertindo os mais críticos e consolidando na alma do homem comum o total descrédito.

Poucas tiveram efeitos práticos importantes, como a que terminou por desencadear o processo de impeachment do Presidente Fernando Collor.

A figura do impeachment estava presente na Monarquia, através da Lei n. 15, de 1827, que dispunha sobre a responsabilidade dos ministros, secretários e conselhereiros de Estado. A figura do Imperador era preservada do impeachment, assim, como na Inglaterra (de onde se originou), aplicando-se a máxima saxônica de que o Rei não erra (the king can do not wrong).

Vários conselheiros e ministros do Imperador sofreram tentativas de impeachment, embora contra apenas um deles tenha sido formalizada acusação, José Clemente Pereira, entretanto, como nos conta Paulo Brossard, foi absolvido pelo Senado, em sessão datada de 09 de junho de 1832.

A primeira Constituição Republicana, de 1891, modelou-se no sistema norte-americano, pelo qual o impeachment não tem caráter criminal e, com pequenas variações, o instituto foi mantido na atual Constituição, firmando-se sua natureza de processo apenas político, não criminal, em que pese o art. 85, da CF, denominar de crimes de responsabilidade os atos presidenciais considerados como ensejadores do processo de impeachment.

Atualmente a discussão sobre a natureza do impeachment não tem grande valia, haja vista ser sabido que as condutas elencadas no artigo retrocitado não se confundem com crimes propriamente ditos, porque outro é o objetivo da tipificação: afastar o Presidente. Tanto é assim que, paralelamente, ao processo de impeachment pode ser autorizada a abertura de processo criminal contra o Presidente, com fundamento na lei penal comum, como foi feito em relação ao Presidente Fernando Collor e que resultou, inclusive, em sua absolvição.

Para se instaurar processo de impeachment é preciso que a acusação seja admitida por 2/3 dos deputados federais, em sessão própria, ante a relevância do tema. Uma das primeiras questões a ser dirimidas é acerca do quórum dessa sessão, mas o certo é que, tomando-se como fundamento o fato de que, apesar de não ser processo judicial, há de se preservar todas as garantias de direito, o certo é que os 2/3 corresponda à totalidade dos congressistas e não apenas aos presentes à sessão, assim como acontece nos tribunais.

Após isso, acaso admitida a acusação, será ela remetida ao Senado Federal ou ao Supremo Tribunal Federal, em caso de crimes comuns, e, havendo o seu recebimento pelo Presidente de algum desses órgãos, o Presidente será suspenso de suas funções, pelo prazo de 180 dias. Não sendo os processos julgados neste prazo, impreterivelmente, o Presidente reassumirá suas funções.

O Senado, que é o fórum competente para julgamento dos crimes de responsabilidade do Presidente, Vice-Presidente, Ministros de Estado, além dos ministros do STF, do Procurador-Geral da República e do Advogado-Geral da União, fará o julgamento, sob o comando do Presidente do STF. A condenação, da mesma forma que a admissão na Câmara, somente se dará pelo voto favorável de 2/3 da totalidade dos senadores e o resulta, afasta o Presidente e inabilita-o para o exercício de funções públicas, por 08 anos.

Apesar de vários casos de impeachment, especialmente nos Estados, o mais importante deles foi o ex-Presidente Fernando Collor e a polêmica foi jurídica e política. Deputados e senadores suspeitos agiram como algozes do ex-Presidente e sequer foram afastados das sessões decisivas, o que seria obrigatório, posto a regra geral de suspeição dos juízes.

Uma das coisas que ficou certa na jurisprudência, com o impeachment capitaneado por Ibsen Pinheiro e Genebaldo Correia, entre outras figuras menos importantes, foi a de vigência da Lei n. 1.079/50, afinal, mesmo sendo o impeachment processo político, não significa que possa marchar à margem da lei, embora isso parece ter acontecido no caso Collor.

Sendo processo político, o principal objetivo, como já foi dito, é o afastamento do processado e, se, por acaso, houver a renúncia do Presidente sob processo? Como fica a situação? Prossegue-se o processo? No caso já citado, quando o Presidente, de próprio punho, resolveu renunciar, momentos antes de iniciada a votação, o Senado desconsiderou o comunicado da renúncia e seguiu adiante, cassando-lhe o cargo e inabilitando-o por oito longos anos, que agora chegaram ao fim.

Carlos Maximiliano, que foi político e Presidente do STF, lecionou que "do veredictum do Senado não há recurso para o Judiciário, nem sequer sob a forma de habeas-corpus: do processo não deslocam a competência de um poder constitucional para outro; nem tão pouco a suspeição dos julgadores é apreciada por um tribunal estranho...".

No Mandado de Segurança n. 21689/DF, o STF decidiu, por maioria de votos, que pode haver controle judicial do impeachment, desde que se alegue lesão ou ameaça a direito, nos termos do art. 5., XX, da CF, mas que a renúncia ao cargo, já iniciada a sessão de julgamento não teria poder de paralisar o julgamento.

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O STF, também, no caso Collor, decidiu que o Habeas Corpus não era meio idôneo para defesa contra processo de impeachment, que configura sanção de índole político-administrativa, não pondo em risco a liberdade. (AGRHC 70055-DF).

A Lei n. 27, de 1892, previa que cessaria o processo de impeachment, acaso o Presidente, por qualquer motivo renunciasse ao cargo, do que tentou se valer o ex-Presidente, entretanto, o STF, no MS acima citado, entendeu que as regras válidas seriam as da Lei n. 1.079/50, embora a mesma não trate desta particularidade.

O que importa realmente é que STF firmou decisão, apesar de ser por maioria, a respeito do tema, nos parametros tratados acima.

Abordemos, agora, a questão da CPI.

As comissões parlamentares de inquérito, segundo o § 3., do art. 58, da CF, "terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentosdas respectivas Casas, serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores".

Por conseguinte, uma CPI somente poderá ser instalada para apurar fato específico e, no atual momento político, há notícias de que se pretende uma CPI ampla, onde se apuraria desde o afundamento da P-36 ao suposto envolvimento do Presidente da República nas obras ilegais do fórum trabalhista de São Paulo, e isso não será possível jurídicamente falando.

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Sobre o autor
Augusto N. Sampaio Angelim

juiz de Direito em Caruaru (PE)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANGELIM, Augusto N. Sampaio. Impeachment e CPI. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 51, 1 out. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2141. Acesso em: 4 nov. 2024.

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