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Processo eletrônico: enfoque no controle dos procedimentos internos como forma de garantir a eficiência da função pública jurisdicional e a efetividade da prestação jurisdicional

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3. ATUAL PAPEL DO ESTADO EM RELAÇÃO AOS JURISDICIONADOS

3.1. CONSENSO DE WASHINGTON: PRINCIPAIS DIRETRIZES

Como função pública, a atividade jurisdicional pauta-se pelas diretrizes da Administração Pública, no que se refere a sua organização (gerenciamento). Nesse sentido, as modificações implantadas na postura do Estado em prol da sociedade trazem reflexos no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário.

Por conseguinte, é possível identificar, no âmbito mundial, que vários países têm se preocupado em alcançar a prosperidade dos seus Estados por meio de novas ideias e medidas. Nos últimos anos, alguns esforços foram realizados por meio de prescrições políticas difundidas entre acadêmicos, especialistas e segmentos mais bem informados da comunidade internacional.

Nesse contexto, insere-se o Consenso de Washington, como um ato claro e estável sobre medidas necessárias a serem tomadas pelos países em busca de se tornarem prósperos. De acordo com Williamson e Kuczynski (2004), essas medidas eram direcionadas aos países em desenvolvimento (ou subdesenvolvidos) no sentido de se tornarem competitivos perante os países desenvolvidos.

Em seu texto original de 1989, referido documento aborda as seguintes matérias: disciplina fiscal; reforma tributária; taxas de juros; taxas de câmbio; abertura comercial; investimento direto do estrangeiro; desregulação; direito de propriedade; privatização.

Como tais ideais, para sua adequada compreensão, necessitam de noções sobre economia, serão abordadas apenas as informações imprescindíveis. Isso porque a análise detalhada do Consenso de Washington não constitui objeto de estudo deste trabalho monográfico.

Quanto à disciplina fiscal, a ideia central do Consenso residia na compreensão de que os altos e contínuos déficits fiscais contribuíam para inflação e fugas de capital, indicando como medida a ser tomada pelos países a promoção do equilíbrio fiscal (redução de despesas, à luz do pensamento neoliberal).

Atinente à reforma tributária, tem-se como medida necessária a ampliação da base de arrecadação tributária. No que se refere às taxas de juros, tem-se como orientação aos países a determinação, pelos mercados financeiros domésticos, das referidas taxas. Além disso, expressou-se a concepção de que as taxas de juros reais e positivas desfavorecem as fugas de capital e aumentam a poupança local.

Quanto às taxas de câmbio, há orientação no sentido de que os países em desenvolvimento devem adotá-la de modo adequado à competitividade. Assim, essas taxas necessitam ser definidas de modo a favorecer as exportações, tornando-as mais baratas no exterior.

A abertura comercial, por sua vez, deve ser alcançada por meio de tarifas minimizadas que não incidam sobre os bens intermediários utilizados como insumos para as exportações. Os investimentos estrangeiros, conforme previsto no Consenso, necessitam ser incentivados, como intuito de introduzir capital e tecnologia no país.

A desregulação, conforme descrita no texto do Consenso de Washington, precisa ser alcançada tendo em vista que a regulação excessiva pode promover a corrupção e a discriminação contra empresas menores. O direito de propriedade, por sua vez, devem ser observados e aplicados no âmbito da sociedade.

Relevante ponto deste documento reside na defesa da privatização. A par da análise econômica do fato (que não é objeto de estudo deste trabalho), é possível depreender, à luz das diretrizes expostas, que as indústrias privadas operam com maior eficiência, em face do maior empenho dos seus responsáveis.

Em face disso, as empresas estatais necessitam dispor de maior eficiência para o alcance dos objetivos a serem perseguidos pelo Estado (interesse público). Com efeito, o modelo burocrático, a par de seus eventuais pontos positivos, pode ensejar o não desenvolvimento satisfatórios das atividades estatais.

Para alguns autores, como Matias-Pereira (2009), os ideais propostos pelo Consenso de Washington fomentaram o desenvolvimento de medidas pelo Estado brasileiro, no sentido de desenvolver e implantar uma Reforma Administrativa. Segundo Williamson e Kuczynski (2004), essas ideias, sucintamente descritas, tiveram relevante influência nas reformas econômicas de muitos países. Não é possível, conforme expõem os doutrinadores, identificar a homogeneidade de aplicação de tais ideais, uma vez que as diretrizes do Consenso de Washington foram interpretadas de modos diversos pelos diferentes Estados.

Em muitos países, as reformas de mercado mostraram resultados rápidos e satisfatórios em termos de estabilidade de preços e, em alguns casos, crescimento econômico. Desse modo, nos anos 90, alguns países, que seguirem as diretrizes primordiais do Consenso de Washington, implementaram relevantes reformas de mercado.

3.2. REFORMA ADMINISTRATIVA

Os fundamentos das principais diretrizes, oriundas do Consenso de Washington, projetaram-se na organização interna de vários países. No Brasil, é possível verificar alguns desses ditames no âmbito da Reforma Administrativa implementada no país, nos últimos anos.

De acordo com Meirelles (2005), a Administração Pública, por vários anos5, esteve orientada pelo excesso na concentração de atribuições nos órgãos de cúpula, bem como pela falta de racionalização dos trabalhos de coordenação dos serviços ineficientes e morosos. Assim, identificava-se “uma burocracia inútil e custosa, que alongava a tramitação dos processos e retardava as decisões governamentais, pela subordinação das atividades-fins às atividades-meios” (MEIRELLES, 2005, p. 715, grifos do autor).

Conforme exposição do autor, um dos primeiros esforços no sentido de modificar esse posicionamento surge com a Reforma Administrativa, introduzida pelo Decreto-lei 200 de 25 de junho de 1967. A desconcentração das atividades administrativas, por meio da descentralização institucional, visava à configuração de um modelo por meio do qual os níveis de direção fossem distintos dos de execução. Assim

[...] os serviços que compõem a estrutura central de direção devem permanecer liberados das rotinas de execução e das tarefas de mera formalização de atos administrativos, para que possam concentrar-se nas atividades de planejamento, supervisão, coordenação e controle (Dec.-lei 200/67, art. 10§§ 1º, “a” e 2º) (MEIRELLES, 2005, p. 715, grifos do autor)

Depreende-se, pois, que o referido diploma legislativo visa estabelecer a estrutura da Administração (direta e indireta), com o objetivo primordial de estabelecer diretrizes orientadoras do melhor funcionamento dos órgãos da Administração Pública. Há, portanto, tem-se, com essa previsão, um esforço no sentido da dinamização das atividades desenvolvidas pelos órgãos da Administração Pública.

Apesar dessa relevante disposição, tem-se que a Emenda Constitucional (EC) nº. 19 de 04 de junho de 1998 foi a responsável por implementar a Reforma Administrativa no Brasil. As disposições desse diploma legal atingiram vários dispositivos da Constituição Federal, de modo a alterar não apenas o seu texto, mas a permitir a ocorrência de profundas mudanças no âmbito da Administração Pública.

De acordo com Bulos (1998, p. 137):

[...] a referida mudança formal repercutiu na vida dos agentes públicos, alternando, sobremaneira, o regime administrativo do Estado brasileiro, seus princípios e normas, além de propor o controle das despesas e finanças públicas, para influenciar o custeio de atividades a cargo do Distrito Federal.

Dentre os pontos introduzidos pela EC nº. 19/1998, há: previsão constitucional do princípio da eficiência; acessibilidade de estrangeiros; ressalva de que os concursos públicos deverão ser compatíveis com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego; determinação de que as funções de confiança devem exercidas por servidores ocupantes de cargo efetivo; estabelecimento de percentuais mínimos previsto em lei para a ocupação de cargos em comissão por servidores de carreira; previsão de lei ordinária para regular o direito de greve; alteração da categoria de subsídios; supressão da determinação geral da remuneração dos servidores civis e militares, de modo a exigir lei ordinária para esse fim; definição da abrangência do teto de remuneração do funcionalismo público; exclusão da ressalva da igualdade de vencimentos para os cargos e atribuições iguais entre Poderes; ampliação do campo de vedação (acréscimos pecuniários percebidos pelos servidores); determinação da irredutibilidade dos subsídios (com a manutenção das remunerações que superavam o teto ao tempo de sua edição); fim do regime jurídico único; prescrição da remuneração dos agentes públicos por subsídios em parcela única; vedação de subtetos; ampliação do lapso de tempo de estágio probatório.

Com efeito, a Reforma Administrativa abarcou inúmeros assuntos, modificando, pois, o regime jurídico do Estado brasileiro. Apesar da relevância das modificações implementadas pela EC nº. 19/1998, não é objetivo deste trabalho tecer considerações sobre todos os tópicos citados alhures, destacando-se apenas, como ponto primordial, o princípio da eficiência e as medidas em prol da redução de despesas públicas.

Assim, com a EC nº. 19/1998 tem-se a incorporação, ao texto constitucional, do princípio da eficiência. De acordo com Bulos (1998), referido princípio já era previsto na legislação infraconstitucional (no Decreto-lei nº. 200/67, na Lei 8.987/95 e na Lei 8.087/90). Para esse autor,

A inserção do princípio da eficiência, ao lado dos vetores clássicos da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade, calcou-se no argumento de que o aparelho estatal deve-se revelar apto a gerar benefícios, prestando serviços à sociedade e respeitando o cidadão contribuinte. (BULOS, 1998, p. 137)

Nesse sentido, a eficiência da Administração Pública traduz a ideia de presteza (bom rendimento funcional), bem como de cumprimento adequado dos deveres impostos ao Estado na defesa dos interesses públicos. A doutrina identifica, como objetivo do princípio da eficiência, a obtenção de resultados positivos no exercício dos serviços públicos e das funções públicas (serviço jurisdicional).

De acordo com Bulos (1998), a interpretação desse princípio abarca, em sentido amplo, condutas tecnocráticas, ou seja, condutas que se voltam à qualidade final dos serviços prestados para a satisfação dos usuários (cidadãos). Sua aplicação, pois, é imediata, sem necessidade de legislação infraconstitucional regulamentadora.

Depreende-se, pois, que a aplicação do princípio da eficiência possui a capacidade de gerar mudanças no comportamento funcional da Administração Pública, no sentido de garantir maior dinamização das atividades realizadas.

Nesse sentido, Moreira (2004) argumenta que o Poder Judiciário necessita, de modo inarredável, de mudanças estruturantes por meio de reformas rápidas e profundas no sistema jurisdicional brasileiro. Esse argumento exposto pela autora demonstra que, por vezes, o Judiciário é alvo de duras críticas, no sentido de ineficiência da prestação jurisdicional para a resolução satisfatória dos conflitos de interesses, submetidos à sua apreciação.

Sendo assim, as mudanças de paradigmas, no âmbito dos órgãos jurisdicionais, perfazem-se como imprescindíveis diante da necessidade de atendimento aos anseios sociais. De fato, o Estado, que detém o poder-dever de dirimir as lides, precisa desenvolver a sua função jurisdicional da melhor forma possível.

Para Mendonça (2007) as mudanças citadas devem ser orientadas pela busca de meios que tornem a atividade estatal (jurisdicional) mais dinâmica. De acordo com o autor, uma “mudança tecnológica acarreta naturalmente uma mudança social, comportamental e consequentemente jurídica” (MENDONÇA, 2007, p. 28).

Além disso, é possível identificar, na doutrina, defensores da tese de que a Reforma Administrativa foi impulsionada pelo principal objetivo de redução de custos e equilíbrio fiscal6, em conformidade com algumas diretrizes do Consenso de Washington. Assim, com a EC nº. 19/1998, há a previsão de medidas administrativas imprescindíveis para garantir a transparência e uniformidade ao tratamento da receita pública.

Desse modo, depreende-se que a Reforma do Estado tem como grande instrumento fomentador os ideais do Consenso de Washington, na defesa de medidas (de cunho expressivamente econômico) de prol da prosperidade. Sendo assim, busca-se primordialmente modificar a perspectiva de atuação do Estado (de suas funções administrativas), bem como promover o equilíbrio fiscal (redução de despesas, à luz do pensamento neoliberal).

No âmbito do Poder Judiciário, é possível identificar medidas, no âmbito gerencial e organizacional, no sentido de aprimoramento da função jurisdicional prestada aos cidadãos. Tem-se, pois, que a Reforma Administrativa apresenta reflexos relevantes na atuação dos órgãos jurisdicionais em busca da satisfação dos interesses públicos a serem perseguidos pelo Estado.


4. PROCESSO ELETRÔNICO: ANÁLISE À LUZ DO DIREITO ADMINISTRATIVO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

4.1. A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO DIANTE DO NOVO PARADIGMA DA GESTÃO PÚBLICA

Com base nos ditames da Reforma Administrativa, principalmente na perspectiva de alcançar a eficiência no desempenho das fuções públicas, o Estado passou a desenvolver alterações no seu modelo gerencial e a utilizar recursos da tecnologia da informação - “conjunto de recursos tecnológicos e computacionais para geração e uso da informação, através de componentes de hardware e seus dispositivos periféricos, software e seus recursos, sistemas de telecomunicações e gestão de dados e informações” (MENDONÇA, 2007, p. 23).

No âmbito das atividades econômicas, o uso da tecnologia da informação perfaz-se como um elemento “que agrega valor aos negócios e faz a diferença na qualidade dos resultados obtidos” (MENDONÇA, 2007, p.27). Diante da competitividade inerente às atividades desenvolvidas pela iniciativa privada, é imprescindível a busca por elementos que possam criar o diferencial na elaboração de produtos ou na prestação de serviços. Assim, a busca pela excelência é consideravelmente visível no âmbito da iniciativa privada, diante da necessidade de manutenção dessas entidades no mercado.

No que se refere a entidades de direito público (ou mesmo órgãos públicos), submetidas a um regime jurídico distinto, não fora possível, durante longos anos, visualizar a preocupação com a excelência na prestação de serviços públicos ou no desenvolvimento de funções públicas. No entanto, é possível identificar um grande impulso na modificação desse modelo de organização a partir da Reforma Administrativa de 1998, diante da necessidade de tornar os entes públicos mais eficientes (em semelhança com o setor das empresas privadas).

Segundo expõe Mendonça (2007, p. 27), “a reforma do aparelho do estado propiciou uma mudança de paradigma em termos de administração pública, pois abandonou de certa forma o modelo burocrático, para adotar um modelo gerencial”. Destarte, as mudanças no modo de organização e gerenciamento dos órgãos do Estado fomentam-se na necessidade de promover o adequado desenvolvimento das funções públicas (com a concepção mencionada no capítulo anterior).

Nesse sentido, o Estado tem buscado aprimorar, gradativamente, os serviços (inerente à função pública correspondente) em prol da melhor administração dos interesses públicos. Segundo Santos (2003), essa modificação é classificada, no âmbito da ciência da Administração, como administração pública de resultados, uma vez que busca, dentre seus pontos primordiais, aumentar a efetividade dos serviços prestados à população.

Em razão da alteração de posicionamento do Estado em face dos cidadãos, a doutrina (do ramo da Administração como ciência) pugna pela migração da cultura do gerenciamento (gerencialismo ou management), antes restrito às empresas privadas, em face da competitividade inerente às atividades econômicas, para o âmbito da Administração Pública.

Outrossim, Paula (2005) argumenta que o gerencialismo, na atualidade, perfaz-se como elemento imprescindível para a administração dos governos contemporâneos. Em sentido semelhante, Mendonça (2007) argumenta que essa transformação no âmbito gerencial dos órgãos públicos proporcionou que Administração Pública obtivesse um gerenciamento mais profissional e eficaz.

Destarte, é possível inferir que o Estado, de modo semelhante ao setor privado no exercício de atividades econômicas, tem buscado aprimorar a sua atuação. Embora não haja a competição e obtenção de lucros, como no âmbito das entidades de direito privado, observou-se a imprescindibilidade de os órgãos estatais acompanharem as inovações tecnológicas (incluindo-se, nesse ponto, a tecnologia de informação), aplicando-as em prol do atendimento adequado aos interesses públicos.

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É imperiosa essa mudança de posicionamento do Estado em face dos cidadãos, pois a legitimidade de atuação daquele ampara-se na busca dos interesses públicos, conforme a ordem constitucional vigente. Nesse sentido,

Apesar de uma acirrada competição ocorrer, geralmente, apenas nas empresas privadas, a busca por utilização de novas tecnologias de informação (TI) não é mérito somente dessas, pois os setores públicos vêm, através de vários programas governamentais, acompanhando de perto o surgimento de novas tecnologias e, a exemplo das empresas privadas, implantando sistemas que buscam oferecer um serviço mais ágil e de melhor qualidade aos cidadãos. (MENDONÇA, 2007, p. 17).

Nesse mesmo sentido, “seja no âmbito da administração privada, seja no da administração pública, eficiência e eficácia necessitam andar juntas, significando que, em qualquer empreendimento ou organização, deve-se sempre buscar o melhor resultado, com o menor esforço ou custo possível” (SANTOS, 2003, p. 189).

Destarte, pode-se inferir que a Administração Pública vem utilizando os novos instrumentos (oriundos da tecnologia da informação) e mudando o seu modo de gerenciamento com o objetivo de garantir a adequada prestação dos serviços públicos e atividades inerentes às funções públicas. Nesse afã, é possível observar a aplicação de novos recursos tecnológicos em ambos os Poderes do Estado, abarcando, pois, as suas funções administrativas.

Com o advento da internet, os órgãos do Estado necessitaram se adequar à gradativa implantação desse recurso tecnológico. No Brasil, tem-se a criação de uma política nacional, no sentido de oferta, pela Administração Pública, de informações e serviços em meio eletrônico, sobretudo pela internet. Assim, a expressão e-government, ou governo eletrônico, surge para designar os serviços eletrônicos disponíveis pelo governo federal.

À luz da exposição de Mendonça (2007), é possível identificar a extensa utilização da tecnologia da informação no âmbito do Poder Executivo. Nesse sentido, tem-se o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI), cuja importância reside no total controle das receitas e gastos públicos. Tem-se, pois, a busca pelo controle dos gastos públicos, desde liberação até a prestação de contas dos gastos, prevendo-se medidas para liberar ou bloquear verbas para quaisquer órgãos, imprimir relatórios, entre outras funcionalidades.

Além disso, cabe citar outros elementos que sistematizam a busca pela maior eficiência na atuação da Administração Pública: a possibilidade de declaração de imposto de renda pela internet; adoção de softwares livres no governo federal; Posto Fiscal Eletrônico informatização do sistema de auditoria pública no Tribunal de Contas de Sergipe; portal cadastral de serviços públicos no Estado de São Paulo; o sistema de registro de preços e pregão eletrônico do Governo Federal (MENDONÇA, 2007, p. 31); Cartão Nacional de Saúde (CNS), “que tem o objetivo de informatizar todos os serviços de atendimento ambulatorial e hospitalar do Sistema Único de Saúde (SUS), mediante a identificação de cada usuário do sistema” (BENNUCI, 2006, 124).

No âmbito do Poder Legislativo, identifica-se a implantação da tecnologia nos seguintes elementos: “Grupo de Trabalho da Desburocratização, Banco de imagens do Senado Federal, Projetos de Lei e Outras Proposições, Gabinete 24h, Projeto SIGA Brasil, INTERLEGIS – Comunidade virtual do poder legislativo” (MENDONÇA, 2007, p. 31).

Segundo Vasconcelos Neto (2008), o Poder Judiciário (nas esferas estadual e federal) vem utilizando, gradativamente, a tecnologia da informação (principalmente a internet) como forma de aprimoramento do serviço jurisdicional prestados aos cidadãos.

Nesse contexto, o autor expõe algumas iniciativas desenvolvidas pelos tribunais por todo o país: o sistema push (que promove o acompanhamento processual mediante cadastro prévio); disponibilização do inteiro teor das decisões proferidas nos tribunais – desde o Supremo Tribunal Federal (STF) até os tribunais estaduais; obtenção de certidões negativas; peticionamento; Diário da Justiça Eletrônico (para os tribunais que já o desenvolveram); sistema de “Cálculo Trabalhista Rápido” do Tribunal Superior do Trabalho.

Ademais, Mendonça (2007) cita outros exemplos de implementação na área de tecnologia da informação que contribuem para a facilitação do acesso aos dados processuais (e outras informações) pelos órgãos do Poder Judiciário: implantação do protocolo eletrônico; a adoção do sistema de penhora on-line, pelos vários tribunais no país; o desenvolvimento do sistema eletrônico de intimações; realização de eleições com urnas eletrônicas.

Carvalho (2000), por sua vez, destaca as home pages do Poder Judiciário, como instrumentos semelhantes às revistas virtuais, por meio das quais os seus órgãos promovem a facilitação da comunicação com sua clientela efetiva ou potencial. Conforme a sua exposição, é possível identificar uma gradativa evolução no modo de utilização desses recursos no sentido de evitar, ao máximo, o deslocamento físico até a sede dos órgãos jurisdicionais por meio da disponibilização do maior quantidade de informações possíveis.

Ressalte-se que ao tempo da elaboração do artigo, não existia o modelo de processo eletrônico. Nesse sentido, a internet, no âmbito do Poder Judiciário, era utilizada como ferramenta de disponibilização de home pages, nesse momento não havia ainda formulações sólidas no sentido de elaborar um sistema de processamento virtual dos autos processuais (com a utilização da Internet).

De acordo com Bennuci (2006), o Poder Judiciário, mesmo que após o Poder Executivo, tem se empenhado no aprimoramento da prestação dos seus serviços aos cidadãos. Nesse afã, é imperioso compreender que função jurisdicional necessita ser analisada não apenas do ponto de vista do Direito, mas, sobretudo, da sua organização (ou seja, sua gestão) enquanto entidade. Assim, a introdução de recursos tecnológicos, nos órgãos que o compõem, perfaz-se como algo essencial, diante da nova compreensão do Estado sobre o seu papel perante os cidadãos.

À luz da exposição de Mendonça (2007), é possível inferir, em breve síntese, que a introdução da tecnologia da informação no Poder Judiciário produziu resultados positivos, como a triplicação do número de acesso aos sites jurídicos, a realização de atos processuais sem a utilização de papel (e sim por meio eletrônico, garantindo maior celeridade ao trâmite processual).

Esse processo gradativo, proporciona “a otimização de procedimentos de gestão, auxílio de acesso à informação, celeridade nos processos, redução de custos e, acima de tudo, eficiência e transparência” (MENDONÇA, 2007, p. 32). Em face da relevância desse tema no presente trabalho, expõe-se, com maiores detalhes a introdução de recursos tecnológicos no Poder Judiciário no tópico seguinte.

4.2 PODER JUDICIÁRIO E A BUSCA PELO APRIMORAMENTO DA FUNÇÃO JURISDICIONAL

4.2.1 Aplicação de recursos tecnológicos no âmbito dos processos judiciais

Seguindo a tendência mencionada alhures, o Poder Judiciário passou a utilizar recursos da tecnologia da informação no exercício da função jurisdicional. De acordo com a exposição de Carvalho (2000), a posição do Poder Judiciário frente às inovações tecnológicas pautou-se, durante alguns anos, pela defesa da segurança e da prudência. Para esse autor, essa vocação de retaguarda fez com que os órgãos jurisdicionais utilizassem mais tardiamente7 os mecanismos virtuais disponíveis. Nesse sentido,

Primeiro, foram os computadores que transpuseram os umbrais dos grandes recintos empresariais ou estatais, para invadir o templo dos escritórios de advocacia ou gabinetes dos juízes e demais agentes do Direito. Uso quase assemelhado ao dado a uma máquina de escrever mais sofisticada. Depois, vieram os softwares mais aprimorados e os recursos de multimídia. E, em seguida, triunfalmente adentrou a Internet, provocando – esta sim – uma verdadeira revolução nos costumes e nas técnicas dos operadores jurídicos (CARVALHO, 2000, p.55).

À luz dessa exposição, é possível depreender que a introdução de recursos tecnológicos, no âmbito dos processos judiciais, inicia-se com a substituição das máquinas de escrever pelos programas de edição de texto na elaboração de peças e termos processuais.

Tem-se, pois, num primeiro momento, os recursos tecnológicos utilizados com o fim de garantir simplicidade e agilidade à marcha processual, mantendo-se, ainda, a utilização de autos baseados no processo físico (de papel). Nessa fase, apesar dos documentos serem elaborados pelo computador, havia a imprescindibilidade de sua impressão e juntada nos autos do processo físico para compor os autos correspondentes. Assim, torna-se possível o armazenamento digital das informações acerca das movimentações do processo, permitindo-se o acompanhamento processual dos autos por meio de um sistema operacional.

Com o passar dos anos, conforme expõe Carvalho (2000), há a utilização da internet como ferramenta de divulgação de informações. No âmbito da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, por exemplo, tem-se a criação da primeira home page no início do ano de 1996. Desenvolve-se, pois “uma espécie de cartão de apresentação do judiciário federal à comunidade (laica e jurídica), com informações institucionais, links interessantes, peças doutrinárias e algumas decisões dos seus juízes”(CARVALHO, 2000, p. 70).

Apesar da relevância dos instrumentos citados, o ápice desta cadeia evolutiva de modernização do processo judicial está presente na substituição dos autos em papel por autos processados integralmente pelo meio eletrônico, por meio do uso da internet. Conforme aduz Parentoni (2007), com a utilização de documentos eletrônicos, dentro de sistema de processamento eletrônico dos autos do processo, alcança-se maior agilidade e eficiência à prestação jurisdicional.

Em suma, a inserção de novos elementos tecnológicos na dinâmica processual perfaz-se como uma situação promissora, em face da agilização dos procedimentos realizados no Poder Judiciário. Assim, a utilização de recursos da informática pode proporcionar ganho de tempo, trabalho e recursos materiais à dinâmica forense.

4.2.2. Dinâmica geral do processo eletrônico

De acordo com Abrão (2009), a praticidade do processo eletrônico inicia-se com a distribuição da petição inicial, seguindo-se do seu recebimento, despacho que ordena a citação e seu cumprimento, apresentação de defesa, análise do conjunto probatório e julgamento da lide. Com a transmutação do processo físico para o eletrônico, não há, pois, alteração substancial nos atos processuais existentes no ordenamento jurídico pátrio, restando modificações apenas no modo de processamento e armazenamento de informações pertinentes.

Cite-se, nesse contexto, a modificação quanto à comunicação dos atos processuais (citação e intimação). De fato, com o advento da Lei nº. 11.280/06, autorizando os tribunais, em sua respectiva jurisdição, a disciplinarem a comunicação oficial por meio eletrônico, vislumbrou-se a possibilidade de implementação do Diário de Justiça Eletrônico, com o fim de publicação dos atos judiciais e administrativos e dos órgãos a ele vinculados.

À luz do posicionamento de Abrão (2009), pode-se afirmar que a finalidade precípua deste instrumento perfaz-se na possibilidade de comunicação precisa, certa e adequada, por meio tecnológico disponível, de menor custo e com eficiência.

Nesse sentido, prioriza-se, com o diário de justiça eletrônico, não apenas a intimação das partes, mas toda espécie de comunicação emanada do Poder Judiciário e necessária ao andamento processual, como encaminhamento de ofícios, requisição de declarações. Com relação à intimação das partes, Abrão (2009, p. 37), expõe que “a respectiva intimação eletrônica dos atos processuais gera a segurança do informe digital, substituindo qualquer outro meio, exceto aquelas hipóteses sem que houver exigência da intimação pessoal”.

Ressalte-se, ainda, que o artigo 5º da Lei 11.419/06 dispõe que sobre a realização da citação ou intimação eletrônica dos autores processuais (bem como, procuradores e terceiros), mediante o acesso aos autos do processo nas redes internas (dos órgãos do Judiciário) ou externas (permissão de acesso aos usuários).

Há, portanto, a prevalência da intimação procedida por meio eletrônico, mediante o cadastramento prévio das partes, apenas em casos excepcionais realiza-se o cumprimento da intimação por oficial justiça ou carta.

Atinente às citações, como primeiro ato processual para dar ciência ao réu da lide, há casos em que, de fato, não se encontrará viabilidade técnica para a realização de tal ato (em razão da parte processual não ter ainda cadastro no sistema virtual utilizado pelo Poder Judiciário local). No entanto, não se pode considerar tal fato como óbice ao regular desenvolvimento da comunicação processual por meio eletrônico.

Como o processo eletrônico está sendo gradativamente implantado nos órgãos do Poder Judiciário, a utilização plena desse modelo será possível com uma gestão estratégica em prol da disseminação dos instrumentos necessários ao correto funcionamento do processo judicial eletrônico pelo maior número de pessoas.

Assim, de modo gradual e conforme a necessidade, advogados, defensores públicos, procuradores, promotores e partes processuais (pessoas físicas, entidades de direito público e privado) promovem, perante o órgão competente, o seu respectivo cadastro no sistema de processamento virtual dos processos judiciais.

Quanto ao peticionamento por meio virtual, não é exigida a apresentação dos documentos originais juntados (excetos nos casos em que a digitalização procedida possa ocasionar dúvidas quanto às informações constantes nos documentos). Assim, com o objetivo de ajuizar a ação ou de cumprir uma determinação judicial determinada, o advogado habilitado poderá apresentar as suas petições (e documentos pertinentes) exclusivamente pelo meio virtual.

Ressalte-se que essa é uma das vantagens desse modelo, visto que os autos do processo podem ser consultados a qualquer momento ou local pelas partes interessadas (autor, réu e Estado). Ademais, evita-se alguns contratempos: dispêndio de tempo para a localização de processos físicos; abertura de prazo para carga dos autos pelo o advogado; possível perda dos autos, dentre outros.

No que se refere aos procedimentos internos realizados por cada vara, é preciso esclarecer a possível diversidade de organização das fases processuais em face da utilização de sistemas virtuais distintos para o processamento eletrônico dos processos judiciais. Assim, cada órgão estabelece a sua organização interna de acordo com as especificidades das demandas, bem como, das suas necessidades primordiais.

Nesse sentido, a Justiça Federal, diante da sua trajetória pioneira na implantação do processo eletrônico, utiliza-se do Sistema Creta, o qual será estudado, com profundidade, no capítulo seguinte deste trabalho.

4.3 IDENTIFICAÇÃO DE UMA NOVA FASE DO PROCESSO CIVIL

Com amparo nas mudanças oriundas no âmbito do direito administrativo (como a Reforma do Estado, a previsão constitucional expressa do princípio da eficiência e a mudança no modelo de gerenciamento da Administração Pública), identificam-se reflexos no âmbito do direito processual civil (diplomas legislativos que visam dinamizar o rito processual civil). Assim, o direito administrativo projetou o seu fundamento para o direito processual civil, no sentido de buscar o aprimoramento da função jurisdicional.

Nesse sentido, voltando-se para a análise do desempenho da função jurisdicional, a legislação processual civil tem buscado modificar algumas regras procedimentais em prol da celeridade processual. Com a análise dessa nova postura, depreende-se que esse ramo do direito tem voltado à atenção para a dinamização das atividades realizadas no âmbito dos procedimentos internos dos órgãos jurisdicionais – elemento que conduz à defesa de uma nova fase metodológica do processo civil.

À luz da doutrina de Dinamarco (2008), há três fases metodológicas fundamentais que compõem a evolução histórica da concepção do processo no âmbito do ordenamento jurídico, quais sejam imanentista, autonomista e instrumentalista do processo. Para fins didáticos, serão abordadas as fases já reconhecidas pela doutrina processualista civil,

4.3.1. Fases do processo civil já consagradas

Até meados do século XIX, estruturava-se a compreensão do ordenamento jurídico sob uma visão plana, ou seja, a ação, incluída no sistema de exercício de direitos, constituía-se como a representação do direito subjetivo lesado e o processo caracterizava-se como mero procedimento (sucessão de atos ordenados). O direito de ação, pois, perfazia-se como o próprio direito subjetivo material que, sendo lesado, conferia permissão ao seu titular de pleitear em juízo.

Conforme Dinamarco (2008), esse período fora concebido como imanentista ou sincrético, devido a sua característica essencial: confusão entre os planos substancial (direito material) e processual. Destarte, o processo era identificado como simples “meio de exercício de direitos” (CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, 2007, p. 48).

Não era identificável, à época, a autonomia entre as relações jurídicas de direito material e processual, de modo que o processo apenas exerceria a sua função caso o direito substancial requerido fosse possível ou a tivesse o pedido julgado procedente. Para os casos de improcedência da pretensão, a sucessão de atos (concebida como processo) seria inútil ou desnecessária.

Pode-se inferir, pois, que havia maior enfoque no direito material, sem a compreensão de que a sua satisfação estivesse vinculada (ou, ao menos, viabilizada) a um processo judicial. Assim, “o processo era tido como um conjunto de formas” (DINAMARCO, 2008, p. 18).

Essa concepção prevaleceu até o desenvolvimento de estudos em torno da natureza jurídica da ação. De início, questionou-se o tradicional conceito civilista de ação, identificando-se algumas conclusões: a ação não constitui elemento do direito material, mas processual; não deve ser dirigida contra o réu, mas ao juiz (que irá dirimir a lide); não possui como objeto o bem da vida (determinado pelo direito material), mas a devida prestação jurisdicional do Estado. Tais compreensões foram responsáveis pela superação desta fase, seguindo-se para uma fase de autonomia entre direito material e processual.

Ultrapassada a concepção sincrética, passa-se a uma nova fase, qual seja, a autonomista, orientada pela compreensão de que o processo perfaz-se como elemento autônomo ao direito material. Destarte, o primordial posicionamento dessa fase fomentava-se na compreensão de que as relações de direito material e processual compunham-se de pressupostos e objetos distintos.

Segundo Dinamarco (2008), com a superação da confusão entre o direito substancial e o processual, tem-se a criação de novas linhas investigativas de estudos do processo como ciência autônoma, com objeto e método próprios. Nesse sentido, Reale (2002), argumenta que diante da autonomia do direito processual, como ciência, faz-se mister a elaboração de métodos próprios, fomentados em premissas bem definidas e conscientizadas.

Com efeito, a postura autonomista orientou-se nas investigações acerca do conceito e natureza jurídica da ação (caráter abstrato), elemento que demonstra o mais elevado grau da compreensão da autonomia do processo em face do direito material. Conforme aduz a doutrina, nessa fase evolutiva, “chegou-se afinal a um ponto de maturidade mais do que satisfatório no direito processual (grifo do autor)” (DINAMARCO, 2008, p. 20).

Apesar dos méritos dessa fase, é possível identificar um elemento desfavorável, qual seja, a sua extremada visão introspectiva. Destarte, centrou-se, de modo intenso, no processo como um fim em si mesmo, ou seja, como instrumento totalmente desvinculado do direito material. Nesse sentido,

Faltou, na segunda fase, uma postura crítica. O sistema processual era estudado mediante uma visão puramente introspectiva, no exame de seus institutos, de suas categorias e conceitos fundamentais; e visto o processo costumeiramente como mero instrumento técnico predisposto à realização da ordem jurídica material, sem o reconhecimento de suas conotações deontológicas e se a análise dos seus resultados na vida das pessoas ou preocupação pela justiça que ele fosse capaz de fazer. (CINTRA, GRINOVER e DINAMARCO, 2007, p.48-49).

Em suma, apesar da escalada da técnica processual, os institutos e conceitos inerentes à novel ciência processual estavam destituídos de sua finalidade, qual seja, permitir a devida e efetiva prestação jurisdicional.

O terceiro momento metodológico do direito processual constitui-se com a concepção, propugnada por Dinamarco (2008), como de instrumentalista. De início, cumpre observar que

O caráter instrumental do processo, enquanto categoria jurídica, constitui no entanto uma característica endo-sistemática que não coincide nem tem a riqueza desta outra de que se cuida que é a instrumentalidade do processo, entendido agora como a expressão resumida do próprio sistema processual; essa sim, é uma perspectiva exterior, em que o sistema é examinado pelo ângulo externo, na sua inserção na ordem jurídica, política e social. (DINAMARCO, 2008, p. 314).

Depreende-se, pois, que a instrumentalidade do processo perfaz-se a partir do descolamento do ponto de vista do processo, de modo a visualizá-lo sob um ângulo externo (à sua metodologia científica), enfocando-se nos seus resultados práticos (jurídicos, políticos e sociais).

Nesse momento, reconhece-se que o processo não constitui mero elemento técnico criado para operacionalizar o reconhecimento do direito material (apenas sob a ótica da ordem jurídica). O processo necessita ser concebido como instrumento de satisfação dos interesses da sociedade e do Estado, de modo que inócuo o seu desenvolvimento sem que haja o escopo de satisfação dos interesses sociais, políticos e econômicos.

Por conseguinte, Silva (2005) entende que:

O processo deve ser apto a cumprir integralmente toda a sua função sócio-política-jurídica, atingindo em toda a plenitude todos os seus escopos institucionais. A efetividade do processo significa a sua aptidão a eliminar insatisfações, com justiça e fazendo cumprir o direito, além de valer como direito e canal de participação dos indivíduos nos destinos da sociedade, e assegurar-lhes a liberdade. (SILVA, 2005, p. 315)

Conforme expõem alguns doutrinadores, a concepção instrumentalista do processo (ou simplesmente fase instrumentalista) apenas tem papel relevante quando há a busca pelo alcance dos objetivos expressos nas três ondas renovatórias expressas por Cappelletti e Garth (1988). Sendo assim, a instrumentalidade do processo é aferida por meio da assistência judiciária aos necessitados; da tutela à interesses transindividuais; e da alteração no modus operandi do processo, por meio de procedimentos mais simples e céleres (como no rito sumaríssimo aplicado aos Juizados Especiais).

Desse modo, pode-se inferir que a visão instrumentalista do processo faz-se presente na preocupação do constituinte e dos legisladores infraconstitucionais em criar novos elementos capazes de garantir a efetividade do processo. Como exemplo, cita-se a implantação de Juizados Especiais (nos âmbitos Estadual e Federal), da criação de legislações protetivas à determinadas classes (Código de Defesa do Consumidor, Lei da Ação Civil Pública, Estatuto da Criança e do Adolescente – destinadas, especialmente, à tutela coletiva).

4.3.2. Enfoque nos procedimentos internos

Para a melhor compreensão da função jurisdicional, é preciso ter enfoque nas regras procedimentais (próprias do direito processual civil, que regulamentam o modo de proteção dos direitos materiais), bem como na função pública (jurisdicional) do Estado em garantir a ordem jurídica.

Nesse pórtico, alia-se a concepção de processo com a atividade realizada pelo Poder Judiciário, em prol da satisfação do direito material pleiteado. Assim, adverte Vasconcelos Neto (2008, p.36)

A atividade jurisdicional, por ser serviço público8, não pode ser compreendida apenas a partir de uma análise feita sob a ótica do Direito, mas também ‘do ponto de vista organizacional ou gestacional’ [...] daí por que o problema da morosidade tem sido enfrentando não apenas por meio de alterações na legislação processual, modificações no entendimento jurisprudencial mediante a adoção de uma postura menos formalista e mais preocupada com a entrega da prestação jurisdicional a tempo e modo.

À luz da exposição transcrita, pode-se inferir que o Poder Judiciário, ao prestar a função pública jurisdicional necessita ponderar não apenas as alterações legislativas (referentes ao processo civil), mas também o seu modo de organização e realização de atividades inerentes à prática forense.

Desse modo, em prol da redução da morosidade (na prestação jurisdicional), identifica-se uma atual fase de compreensão do processo civil, qual seja, a de maior enfoque nos procedimentos internos realizados nos órgãos do Poder Judiciário. Destarte, com a dinamização das atividades internas realizadas pelos serventuários da justiça, é possível conferir maior agilidade ao andamento processual e, com isso, permitir que a prestação jurisdicional seja mais célere.

Sob essa concepção, identifica-se que as recentes reformas do processo civil têm buscado diminuir a prática de determinados atos (que possam ser suprimidos sem prejuízo à prestação jurisdicional), conferindo um novo método de desenvolvimento processual. Ademais, a busca pela eficiência no desempenho da função jurisdicional, pelo Poder Judiciário, constitui uma premissa para o alcance da efetividade da prestação jurisdicional, no momento em que se almeja conferir maior celeridade ao andamento processual.

4.3.2.1. Reformas do processo civil: racionalização dos procedimentos internos

É possível observar que, continuamente, há a introdução de novas técnicas processuais, por meio de reformas ao processo desenvolvido no âmbito civil, com a finalidade de racionalizar os procedimentos internos. À luz da exposição de Marinoni e Arenhart (2005), é possível identificar algumas modificações legislativas que visam, precipuamente, a abreviar o tempo necessário para a resolução da lide.

Sob essa premissa, identifica-se a previsão do artigo 557, caput, do Código de Processo Civil, a qual permite ao relator, no caso de julgamento por órgão colegiado, negar seguimento ao recurso interposto quando houver “confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior”. Depreende-se que esse dispositivo legal visa a evitar o dispêndio de tempo por meio de procedimentos formais desnecessários, em face do entendimento prévio firmado sobre a matéria discutida na lide.

Além disso, cumpre citar a previsão do §1º-A do artigo 557 da lei processual civil, que confere ao relator, do mesmo modo, a possibilidade de dar provimento ao recurso interposto quando a matéria versada na decisão recorrida estiver em confronto manifesto “com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior”. Nesse caso, identificando-se a compatibilidade entre o pleito recursal e o posicionamento dos tribunais superiores, permite-se o seu deferimento sem a realização dos procedimentos próprios ao julgamento de recursos.

O artigo 518, §1º, do mesmo diploma legal também reflete uma medida que visa a dinamizar as atividades do Poder Judiciário, ao permitir que o juiz monocrático não receba a apelação interposta contra sentença que se apresente em conformidade com o entendimento sumulado pelos Tribunais Superiores. Conforme expõem Marinoni e Arenhart (2005), esse instituto tem por finalidade impedir o prosseguimento do processo nas hipóteses em que há entendimento sumulado pelos tribunais superiores e, com isso, reduzir os atos necessários para o deslinde da causa (desnecessidade de sessão para o julgamento).

Ademais, tem-se a introdução do artigo 285-A no mesmo diploma processual, versando sobre a possibilidade de julgamento prima facie, quando se tratar de matéria exclusivamente de direito, cujo entendimento do juízo fora, em casos anteriores e semelhantes, de total improcedência. Conforme divulga a doutrina, busca-se, com esse instituto eliminar a possibilidade da propositura de ações que objetivem pronunciamentos sobre temas pacificados em decisões reiteradas do juízo monocrático ou colegiado.

Destarte, é racional que o processo, objetivando decisão acerca de matéria exclusivamente de direito, seja desde logo encerrado, caso haja posicionamento firmado pelo órgão jurisdicional, evitando-se, com isso, a prática de atos inúteis. Na doutrina pátria, o processo repetitivo conduz a um formalismo desnecessário, visto que apenas tramita para a obtenção de uma decisão, cujo posicionamento encontra-se já definido em momento anterior, quando do julgamento de lide semelhante (ou idêntica).

Conforme expõem Marinoni e Mitidiero (2008, p. 20), essas reformas legislativas, tem “por desiderato racionalizar a atividade judiciária, impedindo que recursos em confronto com a orientação dos Tribunais Superiores tenham seguimento, ocupando inutilmente a estrutura judiciária”.

Além disso, a instituição do requisito da repercussão geral da controvérsia debatida no recurso extraordinário (artigo 543-A do Código de Processo Civil) deve ser considerada como mais um instrumento, criado pelo legislador infraconstitucional, para concretizar o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva. De fato, estabelece-se um novo requisito intrínseco (imprescindível) para a admissibilidade do recurso extraordinário pelo STF.

Assim, a aferição da repercussão geral da controvérsia constitucional discutida no recurso extraordinário tem a finalidade de promover a celeridade processual em face da economia dos atos processuais. Apenas será julgado, pois, pelo STF o recurso extraordinário quando a matéria versada na lide, não se restringindo às partes processuais, tem sua extensão mais ampla.

Segundo Didier Junior e Cunha (2008), com o reconhecimento da repercussão geral, os recursos que versem sobre matérias idênticas serão sobrestados e, uma vez julgado, por amostragem, um processo, os Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recursais terão a possibilidade de declarar tais recursos prejudicados ou retratar a sua decisão. Destarte,

Permite-se o juízo de retratação do órgão a quo, nesses casos, após a decisão do STF sobre a questão de direito que corresponde à ratio decidendi da decisão recorrida, no julgamento do recurso que subiu como amostra. A permissão de retratação justifica-se, pois, a decisão do STF, em sentido diversa daquela proposta pelo tribunal recorrido, foi tomada em abstrato, de modo a resolver o problema em tese, conforme visto. (DIDIER JUNIOR E CUNHA, 2008, p. 320-321).

Com isso, pode-se inferir que essas previsões legislativas destinam-se a garantir a proteção aos direitos fundamentais de ação (acesso à justiça) e duração razoável do processo, demonstrando a busca pela redução de atos processuais para a resolução da lide posta em juízo. Busca-se, pois, dinamizar o procedimento interno desenvolvido no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário, por meio da adoção de medidas que evitem a prática de atos desnecessários.

Em consonância com essa concepção (de maior enforque nos procedimentos internos), cria-se a necessidade de um modelo de processamento dos autos que permita a identificação dos procedimentos efetivamente imprescindíveis ao regular andamento processual, de modo a eliminar atos desnecessários (ou que podem ser suprimidos sem qualquer prejuízo às partes).

Sob esse pórtico, insere-se a criação do processo eletrônico, como ferramenta que permite maior análise dos procedimentos internos realizados no âmbito dos órgãos jurisdicionais. Com esse novel modelo, portanto, há uma nova concepção acerca da dinâmica processual, de modo a conferir maior relevância à organização interna do órgão jurisdicional, por meio da busca por novos métodos de desenvolvimento processual.

Apesar da possibilidade de elaboração de diferentes modelos de sistemas de processo eletrônico9, é preciso destacar que o anseio, com a sua utilização, é semelhante, qual seja, permitir a dinamização das atividades desenvolvidas nos órgãos jurisdicionais. Com essa dinamização, por conseguinte, almeja-se a agilidade dos procedimentos realizados nos órgãos do Poder Judiciário, de modo a conferir maior celeridade à resposta jurisdicional.

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Sobre a autora
Luzia Andressa Feliciano de Lira

Mestranda em Direito Constitucional na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Graduada em Direito na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Advogada.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIRA, Luzia Andressa Feliciano. Processo eletrônico: enfoque no controle dos procedimentos internos como forma de garantir a eficiência da função pública jurisdicional e a efetividade da prestação jurisdicional. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3270, 14 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22011. Acesso em: 25 abr. 2024.

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