5. CONSEQUÊNCIAS DA MOROSIDADE PROCESSUAL
No período pós-guerra mundial, a sociedade começa a tomar consciência de tal morosidade, percebendo que tal anomalia prejudica o auferimento de direitos básicos. A lentidão então retira a eficácia de atribuição de direitos, prejudicando diretamente seus beneficiados.
"O processo, instrumento de atuação de uma das principais garantias constitucionais - a tutela jurisdicional -, teve de ser repensado. É claro que, nos tempos atuais, não basta mais aoprocessualista dominar os conceitos e categoriais básicos do direito processual, como a ação, o processo e a jurisdição, em seu estado de inércia. O processo tem, sobretudo, função política no Estado Social de Direito. Deve ser, destarte, organizado, entendido e aplicado como instrumento de efetivação de uma garantia constitucional, assegurando a todos o pleno acesso à tutela jurisdicional, que há de se manifestar sempre como atributo de uma tutela justa[13]"
O processo é em seu sentido mais básico, um instrumento que possibilita através de si a auferição do direito material. É uma canalização da sociedade ao Estado de Direito e suas garantias fundamentais. Logo, qualquer empecilho que impossibilite o livre tráfego em tal caminho, cria situações e prejuízos irremediáveis.
É senso comum bem aceito e fundamentado que “direito tardio não é justiça”, logo, um processo longo, exaustivo, perdido em seus próprios fins, causa mais prejuízos que benefícios para as partes.
Para Francesco Carnelutti[14]não é diferente, onde este diz que a tutela intempestiva do direito muitas vezes impõe o próprio perecimento deste, constituindo a demora em um verdadeiro ônus à parte mais fraca, sendo o tempo um inimigo do processo, contra o qual todos, partes e estado, devem lutar de forma obstinada.
Medidas processuais tentam contornar esse problema, como a antecipação de tutela, a ação cautelar e o mandado de segurança. Porém, são medidas desesperadas, às vezes ineficazes, que tentam de toda maneira evitar a perda do direito com o tempo.
São instrumentos que não atendem a todos os processos, ou seja, todo o resto continua na demasiada lentidão. Além do mais, são medidas que nem sempre alcançam os seus fins, por impor uma serie de requisitos para que o processo se beneficie delas.
O processo de tão extenso acaba se tornando um fim em si mesmo. O requerente que, ao adentrar com a demanda buscava apenas a resolução da lide da melhor forma possível, encontrará muitos empecilhos à sua frente, tendo assim que dividir sua atenção tanto na lide inicial quanto nas lides proveniente do próprio processo.
Em suma, frente a tantos defeitos processuais a parte, que teve seu direito violado ou ainda não auferido, possui em síntese duas opções: Demandar uma ação extremamente longa, ineficiente, exaustiva e dispendiosa ou abrir mão de seu direito material violado.
6. CONCLUSÃO
O Estado ao se formar e reter para si a capacidade de ditar direitos e mediar conflitos, tomou para si também o dever de realizá-los de uma forma competente e eficaz.
Rousseau ao prever que os súditos deveriam confiar uma parcela da individualidade a um soberano, previa consequentemente um soberano capaz de satisfazer as expectativas do povo. A capacidade de derrubar o Soberano a qualquer momento é a prova clara disso.
Hodiernamente, as expectativas dos “súditos” não estão sendo atendidas, vunerabilizando a credibilidade do Estado e pondo em risco a normalidade e o bem estar social.
A Administração Pública não esta atuando de forma adequada, não cumprindo o seu papel constitucional de independência e harmonia frente aos outros.
O caminho, que em tese, é o mais simples e fácil de auferir direitos fundamentais está se tornando demasiadamente complexo e dispendioso. O mesmo caminho, ao invés de ser uma ferramenta para o povo se transforma em outro empecilho.
Medidas mais relevantes têm sido tomadas ultimamente, as quais possuem um grande impacto no atual “status quo” processual.
A Emenda Constitucional nº 45, publicada em 2004, dentre tantas mudanças acrescentou o inciso LXXVIII no artigo 5ª da Constituição Federal. Nele há uma previsão deduração razoável do processo. Convenhamos que tal princípio, apesar de possuir uma boa intenção, é mais um principio altamente programático. Define o fim, sem apontar nenhuma solução, deixando este encargo aos doutrinadores e juristas em geral.
A criação da lei 9.099/95 foi também uma tentativa eficaz de desafogamento da Justiça Comum. Prezando pela oralidade e celeridade, os juizados especiais tem cumprido um bom papel no Poder Judiciário. Mesmo tendo uma boa parte de sua atuação voltada para resolução de conflitos de bancos, os Juizados de Pequenas Causas tem sim atuado arduamente no combate à morosidade processual. Apesar de tudo, estes são capazes de atender apenas uma parcela mínima das atuais lides, seja pelo fato de ser limitado pelo valor da causa e pelo fato de também sofrer pela falta de estrutura.
A criação de um Código de Processo também possui seus objetivos quanto a uma celeridade processual. O novo código possui raízes constitucionais, não sendo meramente técnico como o atual. Sendo assim, exigirá dos novos julgadores maior envolvimento referente a interpretação e contribuição para seus julgamentos. Isso se dá, pois ele estar totalmente atrelado aos direitos fundamentais. Um código aberto à hermenêutica e não mais apenas a tecnicidade, demonstrando assim que realmente todos processos estão, de uma certa maneira, diretamente ligados a constituição.
Hoje se fala em processo justo, pois não se busca mais algo que condiz apenas com a legalidade, e sim com os reflexos dos direitos fundamentais, assentados no principio da proporcionalidade. O novo CPC busca uma maior cooperação dos litigantes à Justiça, onde os mesmos possuem não apenas o direito, mas o dever de influir e contribuir significativamente no processo. A cooperação ativa entre partes e juízes, respeitando a veracidade e a lealdade processual certamente trará uma maior agilidade no processo, contribuindo muito para sua evolução.
É indiscutível que a transformação do poder Administrativo, empenhando-se em resolver conflitos de forma amigável e prevenindo processos contenciosos poderia ser uma contribuição muito grande para a lentidão.
Se com a Emenda Constitucional nº 19, teve-se a intenção de dinamizar o Poder Administrativo, porque não se poder relativizar o principio da indisponibilidade, aumentando assim o caráter privado do poder público para que se possa prezar pela conciliação?
Porém após a apresentação de tantas medidas utilizadas, a reestruturação do Poder Judiciário pelo Estado seria a forma mais eficaz e prudente a se fazer. Não é de muito ter um Código de Processo Civil que preze pela celeridade processual, vários Juizados espalhados resolvendo as menores causas entre outras medidas, se o ponto mais importante e que abrange a grande parte dos conflitos é precário, arcaico e estático.
Um maior número de varas, juízes, servidores e estagiários são fundamentais para um excelente andamento processual. Uma maior preparação de tais profissionais, apoiados a uma melhor reestruturação da carreira também são pontos a se levantar.
O Estado é parte fundamental para resolver seus próprios problemas, não podendo deixar a cargo dos operadores do direito, tendo estes que se desdobrar de qualquer forma para cumprir uma função que é primariamente dele.
Só desta forma, ele retoma sua credibilidade ideal, possibilitando ao povo um eficaz gozo de direitos e cumprindo seu papel de Estado de Direito, manter a ordem e o bem estar social.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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THEODORO JÚNIOR, Humberto. Revista Síntese "Direito Civil e Processual Civil", Ano VI, n. 36, jul-ago 2005.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil - Parte Geral. Vol. 1º, 12º ed., Atlas, 2012, p. 70.
Notas
[1]ARRUDA, Samuel Miranda. Direito fundamental arazoável duração do processo. Ed. Brasílica Jurídica, Brasília, 2006 p. 95.
[2]Hobbes, Thomas. O Leviatã, p.33.
[3]BARROSO, Luiz Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. 4ª edição, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 149.
[4]CANOTILHO, J. J. Gomes e MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição.
Coimbra: Coimbra Editora, 1991.
[5]MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2000, p. 68.
[6]REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. São Paulo: Saraiva 1980, p. 299.
[7] SLAIBI, Nagib Filho . Reforma da Justiça, Editora Impetus, 2005, p. 19
[8]CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Sergio Antonio Fabris Editor. Porto Alegre, 1988, p. 20-21
[9]ARAGAO, Egas Moniz de. Demasiados Recursos? Revista de Processo. Ano 31, n. 136, julho de 2006, p. 20-21
[10] Razoável Duração do Processo, Quatier Latin do Brasil, São Paulo, 2006, p.99.
[11] Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil - Parte Geral. Vol. 1º, 12º ed., Atlas, 2012, p. 70.
[12]MARINONI, Luiz Guilherme. Questões do Novo Direito Processual Civil Brasileiro. Jurua.
Curitiba, 1999, p. 314
[13] Theodoro Junior, Humberto. Revista Síntese "Direito Civil e Processual Civil", Ano VI, n. 36, jul-ago 2005.
[14]CARNELUTTI, Francesco. Diritto e processo. Napoli, Morano, 1958, p. 354.
Abstract: The article discusses the problem of procedural delays, highlighting its causes, consequences and possible resolutions. It debates about the ideals of the new Code of Civil Procedure and their possible contributions to this question and points out the inefficiency of public administration facing its excessive bureaucracy and inflexibility as a major contributor to that failure. It highlights the importance of a speedy process and efficient towards the measurement of fundamental rights and the ideal role of a rule of law for this.
Keywords: procedural delays, inefficiency of public administration; new code of civil procedure, rule of law