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Sobre a mutabilidade semântica das sobras em cooperativas e sua disciplina constitucional tributária

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16/11/2012 às 16:10
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8 – Disciplinamento Legal da Sobra e do Prejuízo

A Lei n° 5.764/71 dispunha de forma abrangente sobre o destino das sobras (que são, basicamente, os excedentes subtraídos dos custos administrativos gerais da cooperativa) e dos prejuízos, eventualmente, um e o outro, experimentados ao final do exercício financeiro. Importante fixar a distinção entre excedente e sobra.

No que concerne às sobras e aos prejuízos, assim enuncia a Lei das Cooperativas:

Art. 4°.

VII – retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral;

Art. 89 – Os prejuízos verificados no decorrer do exercício serão cobertos com recursos provenientes do Fundo de Reserva e, se insuficiente este, mediante rateio, entre os associados, na razão direta dos serviços usufruídos, ressalvada a opção prevista no parágrafo único do art. 80.

Art. 80 – As despesas da sociedade serão cobertas pelos associados mediante rateio na proporção direta da fruição de serviços.

Parágrafo único. A cooperativa poderá, para melhor atender à equanimidade de cobertura das despesas da sociedade, estabelecer:

I – rateio, em partes iguais, das despesas gerais da sociedade entre todos os associados, quer tenham ou não, no ano, usufruído dos serviços por ela prestados, conforme definidas no estatuto;

II – rateio, em razão diretamente proporcional, entre os associados que tenham usufruído dos serviços durante o ano, das sobras líquidas ou dos prejuízos verificados no balanço do exercício, excluídas as despesas gerais já atendidas na forma do item anterior.

Quando se fala no parágrafo do art. 80 que a cooperativa estabelecerá a forma como os prejuízos e despesas serão tratados, temos que há correlação inafastável com o art. 44, II do mesmo diploma, o qual prescreve os poderes e atribuições da Assembléia Geral. Logo, cabe a esta dar destino às despesas e prejuízos nos termos dos artigos 80 e 89.

O Código Civil trouxe um novo enunciado, uma dicção diferente para o que parece, à primeira vista, ser uma nova roupagem para o mesmo manequim, que nos permitimos aqui repetir:

Art. 1.094 – são características da sociedade cooperativa:

VII – distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com a sociedade, podendo ser atribuído juro fixo ao capital realizado.

Uma interpretação ligeira desse dispositivo pode levar a construção de uma norma jurídica com a seguinte dicção: todos os resultados devem ser distribuídos proporcionalmente às relações efetuadas entre o associado e a cooperativa. Segundo essa proposta interpretativa só há a possibilidade (única) de distribuição dos resultados em proporção aos negócios feitos com a sociedade – e é como entende boa parte da doutrina. Mas não é bem assim.

8.1 – Analítica Crítica do art. 1.094, VII do Código Civil

O enunciado do art. 1.094, VII, Código Civil representa um retrocesso – malgrado tenha, com acerto, evitado falar em lucro, pois que cooperativa não lucra, como estamos vendo, pois acabou por obliterar o trato da matéria.

A expressão anterior “retorno das sobras líquidas” era mais rigorosa terminologicamente do que “distribuição dos resultados”. Restava patente na Lei Cooperativa que o dispositivo se dirigia exclusivamente aos resultados “positivos” auferidos ao final do exercício. Era preciso ao ponto de, a seu modo, distinguir excedentes de sobras, ao se referir à liquidez.

A nova redação, a nosso ver, implica em um equívoco a) lingüístico e num outro, b) jurídico. Explicamos:

a) a expressão “distribuição de resultado” padece de incontornável ambigüidade, posto que resultado tanto pode ser positivo como negativo (sobra e prejuízo). A confusão é reforçada pela circunstância de que a distribuição de resultado, positivo ou negativo, pode ser realizada na proporção das operações realizadas pelos cooperados junto à cooperativa, de acordo com os dispositivos da própria Lei n° 5.764/71 (art. 3°, VII e 89). Então, do ponto de vista da interpretação do enunciado do diploma civil, pode-se construir norma abrangente a ponto de disciplinar a sobra e o prejuízo, à míngua, inclusive, de disposição do C.C. que trate expressamente de prejuízo (ou resultado negativo) – um verdadeiro agravante.

Com efeito, “distribuição de resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com a sociedade”, no contexto das disposições constantes do C.C., tanto pode significar resultado positivo como negativo (sobra ou prejuízo), inclusive resultado positivo oriundo de negócios com não-associados. Não há nada que impeça essa interpretação. A ambigüidade da expressão é flagrante, máxime quando posta no contexto da legislação anterior e dos demais dispositivos do diploma civil.

A questão é importante, pois uma interpretação abrangente construirá norma jurídica contraposta, inclusive, ao disposto no art. 89 da Lei Cooperativa, haja vista que não faz referência ao Fundo de Reserva. E, nesse caso, os prejuízos seriam suportados somente pelos cooperados. As implicações negativas de uma redação legislativa infeliz, como a do enunciado em liça, são inúmeras. E não é dado ao cientista ignorá-las.

b) o imbróglio jurídico que se avulta quando nos deparamos com a redação do art. 1.094, VII, do Código Civil diz respeito aos princípios cooperativos e as características mais relevantes da espécie societária conhecida como cooperativa.

De acordo com esse dispositivo legal, não há mais a possibilidade de a assembléia geral definir, v.g., um destino às sobras que não seja sua distribuição proporcional às operações dos associados com a cooperativa, como constava do art. 4°, VII da Lei n° 5.764/71.

A restrição é substancial. Há, ainda, o caso de simplesmente não haver distribuição (via de regra, no caso de sobra, haveria repasse aos fundos e, no de prejuízo, ficaria o problema de se saber se ainda podem ser suportados pelo Fundo de Reserva, ou se terão de ser levados à conta dos associados).

Sobre as possibilidades que a Assembléia Geral maneja na determinação do destino das sobras, esclarece-nos o escólio de RENATO LOPES BECHO[13]:

Entendemos que as hipóteses colocadas à disposição da assembléia geral, até a vigência do novo Código Civil, são a) devolução das sobras aos associados, na proporção de suas relações com as cooperativas; b) incorporação às quotas-partes, também na proporção dos negócios de cada associado, que passaria a deter um numero variável de quotas-partes; ou c) não distribuição das sobras, modalidade que significa uma doação do resultado positivo à cooperativa. Ressalte-se que, havendo a hipótese “c”, em caso de liquidação futura da cooperativa, esses valores serão destinados ao Tesouro Nacional.

Concordamos com o mestre quanto às possibilidades de destino das sobras que à assembléia geral cabe decidir, lembrando que lhe é vedado, sobretudo, remunerar o capital investido. Outrossim, as sobras “doadas” pelos cooperados, a nosso ver, devem ser destinadas aos fundos cooperativos (o FATES, o Fundo de Reserva, ou ainda um outro criado pela cooperativa, cf. art. 28, § 1°). Só não nos parece ser a solução mais adequada para o caso de liquidação a que diz com a destinação dos valores não distribuídos ao Tesouro Nacional[14]. É que o enredo constitucional e infraconstitucional do regime jurídico cooperativo não se compadece com essa possibilidade[15].

Retomando o fio do novelo de nosso raciocínio, vemos que posta uma norma assim no Código Civil, segundo a interpretação que se acomodou no senso comum teórico (WARAT) da doutrina cooperativista, só haveria uma possibilidade: a distribuição dos resultados na proporção das relações com a sociedade. Uma vez mais reafirmamos a premissa de que as disposições do Código Civil devem ser harmonizadas, dentro do possível, com a Lei das Cooperativas. Parece ser o caso.

Todavia, a nova dicção mereceu uma insuspeita e tímida recepção por parte da doutrina, que ora aplaudiu a nova redação e seu resultado[16], ora criticou (levemente) o resultado, apontando o retrocesso, mas com o mesmo se resignando[17]. Parece que, em todos os casos, só fora considerada a possibilidade interpretativa segundo a qual a norma seria relativa, apenas, às sobras (resultado positivo), que, assim, teriam o destino único de ser distribuídas em proporção aos negócios feitos com a cooperativa, sem considerar as sobras de negócios com não-associados – embora a letra do Código Civil não afaste essa possibilidade.

Essa interpretação, de onde decorre norma com uma única possibilidade de destino dos resultados, não pode vingar - sob pena de se alijar irremediavelmente a atuação cooperativa. Com efeito, a prosperar essa linha interpretativa, estará aberto o caminho para que seja podado o modelo de atuação cooperativo, não só com conseqüências para o destino dos resultados positivos (as sobras, como pressuposto pela doutrina em geral), mas, também, para o destino dos resultados negativos (prejuízos), posto que restará prejudicada a norma que remete-os em primeiro lugar ao fundo de reserva e, somente no caso de sua insuficiência, ao reparte proporcional entre os associados (cf. art. 89 da Lei n° 5.764/71).

A interpretação do citado artigo do Código Civil. Deve ser compatibilizada com as demais normas jurídicas atinentes à matéria, mormente as que definem as características cooperativas (inclusive na legislação anterior) e, principalmente, seus princípios.

Queremos crer que a administração democrática é um verdadeiro princípio cooperativo que anda de mãos dadas com a Constituição.

Nada traduz melhor o princípio democrático nas cooperativas do que a ampla atuação das Assembléias Gerais. Retirar delas o poder de dizer qual destino terão as sobras (dentro das possibilidades que vimos acima) importa em indevido tolhimento de suas funções, alijando as cooperativas de instrumento vital para sua sobrevivência.

Em verdade, a depender do caso concreto, a viabilidade operacional de uma cooperativa em um dado momento, ou mesmo a chance para que ela cresça ou ainda adquira melhores condições de prestar seus serviços em benefício dos associados, depende da maneira como as sobras são manejadas.

Imagine-se o sem número de hipóteses em que a cooperativa poderia - de acordo com o consentimento de seus cooperados expressado pelo voto em assembléia - destinar as sobras para fins essenciais à melhor prestação de seus serviços numa dada situação, ou para assegurar a sua sobrevivência. Decisão desse jaez não pode ser subtraída dos cooperados, que decidem em relação a ela, democrática e solidariamente, na assembléia geral. Ora, o foro adequado para que se efetive o equilíbrio necessário entre os interesses dos associados e os interesses da cooperativa mesma só pode ser a assembléia geral.

Em sendo assim, pensamos que a interpretação do inc. VII, do art. 1.094 do C.C., deve ser, necessariamente, harmonizada com a letra do inc. VII, art. 4°, e art. 89, da Lei Cooperativa e, notadamente, com os princípios cooperativos, no afã de manter, também, a possibilidade de a Assembléia Geral dispor acerca do destino das sobras (especificamente). Somente desse modo poderemos construir uma norma mais consentânea com o sistema cooperativo.

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9 – Conclusão

Segundo uma análise crítica da matéria cooperativa, a sobra assume conteúdo semântico distinto vinculado à arquitetura estrutural e organizacional de uma cooperativa, de acordo com o ramo em que atua e conforme sua posição no ciclo econômico do mercado.

Assim, propomos uma classificação jurídica das sobras, em: sobra stricto sensu ou em sentido estrito e sobra lato sensu ou em sentido amplo.

A primeira espécie, a sobra stricto sensu, diz respeito ao resultado final efetivamente positivo sob a perspectiva do cooperado, onde a sobra se traduz num acréscimo de valor, um ganho real, ao seu trabalho ou produção, como acontece relativamente à sistemática realizada numa cooperativa como a de produção agropecuária. A outra espécie, qual seja, a sobra lato sensu, aplica-se ao resultado contábil “positivo” ao final do exercício, mas que não se manifesta como efetivo ganho do ponto de vista do cooperado, pois que não há ali acréscimo real em sua condição sócio-econômica.

O art. 1.094, VII, do Código Civil representa um retrocesso no direito cooperativo, a vingar a interpretação que se acomodou no senso comum teórico da doutrina cooperativista, em que só haveria uma possibilidade: a distribuição dos resultados na proporção das relações com a sociedade. Haveria conseqüências para o destino dos resultados positivos (como pressuposto pela doutrina em geral), mas, também, para o destino dos resultados negativos (prejuízos), vez que restará prejudicada a norma que os remete em primeiro lugar ao fundo de reserva e, somente no caso de sua insuficiência, ao reparte proporcional entre os associados (cf. art. 89 da Lei n° 5.764/71).

Essa interpretação não pode prosperar – sob pena de se alijar irremediavelmente o arquétipo jurídico das cooperativas. Nada traduz melhor os princípios jurídicos cooperativos do que a ampla atuação das assembléias gerais. Retirar delas o poder de dizer qual destino terão as sobras (art. 4°, VII, da Lei das Cooperativas) importa subversão da lógica do sistema cooperativo e malogro de seus princípios mais elementares. Logo, cabe ainda às assembléias gerais ditar o destino dos “resultados”, nos limites da lei.


Notas

[1] Em verdade, nossa dissertação (inédita) de mestrado em Direito Tributário na PUC/SP versou acerca de uma Teoria Geral do Fato Jurídico Cooperativo e sua Tributação, de modo que este é o estudo mais amplo do qual esse ensaio é só um esboço inicial de parte dele.

[2] Cf. CRACOGNA, Dante. Aproximaciones a la teoría del acto cooperativo en derecho latinoamericano. In Temas de Derecho Cooperativo. Buenos Aires: Intercoop, [198-].

[3] Não é o objeto desse labor esmiuçar toda a legislação sobre cooperativas, que importa em infinitos desdobramentos jurídicos. Quanto ao código Civil, malgrado a sua relevância inconteste, não trataremos de cada uma de suas disposições. Para estudos aprofundados especificamente sobre o tema das disposições do Código Civil acerca das Cooperativas, remetemos o leitor, dentre outras obras, a Elementos de Direito Cooperativo. São Paulo: Dialética, 2002, p. 54 ss, de RENATO LOPES BECHO.

[4] Atos cooperativos e sua tributação pelo ISS à luz da teoria geral do direito, in Problemas Atuais do Direito Cooperativo, RENATO BECHO (coord.), op. cit., p. 126.

[5] Cf. art. 1.093, onde se lê que “a sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto no presente Capítulo, ressalvada a legislação especial”.

[6] Partimos da premissa de que a norma jurídica é construída pelo intérprete a partir do texto, e não extraída ou descoberta. A distinção entre texto e significação, inclusive no sentido de que o texto propicia inúmeras interpretações possíveis fora percebida já por KELSEN, em sua tentativa de romper com o racionalismo e os dogmas do positivismo jurídico (como a completude). Noções como a mutabilidade normativa (sistema dinâmico) e moldura dão conta da posição do pensador de Viena. Para mais, vide Teoria Pura do Direito. 6ª ed. Trad. João Batista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1999, et passim.

[7] Em estudo sobre as assembléias gerais cooperativas, ÊNIO MEINEN destaca a convivência entre os dois diplomas dirigidos às cooperativas, a Lei n° 5.764 e o Código Civil, apontando as vicissitudes da redação deste último. Segundo esse autor, “deve ser dado prestígio máximo a tese da prevalência da Lei Cooperativista (Lei Especial para todos os efeitos), ou pelo menos a sua harmoniosa convivência/integração com o CCB (...)”. Assembléias gerais: quorum e delegados, in Cooperativismo e o Novo Código Civil, GUILHERME KRUEGER (coord.), p. 185. Já para RENATO BECHO, em artigo publicado na mesma obra, houve grandes avanços e significativa modernização da legislação cooperativista com o advento do (novo) C.C. In As Metodologias de Cotejo da Lei 5.764/71 e o Código Civil para a Definição do Novo regime Jurídico das Sociedades Cooperativas, Ibidem, p. 44. No sentido de que as disposições do C.C. acerca de cooperativas padecem de inconstitucionalidade, consultar VERGÍLIO FREDERICO PERIUS, As Sociedades Cooperativas face o Novo Código Civil, in Problemas Atuais do Direito Cooperativo, RENATO BECHO (coord.), op. cit., p. 287 ss.

[8] Para estudo mais aprofundado sobre o assunto vide nosso: “Atos cooperativos e sua tributação pelo ISS à luz da teoria geral do direito”, in Problemas Atuais... RENATO BECHO (coord.), op. cit., et passim.

[9] Tratado de Direito Privado – Tomo XLIX, Rio de Janeiro: Borsoi, 1965, p. 432.

[10] Nesse sentido: RUI NAMORADO, Os Princípios Cooperativos. Coimbra: Fora do Texto, 1995, p. 80 e 82. RENATO LOPES BECHO, Tributação das Cooperativas. 2ª ed. São Paulo: Dialética, 1999, p. 155.

[11] Os Princípios... op. cit., p. 84 e 85.

[12] É assim que muito atiladamente RUI NAMORADO vai dizer que resultado positivo nem sempre é indicativo de boa gestão cooperativa, assim como nos casos de sucessivos resultados neutros, onde o aspecto sobra não é valorizado, nem sempre a gestão poderá ser tida por deficiente. Acabamos de ver que, por vezes, o melhor é que o resultado não seja nem a sobra, nem o prejuízo. O importante é o equilíbrio entre os interesses de cada cooperativa e dos seus cooperados, a depender da espécie de cooperativa. In Princípios... op. cit., 81.

[13] Elementos de Direito Cooperativo, op. cit., p. 101. A justificativa para a destinação ao Tesouro Nacional é dada por conta de dispositivo da lei das Cooperativas que previa a destinação dos fundos indivisíveis, no caso de liquidação, para o Banco Nacional de Crédito Cooperativo. Sua extinção (do BNCC) implicou na absorção de sua parte não comercial pelo Tesouro Nacional.

[14] De pronto, toma-nos de assalto a impressão de que essa medida (destinação do patrimônio cooperativo ao Tesouro Nacional) se trata de expediente confiscatório e expropriatório. A opinião de ÊNIO MEINEN é na mesma linha (ver: Assembléias Gerais: quorum e delegados, in Cooperativismo... op. cit., p. 184. Aqui o autor trata do inc. VIII do mesmo art., o qual dispõe acerca da “indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da sociedade”. Para este autor, o fundo de reserva, como patrimônio construído pelos associados, deve ser distribuído entre eles na proporção de seu capital social.

[15] Há em norma desse jaez – onde o patrimônio de uma sociedade civil é levado aos cofres públicos – uma insuspeita ingerência estatal. A injuridicidade no caso das cooperativas, para nós, é clarividente, máxime por força da norma construída a partir do art. 5°, XVIII, da Magna Carta, donde se depreende que é vedada a intervenção estatal nas cooperativas, como corolário mesmo do primado da liberdade. Seria o caso de se perguntar qual o fundamento constitucional de uma medida assim.

[16] RENATO BECHO, Elementos... op. cit., p. 101. O autor dispõe assim: “Agora, o novo código civil restringiu a apenas uma possibilidade”. E conclui: “Nesse sentido, parece ter laborado bem o legislador do novo código, ao ter restringido para apenas a distribuição proporcional”. Para fundamentar essa conclusão argumenta que o fundamental é a filosofia por trás da disposição do código (distribuição proporcional, ou não se distribui e o resultado fica num findo indivisível na cooperativa), encetada pela vedação de que outras pessoas se beneficiem do trabalho alheio.

[17] É o caso de ÊNIO MEINEN, ibidem, p. 184 e 185. E também de PERCI LONDERO, Assembléias gerais e o retorno das sobras, in Cooperativismo... op. cit., p. 207 ss.

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Sobre o autor
Helder Gonçalves Lima

Professor de Direito Tributário da Universidade Federal de Alagoas - UFAL Mestre e Doutorando em Direito Tributário pela PUC/SP Ex-Vice-presidente da Comissão de Estudos Tributários da OAB/AL Advogado e Consultor

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Helder Gonçalves. Sobre a mutabilidade semântica das sobras em cooperativas e sua disciplina constitucional tributária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3425, 16 nov. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23029. Acesso em: 19 nov. 2024.

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