Artigo Destaque dos editores

Discriminação da mulher no mercado de trabalho

Exibindo página 2 de 4
Leia nesta página:

3 A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO

3.1 Parte histórica

Para entendermos o princípio do estudo do trabalho feminino é de suma importância que analisemos as causas do aparecimento da mulher no mercado de trabalho.

A primeira forma de divisão do trabalho nas sociedades primitivas ocorreu  entre  os  dois  sexos,  sendo  aos  homens  confiadas  as atividades de caça e pesca e, à mulher, a coleta dos frutos, evoluindo para a cultura da terra. Na antiguidade, a história registra, sobretudo no Egito  antigo, que as atividades eram divididas entre homens e mulheres. Dada  a mediocridade de suas pretensões  militares, as mulheresnãoeramconsideradasumserinferioretinham participação  na  divisão  do  trabalho,  sobretudo  na  tecelagem.  As mulheres mais pobres chegavam a trabalhar em grandes obras de construção.  Na  sociedade  cretense  a  mulher  ocupava  lugar  de destaque,  desfrutando  de  uma  certa  liberdade,  tendo  papéis  nas peças   de  teatro  e  nas  celebrações  religiosas.  Por  sua  vez,  a sociedade  grega  do  período  clássico  não  permitiu  o  acesso  da mulher ao conhecimento, excetuado algumas cortesãs, situação que só começa a mudar um pouco com o helenismo, quando as mulheres passam a ter acesso à filosofia e às artes. Do século X ao XIV, as profissões   comuns   aos   dois   sexos   se   avolumaram,   havendo mulheres  escrivãs,  medicas  e  professoras.  No  renascimento,  as mulheres vão perdendo varias atividades que lhes pertenciam e se confinam nas atividades domésticas. Posteriormente, os trabalhos da mulher e do menor passam a  ser solicitados na indústria têxtil da Inglaterra e da França. Com a descoberta de novas fontes de energia e com a migração de grandes contingentes humanos do campo para as cidades em busca de condições melhores de vida no século XVIII, ocorre   a   Revolução   Industrial.   As   condições   a   que   estavam submetidos os trabalhadores, com jornadas de até 16 horas diárias em condições absolutamente insalubres, mostrou a necessidade de normas  que  disciplinassem  a  exploração  do   trabalho   humano. (NETO, 2011, p.1).

3.1.1 Período anterior à Proclamação da República

Nem sempre tivemos a igualdade de gêneros positivada na norma jurídica como temos hoje em dia no mercado de trabalho, senão vejamos:26

No período colonial, as mulheres livres eram minoria, tendo como único  papel  social  o  de  esposa.  As  negras  trabalhavam  como escravas  e   laboravam  ao  lado  dos  negros,  tendo,  por  vezes, trabalhos  mais  leves  pela  sua  complexão  física,  morfológica.  Os trabalhos mais  penosos na extração do ouro são executados pelos negros e os mais fáceis pelas negras. Os primeiros tiram o cascalho do fundo do poço, as  mulheres o carregam em gamelas, para ser lavado.  Ainda  no  período   colonial,  a  participação  feminina  era limitadaàpequenasindústriasdomésticas,emofícios predominantemente  masculinos  como  panificação  e  alfaiataria  ou ainda  em  atividades  consideradas  à  época  como  exclusivamente femininas   como  doceiras,  rendeiras  e  no  comércio  ambulante, quando recebiam a denominação de negras de tabuleiro. No Império, valorizou-se o papel da mulher como guardiã do lar, ao ponto que a medicina incentivava as mulheres a fazerem o máximo de atividades domésticas  com  o  fim  de  combater  o  ócio.  Porém,  às  mulheres pobres e escravas restava apenas trabalhar pelo sustento seu e de sua família enfrentando o preconceito de  uma sociedade que via o espaço público como domínio privativo dos  homens. (CALIL, 2007, p.19).

3.1.2  Período após a Proclamação da República

Somente  após  a  Proclamação  da  República  é  que vivenciaríamos  as primeiras  normas de proteção ao trabalho laboral feminino, tornando possível a contratação de emprego pela mulher independente da autorização do marido, porém limitando ainda o horário noturno.

Mesmo assim, se analisarmos friamente, qual era a mulher que entraria em rota de colisão com seu marido por trabalho? Àquela época a mulher desquitada era extremamente repudiada pela sociedade, fazendo com que a norma nada mais fosse do que uma procrastinação  para a mente feminina de que tempos melhores viriam.

Ainda  assim,  o  ruído  causado  por  tal  emancipação  fora  deveras assustador, pois os parlamentares da época achavam um absurdo a mulher trabalhar independente da outorga marital. Incluía-se nas reclamações o fato de que o valor do trabalho feminino era muito menor   que  o  masculino  em  termos  econômicos.  Outros  ainda defendiam que o amparo salarial no período que antecede e procede ao parto era tornar a gravidez rendosa e cômoda profissão. (CALIL,2007, p. 28).27

Em 1962, o então presidente da república João Goulart, sancionou a Lei 4.121  (Estatuto  da  Mulher  Casada),  e  a  partir  daí  a  mulher  deixou  de  ser relativamente capaz para assumir um papel diferente na sociedade, conforme vemos em parte de seu texto:

Art. 1º Os artigos 6º, 233, 240, 242, 246, 248, 263, 269, 273, 326,380,  393,  1.579  e  1.611  do  Código  Civil  e  469  do  Código  do Processo Civil, passam a vigorar com a seguinte redação: I - Código Civil

Art. 6º São incapazes relativamente a certos atos (art. 147, nº I), ou à maneira de os exercer:

I - Os maiores de 16 e os menores de 21 anos (arts. 154 e 156). II - Os pródigos.

III - Os silvícolas.

Parágrafo  único.  Os  silvícolas  ficarão  sujeitos  ao  regime  tutelar, estabelecido em leis e regulamentos especiais, o qual cessará à medida  que  se  forem  adaptando  à  civilização  do  País.(BRASIL,1962).

Art. 248. A mulher casada pode livremente:

I - Execer o direito que lhe competir sôbre as pessoas e os bens dos filhos de leito anterior (art. 393);

II -Desobrigar ou reivindicar os imóveis do casal que o marido tenha gravado ou alegado sem sua outorga ou suprimento do juiz (art. 235, número 1);

III - Anular as fianças ou doações feitas pelo marido com infração do disposto nos números III e IV do art. 285;

IV - Reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo marido à concubina (art. 1.177).

Parágrafo .único. Êste direito prevalece, esteja ou não a mulher em companhia do marido, e ainda que a doação se dissimule em venda ou outro contrato;

V - Dispor dos bens adquiridos na conformidade do número anterior e de quaisquer outros que possua, livres da administração do marido, não sendo imóveis;

VI - Promover os meios assecuratórios e as ações que, em razão do dote  ou de outros bens seus, sujeitos à administração do marido, contra êste lhe competirem;28

VII - Praticar quaisquer outros atos não vedados por lei. (BRASIL,1962).

3.2 Situação atual da mulher no mercado de trabalho

Alguns dados estatísticos servem para termos uma visão geral e atual do assunto acerca da importância do trabalho da mulher.

Assim é que o índice de desocupação entre as mulheres é mais alto do que entre os homens. [...] Mais de 70% das mulheres concentram- se na área de serviços, principalmente serviços domésticos. Outros serviços  também  contam  com  grande  presença  feminina  como a educação,   saúde  e  demais  serviços  sociais,  o  que  explica  a predominância de mulheres entre os estatutários. [...] Mesmo com a participação no  mercado  de  trabalho menor que  a masculina, as mulheres  tem  se  tornado,  cada  vez  mais,  referencial  da  renda familiar. Em 20 anos,  esse percentual cresceu 24,7%, alcançando em 2002 o percentual de  27,3%. Dentre tais famílias, 65,1% são compostas  unicamente  pela   mulher,  sem  cônjuge,  e  filhos.  As mulheres  ganham  menos  que  os  homens  em  todos  os  estados brasileiros e em todos os níveis de escolaridade. No ano de 2002, a renda média da mulher era de R$ 505,00, enquanto a do homem era de R$ 719,00, o que resulta em 70,2% do  salário masculino. Além disso, existem mais mulheres do que homens  que ganham até 2 salários mínimos, e o quadro é inverso quando a renda é superior a 5 salários. E ainda, 90% das mulheres ocupadas também  exercem serviços domésticos. (NETO, 2011, p.1).

A  legislação  avançou  bastante  na  proteção  ao  trabalho  da  mulher. Contudo, avanços ainda devem ser feitos para que se consiga, finalmente, a mais completa e devida isonomia de direitos entre homens e mulheres.

Na parte diretiva das empresas a situação é ainda pior:

Estudo da OIT realizado em 1997 revelou que na Alemanha somente

12% dos postos diretivos de alto nível médio e 60% de nível superior são   ocupados  por  mulheres;  na  Grã-Bretanha  a  proporção  de mulheres  entre diretores não passa de 40%, na França 13% dos cargos de nível  executivo são exercidos por mulheres, na Holanda 18% e no Brasil só 3% dos diretores de grandes empresas são mulheres.  Nos  Estados  Unidos  e  Austrália,  43%  dos  cargos  de 29 diretoria e de nível superior da administração pública são ocupados por mulheres. (SUSSEKIND, 2001, p.279, grifo nosso).

3.2.1 O obstáculo da dupla jornada de trabalho

Como costume, a mulher após um dia intenso de trabalho, ao chegar em casa  assume  tarefas  domésticas  que,  na  grande  maioria  dos  casos,  não  são ajudadas pelo homem.

Se, antigamente, o espaço doméstico era o lugar privativo da mulher e os  afazeres domésticos, sua obrigação, com a saída da mulher para  o   mercado  de  trabalho  isto  nada  ou  pouco  mudou:  na esmagadora maioria dos lares, o espaço doméstico e seus afazeres continuam  sendo  obrigação  da  mulher.  [...]  Assim,  se  o  homem aceita de bom grado os  rendimentos vindos do trabalho feminino para  que  este  se  junte  ao  seu  para  compor  a  renda  familiar,  a contrapartida não é verdadeira: poucos homens auxiliam no trabalho doméstica  para  diminuir  a  sobrecarga  a  que  sua  companheira  é submetida  ao  tentar  administrar  seu  trabalho  e  aquele  que  se acumula dentro de casa. (CALIL, 2007, p.80).

O que ocorre é que o homem pode levar serviço pra casa, aumentar sua produtividade,  fazer um trabalho mais bem feito, pois além de sua jornada de 44 horas possui o tempo  necessário a aperfeiçoá-la. Ao fazer isso, no dia seguinte, entrega um trabalho ou ideia para seu chefe, que o promove ou o tem como uma pessoa extremamente superior às outras.

A mulher, em contrapartida, sai do trabalho, vai pra casa, cuida do lar, lava roupa (ou coloca na máquina de lavar), faz jantar, limpa o que está sujo e às vezes ainda prepara almoço para o dia seguinte (muitas vezes dela e do marido). Não lhe sobra, desta forma, tempo pra trabalhos “extras”, criação de ideias novas e até de algum lazer que faça a sua mente “respirar” e atuar de forma mais tranquila no dia seguinte.

A jornada  de  trabalho  das  mulheres  tornou-se  muito  extensa.  A grande maioria dos homens não cozinha, não lava roupa, não passa,30 não  limpa  a  casa  e  não  faz  as  camas.  Isso  é  feito  por  suas companheiras, ao longo de 30 horas por semana, em média, e que se  somam a uma jornada de 44 horas, quando trabalham fora de casa. São quase 75 horas semanais. (PASTORE, 1998, apud CALIL, 2007, p.80).

Tomando essa maneira de pensar como o que mais acontece realmente no sistema,  temos um homem que será valorizado acima da mulher porque teve tempo para realizar o seu trabalho, organizar suas ideias, e assim continuar o ciclo vicioso que logo se transformará em suposta “verdade” de que os homens são mais eficientes que as mulheres. Esse é apenas um exemplo que nos leva a pensar em como temos que mudar o pensamento e a forma de convívio com as mulheres.

A dupla jornada das mulheres é fator para que as mulheres recebam remuneração menor, pois sabendo desta carga maior que a mulher costuma ter, os empregadores deixam de promovê-las a cargos de maior responsabilidade e pagar salários maiores. Tudo faz parte de um  ciclo vicioso, pois tendo a dupla jornada como obstáculo o empresário termina por ter receio de que isso prejudique o foco da funcionária no trabalho.

Apartirdessepensamento,oart.384daCLTfoiconsiderado constitucional pela nossa jurisprudência, conforme veremos a seguir:

Proteção   do   Trabalho   da   mulher.   Elastecimento   do   intervalo intrajornada mediante acordo escrito. Impossibilidade. Inteligência do art.   383  da  CLT.  A  gênese  do  art.  383  da  CLT,  ao  proibir, expressamente, a majoração do intervalo intrajornada para a mulher, não  concedeu direito desarrazoado às trabalhadoras. Ao contrário, objetivou  preservá-las da nocividade decorrente da concessão de intervalo  excessivamente elastecido, que gera um desgaste natural pelo longo período de tempo em que a trabalhadora fica vinculada ao local de  trabalho,  uma vez que precisa  retornar à empresa  para complementarsuajornadalaboral.Essaprevisãolegislativa considerou,  para  tanto,  a  condição  física,  psíquica  e  até  mesmo social  da  mulher,  pois  é  público  e  notório  que,  não  obstante  as mulheres venham conquistando merecidamente e a duras penas sua colocação no mercado de trabalho, em sua grande maioria ainda são submetidas a uma dupla jornada, tendo que cuidar de seus lares e de suas famílias. O Comando do art. 383 da CLT, recepcionado pelo princípio isonômico tratado no art. 5º, I, da Magna Carta, é expresso 31 em vedar essa prática, ao dispor que o intervalo não poderá ser “inferior  a  1  (uma)  hora  nem  superior  a  2  (duas)  horas  salvo  a hipótese  prevista  no  art.  71,  §  3º”.  A  única  exceção  à  aludida proibição, admitida pelo legislador ordinário, é a do § 3º do art. 71 da CLT, que autoriza a diminuição do intervalo mínimo, o que não é o caso.  O   descumprimento  do  limite  máximo  legal  destinado  ao intervalo para refeição e descanso da mulher, tratado no art. 383 da CLT,  importa   pagamento  de  horas  extraordinárias   do  período dilatado, por se tratar de norma de ordem pública, dirigida à proteção do trabalho da mulher, infensa à disposição das partes. Recurso de embargos  conhecido  e  provido.  TST,  E-RR  51/2002-028-12-00.1, SDI-1, Rel. Min. João Batista  Brito Pereira, DEJT 7.8.09. (SAAD, 2012, p.384).

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

Em apelação cível, julgado da magistrada Ramza Tartuce em 1997, citou o exemplo da dupla jornada em sua fundamentação para manter o direito da autora, vejamos:

PREVIDENCIÁRIO-APOSENTADORIAPROPORCIONALAO TEMPO DE SERVIÇO - COEFICIENTE - ART. 53 DA LEI 8213/91 - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 5, I, E 202, PAR.1, DA CF  -   PRELIMINAR   DE   NULIDADE   REJEITADA   -   RECURSO IMPROVIDO-SENTENÇAMANTIDA.5382135I202PAR.1CF  1. CONSIDERANDO QUE O RELATÓRIO DA SENTENÇA ABORDOU TODAS AS QUESTÕES SUSCITADAS PELAS PARTES, ALÉM DO QUE A DECISÃO SE  ENCONTRA FUNDAMENTADA, DE FORMA SUBSTANCIOSA  E  CONSISTENTE,  É  DE  SER  REJEITADA  A PRELIMINAR DE NULIDADE, ARGUIDA PELO AUTOR. 2. O ART. 53 DA LEI 8213/91 NÃO AFRONTA OS ARTIGOS 5, INCISO I, E 202, PAR.1, DA CF, ANTES COMPLEMENTA-OS, ATÉ PORQUE A LEI  MAIOR REMETE A FIXAÇÃO DOS COEFICIENTES À LEI ORDINÁRIA.5382135I202PAR.1CF. 3. O ART. 5, INCISO I, DA CF, VEIO INSPIRADO NA NECESSIDADE DE SE ELIMINAR TODAS AS FORMAS  DE DISCRIMINAÇÃO.5ICF. 4. A REDUÇÃO DO TEMPO DE   ATIVIDADE   PARA   A   AQUISIÇÃO   DA   APOSENTADORIA, DEFERIDA  À  MULHER,  SE  JUSTIFICA  EM  RAZÃO  DA  DUPLA JORNADA DE  TRABALHO QUE ELA É OBRIGADA A CUMPRIR, DENTRO   E   FORA   DO   LAR,   ALÉM   DAS   PECULIARIDADES FÍSICAS  E  PSICOLÓGICAS  QUE  A  DIFEREM  DO  HOMEM.  5. PRELIMINARREJEITADA.APELOIMPROVIDO.SENTENÇA MANTIDA.  (22058  SP  97.03.022058-4,  Relator:  JUIZA  RAMZA TARTUCE, Data de Julgamento: 30/06/1997, Data de Publicação: DJ DATA:26/08/1997 PÁGINA: 67657). (BRASIL, 1997).32

3.2.2 A maternidade

A maternidade é mais um obstáculo enfrentado pelas mulheres quando querem adentrar na seara laboral e que muitas vezes prejudica a contratação por parte dos empregadores pois acham que a mulher com filho será menos atenta ao trabalho por conta dos problema familiares. O que acontece na maioria das vezes é que nem sempre a mãe tem condições de trabalhar por conta de uma maternidade precoce, ou abandono do lar realizado pelo seu  companheiro, ou até, em muitos casos, por não conhecer mesmo o pai da criança e ter que  arcar com todo o arcabouço de problemas inerentes à função de chefe do lar.

A justiça de família nem sempre leva em consideração este problema para determinação da guarda, fazendo com que o homem saia com toda a liberdade para começar uma nova vida e a mulher arque com todo o ônus do relacionamento destruído. Nesse caso, é lógico que o homem tem muito mais chances de continuar no mercado de trabalho, pois a estrutura do nosso país para acolher a mãe obreira não permite, na maioria dos casos, que ela retorne ao mercado de trabalho de forma fácil. A mudança dessa estrutura, com criação de creches de qualidade para todos, iguais às nossas escolas particulares, com higiene, cuidados e excelente orientação e educação é de suma importância para trazer àquela mãe de volta ao mercado.

Apesar da  proteção  dada  à  mulher  no  mundo  positivo,  pouco  ainda mudou na mente das pessoas. Para evitar a discriminação da mulher, é necessário haver escolas públicas de  tempo integral, já que nem todos podem pagar uma empregada doméstica. O problema está  na  qualidade das escolas já existentes. Nenhuma  mãe  que  tem  maiores  cuidados  com  seus  filhos  trabalha  tranquila sabendo que teve que entregá-los à estrutura atualmente existente em nosso país.

A parte do Estado como protetor da dignidade da pessoa humana não está sendo  bem cumprida, e por isso temos mães cada vez mais deixando de trabalhar para tentar dar o mínimo de conforto e educação para seus filhos, que o 33 Estado não consegue dar. No caso, não só a mulher seria beneficiada, mas o homem que cuida do lar e dos filhos também seria.

Em relação à mulher, o legislador, com o objetivo de assegurar o desenvolvimento demográfico e diminuir as desigualdades sociais, cuidade  preservarasuafunçãofundamental quandoda maternidade. É que as normas que versam a respeito do trabalho da mulher grávida são necessárias por que dizem respeito tanto à sua função  biológica, quanto à perpetuação e conservação da espécie. Afinal,  não se pode esquecer que a maternidade tem uma função social, motivo pelo qual a finalidade do instituto é garantir à mulher a proteçãonecessáriaduranteagestação,noperíodode amamentação e parto, evitando determinados riscos que poderiam ameaçar a sua saúde e o desenvolvimento da gravidez e da criança. Nessa  linha, o legislador constituinte estabeleceu as diretrizes da proteção à maternidade, [...], deixando a cargo do legislador ordinário o tratamento da  matéria, que o fez nos artigos 391 e seguintes da CLT, sob o título "Da  proteção à maternidade", esmerando-se na defesa  da  integridade  orgânica  e  moral  da  empregada  gestante. Contudo, é de se ressaltar  que, com o movimento em busca de igualdade  de  tratamento  entre  homens  e  mulheres,  sobreveio  a progressiva retirada das normas de proteção ao trabalho da mulher. Afinal, a proteção  em excesso  implicava,  na prática, restrições  à admissão das trabalhadoras, fazendo com que o empregador desse preferência  aos  homens.  A  legislação   brasileira,  inspirada  em convenções internacionais, proíbe o trabalho da gestante no período compreendido entre 4 (quatro) semanas antes e 8  (oito) semanas depois do parto (artigos 392 e 393 da CLT). Entretanto,  a CF/88 ampliou essa licença para 120 dias, além de não ter se referido  à expressão "antes e depois do parto". Assim, poder-se-ia pensar que houve um permissivo para que as legislações ordinárias fossem mais flexíveis quanto à distribuição da licença, mormente antes do parto. No  entanto, é de se ter em mente que a CF se referiu à licença gestante, o que pressupõe que tal licença seja concedida antes do parto. Registre-se que os tribunais têm admitido a prova de gravidez mediante o seu adiantado estado aparente, como tem feito em caso de  despedida  da   empregada  nas  proximidades  do  parto,  com fundamento em fraude à lei. (NETO, 2011, p.1).

Se dermos tratamento do problema feminino como se fosse um problema de ambos os  gêneros, acabamos por unir forças e criar normas verdadeiramente eficazes,  que  cumpram  o   seu  propósito  e  atinjam  um  nível  maior  do  que simplesmente regular as ações, mas sim o de igualar pensamentos e acabar com as discriminações e disputas entre homens e mulheres,  tornando-os sujeitos de uma única realidade e guerreiros de uma mesma batalha contra a injustiça social.34

A partir daí, teremos uma disputa laboral mais justa e acirrada, baseada na  competência e não na desigualdade de gêneros. Ainda que existam leis que tentem igualar as condições da mulher no momento da admissão, sempre existirá quem passe por cima da norma por motivos pessoais. A Lei 5.473/68 prevê sanções para a discriminação contra a mulher no provimento de empregos:

Art.  1º:  São  nulas  as  disposições  e  providências  que,  direta  ou indiretamente, criem discriminações entre brasileiros de ambos os sexos,  para o provimento de cargos sujeitos a seleção, assim nas empresas  privadas,  como  nos  quadros  do  funcionalismo  público federal, estadual ou municipal, do serviço autárquico, de sociedades de  economia  mista  e  de  empresas  concessionárias  de  serviço público. (BRASIL, 1968).

Sabemos que empregadores burlam as normas, seja por falta de maior fiscalização ou mesmo por desconhecimento das proteções existentes.

Na CLT, os artigos 391 ao 400 tratam sobre a proteção à maternidade e seráobjetodeestudoemnossoquartocapítulo,ondecitamosalgumas jurisprudências sobre o tema.

3.2.3 Mulher chefe do lar

No mesmo problema encontramos a mulher chefe do lar, porém, nesse caso específico suponhamos que ela tenha o marido dentro de casa para ajudá-la. Ora, é inegável que ela estaria em situação mais confortável que as mães solteiras ou separadas, pois o suporte emocional se encontra em casa, ao retornar do labor diário. Porém, será que a mãe chefe do lar,  em seu trabalho, recebe igual aos homens chefe dos seus lares que labutam na mesma  empresa? Na maioria dos casos não. E qual é a diferença entre essa chefe do lar e os demais?  Apenas a questão  de  gênero.  Portanto,  se  dermos  sempre  à  mulher  uma  desvalorizada posição, estaremos por condenar a sociedade a injustiças.35

Veja como o ciclo termina prejudicando os dois gêneros, no último caso, por questões de preconceitos, o marido foi prejudicado, pois se a esposa ganhasse mais dinheiro, ele poderia  estudar enquanto seus filhos estivessem numa creche bem organizada e estruturada. Ou seja, a discriminação termina por atingir ambos os sexos, não interessando de onde ela tenha sido criada. E é exatamente por isso que não adianta pensar em medidas protetivas apenas para beneficiar A ou B, pois será uma solução paliativa, que terminará por causar um mal maior nas sociedades vindouras.

Para exemplificar uma norma que pode ser eficaz temos o exemplo do Projeto de Lei do Senado (PLS 525/11) de autoria da senadora Ana Rita, que aumenta de quatro  para  seis  meses  o  seguro-desemprego  para  as  mulheres  que  chefiam famílias. Vejamos o que diz a ementa:

Acresce § 2º ao art. 4º da Lei nº 7.998/90 (regula o Programa do Seguro-Desemprego, o Abono Salarial, institui o Fundo de Amparo ao  Trabalhador  -  FAT)  para  prever  que  o  benefício  do  seguro- desemprego será concedido; no caso de tratar-se de trabalhadora desempregada chefe de família, que percebia até 3 salários mínimos por ocasião da demissão sem justa causa; por um período máximo de 6 (seis) meses, de forma contínua ou alternada, a cada período aquisitivo de 14 (quatorze) meses, contados da data de dispensa que deu origem à primeira habilitação. (BRASIL, 2011).

Esse projeto corrigirá uma desigualdade e será importante para que a mulher tenha  um pouco mais de tranquilidade para de realocar no mercado de trabalho.

3.2.4 Trabalho de mulher

Trabalho  de  mulher  é  apenas  uma  expressão  criada  para  dar  o entendimentopreconceituosodequedeterminadasprofissõessão preferencialmente voltadas para o sexo feminino. Vejamos algumas opiniões:36

Ainda nos dias de hoje é recorrente a concentração de ocupações das  mulheres no mercado de trabalho, sendo que 80% delas são professoras,   cabeleireiras,   manicures,   funcionárias   públicas   ou trabalham em serviços de saúde. Mas o contingente das mulheres trabalhadoras mais importantes está concentrado no serviço doméstico remunerado; no geral, são mulheres negras, com baixo nível de escolaridade e com os menores rendimentos na sociedade brasileira. (CAMARGO, 2012, p.1).

No serviço doméstico:

O trabalho doméstico sempre foi tido como um trabalho exclusivo das mulheres. Se antes era tratado como “ajuda” às donas-de-casa, hoje é determinante na vida de homens e mulheres que trabalham fora. Nenhumacategoriaprofissionalexpressatãoclaramentea discriminação no mercado de trabalho como a do trabalho doméstico, realizado em sua maioria por mulheres negras. Sintetizando, assim, os efeitos da dupla discriminação, de gênero e de raça, presente no mercado  de  trabalho  brasileiro.  Dados  de  2006  da  PNAD/IBGE revelam a existência no Brasil, de cerca de 6,7 milhões de pessoas no trabalho  doméstico, deste total, 6,2 milhões são mulheres, ou seja,  93,2%  e  6,8%,  são  homens.  O  maior  contingente  é  o  das mulheres negras: as domésticas são 21,7% das mulheres ocupadas, ou   seja,   de   cada   100   mulheres   negras   ocupadas   no   Brasil aproximadamente 22 são empregadas domésticas. A grande maioria das domésticas, cerca de 72,5%, não tem carteira assinada, desse contingente, 57,5% são negras. Para as mulheres, esta tem sido uma ocupação relevante, muitas vezes servindo como porta de entrada no mercado de trabalho para as jovens. Em cidades como Salvador e Distrito Federal, o trabalho doméstico abriga mais de 20% do total de jovens ocupadas de 18 a 24 anos (OIT/DIEESE,  2006). Além das jovens, ingressam neste, mulheres de maior idade,  muitas vezes, pela primeira vez ou que retornam após períodos de inatividade. Em sua  grande  maioria,  essas  trabalhadoras  têm  baixa  escolaridade. Nas regiões metropolitanas, cerca de 60% têm o ensino fundamental incompleto. (SILVA, 2008, p.1).

Mesmo com essa realidade, as domésticas foram desprestigiadas pela CLT, senão vejamos:

Art. 7º - Os preceitos constantes da presente Consolidação, salvo quando for, em cada caso, expressamente determinado em contrário, nãoseaplicam:[...]aosempregadosdomésticos,assim considerados,  de  um  modo  geral,  os  que  prestam  serviços  de natureza não-econômica à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. (BRASIL, 1943).37

O  legislador  deixou  que  a  Lei  5859/72  tratasse  dos  empregados domésticos, e  assim terminou por retirar proteções à mulher doméstica como, por exemplo, a fixação de jornada de trabalho para o cômputo de horas extraordinárias, o direito ao FGTS, entre outras. Ora, resta claro que a mulher ainda está presa a conceitos retrógrados que não mudam apenas com a criação de leis e sim com a forma de pensar. Os trabalhos ditos “de mulher” atravessaram  épocas, desde o período  colonial,  passando  pelo  império,  proclamação  da  república  até  os  dias atuais.

Naquela época tínhamos as rendeiras, as negras de tabuleiro e hoje temos as professoras primárias, manicures, enfermeiras e empregadas domésticas em  sua  maioria  exercendo  as  atividades  que  geralmente  são  as  que  menos remuneram no país. Quando  falamos em arrumar uma empregada para exercer atividade doméstica, raramente pensamos em  um empregado do sexo masculino lavando a louça, varrendo a casa. Quando falamos em  enfermagem, é notório a maior quantidade de enfermeiras nos hospitais em relação ao paradigma  do sexo oposto.  O  que  temos  mais  nos  hospitais  em  gênero  masculino  são  médicos, refletindo claramente a diferença social que há em outras profissões, pois é essa a cultura.

As  mulheres,  por  vários  motivos  já  expostos  aqui,  (dupla  jornada, maternidade, entre outros) aceitam ou aceitavam até pouco tempo, de bom grado, qualquer  emprego  que  lhe   venha  a  calhar  na  situação  em  que  vivem,  pois historicamente já sofreram a discriminação social. É como se o impacto de aceitar um trabalho humilhante fosse menor para elas do que  para  eles. Dados do IBGE confirmam isso:

Orendimentomédiodasmulherescorrespondea67%da remuneração dos homens no Brasil, a pesquisa realizada em 2003 revela  que apenas 17% dos cargos executivos das 100 melhores empresas para trabalhar são ocupados por mulheres. (Guia Exame2003, apud CALIL, 2007, p.62).38

Isso porque estamos falando das melhores empresas para trabalhar, que já são bem menos preconceituosas. Em empresas menores a realidade é que essa percentagem cai bastante, fazendo com que o percentual de mulheres em cargos de direção seja mínimo.

Ao estudarmos esse assunto, devemos tentar mudar o pensamento no sentido  de  enfrentarmos  o  problema  para  ambos  os  gêneros.  Ou  seja,  se  um trabalho é indigno, que seja para as duas partes, homens e mulheres, apenas por ser indigno, e não porque é digno para as mulheres e indigno para os homens, pois essa mudança de pensamento deve ocorrer já, uma vez que não permanecem os motivos para a continuidade de retrógrados pensamentos.

Se não mudarmos essa realidade, é porque ainda não nos preparamos como  devíamos para enfrentar o problema, e criar normas com esse preconceito embutido na alma certamente descambará em normas machistas e discriminatórias, onde por vezes achamos que  estamos protegendo as mulheres, mas na verdade estamos é protegendo os homens da possível aceleração produtiva que as mulheres poderiam dar ao mercado de trabalho.39

Assuntos relacionados
Sobre o autor
Alfredo Manuel de Azevedo Ferreira

Policial Rodoviário Federal. Bacharel em Direito.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERREIRA, Alfredo Manuel Azevedo. Discriminação da mulher no mercado de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3551, 22 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24024. Acesso em: 24 abr. 2024.

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos