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Sentença trabalhista e revisão de benefícios previdenciários

28/03/2013 às 09:04
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A competência da Justiça do Trabalho restringe-se ao aspecto tributário da relação previdenciária, razão pela qual não possui competência para julgar questões relativas à concessão ou revisão de benefícios previdenciários, averbação de tempo de serviço/contribuição em razão do reconhecimento de um vínculo de emprego.

Resumo: O presente trabalho objetiva a análise da revisão de benefícios previdenciários fundada em decisão proferida pela Justiça do Trabalho, discorrendo sobre a competência da Justiça do Trabalho em matéria previdenciária, a extensão e os efeitos de suas decisões, e as hipóteses em que seria possível a revisão de benefícios previdenciários com base em decisão trabalhista, à luz da legislação e da jurisprudência. 

Palavras-chave: Direito Previdenciário. Revisão de benefícios. Sentença trabalhista. Efeitos da sentença.


Introdução

A divisão da ciência jurídica em disciplinas ocorre apenas para fins de estudo, sendo certo que as diversas áreas do Direito não constituem compartimentos estanques e incomunicáveis, mas pelo contrário, estão ligadas umas às outras como os diversos ramos de uma mesma planta, cujo tronco é a Constituição Federal.

Houve um tempo em que se estudava o Direito Previdenciário como um apêndice do Direito do Trabalho, porém tal entendimento resta superado em face da sua autonomia científica, vez que possui objeto de estudo, princípios e normas próprios, distintos do Direito do Trabalho.

Apesar de se constituírem em disciplinas autônomas de estudo na ciência do Direito, Direito Previdenciário e Direito do Trabalho guardam entre si intrínsecas relações. Pode-se dizer que, para os segurados obrigatórios, a relação previdenciária decorre da relação de trabalho, em suas mais diversas acepções - relação de emprego, prestação de serviços autônoma, trabalho avulso, etc.

Além disso, o Direito Previdenciário utiliza diversos conceitos próprios do Direito do Trabalho (com as adaptações necessárias às suas peculiaridades), tais como empregado, empregador, salário, remuneração, dentre outros.

Os fatos ligados à relação trabalhista muitas vezes produzem efeitos na relação previdenciária. O aumento de salário ou o recebimento de horas extras implica no aumento do valor do salário de contribuição previdenciário. Um acidente de trabalho pode resultar no pagamento de um benefício acidentário. Por conta dessa íntima ligação entre a relação trabalhista e a previdenciária, são comuns os casos em que o segurado, após obter uma sentença favorável na Justiça do Trabalho, procura a autarquia previdenciária com o intuito de proceder à revisão de seu benefício, em razão dos consectários de tal decisão.


1 - A competência da Justiça do Trabalho em matéria previdenciária

A Emenda Constitucional nº 20/98 ampliou a competência da Justiça do Trabalho ao introduzir o §3º no art. 114, com a seguinte redação:

Art. 114 - ......................................................................................

(...)

§ 3º - Compete ainda à Justiça do Trabalho executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no art. 195, I, "a", e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir."

Posteriormente, com a Emenda Constitucional 45/04, que introduziu a chamada Reforma do Judiciário, passou a redação do §3 a constar do inciso VIII do art. 114 da Constituição Federal[1]. Desse modo, a competência da Justiça do Trabalho restringe-se ao aspecto tributário da relação previdenciária, razão pela qual não possui competência para julgar questões relativas à concessão ou revisão de benefícios previdenciários, averbação de tempo de serviço/contribuição em razão do reconhecimento de um vínculo de emprego, dentre outros.

A título de exemplo, suponha-se que determinada ação trabalhista tenha por objeto o reconhecimento de um vínculo de emprego e o pagamento de indenização por acidente do trabalho[2], e que na esfera administrativa, pela falta da qualidade de segurado do RGPS[3], foi negado pelo INSS ao autor o benefício acidentário requerido em razão do mesmo evento objeto do pedido de indenização na Justiça do Trabalho. Julgados procedentes os pedidos, em face da limitação constitucional da competência em matéria previdenciária, não poderá o Juiz do Trabalho determinar a concessão do benefício anteriormente indeferido.

Neste sentido:

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - DETERMINAÇÃO DE REVISÃO DO INDEFERIMENTO DA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - INSS - INCOMPETÊNCIA DESTA JUSTIÇA ESPECIALIZADA - LIMITES SUBJETIVOS DA COISA JULGADA.

Falece competência à Justiça do Trabalho para dirimir lides previdenciárias. Portanto, a decisão prolatada por magistrado trabalhista determinando ao INSS, que sequer integrou a reclamação trabalhista, a revisão de benefício previdenciário de trabalhadora consubstancia-se em usurpação da competência outorgada à Justiça Federal Comum (art. 109, I, CR) ou, excepcionalmente à Justiça Estadual Comum (art. 109, parágrafo 3º, da CR), além de afrontar os limites subjetivos da coisa julgada, que repousa no disposto no art. 472, do CPC. O C. TST, por meio da Orientação Jurisprudencial 57, da SBDI-2, não discrepa deste entendimento. Segurança concedida.

(TRT da 3.ª Região; Processo: MS - 623/08; Data de Publicação: 20/02/2009; Órgão Julgador: 1ª Seção Espec. de Dissídios Individuais; Relator: Marcelo Lamego Pertence; Revisor: Maria Laura Franco Lima de Faria; Divulgação: DJMG . Página 9)

EMENTA: AÇÃO DE REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO - CONFLITO DE COMPETÊNCIA –

Diante do que dispõem os artigos 109, I, da Constituição da República e 129, II, da Lei 8.213/91, a Justiça do Trabalho não tem competência para processar e julgar demanda que tem por objeto a revisão de benefício previdenciário, entendimento que ora se reafirma mesmo diante da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do conflito de competência 7204-1, que apenas ressalvou a competência desta Especializada para o exame das ações de indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho movidas pelo empregado contra seu ex-empregador, o que não alcança as ações previdenciárias, cuja competência permanece da Justiça Comum Estadual. E como esta já declinou de sua competência para apreciação do litígio, cabe a este Tribunal suscitar o conflito de competência, na forma do art. 105, I, da CR/88.

(TRT da 3.ª Região; Processo: RO -20406/05; Data de Publicação: 10/02/2006; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relator: Convocada Taisa Maria M. de Lima; Revisor: Mauricio J.Godinho Delgado; Divulgação: DJMG . Página 7)

Como visto, a competência da Justiça do Trabalho limita-se ao aspecto tributário da relação previdenciária, nos moldes estabelecidos pela Constituição Federal em seu art. 114, inciso VIII.


2 – As pretensões de revisão de benefícios decorrentes de decisões proferidas pela Justiça do Trabalho

Apesar da íntima ligação entre a relação trabalhista e a previdenciária, ambas se distinguem e são completamente independentes juridicamente. Assim, a sentença trabalhista não tem por si o condão de impor qualquer obrigação ao INSS, em face da limitação da competência da Justiça do Trabalho em matéria previdenciária, e ainda pela limitação subjetiva da coisa julgada, cujos efeitos se operam somente entre aqueles que foram parte no processo, não podendo vincular terceiros e gerar efeitos diversos da competência trabalhista, vez que a autarquia previdenciária não figurou como parte no processo[4].

De tais decisões pode resultar o reconhecimento de um vínculo de emprego não registrado na CTPS, a condenação ao pagamento de verbas salariais não pagas no curso do contrato de trabalho (horas extras, adicional noturno, etc.), a declaração da existência de salários pagos “por fora”, com a consequente anotação na CTPS de tais valores e o pagamento das demais verbas salariais daí decorrentes, dentre outras.

Em linhas gerais, a sentença trabalhista julga o mérito com exaurimento da instrução processual, baseando-se nas provas produzidas, ou então apenas homologa um acordo celebrado entre os litigantes. Pode ainda ocorrer que a condenação se dê em razão dos efeitos da revelia (artigos 844 da CLT e 319 do CPC).

São comuns os casos em que o segurado pleiteia a revisão de seu benefício previdenciário tendo por base uma sentença trabalhista, para incluir um vínculo de emprego não anotado em CTPS ou para incluir salários de contribuição relativos a determinado período com vistas a majorar o cálculo da renda mensal inicial do benefício que recebe. Resta saber em que hipóteses tais decisões poderão servir como documento hábil a produzir efeitos na relação previdenciária.

Não é demais dizer que a relação previdenciária se dá entre o segurado e Previdência Social, e tem por norte o disposto na legislação previdenciária. No que diz respeito ao reconhecimento do tempo de serviço, a Lei 8213/91 traz norma específica no art. 55, §3º:

Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei,mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

(...)

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.

Desse modo, em face do dispositivo acima transcrito, somente nas hipóteses em que a sentença trabalhista tenha se baseado em prova material (da efetiva prestação de serviços e do período trabalhado), que tenha servido de base para a condenação é que a mesma poderá servir como documento hábil a influenciar a relação previdenciária. Vale dizer: apenas a sentença desprovida de qualquer outro elemento de prova que tenha servido de suporte à decisão é insuficiente a fundamentar um pedido de revisão perante o INSS.

Nesse sentido, veja-se a farta jurisprudência do STJ:

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. SENTENÇA NÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS E TESTEMUNHAIS.  INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CARACTERIZADO.

 1. Segundo entendimento pacífico desta Terceira Seção, a sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária.

 2. Não cabem embargos de divergência quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado. Súmula n.168/STJ.

 3. Agravo regimental improvido.

(AgRg nos EREsp  811.508/PR, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/11/2012, DJe 05/12/2012)

PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. POSSIBILIDADE.

JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. IMPOSSIBILIDADE.

1.  "A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária" (EREsp 616.242/RN, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, DJ 24.10.2005).  No mesmo sentido: AgRg no Ag 1.301.411/GO, Rel. Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador Convocado do TJ/RJ), Quinta Turma, DJe 12.5.2011; e AgRg no REsp 1255231/PE, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ/RS), Sexta Turma, DJe 16.5.2012.

2. O acórdão recorrido está em sintonia com atual orientação do STJ, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Súmula 83/STJ.

3. O Tribunal de origem consignou a suficiência da prova material e testemunhal para a comprovação do tempo de serviço pleiteado. A revisão desse entendimento depende de reexame fático, inviável em Recurso Especial, conforme disposto na Súmula 7/STJ.

4. Agravo Regimento não provido.

(AgRg no REsp 1317071/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/08/2012, DJe 03/09/2012)

PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR URBANO. TEMPO DE SERVIÇO. URBANO. SENTENÇA TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.

1. É possível a utilização da sentença trabalhista como início de prova material para comprovação do exercício de atividade laborativa, desde que existam outros elementos aptos à comprovação, na linha dos precedentes desta Corte sobre a matéria.

2. Agravo interno ao qual se nega provimento.

(AGRESP 200500142354, CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) - SEXTA TURMA, DJE DATA:03/11/2009.)

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA TRABALHISTA NÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PRECEDENTES.

1. A sentença trabalhista apenas será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, quando fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária, o que não ocorre na hipótese em apreço. Precedentes.

2. Agravo regimental desprovido.

(AGRESP 200802230699, LAURITA VAZ - QUINTA TURMA, DJE DATA:20/04/2009.)

AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. PROVA MATERIAL.

1. A jurisprudência pacífica desta Corte é de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material, sendo hábil para a determinação do tempo de serviço enunciado no artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, desde que fundada em elementos que evidenciem o exercício da atividade laborativa na função e períodos alegados na ação previdenciária, ainda que o INSS não tenha integrado a respectiva lide.

2. Agravo regimental improvido.

(AGRESP 200801064800, PAULO GALLOTTI - SEXTA TURMA, DJE DATA:06/10/2008.)

AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. SENTENÇA TRABALHISTA DESACOMPANHADA DE DOCUMENTAÇÃO A EVIDENCIAR A ATIVIDADE LABORATIVA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CARACTERIZADA. MATÉRIA PACÍFICA.

1. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que a sentença trabalhista pode ser considerada como início de prova material, mostrando-se hábil para a determinação do tempo de serviço previsto no artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, desde que fundada em elementos que evidenciem o exercício da atividade laborativa na função e períodos alegados na ação previdenciária, ainda que o INSS não tenha integrado a respectiva lide.

2. In casu, a decisão da Justiça do Trabalho não serve como prova apta a autorizar o reconhecimento do alegado tempo de serviço, pois inexistentes quaisquer documentos a evidenciar o exercício da atividade laborativa.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AGRESP 200800969977, PAULO GALLOTTI - SEXTA TURMA, DJE DATA:06/10/2008.)

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL. ANOTAÇÕES FEITAS POR ORDEM JUDICIAL. SENTENÇA TRABALHISTA NÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS E TESTEMUNHAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CARACTERIZADO. 

1. A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária. Precedentes das Turmas que compõem a Terceira Seção.

2. No caso em apreço, não houve produção de qualquer espécie de prova nos autos da reclamatória trabalhista, tendo havido acordo entre as partes.

3. Embargos de divergência acolhidos.

(ERESP 200500170474, LAURITA VAZ - TERCEIRA SEÇÃO, DJ DATA:24/10/2005 PG:00170.)

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Isto não significa negar validade à sentença trabalhista transitada em julgado. Esta produz efeitos no âmbito da relação de trabalho e dentro dos limites subjetivos da coisa julgada. Porém, para que sirva de documento hábil a embasar qualquer pretensão em face da Previdência Social, é necessário que a sentença tenha se baseado em prova documental contemporânea à relação de emprego declarada.

Contudo, pode ocorrer tratar-se de sentença homologatória de acordo, em processo na qual as partes resolveram por fim à lide sem que houvesse a produção de provas, reconhecendo a existência de um vínculo de emprego. Nessa hipótese, em face da ausência de prova material, a sentença homologatória não poderá ser utilizada como documento apto a fundamentar um pedido de revisão. Da mesma forma, pode ocorrer ainda tratar-se de sentença na qual o réu é condenado em razão dos efeitos da revelia, sem que haja produção de prova material robusta. Não são raros os casos em que se ajuíza ação trabalhista visando o reconhecimento de um vínculo de emprego, no qual as partes em conluio celebram acordo reconhecendo o vínculo, com o recolhimento das contribuições devidas pelo suposto empregador, tão somente com o fim de buscar posteriormente que tal avença produza efeitos na seara previdenciária.

Vejam-se a respeito os seguintes julgados:

PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. PROVA MATERIAL. SENTENÇA TRABALHISTA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. UTILIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

1. Impossível a utilização de sentença trabalhista homologatória de acordo judicial, como início de prova material, se não fundada em outros elementos que comprovem o labor apontado.

2. Agravo regimental ao qual se nega provimento.

(AgRg no AREsp 25.553/PR, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 02/08/2012, DJe 13/08/2012)

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO POR MEIO DE SENTENÇA TRABALHISTA. MERO RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE TRABALHO POR PARTE DO RECLAMADO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DE PROVAS A SUBSIDIAR O PEDIDO.

 I. "A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária. Precedentes das Turmas que compõem a Terceira Seção" (EREsp 616.242/RN, 3ª Seção, Rel. Min.ª Laurita Vaz, DJ 24/10/2005).

II. In casu, a sentença trabalhista tão somente homologou acordo firmado entre as partes, no qual o reclamado reconheceu relação de emprego do reclamante, não tendo sido juntado, porém, qualquer elemento que evidenciasse, na ação trabalhista, que ele houvesse prestado serviço na empresa e no período alegado na ação previdenciária. Agravo regimental desprovido. (AGRESP 200901121274, FELIX FISCHER - QUINTA TURMA, DJE DATA:30/11/2009.)

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL. ANOTAÇÕES FEITAS POR ORDEM JUDICIAL. SENTENÇA TRABALHISTA NÃO FUNDAMENTADA EM PROVAS DOCUMENTAIS E TESTEMUNHAIS.  INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CARACTERIZADO.

1. A sentença trabalhista será admitida como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, caso ela tenha sido fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador na ação previdenciária. Precedentes das Turmas que compõem a Terceira Seção.

2. No caso em apreço, não houve produção de qualquer espécie de prova nos autos da reclamatória trabalhista, tendo havido acordo entre as partes.

3. Embargos de divergência acolhidos.

 (EREsp. 616.242/RN, Rel. Min. Laurita Vaz, D.J. de 24/10/2005).

O entendimento administrativo do INSS a respeito da questão está consolidado na Súmula 04 do Conselho de Recursos da Previdência Social:

“Consoante inteligência do § 3º, do art. 55, da Lei 8.213/91, não será admitida como eficaz para comprovação de tempo de contribuição e para os fins previstos na legislação previdenciária, a ação Reclamatória Trabalhista em que a decisão não tenha sido fundamentada em início razoável de prova material contemporânea constante nos autos do processo.”

A Instrução Normativa INSS PRES 45/2010 trata da questão em seu art. 90.

De acordo com o disposto no art. 90, III da citada IN 45, tratando-se de ação trabalhista transitada em julgado envolvendo apenas a complementação de salários de contribuição de vínculo empregatício devidamente comprovado, não será exigido pelo INSS início de prova material, independente de existência de recolhimentos correspondentes.


3 – Decadência:

Questão relevante quanto à revisão de benefícios previdenciários é a relativa à decadência. A Lei 8213/91, na redação conferida ao art. 103 pela Lei 10.839/04, assim dispõe:

Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil.

Suponha-se que uma ação trabalhista se arraste por longos anos, buscando as partes o esgotamento de todas as vias recursais. Caso tenha decorrido o prazo fixado no art. 103, caput, da Lei 8213/91 quando do requerimento de revisão do benefício fundado na decisão proferida pela Justiça do Trabalho, ainda que tal decisão esteja amparada em farta prova documental, restará fulminada a pretensão revisional pela consumação da decadência.


4 - Conclusão

Em face da limitação constitucional da competência da Justiça do Trabalho em matéria previdenciária e dos limites subjetivos da coisa julgada, a sentença trabalhista não tem por si a força de impor obrigações no âmbito da relação entre o segurado e a Previdência Social.

A sentença trabalhista poderá servir como documento hábil a embasar pedido de revisão de benefício previdenciário desde que fundada em elementos probatórios que evidenciem a efetiva prestação de serviços e o período alegado pelo segurado.

Não é possível utilização de sentença meramente homologatória de acordo como início de prova material, se não fundada em outros elementos que comprovem o labor apontado no acordo.

Tratando-se de ação trabalhista transitada em julgado envolvendo apenas a complementação de salários de contribuição de vínculo empregatício devidamente comprovado, não é exigido pelo INSS início de prova material, conforme o disposto no art. 90, III da Instrução Normativa INSS PRES 45/2010.

Caso tenha transcorrido o prazo fixado no art. 103, caput, da Lei 8213/91, a pretensão revisional restará fulminada pela decadência.


Bibliografia:

AMADO, Frederico. Direito e Processo Previdenciário sistematizado. 3ª edição ampliada e atualizada. Salvador: JusPodivm, 2012.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 20ª edição. São Paulo: Atlas, 2004.


Notas

[1] Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar

(...)

VIII - a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a , e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;

[2] Súmula Vinculante 22 do STF: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho propostas por empregado contra empregador, inclusive aquelas que ainda não possuíam sentença de mérito em primeiro grau quando da promulgação da emenda constitucional nº 45/04.”

[3] Regime Geral de Previdência Social.

[4]  Código de Processo Civil - Art. 472.  A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros.

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Sobre o autor
Alexandre Lopes Ribeiro

Procurador Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Alexandre Lopes. Sentença trabalhista e revisão de benefícios previdenciários. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3557, 28 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24048. Acesso em: 22 nov. 2024.

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