5. Conclusão
Diante de tudo que se viu, conclui-se que:
1. Os sócios administradores não responderão pessoalmente pelos tributos devidos pelas empresas, salvo comprovação de atuação dolosa caracterizadora de infração à lei, contrato social ou estatuto, ou mesmo quando da prática de crime contra a ordem tributária, tudo nos moldes do Código Tributário Nacional, mais precisamente artigos 135 e 137.
2. Em que pese a existência de correntes contrárias, a responsabilidade do sócio gerente, nesses casos, deverá ser solidária à da empresa. A expressão responsabilidade pessoal não é sinônima de responsabilidade exclusiva ou mesmo subsidiária. Nada há na lei que permita concluir pela exclusão do dever da sociedade empresária de pagar aquilo que deve em virtude da concretização da hipótese de incidência tributária. O fato de os sócios usarem a pessoa jurídica como escudo para a prática de condutas ilícitas não pode e nem deve retirar do fisco o direito de buscar a satisfação de seu crédito também no patrimônio da empresa.
3. Poucos são os casos concretos nos quais a jurisprudência nacional vem admitindo a responsabilização do sócio gerente por dívidas da empresa - embora diversas sejam as hipóteses abstratas previstas em lei. Dentre as poucas situações de responsabilidade do sócio por infração à lei amplamente aceitas nos Tribunais pátrios destaca-se a de fechamento irregular da empresa. Argumenta-se aqui afronta às disposições do Código Civil de 2002 atinentes à dissolução e liquidação da pessoa jurídica.
4. A situação narrada acima torna-se ainda mais difícil na esfera processual, mais precisamente no curso do processo de execução fiscal. O entendimento dominante tem sido o de que o sócio gerente só responderá pela obrigação tributária inadimplida pela empresa quando seu nome constar na Certidão de Dívida Ativa Tributária. Fora disso, tem sido praticamente ignorado qualquer tipo de incidente processual cognitivo de verificação de prática violadora de lei contrato social ou estatuto por parte do administrador.
5. Com base no exposto no parágrafo anterior, e na presunção de boa-fé que deve nortear as relações negociais e a conduta dos administradores, o Superior Tribunal de Justiça, por meio de seu enunciado de súmula n. 430, pacificou o entendimento de que o mero inadimplemento de tributo não é suficiente para o deslocamento da obrigação tributária aos sócios. Levou-se em conta, de maneira sábia e bastante prudente, a existência de fatores externos outros que podem constituir óbices ao pagamento regular dos tributos, como a complexa estrutura burocrática e a elevada carga tributária do país.
6. Em seguida à publicação do enunciado supra, os magistrados passaram a reduzir ainda mais a importância do incidente cognitivo processual de reconhecimento da responsabilidade dos sócios. A expressão “por si só”, contida no verbete n. 430 do STJ não tem sido corretamente apreciada pelos Tribunais brasileiros.
7. Diversos são os casos de reiterado e voluntário inadimplemento de tributos decididos com base no verbete sumular em epígrafe. Os maus administradores agem dessa maneira valendo-se, dentre outras motivos, da combalida estrutura do Poder Judiciário nacional e da facilidade encontrada para ocultar bens de quem quer que seja. Executivos fiscais aos montes são extintos em decorrência do advento da prescrição intercorrente. Encoraja ainda as práticas narradas anteriormente a dificuldade de se conseguir a quebra do sigilo bancário das empresas devedoras e, sobretudo, de seus administradores.
8. Dentre as piores conseqüências do reiterado e voluntário inadimplemento de tributos, destaca-se: a) os fortes desequilíbrios na concorrência causados por tal prática; b) o aumento do número de demandas judiciais, mais especificamente de execuções fiscais ajuizadas em face das empresas inadimplentes; c) diminuição da arrecadação tributária e, consequentemente, da qualidade dos serviços prestados pelo Poder Público àqueles que realmente precisam.
9. Em resumo, o casual, esporádico e involuntário inadimplemento tributário não pode, de maneira alguma, ser tratado da mesma forma que o voluntário e reiterado inadimplemento. Tem-se, nesse último caso, planejamento tributário claramente ilegal e altamente lesivo à Fazenda Pública e, em última instância, à sociedade. Aqui, os sócios administradores infratores da lei devem ser chamados ao processo executivo fiscal e responder, ao lado da empresa, pelos valores devidos.
Notas
1 Enunciado n. 430 da súmula do Superior Tribunal de Justiça.
2 Art. 9º O registro dos atos constitutivos, de suas alterações e extinções (baixas), referentes a empresários e pessoas jurídicas em qualquer órgão envolvido no registro empresarial e na abertura da empresa, dos 3 (três) âmbitos de governo, ocorrerá independentemente da regularidade de obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem, sem prejuízo das responsabilidades do empresário, dos sócios ou dos administradores por tais obrigações, apuradas antes ou após o ato de extinção.
3 Nesse sentido: STJ, AgRg no Ag 1359231/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/0202011, Dje 28/04/2011; STJ, REsp 1216098/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/05/2011, Dje 31/05/2011; AgRg no REsp 1122807/PR, Rel. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/04/2010, Dje 23/04/2010.
4 Nesse sentido: STJ, REsp 1104064/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 14/12/2010.
5 COSTA, Regina Helena, Curso de Direito Tributário, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 205.
6 CANAZARO, Fábio. A Responsabilidade Tributária dos Sócios e Dirigentes em Relação ao passivo tributário da Sociedade Cooperativa. RDDT n. 145. Outubro de 2007. p. 23.
7 MACHADO, Hugo de Brito, Curso de Direito Tributário, 30ª ed., São Paulo: Malheiros, 2009. p. 161.
8 Enunciado n. 435 da súmula do Superior Tribunal de Justiça: Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio gerente.
9 PAULSEN, Leandro, ÁVILA, René Bergmann e SLIWKA, Ingrid Schroder, Direito processual tributário (processo administrativo fiscal e execução fiscal à luz da doutrina e da jurisprudência), 7ª ed. São Paulo: Livraria do advogado, 2012. p. 285.
10 Nesse sentido: STJ, REsp. 153.441/RS, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2001, DJe 04/02/2002.
11 TRF4, AG 0000584-98.2012.404.0000, Relator OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, SEGUNDA TURMA, DJ. 05/03/2012.
12 MARINS, Jaime, Direito Processual Tributário (administrativo e judicial). São Paulo: Dialética, 2001. PP. 535-6.
13 Nesse sentido: STJ, AgRg no REsp 1.104.109/RJ, Rel. ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2009, DJe 21/09/2009 );
14 DIDIER JR., Fredie, BRAGA, Paulo Sarno e OLIVEIRA, Rafael, Curso de Direito Processual Civil- Volume 2, 6ª Ed., Salvador: Jus Podivm, 2011, PP. 402-3.
15 Nesse sentido: TJPR - 3ª C.Cível - AC 0712510-6 - União da Vitória - Rel.: Des. Paulo Roberto Vasconcelos Unânime – J. 07.12.2010; TJPR - 1ª C.Cível - A 889289-7/01 - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Rel.: Fabio Andre Santos Muniz - Unânime - J. 15.05.2012; TJPR - 1ª C.Cível - A 863985-4/01 - Ponta Grossa - Rel.: Fabio Andre Santos Muniz - Unânime - J. 08.05.2012
16 Nesse sentido: STJ, REsp 529.464/PR, Relator Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/09/2003, Dje 13/10/2003.
17 CUNHA, Leonardo Carneiro da., A Fazenda Pública em Juízo, 9ª Ed., São Paulo, Dialética, 2011, PP. 390-1.