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Aspectos gerais do divórcio e inventário pela via extrajudicial

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12/07/2013 às 17:25
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4. Inventário Extrajudicial

4.1 . Requisitos para a realização do inventário extrajudicial

Nas palavras de César Fiuza "Inventário é, pois, processo judicial pelo qual se apura o ativo e o passivo da herança, a fim de se chegar à herança líquida (ativo menos passivo). Esta herança líquida, que se apura após o pagamento das dívidas e recebimento dos créditos, será, então, partilhada entre os herdeiros” (2004, p. 952).

Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário (Art. 982 do Código de Processo Civil, com redação dada pela Lei nº 11.441/07).

Dessa forma, são requisitos para que o inventário seja realizado extrajudicialmente, por meio de escritura pública em Tabelião de Notas, que (i) todos os herdeiros sejam capazes; (ii) o autor da herança não tenha deixado testamento e (iii) haja acordo entre os herdeiros quanto a partilha de bens.

Neste sentido, Sílvio de Salvo Venosa aduz que "persiste a necessidade de inventário judicial se houver testamento ou interessado incapaz. No testamento, há interesse público para seu exame e, havendo incapaz, há que se assegurar sua plena proteção" (VENOSA, 2008).

Existe uma corrente doutrinária que se manifesta no sentido de que o inventário só será obrigatoriamente judicial se o de cujus deixar testamento contendo disposições de ordem patrimonial. Se existir testamento com disposições apenas pessoais, abrir-se-á a possibilidade de que o inventário seja feito pela via administrativa, não obstante a existência daquele.

Esta corrente possui entre seus defensores a professora Maria Helena Diniz, que leciona serem requisitos do regime notarial na sucessão causa mortis: a) todos os interessados sejam maiores e capazes ou emancipados; b) a sucessão seja legítima, pois o de cujus não pode ter deixado testamento contendo disposições de ordem patrimonial. Logo, nada obsta a que o inventário se dê administrativamente, se o testamento por ele feito contiver disposições pessoais, p. ex., emancipação de filho; reconhecimento de prole ou de união estável; instituição de tutor testamentário (CC, art. 1.729, parágrafo único) ou de bem de família convencional (CC, art. 1.711); revogação de testamento anterior, para que sejam aplicáveis as normas da sucessão legítima [...] (DINIZ, 2009).

Vale relembrar que, tal como na separação e divórcio extrajudicial, as escrituras públicas de inventário e partilha também não dependem de homologação judicial e são títulos hábeis para o registro civil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de valores – DETRAN, Junta Comercial, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas, etc.(art. 3ºda Resolução CNJ n.º 35/2007).

4.2. Do Prazo e possibilidade de desistência do inventário judicial

O artigo 983, do CPC determina que o prazo para abertura de inventário é de 60 dias. Todavia, o referido artigo, trata tão somente da penalidade de ordem fiscal, que caso não seja respeitado o respectivo prazo de 60 dias – contados a partir da data do óbito do autor da herança – haverá a aplicação de multa sobre o valor do imposto, além de correção monetária e juros de mora.

O artigo 31 da Resolução do Conselho Nacional de Justiça determina que “a escritura pública de inventário e partilha pode ser lavrada a qualquer tempo, cabendo ao tabelião fiscalizar o recolhimento de eventual multa, conforme previsão em legislação tributária estadual e distrital específicas.”

É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial, nos termos do artigo 2º da Resolução do Conselho Nacional.

4.3. Nomeação de responsável e indícios de fraude

É obrigatória a nomeação de interessado, na escritura pública de inventário e partilha, para representar o espólio, com poderes de inventariante, no cumprimento de obrigações ativas ou passivas pendentes, sem necessidade de seguir a ordem prevista no art. 990 do Código de Processo Civil. (art. 11 da Resolução 35/2007).

Além disso, o tabelião poderá se negar a lavrar a escritura de inventário ou partilha se houver fundados indícios de fraude ou em caso de dúvidas sobre a declaração de vontade de algum dos herdeiros, fundamentando a recusa por escrito (nos termos do art. 32 da Resolução 35/2007),

4.4. Recolhimento dos tributos

Cabe ressaltar que os prazos e alíquotas de recolhimento do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos – ITCMD dependem das leis estaduais que tratam da matéria. Todavia, o recolhimento do referido ITCMD é efetuado antes da lavratura das escrituras de inventário e partilha, mesmo se os bens partilhados forem situados em outras unidades da federação.

4.5. Existência de herdeiro analfabeto

Conforme leciona Cassettari, no caso da existência de herdeiro analfabeto, o notário deverá declarar o fato na escritura e colher a impressão digital do referido herdeiro, solicitando que alguém assine a seu rogo (2010, p.153).

Neste mesmo sentido, o referido autor cita orientação do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, estabelecendo que “sendo a parte analfabeta ou não podendo assinar, o notário declarará, colhendo a impressão digital do herdeiro, cônjuge supérstite, separando ou divorciando impossibilitado, caso em que a pessoa qualificada assina a seu rogo”.

4.6. A Cessão de Direitos Hereditários, doação e renúncia de direitos na escritura de inventário

A cessão, doação e renúncia de direitos hereditários são atos jurídicos distintos do inventário, plenamente autorizados, podendo ser realizados no teor da escritura de inventário e partilha.

No caso específico da renúncia, que é ato jurídico unilateral, cabe destacar também que existem duas modalidades: a renúncia pura e simples ou também chamada de abdicativa, quando não beneficia um herdeiro específico, e a renúncia imprópria ou translativa, quando feita em favor de alguém, importando em cessão de direitos hereditários. No primeiro caso, não incidirá os impostos causa-mortis e inter-vivos, no segundo, ocorrerá incidência tributária.

4.7. Sobrepartilha

A Sobrepartilha ou a partilha adicional, segundo Maria Helena Diniz, é uma nova partilha de bens que, por razões fáticas ou jurídicas, não puderam ser divididos entre os titulares dos direitos hereditários (DINIZ, 2008).

Nesse sentido versa os artigos 2.021e 2.022 do Código Civil, respectivamente:

Art. 2.021- Quando parte da herança consistir em bens remotos do lugar do inventário, litigiosos, ou de liquidação morosa ou difícil, poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dos outros, reservando-se aqueles para uma ou mais sobrepartilhas, sob a guarda e administração do mesmo ou diverso inventariante, e consentimento da maioria dos herdeiros.

Art. 2.022- Ficam sujeitos a sobrepartilha os sonegados e quaisquer outros bens da herança de que se tiver ciência depois da partilha.

Francisco José Cahali ensina que a sobrepartilha também pode ser chamada de complementação da partilha, partilha adicional ou nova partilha, o que demonstra que ela poderá ser feita não só nas hipóteses do artigo 1.040 do CPC, mas também quando necessário para dividir bens que por qualquer motivo não tenham sido partilhados no inventário (2003, p. 519).

O Conselho Nacional de Justiça, na Resolução nº. 35, de 24/04/2007, definiu claramente, em seu artigo 25, a competência do tabelião para realizar sobrepartilhas, nos seguintes temos:

Art. 25. “É admissível à sobrepartilha por escritura pública, ainda que referente a inventário e partilha judiciais já findos, mesmo que o herdeiro, hoje maior e capaz, fosse menor ou incapaz ao tempo do óbito ou do processo judicial.”

Admite-se escritura pública com partilha parcial, quando não seja possível partilhar todos os bens deixados pelo autor da herança. Os bens deixados para sobrepartilha são aqueles que dependem de decisão por serem litigiosos, os sonegados, os que se achem em lugar distante ou de difícil acesso e os que se apurem posteriormente.

A sobrepartilha será realizada pela mesma forma como a partilha, ou seja, por outra escritura pública, desde que todos os herdeiros sejam capazes e concordes. Caso subsista litígio, a sobrepartilha será objeto de ação judicial, por inventário comum.

No caso da existência de erros na partilha, pode ser feita a retificação por meio de escritura pública, com as mesmas formalidades do ato original, desde que compareçam todos os interessados.

4.6. Dos documentos exigidos para a realização da escritura de inventário

De acordo com as recomendações do Colégio Notarial do Brasil, para lavratura da escritura de inventário são necessários os seguintes documentos:

- Documentos do falecido

- RG, CPF, certidão de óbito, certidão de casamento (atualizada até 90 dias) e escritura de pacto antenupcial (se houver);

- Certidão comprobatória de inexistência de testamento expedida pelo Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo (http://www.cnbsp.org.br/Rcto.aspx);

- Certidão negativa da Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional;

- Documentos do cônjuge, herdeiros e respectivos cônjuges

- RG e CPF, informação sobre profissão, endereço, certidão de nascimento, certidão de casamento dos cônjuges (atualizada até 90 dias).

- Documentos do advogado

- Carteira da OAB, informação sobre estado civil e endereço do advogado

- Informações sobre bens, dívidas e obrigações, descrição da partilha e pagamento do ITCMD

- imóveis urbanos: certidão de ônus expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis (atualizada até 30 dias), carnê de IPTU, certidão negativa de tributos municipais incidentes sobre imóveis, declaração de quitação de débitos condominiais

- imóveis rurais: certidão de ônus expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis (atualizada até 30 dias), cópia autenticada da declaração de ITR dos últimos 5 (cinco) anos ou Certidão Negativa de Débitos de Imóvel Rural emitida pela Secretaria da Receita Federal – Ministério da Fazenda, CCIR – Certificado de Cadastro de Imóvel Rural expedido pelo INCRA

- bens móveis: documento de veículos, extratos bancários, certidão da junta comercial ou do cartório de registro civil de pessoas jurídicas, notas fiscais de bens e jóias, etc.

Atenção: O pagamento do imposto de transmissão causa mortis (ITCMD) deve ser efetuado em até 180 dias da data do óbito.


5. Conclusões

A Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007, alterou a redação do Código de Processo Civil, possibilitando que a separação, o divórcio, o inventário e a partilha, sejam objeto de lavratura de escritura pública através da via administrativa, desde que obedecidas as exigências legais e preenchidos os requisitos e pressupostos jurídicos.

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Máxima do princípio constitucional da razoável duração dos processos e da celeridade processual, a lei surgiu para satisfazer os anseios da população moderna. Todavia, embora existam posicionamentos doutrinários em sentido diverso, o novo procedimento surge como uma faculdade aos interessados e não como uma obrigação para que eles requeiram seus direitos extrajudicialmente.

Inegavelmente, a referida Lei inovou o ordenamento jurídico brasileiro e representa um avanço da sociedade brasileira, tendo em vista que trouxe agilidade ao desfecho do inventário e partilha amigável, bem como simplificou o procedimento de separação e divórcio consensual, contribuindo para desafogar o Poder Judiciário e melhorar a vida das pessoas.


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Nota

[1] Colégio Notarial do Brasil: http://www.cnbsp.org.br/AtosNotariais.aspx?AtoID=7

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Sobre o autor
Jadir Silva Rocha

Auditor Interno do Banco do Brasil S.A., Advogado, Pós-graduado em Direito Público e Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino – UMSA.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROCHA, Jadir Silva. Aspectos gerais do divórcio e inventário pela via extrajudicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3663, 12 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24911. Acesso em: 26 abr. 2024.

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