Há muito se sofre e se reclama dos embaraços que postergam a cobrança judicial dos rateios de condomínio: são demasiados os anos contados desde o inadimplemento da cota até que se alcance o recebimento do valor.
Em conseqüência, a operação do condomínio é prejudicada e os adimplentes findam suportando a parcela do orçamento que não foi liquidada, por muito tempo e em adição ao valor que lhes compete; enfim, são obrigados a pagar a conta do inadimplente, que por seu turno permanece gozando do condomínio.
Já não surpreende a abundância de situações em que o débito amontoado é maior do que, até, o valor da unidade geradora das despesas, a demonstrar quanto tarda a solução da demanda judicial. Embora a base legal (senão moral) da cobrança das contribuições seja pacífica, tal não impede o arrastar dos processos judiciais.
Isso se dá não apenas devido às carências da estrutura do Poder Judiciário, mas porque, se é verdade que a lei prevê que a ação de cobrança corra pelo “procedimento sumário” (espécie do gênero “procedimento comum”, criada em prol da redução do tempo de trâmite do processo), também é verdade que de sumário (ou rápido) esse procedimento nada tem.
Aliás, o “procedimento sumário” já foi denominado “procedimento sumaríssimo”; a Constituição Federal o chamou, cogitando das “causas cíveis de menor complexidade”, de “procedimento sumariíssimo” e somente recebeu a atual designação em 1.995, talvez numa busca, pelo legislador, de razoável precisão terminológica através da supressão do sufixo que além de incorreto (havia procedimento sumário e repentinamente, havia o procedimento sumaríssimo, sem intermédio) traduzia evidente incoerência entre o significado e o significante.
Sobre o curso das ações pelo procedimento sumário, a se crer na lei vigente: uma vez ajuizada a ação ocorreria audiência de conciliação em trinta dias (art. 277, do CPC), proferindo-se sentença se injustificadamente o réu a ela faltar; se for desnecessária perícia (como o é, normalmente, no caso de cobrança de rateio de condomínio), haveria de ser “designada audiência de instrução e julgamento para data próxima, não excedente a 30 (trinta) dias” (art. 278, parágrafo 2º, do CPC); ao depois, “findos a instrução e os debates orais, o juiz proferirá sentença na própria audiência ou no prazo de 10 (dez) dias” (art. 281, do CPC). Assim, em setenta dias se atingiria a sentença.
Porém, a realidade é diversa: são conhecidos os óbices de toda ordem que impedem a rapidez que a lei supôs, a ponto de terem os juízes, com indiscutível atenção à realidade, passado a determinar a tramitação da demanda pelo “procedimento ordinário”, que finda sendo mais célere, providência que é admitida pela jurisprudência. Seja como for, um dia será alcançada a sentença.
Mas não se encerrará, ainda, a faina: sentenciada a procedência da ação de cobrança, o vencedor deverá aguardar o julgamento do recurso de apelação (processado com os efeitos devolutivo e suspensivo) oposto pelo condômino vencido. A quase totalidade dos recursos, nessas situações, resulta na manutenção da decisão de primeiro grau de jurisdição, mas o tempo, este corre, e o débito, se avoluma.
Depois de mantida a decisão condenatória é iniciada a execução propriamente dita, inaugurando-se a fase de cumprimento da sentença (certa e exigível), que por si só, pode ser penosa: não sendo encontrado dinheiro passível de penhora, realizar-se-á a constrição da unidade condominial, exigindo, os procedimentos, minuciosas cautelas e custosas providências. Por fim, o bem penhorado precisará ser avaliado (consumindo energia, tempo, dinheiro), prosseguindo-se no processo até a alienação pública e, ultrapassados os trâmites finais, o pagamento ao credor.
Tudo se dá sob a possibilidade de oferecimento de objeções, recursos, impugnações ou embargos e, deve ser dito, o suporte da sucumbência (ou, ainda, da eventual pena por litigância indevida) pelo vencido, decorrente de incidentes processuais ofertados mesmo que com insucesso previsível, não assusta o devedor. Este, a tais alturas, já convive com volumoso débito e, muitas vezes, já se sente em conforto, assediado que é pelo Condomínio, cujas finanças provavelmente precárias (devido à tardança do resultado da cobrança) motivam urgentes e repetidas tentativas de acordos, com o abatimento de valores ou o alongamento extremo do prazo para liquidação.
Somente depois dessa epopéia o condomínio receberá.
Ou seja, malgrado exista lei impondo o pagamento do rateio de despesas de condomínio (aí está o Código Civil), essa imposição tem ficado no vazio, mercê das normas processuais.
Não era assim: a Lei nº. 4.591, de 1.964 previa no seu art. 12, parágrafo 2º: “Cabe ao síndico arrecadar as contribuições, competindo-lhe promover, por via executiva, a cobrança judicial das cotas atrasadas”. Mas, a “via executiva” foi afastada em 1.973, quando o Código de Processo Civil dispôs no art. 275 – II “b” o que hoje se conhece como “procedimento sumário” quando se tratar “de cobrança ao condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio” (na redação dada pela Lei nº. 9.245, de 1.995).
Observe-se que essa hoje inexistente possibilidade de execução das contribuições de condomínio não se confunde com aqueles casos em que o locador as execute ante ao locatário, com base na relação jurídica com este mantida (desde que esta abranja o dever de pagar tais rateios), como já é admitido pelo art. 585 – V, do CPC (“V – o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio”, na redação dada pela Lei nº. 11.382, de 2006).
Ora, há muito se pensa no retorno à antiga execução, que economizaria cerca de dois terços do tempo gasto no processo judicial, pois ao ter o crédito expresso em um título executivo, o credor pode executar o patrimônio do devedor, imediatamente o penhorando, até que receba. Lembre-se, isso somente ocorre atualmente, no que diz com os condomínios, quando a sentença que condenou o condômino a pagar, transitar em julgado (formando-se o título).
A possibilidade conceitual (hoje ainda não legal, pois falta lei que o expresse) de executar tais contribuições parece existir: o título executivo extrajudicial, expressando obrigação certa, líquida e exigível, se comporia pelo conjunto da convenção de condomínio (da qual se extrai basicamente o critério de divisão das despesas dentre as unidades autônomas condominiais), da ata de assembléia aprovando o orçamento (o montante a dividir), da discriminação do débito e da data prevista para o vencimento. Já a sujeição passiva na execução decorreria do Código Civil, cujo art. 1.336 impõe ao condômino o dever de “I - contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção”.
Ao menos o futuro é promissor. Esquecida no primeiro Projeto do novo Código Processual, a atribuição de força executiva ao crédito relativo à contribuição condominial foi bem lembrada no relatório geral coordenado pelo Senador Valter Pereira.
E, em boa hora o Deputado Federal Paulo Teixeira, Relator-Geral do Projeto de Lei nº. 8.046, de 2010, o “Novo Código de Processo Civil” opinou por incluir entre os títulos executivos “o crédito referente a contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício previstas em convenção de condomínio ou aprovadas em assembléia geral, desde que documentalmente comprovadas”.
Às vezes a boa novidade é antiga. Esperemos que a aprovação do Projeto de Lei deixe no passado aquelas cobranças tormentosas, tão danosas aos condomínios edilícios.