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SESC e SENAC, burlando a lei, cobram por cursos profissionais aos trabalhadores

02/01/2014 às 08:09
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O SESC-SENAC cobra de forma abusiva por cursos que deveriam ser prestados gratuitamente à mão de obra operária, pois recebe recursos públicos para isso.

O SESC (Serviço Social do Comércio), como o SENAC (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), entidades administradas pela Confederação Nacional do Comércio, por outorga do Decreto-Lei nº. 9.853/46 e Decreto-Lei n° 8.621/46, nasceram credenciadas tão-somente para planejar e executar medidas que contribuam para o bem estar social e a melhoria do padrão de vida dos comerciários e suas famílias e da difusão e aperfeiçoamento do ensino comercial, formando e treinando mão de obra destinada a atender o segmento de comerciantes, conforme está preceituado nos respectivos artigos primeiros de cada Decreto-Lei acima identificado.

Logo o objeto fim tanto do SESC como do SENAC é cuidar da formação, treinamento e aperfeiçoamento da mão de obra operária do Comércio e, para isso, recebem contribuições tributárias recolhidas mensal e compulsoriamente das empresas de comércio, como assinalam as duas legislações de base, e ainda, de forma anômala e ilegal, de boa parte das empresas de serviços que não têm nenhuma relação com o segmento de compra e venda de mercadorias e bens.

Mas hoje — nas barbas das autoridades, do Governo, do Judiciário — sabe-se que há algo de estranho no reino da Dinamarca. O SESC-SENAC cobra diretamente do trabalhador cursos que deveria oferecer gratuitamente e faz acintosas publicidades a respeito dos cursos oferecidos à classe trabalhadora como se fosse uma divulgação normal. De forma absurda, os valores cobrados ao trabalhador são bem mais elevados que os oferecidos por  escolas de ensino técnico privadas.

Essa linha publicitária pela qual vendem seus cursos se vê, por exemplo, no próprio site do SENAC e do SESC ([email protected][email protected] /WWW.rj.senac.br ou pelo telefone 4002-2002 e nos anúncios no Jornal O GLOBO, de 28/9/2012 (curso técnico em enfermagem ao preço de R$ 1770,00); 08/10/2012, (pág. 9, curso de moda, ao preço de R$ 1.213,00); de 13/9/2011, (curso de design de ambientes, ao preço de R$ 2.510,00); de 29/9/2012, (curso de cabeleireira, ao preço de R$ 1.890,00); 24/7/2011, (curso superior em graduação de Sistema par Internet; Redes de Computadores; Gestão de Telecomunicações, ao preço cada de 12 parcelas de R$ 480,00) e muitos outros anúncios para venda de cursos em geral.

Importante frisar que tais Instituições, apesar de serem entidades privadas, são bancadas por contribuições tributárias destinadas pelos estabelecimentos comerciais submissos à Confederação Nacional do Comércio (art. 3º do Decreto-lei nº. 9.853/46 e do art. 4º do Decreto-lei nº. 8.621/46), logo os serviços de formação técnico-profissional aos trabalhadores comerciários terão de ser gratuitos, pois é exatamente isto que assegura também — repetindo o que está nos decretos-leis básicos dessas entidades da CNC —  o art.  3º  do Decreto nº 61.843/67, do Regulamento do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac): “ oferecer formação inicial, com mínimo de cento e sessenta horas, em programa de gratuidade;  reconhecer e certificar a experiência profissional como formação inicial de trabalhadores, inserida nos itinerários formativos como condição para a realização de cursos iniciais de menor duração; Oferecer formação inicial, com no mínimo de cento e sessenta horas, em programa de gratuidade; garantir oferta de vagas gratuitas em aprendizagem, formação inicial e continuada e em educação profissional técnica de nível médio, a pessoas de baixa renda, na condição de alunos matriculados ou egressos da educação básica, e a trabalhadores, empregados ou desempregados (...). E o Brasil é o único país do mundo a ter um tributo privado!

Assim, o sistema SESC-SENAC teria que ser, por determinação, um exemplo para a sociedade, mas vem agindo de forma totalmente contrária ao ideal de sua criação. Por ganância, deixa de cumprir seu dever legal. Consegue recursos por via tributária e os aplica em negócios paralelos que nada têm a ver com a formação profissional do trabalhador comerciário, constituindo aí verdadeiros impérios estranhos ao fim que lhe determinaram os Decretos-Leis.

 A CNC — entidade-mater do SESC-SENAC — também investe essa arrecadação tributária em fartas propagandas (mídia) e na aquisição de imóveis e mais empreendimentos como se fosse um conglomerado empresarial, mas tudo com dinheiro tributário desviado.

       Também os recursos tributários têm origem em cobranças ilegais a muitas empresas de serviços que, reagindo, dirigem-se ao Judiciário, pois não existe nenhuma lei que as ponha na condição de sujeito passivo dessa obrigação. Mas, em alguns casos quando deveriam receber justa chancela de respeito à CF (art. 150, I) e ao CTN (art. 97), alguns juízes se atrelam a beneficiar o SESC-SENAC e de modo estranho, fundamentam que devem as empresas em geral pagar os SESC-SENAC em virtude de “essas entidades proporcionarem a valorização do trabalho humano”  e “assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”, como o fez o Ministro Mauro Campbell ao argumentar na recente edição da Súmula 499 do STJ que vem impor a todas as empresas de serviços a condição de sujeito passivo de uma obrigação tributária, para elas, inexistente.

  Mas essa formar tendenciosa de judicar já se acha sob a apreciação do CNJ e da presidência do STJ.

   Em verdade, o que se vê — o Governo, o Judiciário e o Congresso Nacional não se atentam a essa imoralidade e passivamente se postam — é uma conduta infringente que só prejudica os reais beneficiários dos referidos Decretos-Leis, ou seja, os trabalhadores do comércio. E, por esse caminho desviante, investe também a CNC na aquisição de propaganda em TVs, em ônibus, além de aplicação em empreendimentos como colégios para alunos da classe alta (como o da Barra da Tijuca, no Rio), universidades, hotéis de alto padrão/luxo, editoras, canal de televisão.

  Prejudicando abertamente os trabalhadores — e agindo com equidade social ao contrário — o SESC-SENAC vem explorando aqueles a quem deveriam atender sem ônus, pois recebe tributariamente para isso, cobrando de forma abusiva por cursos que deveriam ser gratuitamente prestados à mão de obra operária.

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  Para se ter ideia dessa gravidade da conduta da CNC, os mais simples cursos da alçada e nível do trabalhador são cobrados por valores elevados, podendo ser citados, a título de amostragem, os seguintes: cabeleireiro; camareira de hotel; auxiliar de Confeitaria; confeccionador e montador de bijuterias; cuidador de idosos; cozinheira de comida japonesa; cuidador de Crianças; depilador; auxiliar de decoração; design de sobrancelhas; DJ – disc-jóquei;  confeiteiro de doces para festas; técnico em segurança do trabalho;  cursos de geleias e compotas (doceiro); garçon; auxiliar de garçom; recepcionista; recepcionista de hospital; introdução à informática; comin; manicure e pedicure; maquiador; massagista; mensageiro em meios de hospedagem; cabineiro (operador de elevador); padeiro- confeiteiro; auxiliar de aplicador de “Pedras Quentes” (curso de beleza); pizzaiolo; porteiro e vigia; preparador de churrasco; saladeiro (auxiliar de cozinha); técnicas para auxiliar de cozinheiro; curso de governanta em meios de hospedagem; curso de vitrinista; cozinheiro de gastronomia árabe; auxiliar de contabilidade; auxiliar de secretaria escolar.

... e muitos outros cursos que o trabalhador, para inscrever-se, tem de pagar e caro, como se pode ver em simples levantamento nos sítios da internet das 39 unidades do SENAC/SESC no País.

São, por fim, “vendidos” 323 cursos, identificados por diferentes categorias, como Graduação, Pós Graduação, curso técnico, curso livre, ensino a distância e todos são pagos. Os ditos gratuitos (inexpressivos) não são cursos de qualificação profissional.

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Sobre o autor
Victor Antonio Nascimento

Advogado no RJ (OAB-RJ n°128976), pós-graduado em Direito Público, membro da ANAE e pesquisador do IBOSS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASCIMENTO, Victor Antonio. SESC e SENAC, burlando a lei, cobram por cursos profissionais aos trabalhadores. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3837, 2 jan. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26310. Acesso em: 28 mar. 2024.

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