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Do indevido pagamento do serviço de corretagem pelos compradores de imóveis na planta em stand de vendas das construtoras

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As construtoras condicionam a venda de seus produtos à contratação de serviço de corretagem que, na situação descrita, não foi prestado ao consumidor.

Resumo: O presente artigo pretende demonstrar a ilegalidade da cobrança dos serviços de corretagem ao comprador que adquire imóvel na planta quando ele se dirige ao stand de vendas do empreendimento e realiza o negócio.

Analisando a questão sob o aspecto do que acontece no mundo real, demonstra-se a existência de prática que lesa o consumidor ao transferir o ônus do pagamento da corretagem na específica situação mencionada.

Palavras-chave: Taxa de corretagem; Ilegalidade da cobrança ao consumidor; Imóvel adquirido na planta.


Introdução

Atualmente, tem se tornado demasiadamente comum a prática das construtoras em repassar o ônus de arcar com os valores de corretagem na compra de imóveis na planta para os compromissários compradores.

Em tempos em que a construção civil vive um momento de bons resultados, onde dezenas de vendas de apartamentos são realizadas quase que diariamente em algumas cidades do Brasil, os consumidores ainda assim têm sido constantemente lesados ao se verem obrigados a pagar taxa de corretagem para realizar a compra do tão sonhado imóvel próprio.

O presente artigo não questiona a validade dos valores da taxa de corretagem propriamente dita, já que o corretor, ao ter realizado o seu trabalho satisfatoriamente, merece e deve receber pelos seus serviços.

Entretanto, a prática de repassar esses custos aos compradores de imóveis não encontra amparo no ordenamento jurídico consumerista brasileiro, pois os serviços devem ser arcados por quem em verdade a contratou.


Breves noções sobre a corretagem

A corretagem encontra-se disciplinada no Capítulo XIII do Código Civil (CC/02), abrangendo os arts. 722 a 729. No âmbito imobiliário, a regularização dos corretores de imóveis está prevista na Lei nº 6.530/78, ao passo que é regulamentada pelo Decreto nº 81.871/78.

Nos termos do art. 722 do CC/02, o contrato de corretagem é negócio no qual “(...) uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas.”.

Nessa esteira, é papel do corretor intermediar o objeto de negociação entre as partes contratantes, cujo objetivo pode se tratar de venda, locação ou permuta de imóveis.

Assim, ao intermediar uma aquisição imobiliária, o corretor tem direito a receber o pagamento pelos seus serviços prestados. Resta saber então, quem irá pagar essa conta.


Da ilicitude do repasse da corretagem

Quando determinada construtora ou incorporadora finaliza um empreendimento novo, é comum a criação de stands para demonstrar seus produtos aos consumidores, ao que estão ali presentes diversos corretores prestando nitidamente serviços tão somente às empresas que construíram tais novos empreendimentos.

O que ocorre é que nestas situações há toda a aparência de que os compradores estão adquirindo seus imóveis diretamente com as construtoras, já que muitas vezes o stand de vendas possui o logotipo da construtora e do empreendimento, bem como já são apresentados aos consumidores os contratos de promessa de compra e venda em nome da construtora.

Em situações como estas, havendo ou não cláusula no contrato de promessa de compra e venda do imóvel estipulando que o comprador arque com os custos da corretagem, a referida obrigação não deve prosperar já que os serviços de corretagem são prestados para as construtoras.

Visando inibir condutas deste tipo, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu art. 51, IV, estabelece o seguinte:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

Nessa esteira, a previsão de responsabilidade do consumidor pelo pagamento da corretagem é abusiva, já que o coloca em desvantagem ao estipular que este arque com valores de serviços que não lhe foi prestados.

Nesse mesmo sentido, a jurisprudência vem se manifestado, conforme o julgado abaixo transcrito:

“CIVIL E DEFESA DO CONSUMIDOR. FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. REVISÃO DE CONTRATO. SALDO DEVEDOR. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO INICIAL. DATA ANTERIOR À CELEBRAÇÃO DO CONTRATO. IMPOSSIBILIDADE. CORRETORA CONTRATADA PELA INCORPORADORA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. ÔNUS DO CONTRATANTE. PAGAMENTO PELO CONSUMIDOR. INADMISSIBILIDADE. INADIMPLEMENTO DO PROMITENTE COMPRADOR. MORA. JUROS. PERCENTUAL DE 20%. VIOLAÇÃO DO § 1º DO ART. 52 DO CDC. REDUÇÃO PARA 2%.É descabida a incidência de correção monetária a partir de data anterior a celebração do contrato de promessa de compra e venda de unidade imobiliária .A correção é devida a partir da data em que foi celebrado o contrato entre as partes. Se a corretora foi contratada pela incorporadora, não pode esta pretender que o comprador arque com o pagamento das despesas de corretagem. O pagamento feito sob esta rubrica deve ser considerado como pagamento de parte do preço da unidade imobiliária adquirida.É abusiva a multa moratória fixada em 20% do valor da prestação, devendo a mesma ser reduzida para 2%, adequando-se ao limite do § 1º do art. 52 do CDC. Precedentes do TJERJ. Provimento do recurso”. (TJ-RJ. Processo nº 2008.001.24235. Décima Sexta Câmara Cível. 15 de Setembro de 2008). (Grifos acrescidos)

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Outro fato que fortalece a tese de ser indevido o ônus do pagamento da corretagem pelo comprador do imóvel é que os contratos confeccionados pelas construtoras tratam-se de contratos de adesão, o que não permite ao consumidor a opção de pagamento, ou, caso quisesse, a situação enfrentada nos stands não permite ao comprador escolher um corretor de sua confiança na grande maioria das vezes.

Vale ressaltar também que é totalmente desarrazoado se presumir e aceitar que um homem médio, por sua livre e espontânea vontade, concorde em arcar com os custos de um serviço que não lhe foi prestado no momento da realização da compra do imóvel, ainda mais depois de assumir um compromisso financeiro que, na grande maioria das vezes, é grande para quem está comprando um novo imóvel para morar.

Como se vê, a prática de condicionar a venda do imóvel ao pagamento da corretagem pelo comprador é conduta análoga à venda casada, o que, mais uma vez, não é permitida pelo CDC, já que as construtoras condicionam a venda de seus produtos à contratação de serviço de corretagem que, nesta situação, não foi prestado ao consumidor. Para que não restem dúvidas, segue a transcrição do art. 39, I, do CDC:

Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

I - condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;

Por estas razões, a prática de repassar os custos da corretagem ao comprador é abusiva. Assim, o CDC, mais uma vez atuando em defesa do consumidor, estabelece no parágrafo único do art. 42 o seguinte:

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

Desta forma, aquele consumidor que teve de arcar com os custos da corretagem, tem o direito de receber em dobro aquilo que pagou indevidamente por condição inicialmente imposta pela construtora.

Vale mencionar que a hipótese aqui defendida trata-se da situação em que o comprador se dirige ao stand de vendas de um empreendimento e ali fatalmente será abordado por um corretor presente, atuando em nome da corretora, porém a serviço da construtora do empreendimento.

O corretor, nestas situações, atua em verdade como se fosse um mero vendedor da construtora que objetiva tão somente a venda de um produto e não a aproximação entre as partes contratantes.

Em outras situações nada impede de que o comprador efetivamente tenha o dever de arcar com a corretagem, especialmente quando ele se dirige ao corretor diretamente e busca, através deste último, informações e aproximações com promissários vendedores de imóveis que tenha interesse de adquirir e acabe por realizar a compra. Porém, esta não é a situação de quem comparece ao stand de venda de determinado empreendimento.


Considerações Finais

Tendo em vista os fatos que se traduzem em situação diversa do exercício da aproximação das partes, quando o consumidor se desloca diretamente ao stand de vendas de determinado empreendimento, para adquirir uma unidade à venda, não se mostra lícito o repasse da taxa de corretagem ao adquirente, já que o serviço está sendo nitidamente prestado ao compromissário vendedor.

Vale lembrar que o direito somente nasceu para regular o mundo real, razão pela qual, o fato de o corretor presente no stand de vendas de um empreendimento realizar a venda de um imóvel ali disposto, não transforma a situação de venda em serviço de corretagem para ser arcada pelo comprador.

Assim, em decorrência de a atividade de corretagem ter previsão legal, não se pode visualizar os fatos no mundo real de forma distorcida a fazer prevalecer o que está estabelecido no mundo jurídico, abarcando uma situação parecida com o que se está acontecendo na realidade, mas que em verdade não é, ou seja, aquele corretor que presta serviço a uma construtora em seu stand de vendas, não aproxima as partes, mas sim realiza uma verdadeira venda em nome da construtora, agindo nesta oportunidade como vendedor que deve ser remunerado pela empresa que lhe contratou no intuito de oferecer seus imóveis ao público do stand de vendas.

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Sobre o autor
Antônio Felix do Nascimento Neto

Advogado – Pós-graduando em Direito Tributário pelo IBET – Sócio do escritório Barradas e Felix Advogados Associados

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NASCIMENTO NETO, Antônio Felix. Do indevido pagamento do serviço de corretagem pelos compradores de imóveis na planta em stand de vendas das construtoras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3856, 21 jan. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26458. Acesso em: 19 mar. 2024.

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