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UPP: a ocupação paliativa

19/02/2014 às 14:18
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A inviabilidade da mera política de ocupação de favelas como solução de segurança pública contra o tráfico de drogas.

A notícia de que o comandante geral das UPPs – Unidades de Polícia Pacificadora do Rio de Janeiro se feriu durante um tiroteio na favela da Rocinha traz à tona, mais uma vez, a discussão sobre a efetividade do modelo de combate às atividades criminosas através de políticas de ocupação. Afinal, ocupar as favelas é eficaz contra o tráfico de drogas?

A resposta não é simples, mas, a médio prazo, a negativa de impõe.

Não há dúvida de que a chegada maciça do Poder Público numa localidade dominada pelo tráfico representa uma mudança significativa no panorama. Se antes da ocupação o domínio das quadrilhas era absoluto, com o crime praticado a qualquer hora, a céu aberto, e a eventual chegada da polícia podia ser percebida com bastante antecedência, ter os policiais constantemente presentes na comunidade dificulta enormemente os ilícitos.

O efeito deste primeiro momento é, portanto, positivo, como sempre ocorre quando o poder repressivo estatal supre uma ausência sua. A ocupação, assim, ao menos imediatamente, faz jus ao seu propósito de pacificação.

Contudo, cumprindo papel apenas inibidor das atividades delitivas, já a médio prazo as unidades implantadas fadam-se a um frustrante fracasso. A ocupação física do campo de atividade dos criminosos pode impedir que eles ali atuem, mas não representa a desarticulação das quadrilhas que integram. Mantendo-se articuladas, é questão de tempo para que as organizações voltem a agir, impactando negativamente o macrossistema de segurança pública.

Assim que a ocupação se inicia, se os criminosos não forem presos, desarticulando-se as quadrilhas, duas são as possibilidades: ou eles migram para outra região e nela se estabelecem – vide a expansão do tráfico na Região Nordeste na última década -, ou eles simplesmente se recolhem, se reorganizam, se fortalecem e, então, afrontam o sistema de pacificação – este o caso que agora se constata no Rio de Janeiro.

Para que surta efeitos permanentes, a política de pacificação não pode ser uma ação apenas de polícia repressiva. É fundamental que a ocupação se opere de modo integrado, não só coibindo a prática criminosa, mas identificando os criminosos e os punindo, retirando-os de circulação. Para isso, as ações não podem ficar apenas a cargo da polícia militar, elas exigem a integração das polícias civis, do Ministério Público e do Poder Judiciário.

É uma necessidade bastante distante da realidade da política de pacificação brasileira. Os resultados das ocupações no modelo mais consolidado no país, no Rio de Janeiro, são demasiadamente tímidos no tocante a prisões e apreensões de armas e drogas. Há uma horda de criminosos ainda à solta, munida de um arsenal superior ao da própria polícia, e isso, cedo ou tarde, resulta na retomada de suas atividades delitivas, com ainda maior potencialidade.

Ocupar um núcleo do tráfico de drogas, mas deixar os traficantes livres e armados, podendo apenas se transferir para outro lugar ou se fortalecer para próximos embates, não é solução de segurança pública, é mero paliativo de efeito local.

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Sobre o autor
Fabricio Rebelo

Pesquisador nas áreas Jurídica e de Segurança Pública, Coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (CEPEDES), Professor (cursos livres), Autor de "Articulando em Segurança: contrapontos ao desarmamento civil", Assessor Jurídico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REBELO, Fabricio. UPP: a ocupação paliativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3885, 19 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26743. Acesso em: 18 mar. 2024.

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