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Caso concreto de Direito do Consumidor à luz do utilitarismo

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta deste artigo foi analisar um caso de desrespeito ao Direito do Consumidor sob o prisma da ética Utilitarista, com maior enfoque ao pensamento do expoente desta Teoria, Jeremy Bentham.

No caso concreto analisado, Ford Pinto, pode-se perceber o absurdo praticado por esta empresa, que após alguns cálculos e baseada em valores fornecidos pela própria Administração Nacional de Segurança do Tráfego Rodoviário, quantificou o valor das vidas perdidas por um erro de projeto, e chegou à conclusão que baseada no custo-benefício era mais vantajoso não fazer o recall para a troca de tanques mais seguros e que não explodiriam, e simplesmente deixar que pessoas inocentes que nem sabiam do risco que estavam correndo morressem ou tivessem seus corpos mutilados para depois pagar singelas indenizações.

A ética Utilitarista é uma teoria muito utilizada e querida por economistas e administradores. Esta teoria prega que, de acordo com o princípio do consequencialismo, a moral está nas consequências, e não nos atos, na intenção. Partindo desta premissa e acrescendo o princípio da agregação, o qual preconiza que determinado ato é moral ou não através da analise de seu custo-benefício, os Executivos da Ford fizeram seu “cálculo da felicidade” e chegaram ao entendimento que seria mais vantajoso financeiramente, como de fato resta demonstrado pelos números expostos acima, a morte e o posterior pagamento de indenizações.

Esta constatação absurda não levou em conta o sofrimento das pessoas envolvidas em acidentes, bem como de terceiros que perderam seus parentes mais próximos. Todavia, este artigo tem o intuito de alertar e analisar que tal prática, executada pela Ford, não é uma raridade ou somente um caso isolado no atual mundo empresarial.

Diversas empresas desrespeitam o consumidor, não se preocupam com a segurança e saúde de seus consumidores, institutos amplamente defendidos pelo Código de Defesa do Consumidor, preocupam-se apenas como maximizar seus lucros.

Atualmente a mudança de visão das empresas e a maior fiscalização governamental fez com que a prática do recall seja corriqueira, principalmente no setor automobilístico. Contudo, deve-se atentar para as demais empresas que, apesar de apregoar nas paredes de suas empresas que a missão daquela é o bem estar do consumidor, praticam atos semelhantes ao caso exposto, em nítido desrespeito ao CDC.

O exemplo utilizado retrata bem a política do custo-benefício. As empresas de telefonia, recordes absolutos de reclamações nos PROCONs, preferem arcar com as pífias indenizações em que são condenadas, a melhorar os serviços prestados. Outro exemplo de fácil demonstração é a relação dos bancos com seus correntistas.

Concluindo, deve-se atentar para as práticas empresariais que ferem a moral e a ética de mercado, e que, utilizam-se mesmo sem saber, de explicações Utilitaristas para justificar o injustificável, tudo em busca de um maior lucro. O Código de Defesa do Consumidor brasileiro trouxe grandes avanços na defesa dos consumidores e na fiscalização das empresas inescrupulosas, porém cabe a todos os consumidores diuturnamente fiscalizar e efetivamente aplicar as normas insertas neste grande dispositivo legal.


REFERÊNCIAS

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WALD, Arnoldo. O Novo Código Civil e o Direito Empresarial. Jornal Valor Econômico, p. B-2, São Paulo, 06.09.2001, in MORAES, Luiza Rangel.


Notas

2 FUCITO, Felipe. Sociología del Derecho. El orden jurídico y sus condicionales sociales. 2ed. Buenos Aires, 1999.

3 FUCITO, Felipe. Sociología del Derecho. El orden jurídico y sus condicionales sociales. 2ed. Buenos Aires, 1999.

4 SANDEL, Michael J. Justiça. O que é fazer a coisa certa. 9ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

5 CORREA, Lara Cruz. Utilitarismo e Moralidade. Considerações sobre o indivíduo e o Estado. Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol. 27. Nº 27. Jun. 2012.

6 COSTA, Cláudio. Uma introdução à Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

7 KIM, Douglas. O livro da filosofia. São Paulo: Globo, 2011.

8 BRYCH, Fábio. Ética utilitarista de Jeremy Bentham. Âmbito Jurídico, Rio Grande, VIII, n.23, nov. 2005.

9 MILL, John Stuart. Utilitarismo. Filosofia Aberta. Lisboa: Gradiva, 2005.

10 Idem, ibidem.

11 BRYCH, Fábio. Ética utilitarista de Jeremy Bentham. Âmbito Jurídico, Rio Grande, VIII, n.23, nov. 2005.

12 KIM, Douglas. O livro da filosofia. São Paulo: Globo, 2011.

13 BARSALINI, Glauco. et. al. Sociologia Geral e do Direito. 5ed. Campinas. Alínea: 2012.

14 LAZARRINI, M. et al. Código de Defesa do Consumidor: anotado e exemplificado. São Paulo: ASV Editora, 1991.

15 BAUMAN, Zygmunt. Vida para o consumo. A transformação das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.

16 SANDEL, Michael J. Justiça. O que é fazer a coisa certa. 9ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

17 SANDEL, Michael J. Justiça. O que é fazer a coisa certa. 9ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

18 O caso da Corte era Grimshaw v. Ford Motor Co., 174 Cal Reporter 348 (Cal. Ct., App. 1981). A análise custo-benefício foi divulgada em Mark Dowie, “Pinto Madness”, Mother Jones, setembro/outubro de 1977. Para um caso similar da GM ver, Elsa Walsh e Benjamin Weiser, “Court Secrecy Masks Safety Isues”, Washington Post, 23 de outubro de 1988, pp. A-1, A-22.

19 SANDEL, Michael J. Justiça. O que é fazer a coisa certa. 9ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

20 Idem, ibidem.

21 MADRUGA, Roberto. O Código de Defesa do Consumidor na visão da moral da utilidade – o utilitarismo e da moral dever – o absolutismo. Disponível em: https://www.conquist.com.br. Acesso em: 1 mar. 2013.

22 Vale lembrar que esta simplicidade de cálculo é validade apenas para o Utilitarismo de Bentham, pois neste não existe distinção, peso, entre as pessoas e os diversos tipos de dor ou prazer. Não há distinção entre a dor dos cristãos e o pífio prazer dos espectadores, para Bentham, entram no cálculo simplesmente como números absolutos com pesos e importâncias iguais.

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Sobre o autor
Luis Eduardo Oliveira Alejarra

Advogado no escritório Oliveira e Becker. Formado em Direito pelo Instituto Processus. MBA Executivo em Finanças Corporativas. Pós-graduado em Direito Empresarial. Doutorando pela Universidade de Buenos Aires. Especialista em Direito Empresarial, Tribunal de Contas da União e Licitações Internacionais Diretrizes Banco Mundial - BIRD.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALEJARRA, Luis Eduardo Oliveira. Caso concreto de Direito do Consumidor à luz do utilitarismo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3909, 15 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26914. Acesso em: 16 abr. 2024.

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