RESUMO: O presente trabalho tem por objeto o estudo do pressuposto do nexo causal no instituto da Responsabilidade Civil. Pretende-se abordar de forma ampla a questão do nexo de causalidade, suas teorias e aplicabilidade na seara da responsabilidade civil do direito brasileiro, sem ter a pretensão de esgotar o tema.
Palavras-Chaves: Responsabilidade Civil.
SUMÁRIO: Introdução. 1. O Nexo Causal na Responsabilidade Civil. 1.1. Conceito. 1.2. A Dupla função do nexo causal. 2. Teorias sobre a relação de causalidade. 2.1. Teoria Generalizadora. 2.1.1. Teoria da equivalência dos antecedentes causais. 2.2. Teorias Individualizadoras. 2.2.1. Teoria da causa próxima. 2.2.2. Teoria da causa eficiente. 2.2.3. Teoria da causalidade adequada. 2.2.4. Teoria do escopo da norma jurídica violada. 2.2.5. Teoria da ação humana. 2.2.6. Teoria do dano direto e imediato. 3. Causalidade e Imputação Objetiva. 4. O Fenômeno da Concorrência de Causas 4.1. Causas complementares (concausas). 4.2. Causas Cumulativas (concorrentes) 4.3. Causas Alternativas. 5. Excludentes do Nexo de Causalidade. 5.1. Força Maior e Caso Fortuito. 5.2. Culpa Exclusiva da Vítima ou Fato de Terceiro. 5.3. Culpa Concorrente da Vítima ou de Terceiro. 6. Causalidade e jurisprudência. Conclusão. Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
Para ocorrer o dever de indenizar, necessário se faz que haja um dano e uma ação causadora desse dano. Entre o dano e a ação aparece o nexo de causalidade, tema de fundamental importância no plano da responsabilidade civil.
Gisela Sampaio da Cruz (2005. p. 21) afirma que embora o estudo do nexo causal tenha frequente aplicação prática, a doutrina não dá a devida atenção e a jurisprudência, não obstante tenha desempenhado um papel fundamental na responsabilidade civil, é bastante confusa no que tange ao nexo causal.
Assim, o presente estudo busca abordar de forma ampla a questão do nexo de causalidade, suas teorias e aplicabilidade na seara da responsabilidade civil do direito brasileiro, sem ter a pretensão de esgotar o tema. Para tanto, o trabalho foi desenvolvido em seis capítulos, sendo o primeiro o estudo do conceito do pressuposto do nexo causal no âmbito da responsabilidade civil e o segundo capítulo uma contextualização das teorias sobre a relação de causalidade. No terceiro capítulo tratou-se da causalidade e da imputação objetiva, trazendo ainda o estudo do fenômeno das concorrências de causas no quarto capítulo. No quinto capítulo buscou-se discorrer sobre as excludentes do nexo de causalidade e, por fim a jurisprudência brasileira no sexto capítulo.
O NEXO CAUSAL NA RESPONSABILIDADE CIVIL
Conceito
O nexo de causalidade é elemento indispensável em qualquer espécie de responsabilidade civil. Sergio Cavalieri Filho (2012. p. 67) define nexo causal como “elemento referencial entre a conduta e o resultado. É através dele que poderemos concluir quem foi o causador do dano.” O autor em referência ainda ressalta que o nexo de causalidade é elemento indispensável em qualquer espécie de responsabilidade civil. Pode haver responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem nexo causal.
A princípio parece um instituto simples, mas a realidade não corresponde a uma estrutura simples de uma conduta-causa que produz um dano-efeito. As coisas, nem pelo lado da causa, nem pelo lado do efeito, nunca são bem definidos e delimitados. (CRUZ, 2005. p. 19)
Nesse sentido, afirma Aguiar Dias (1983, p. 177) que é preciso demonstrar, para intentar a ação de reparação que sem o fato alegado, o dano não se teria produzido. Quando o dano decorre de um fato simples, a questão não oferece a menor dificuldade. O problema torna-se um pouco mais complexo nas hipóteses de causalidade múltipla, isto é, quando há uma cadeira de condições, ou seja, várias circunstâncias concorrendo para o evento danoso.
Ademais, com a nova realidade social, fundada depois do advento da Constituição Federal de 1988, que tem como um dos princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana, impõe que hoje a responsabilidade civil tenha por objetivo não mais castigar comportamentos negligentes, senão proteger a vítima do dano injusto. (CRUZ, 2005. p. 16-17)
Em busca da reparação e proteção da vítima de forma mais ampla possível, presenciou-se um processo de “desculpabilização”, com o incremento das hipóteses de responsabilidade objetiva. (CRUZ, 2005. p. 16-17) A responsabilidade civil passa a mirar a pessoa do ofendido (vítima) e não a do ofensor; a extensão do prejuízo, para a graduação do quantum reparador, e não a culpa do ofensor. (SILVA, 1983. p. 573)
Nesse contexto, o conceito de nexo causal é flexibilizado, com vistas a permitir a efetivação do princípio da reparação integral. Em face dos princípios constitucionais, não é mais possível exigir da vítima, diante de certas circunstâncias, a prova cabal e absoluta da relação de causalidade. Assim, embora o nexo causal constitua tal qual o dano, um dos elementos da responsabilidade civil, exige-se, com fundamento na nova ordem constitucional, que em certas situações o liame causal seja até presumido. Esse é o grande problema do nexo causal na atualidade.
Cavaliere Filho (2012. p. 49) afirma que o conceito de nexo causal não seria exclusivamente jurídico, sendo primeiramente precedido de leis naturais. Seria o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. Contudo, tal afirmação não parece a mais acertada, tendo em vista que as causalidades são sempre complexas, múltiplas entrelaçadas. Se quiséssemos segui-las todas, não poderíamos deter-nos naquela que seria a causa do acontecimento. Portanto é preciso fazer uma escolha, ou seja, privilegiar algumas delas; escolha que, evidentemente, nada tem de natural: ela própria não tem nas coisas a sua razão, mas no juízo que delas se faz. (CRUZ, 2005. p. 19)
Gisela Sampaio da Cruz (2005. p. 21) salienta que o pressuposto do nexo causal não recebeu o devido tratamento pelo legislador, uma vez que o único dispositivo do Código Civil que trata do nexo causal (art. 403 do Código Civil) é obscuro e insuficiente, além de estar mal localizado no Código, in verbis:
Art. 403. Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.
A autora em referência destaca que o dispositivo é: (i) obscuro, pois a expressão “direto e imediato” suscita uma série de controvérsias em relação ao ressarcimento dos danos indiretos; (ii) insuficiente, tendo em vista que a brevidade de sua regulamentação não leva em conta toda a complexidade do tema e (iii) mal localizado, porque o artigo 403 do Código Civil é aplicado tanto à responsabilidade contratual quanto à extracontratual, razão pela qual não deveria constar do título referente ao inadimplemento das obrigações (Título IV), mas, sim, em vez disso, dos capítulos relativos à responsabilidade civil (Título IX).
1.2. A dupla função do nexo causal
No campo da responsabilidade civil, o nexo causal cumpre uma dupla função: (i) permite determinar a quem se deve atribuir um resultado danoso e (ii) é indispensável na verificação da extensão do dano a se indenizar, pois serve como medida da indenização. (CRUZ, 2005. p. 22)
Durante muito tempo, predominou o entendimento de que era a culpabilidade, e não a causalidade, que determinava a medida da responsabilidade. Críticas defendem ausência de caráter científico e afirmam que para a determinação da extensão do dano indenizável, o que importa não é a gravidade ou o peso da culpa, mas o nexo de causalidade.
Na responsabilidade objetiva, em face da ausência dos parâmetros da ilicitude e da culpa, o nexo causal assume particular relevo, in verbis:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
e convive, lado a lado, com a cláusula geral de responsabilidade subjetiva, in verbis:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Gisela Sampaio da Cruz (2005, p. 24-25) afirma que a importância do nexo causal não se restringe, porém aos casos de responsabilidade objetiva. Por meio do nexo de causalidade, delimita-se a extensão do dano a indenizar em todas as espécies de responsabilidade civil. O nexo causal é indispensável até mesmo na responsabilidade civil por omissão.
Diz-se, por vezes, que a omissão não pode ser causa de efeitos, porque a inação não muda o mundo exterior. No entanto, essa concepção de causalidade só entre fatos positivos, levaria a consequências erradas.
Ex: Salva-vidas que vendo pessoa se afogar no mar, não faz nada.
TEORIAS SOBRE A RELAÇÃO DE CAUSALIDADE
A autora Gisela Sampaio da Cruz (2005. p. 24-25) divide as teorias em: 1) Teoria generalizadora, a qual equipara as causas às condições; e 2) Teorias individualizadoras, que destacam no conjunto de antecedentes as causas das condições.
Importante aqui esclarecer a diferença entre causa e condição. Causa do dano são apenas aquelas condições consideradas efetivamente determinantes desse resultado, enquanto que a Condição são todos os fatores que estão na origem de um dano, são todos os elementos sem os quais ele não teria sido produzido, são todas as circunstâncias de que não se pode abstrair, sem mudar o resultado danoso. Judith Martins Costa salienta que podem ocorrer condições que são mera ocasião e condições que constituem propriamente causa.
Teoria Generalizadora
Teoria da Equivalência dos Antecedentes causais
A teoria da equivalência dos antecedentes causais, também conhecida como teoria da equivalencia das condições, teoria objetiva da causalidade ou conditio sine qua non, cartacteriza-se por equiparar causa e condição. Esta teoria é atribuída ao penalista alemão Maximiliano von Buri e basicamente defende que todas as condições são igualmente indispensáveis para a produção do consequente e o estabelecimento da causa é incompleto se não introduzimos, de uma ou outra forma, todas elas.
Von Buri estabeleceu que é causa toda condição da qual dependeu a produção do resultado, sem considerar sua maior ou menor proximidade ou importância, pois, para ele, todas as circunstâncias eram equivalentes, ou seja, cada circunstância é necessária para produção do resultado. Cada condição origina assim a causalidade das outras.
Teoria da Equivalência os Antecedentes chegou a influenciar estatutos penais de diversos países, inclusive o Código Penal brasileiro em vigor, não obstante, quanto ao tema da superveniência de causa relativamente independente, a legislação brasileira tenha acolhido a concepção de condição qualificada. Mas aos poucos foi perdendo prestígio até quando acabou sendo acolhida pelos civilistas.
A autora Gisela Sampaio da Cruz (2005. p. 24-25) elenca os pontos positivos e principais críticas do instituto, a saber:
Pontos Positivos: (i) grande simplicidade de aplicação; (ii) maiores probabilidades de reparação das vítimas; (iii) intenso efeito preventivo na diminuição de danos)
Principais críticas: (i) transforma a serie causal em uma cadeia sem fim.( Ex: fabricante de arma); (ii) falsa, pois todas as condições do delito ou prejuízo são equivalentes; (iii) pode levar a decisões injustas; (iv) apego à causalidade natural (ao lado da causalidade natural, há que se levar em conta os limites objetivos traçados pelo sistema jurídico, sob pena de se chegar a resultados contraditórios); (v) iguala, erroneamente, nexo causal (elemento objetivo) e nexo de responsabilidade (elemento subjetivo/interno);
Teorias Individualizadoras
2.2.1. Teoria da Causa Próxima
Teoria desenvolvida pelo inglês Francisc Bacon, no seculo XVI. Bacon sustentava que seria para o direito uma tarefa infinita analisar a causa das causas e as influências de umas sobre as outras. Bastaria então considerar a causa imediata, analisando as ações segundo esta última e sem a necessidade de remontar à causa de grau superior mais distante, ou seja, importaria apenas aquela condição que aparecesse em último lugar na série.
Gisela Sampaio afirma (2005. P. 25-29) que de certa forma essa teoria influenciou o direito brasileiro, que limitou a indenização devida aos danos que fossem consequência “direta e imediata” da inexecução, restringindo, dessa forma, os danos ressarcíveis.
A autora em referência elenca os pontos positivos e principais críticas (2005. P. 24-25) do instituto, a saber:
Principais Críticas: (i) muitas vezes a carga nociva não está no último fator atuante, senão em outro que o precede; (ii) reduz a responsabilidade do agente à mera questão cronológica, conduzindo muitas vezes a soluções injustas.
Ex: dolosa ou culposamente alguem troca um remédio, que deveria ser dado a determinado enfermo, por uma substancia tóxica, e a enfermeira, ignorando a substituição, dá suposto remédio ao diente que, em razão disso morre.
2.2.2. Teoria da Causa Eficiente – Teoria da Causa Preponderante
Não mais interessa o acontecimento que precedeu imediatamente o dano, senão aquele que estabeleceu a relação causal de maior grau de eficiência no resultado. Essa teoria nega que todas as condições se encontram, indo de encontro com a Teoria da Equivalência dos Antecedentes causais.
Dessa teoria outras surgiram, buscando encontrar um critério quantitativo/qualitativo para determinar a condição mais ativa, isto é, aquela que em maior medida contribuiu para a produção do resultado.
A autora Gisela Sampaio da Cruz (2005. p. 24-25) afirma que a principal crítica dessa teoria foi estabelecer, no caso concreto, qual das diversas condições de um resultado é mais eficiente ou preponderante para a produção do dano.
2.2.3. Teoria da Causalidade Adequada
Essa teoria, concebida pelo filósofo Von Kries, procurou identificar, na presença de uma possível causa, aquela potencialmente apta a produzir o dano. Assim, se examina a adequação da causa em função da possibilidade e probabilidade de determinado resultado vir a ocorrer, à luz da experiência comum. De acordo com essa teoria, quanto maior é a probabilidade com que determinada causa se apresente para gerar um dano, tanto mais adequada é em relação a esse dano.
Assim, diante de uma pluralidade de concausas, indaga-se qual delas, em tese, poderia ser considerada apta a causar o resultado. Respondida esta primeira pergunta, questiona-se se essa causa, capaz de causar o dano, é também hábil, segundo as leis naturais;
Não basta que um fato seja condição de um evento; é preciso que se trate de uma condição tal que, normal ou regurlamente, provoque o mesmo resultado. É o chamado juízo de probabilidade, realizado em abstrato – e não concreto, considerando os fatos como efetivamente ocorreram -, cujo objetivo é responder se a ação ou omissão do sujeito era, por si só, capaz de provocar normalmente o dano.
Nota-se que ao contrário da teoria da equivalência dos antescedentes, na teoria da causalidade adequada a “causa” deve ser estabelecida em abstrato, segundo a ordem natural das coisas e a experiência da vida, e não em concreto, a considerar os fatos tal como se deram, já que, em tais circunstâncias, as condições são mesmo equivalentes.
É necessário que o julgador, em sua análise, retroaja mentalmente até o momento da ação ou omissão para estabelecer se esta era ou não adequada para produzir o dano. Realiza-se, assim, uma “prognose póstuma”, já que o julgador se coloca no momento da ação, como se o resultado não tivesse ocorrido, a fim de determinar sua probabilidade. (CRUZ, 2005. p. 24-25)
Nota-se, portanto, que Von Kries tomava como referência o ponto de vista do autor do ato – e, assim, computava o que este conhecia concretamente ou podia conhecer para a avaliar a previsibilidade de seu atuar.
Posteriormente, surgiram percepções de caráter objetivo, como o de Von Tur, que sustentavam que essa análise deveria levar em conta o que era conhecido não pelo agente, senao pelo homem comum médio.
Com o passar do tempo, para que fosse possível identificar a causa adequada do dano, surgiram também duas formulações para a Teoria da Causalidade Adequada: a formulação positiva e a formulação negativa.
Formulação Postiva: um fato será considerado causa adequada do dano, sempre que este constitua uma consequencia normal ou típica daquele. Quer dizer, sempre que, verificado o fato, se possa prever o dano como uma consequência natural ou como um efeito provável dessa verificação.
Formulação negativa: é preciso examinar se o fato é causa inadequada a produzir o dano. O fato que atua como condição do dano só deixará de ser considerado causa adequada, quando, dada sua natureza geral, se mostrar indiferente para a verificação do dano, estranhas e extraordinárias. (aponta-se as causas inadequadas do dano e, pode levar a resultados opostos).
Exemplo: A agride B, o qual ao levar um soco, vem a falecer por ser portador de grave moléstia do coração. De acordo com a formulação positiva, a agressão não terá sido causa adequada do dano, porque o resultado morte não é consequencia natural e normal de um único soco. Na formulação negativa será possível admitir-se o nexo causal, já que a agressão nao foi de todo indiferente para a produção do dano.
Nota-se que a formuação negativa é mais ampla e acaba se aproximando da Teoria da Equivalência dos Antecedentes Causais, embora com está não se confunda!
A autora Gisela Sampaio da Cruz (2005. P. 24-25) afirma que a principal crítica dessa teoria é que ela é filosófica demais (saber ontológico e gnomológico), além de ser complexa e imprecisa.
2.2.4. Teoria do Escopo da Norma Jurídica Violada (Teoria da relatividade aquiliana)
Essa teoria defende que a distinção entre os danos indenizáveis e não indenizáveis deve ser feita, não em obediência ao pensamento da causalidade adequada do fato, mas tendo me vista os reais interesses tutelados pelo fim do contrato, no caso da responsabiidade contratual, ou pelo fim da norma legal, no caso da responsabilidade extracontratual.
O critério fundamental da seleção dos danos reparáveis repousaria, assim, de acordo com a tese lançada por RABEL, não na idéia clássica da causalidade, mas no elemento positivo do fim da proteção contratual ou legal. (CRUZ, 2005. p. 24-25)
Essa teoria, também conhecida como Teoria da relatividade aquiliana, se funda no pressuposto de que não é possível individualizar um critério único e válido para se aferir o nexo causal em todas as hipóteses de responsabilidade civil. Propõem-se, então que o julgador se volte para a função da norma violada, para verificar se o evento danoso recai em seu âmbito de proteção.
Gisela Sampaio da Cruz (2005. p. 24-25) frisa que essa teoria foi bastante debatida, contudo, no Brasil, a doutrina não se refere expressamente à Teoria do Escopo da Norma nem para criticá-la, tampouco para elogiá-la.
2.2.5. Teoria da Ação Humana
Teoria formulada por Sebastian Soler, centrada na distinção conceitual entre ação e causalidade. De acordo com essa teoria, para o Direito a causalidade natural pouco importa, pois causa normal é apenas o que advem da vontade do sujeito atuante como força produtora supercausal. Na formulação de Soler é equivocado observar o problema da causalidade sob o ponto de vista físico, já que o ser humano age segundo sua consciência e vontade, componentes que contribuem decisivamente nas suas relações com o mundo exterior.
A Teoria da Ação Humana apresenta certas semelhanças com a Teoria da Causalidade Adequada, especialmente em relação à sua concepção subjetivista. Mas, enquanto para esta é suficiente que as consequências produzidas sejam possíveis em tese, a Teoria da Ação Humana, ao contrário, requer um juízo razoável em relação às probabilidades de se produzir tal ou qual resultado, análise que deverá ser realizada tendo em vista o caso concreto, isto é, a situação existente quando da realização da ação, as previsões do seu autor no momento e o curso que realmente seguiu sua ação.
Os defensores, no âmbito penal, dessa teoria partiram da premissa de que a causalidade, como ponto crucial da teoria do tipo, deve ser substituída pelo conceito de ação. Exatamente por isso, essa teoria não é considerada satisfatória para explicar a relação de causalidade no Direito Civil.
2.2.6. Teoria do Dano Direto e Imediato
Com o objetivo de explicar a expressão “direto e imediato” constante no art. 1060 do CC de 1916 e repetida no art. 403 do CC de 2002, várias escolas surgiram, tentando descobrir a fórmula perfeita que pudesse se resolver todas as hipóteses. Em comum, todas elas defendiam que, se há violação de direito por parte do credor ou de terceiro, resta interrompido o nexo causal e, por consequência, libertado da responsabilidade está o autor da primeira causa. Mas quando a interrupção do nexo causal ocorria por fatos naturais, as divergências vinham à tona.
Subteorias:
Teoria da Causalidade Jurídica (Tomaso Mosca). Baseia-se na distinção entre causa no mundo físico e causa no mundo jurídico, pois, segundo este autor, não se reputam causas senão os fatos ilícitos. A fim de se determinar a causa direta e imediata no campo jurídico, seria necessário desconsiderar os fatos naturais, bem como os voluntários não ilícitos. Em outros termos, se o novo dano decorresse de fato natural, ou de pessoa inimputável, subsistiria a responsabilidade do causador do primeiro dano, mas se o causador do segundo dano fosse capaz, o ato ilícito, o primitivo agente não responderia. A teoria peca por excluir o caso fortuito do papel de causa estranha, interruptiva do nexo causal.
Teoria de Coviello. Para essa teoria necessário se faz verificar se a causa que gerou o novo dano o teria produzido, abstração feita do ato do devedor, autor do primeiro dano. Caso a resposta fosse positiva, romper-se-ia o nexo.
Teoria da Necessidade da Causa (Dumoulin e Pothier). Segundo Gisela Sampaio (2005. p. 25) foi a teoria que obteve mais êxito ao explicar o significado da expressão “direto e imediato”. De acordo com a escola da necessariedade, o dever de reparar só surge quando o evento danoso é efeito necessário de determinada causa. Para a subteoria da necessariedade, a expressão “direto e imediato” deve ser interpretada, em conjunto, como “necessário”.
Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, este só responde pelos danos que são consequência necessária do inadimplemento, mas não pelos originados de outras consequências não necessárias, de mera ocasião.
Assim, embora muitos sejam os fatores que contribuem para a produção do dano, não se deve chamar de causa todos eles, mas tão somente os que se ligam ao dano em uma relação de necessariedade, a romper o equilíbrio existente entre as outras condições.
Se várias condições concorrem para o evento danoso, nem todas vão ensejar o dever de indenizar, mas apenas aquela elevada à categoria de causa necessária do dano.
Assim, a causa direta e imediata nem sempre é a mais próxima do dano, mas, sim, aquela que necessariamente o ensejou, pois não é a distância temporal entre a inexecução e o dano que rompe o nexo causal. A idéia central, enunciada e repetida pelas autores, é, pois, a de que o aparecimento de outra causa é que rompe o nexo causal e não a distância entre a inexecução e o dano.
O dano indireto pode ser passível de ressarcimento, contanto que seja consequência direta de um ato ilícito ou de uma atividade objetivamente considerada.
Não é o tempo propriamente que revela a responsabilidade pela causação do dano, mas a próximidade lógica. Em regra, os danos indiretos ou remotos não são indenizáveis, porque quase sempre deixa de ser efeito necessário, em decorrência do aparecimento de concausas, mas se isso não ocorrer, eles devem ser indenizados.
De acordo com a escola de necessariedade da causa, rompe-se o nexo causal, não só quando o credor ou terceiro é autor da causa direta e imediata que provoca o novo dano, mas ainda quando a causa necessária é fato natural (caso fortuito e força maior).
Sob o ponto de vista da vítima, pode-se objetar que, se a responsabilidade do devedor primitivo desaparece quando um terceiro é autor do novo dano, a vítima não está desamparada, porque este último será obrigado a lhe ressarcir; enquanto que, se a causa do novo dano for um fator natural, e o nexo, em relação ao autor da causa remota estiver rompido, não haverá quem responda pelo novo dano.
Agostinho Alvim: a obrigação de indenizar somente o dano direto e imediato. Não é possível obrigar o devedor a responder por outros danos, derivados de outras causas. O legislador no artigo 403 do CC, se recusou a sujeitar o autor do dano a todas as nefastas consequências do seu ato, quando já não ligadas a ele diretamente. “Não seria justo que o autor do primeiro dano responda ilimitadamente”.
Para Gisela Sampaio Cruz (2005. p. 32) a Teoria do Dano Direto e Imediato mostra-se, como se vê, mais apta a enfrentar o problema da causalidade múltipla do que a maioria das teorias expostas anteriormente que quase sempre conduzem o julgador a soluções injustas.
Segundo a autora em referência, a Teoria do Dano Direto e Imediato é a teoria adotada no Brasil, não obstante a jurisprudência ainda vacile, invocando outras teorias. Nesse sentido Gustavo Tepedino salienta:
“(...) sob a influência de todas as três correntes acima mencionadas, os Tribunais fixam o nexo de causalidade de forma intuitiva, invocando alternativamente a Teoria da Causalidade Adequada, da Interrupção do Nexo Causal, e da conditio sine qua non, sempre na busca de um liame de necessariedade entre causa e efeito, de modo que o resultado danoso seja consequência direta do fato lesivo.” (grifa-se)
Agostinho Alvim afirma que a Teoria do Dano Direto e Imediato não tem o condão de resolver todas as dificuldades práticas que o tema suscita, mas é a que de modo mais simples traduz a expressão “dano direto e imediato” disposta no Art. 403 do CC.
Sergio Cavalieri Filho (2012. p. 67) afirma que a teoria da equivalencia dos antecedentes predomina na esfera penal, enquanto que a Teoria da Causalidade Adequada é a prevalecente na órbita civil.