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Súmula vinculante nº 13 e os agentes políticos – a grande omissão do Supremo Tribunal Federal

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11/05/2014 às 15:15

Resumo:


  • A nomeação de "agentes políticos" no Brasil pode ocorrer sem concurso público, mas não deve violar princípios constitucionais administrativos.

  • As súmulas vinculantes, com suporte na Constituição, visam garantir segurança jurídica e vinculam a administração pública em geral.

  • O nepotismo, prática de nomear parentes para cargos públicos, é vedado pela Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal, mas há controvérsias sobre sua aplicação a "agentes políticos".

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O STF omitiu-se a respeito da inclusão expressa dos agentes políticos no texto da súmula vinculante que veda o nepotismo, causando insegurança jurídica e avalizando atos de improbidade por todo o país.

Resumo: Dentre as várias formas de provimento de cargos públicos no Brasil, está a nomeação para os cargos classificados como “agentes políticos” que, em alguns casos, podem ser nomeados sem concurso público, desde que essa nomeação não viole os princípios constitucionais administrativos. Vigem no Brasil as súmulas vinculantes, que, com suporte constitucional, vinculam a administração pública em geral e visam a alcançar aos jurisdicionados a segurança jurídica sobre posições pacíficas do STF. Há em nosso País a tradição de um parente, ocupante de cargo político eletivo, nomear outro parente para a assunção de cargo político não eletivo, ato administrativo esse que viola os princípios da administração pública e caracteriza o nepotismo. A súmula Vinculante n. 13 do Supremo Tribunal Federal veda o nepotismo na administração pública brasileira. Os tribunais pátrios, firmados em um suposto entendimento do Supremo, têm julgado que a Súmula Vinculante n. 13 não se aplicaria aos agentes políticos, linha essa que, se bem vista, não representa a posição da Corte Maior Brasileira. O Supremo Tribunal Federal omitiu-se, e vem se omitindo, a respeito da inclusão expressa dos agentes políticos no texto da súmula vinculante, lacuna casual (ou seria casuística?) que tem causado enorme insegurança jurídica e tem avalizado atos de improbidade por todo o país.

Palavras-chave: Súmula Vinculante n. 13; Agentes Políticos; Nepotismo; omissão; Supremo Tribunal Federal


INTRODUÇÃO

O presente trabalho é um exame contemporâneo sobre a Súmula Vinculante nº 13, do Supremo Tribunal Federal, voltado à análise sobre aplicação deste enunciado aos chamados agentes políticos.

Os estudos que originaram o presente artigo foram realizados no segundo semestre do ano de 2013, de modo que o arrazoado retrata a realidade do tema nessa época e, por consequência, tem suporte nas decisões dos Tribunais sobre a matéria publicados até o final desse ano1.

Por todo o Brasil têm se disseminado decisões que tomam a Súmula Vinculante nº 13 com não aplicável aos agentes políticos, sob o argumento de que o Supremo Tribunal Federal assim tem entendido. Desse modo, o intuito do presente estudo é analisar se de fato esse é o entendimento da Corte Maior sobre a matéria e, em um segundo momento, tecer uma análise crítica sobre o tema.

Não se trata de uma análise profunda doutrinária sobre os temas pertinentes. O foco principal, como dito, é a observância contextual das principais decisões que dão suporte aos julgamentos sobre a não aplicação da Súmula e a realização de uma análise crítica sobre o assunto.

O estudo está dividido em seis capítulos, tratando o primeiro sobre a forma de provimento dos servidores públicos (lato sensu); o segundo das súmulas vinculantes; o terceiro da Súmula Vinculante nº 13 e decisões concernentes; o quarto do nepotismo e da violação aos princípios da administração pública; o quinto da Súmula Vinculante nº 13 e os agentes políticos na visão do Supremo Tribunal Federal e o sexto da Súmula Vinculante nº 13 - uma análise crítica.

Essas são as ponderações iniciais.


1 DOS SERVIDORES PÚBLICOS (LATO SENSU) E DAS FORMAS DE PROVIMENTOS

Os servidores públicos (lato sensu) são tratados pela Constituição Federal no Título III, Capítulo VII, este que trata da Administração Pública, com redação dada pela Emenda Constitucional 19/98.

Nesse Capítulo, o art. 37, após fixar em seu caput os princípios basilares da Administração Pública2, disciplina em seu inciso I que “os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei”. Logo em seguida, no inciso II, consta que:

a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Essa distinção inicial já permite a diferenciação entre cargo, emprego e função pública, de modo que somente os dois primeiros é que são providos por meio de concurso público3.

Adiante, ainda no mesmo art. 37, a Constituição estabelece como são providas as funções públicas, dividindo-as em funções de confiança e os cargos em comissão ou de contratação por tempo determinado:

V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento. (…) IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público.

Ainda nesse dispositivo, ao tratar da remuneração e do subsídio, em uma redação ali inserida pela Emenda 41/03, há na Constituição Federal a menção a uma outra categoria, a dos agentes políticos:

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como li-mite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o sub-sídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tri-bunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos. (grifou-se)

Então, em uma interpretação lógica do texto constitucional, afora outras categorias de menos importância para o presente trabalho4, temos os cargos e empregos públicos, as funções de confiança e em comissão, os servidores temporários e os agentes políticos.

Nessa classificação, no que ora interessa, Celso Antônio Bandeira de Mello traz uma respeitada concepção agentes políticos:

Agentes políticos são os titulares dos cargos estruturais à organização política do país, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São agentes políticos apenas o Presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos dos Chefes do Executivo, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados Federais e estaduais e os vereadores.5

Ainda sobre o quem são os agentes políticos, a doutrina de Maria Sylvia Zanella Di Pietro é esclarecedora:

São, portanto, agentes políticos, no direito brasileiro, por que exercem típicas atividades de governo e exercem mandato, para o qual são eleitos, apenas os Chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e municipal, os Ministros e Secretários de Estado, além de Senadores, Deputados e Vereadores. A forma de investidura é a eleição, salvo para os Ministros e Secretários, que são de livre escolha do Chefe do Executivo e providos em cargos públicos, mediante nomeação.6

Dessa forma, quanto a forma de provimento, em suma: os cargos e empregos públicos são ocupados mediante concurso público; as funções públicas podem ser preenchidas sem concurso público no caso de função em comissão; e os agentes políticos podem alcançar o cargo por meio de eleição ou, em alguns casos, por livre nomeação do eleito.


2 SÚMULAS VINCULANTES

O Título IV da Constituição Federal trata “da organização dos poderes” no Brasil. No Capítulo III desse Título, onde é regulado o “Poder Judiciário”, na sua Seção II, que estrutura o STF, foi acrescido no ano de 2004, por meio da Emenda Constitucional nº 45, o artigo 103-A, que criou em nosso país a chamada Súmula do STF com efeito vinculante.

Uma vez criadas, as súmulas vinculantes ficaram adormecidas desde a sua criação, em 2004, até o ano de 2006, quando o instituto foi regulado pela Lei Federal Ordinária nº 11.417, de 20 de dezembro daquele ano. Essa Lei, em onze artigos, regulamentou a matéria, fixou os limites da edição das súmulas vinculantes e reafirmou a abrangência traçada pela Constituição Federal.

Após essa regulamentação ter passado a viger, a questão ainda ficou fora de cena por mais alguns meses, até que na sessão plenária do Supremo Tribunal Federal realizada em 30 de maio de 2007 foram editadas as primeiras três súmulas vinculantes.

A Súmula Vinculante nº 13, objeto de estudo do presente trabalho, foi proposta na sessão de 20 de agosto de 2008 e aprovada no dia seguinte, na sessão plenária que ocorreu em 21 de agosto de 2008.

Nesses termos7, havendo a regular tramitação, as súmulas vinculantes, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terão efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como podem ser revistas ou canceladas, na forma prevista nessa Lei.

Considerando esse pilar constitucional e legislativo, essa vinculação que passa a existir com a publicação da súmula vinculante somente desaparece na hipótese de haver a revisão ou cancelamento de seu enunciado.

Outra observação necessária é no sentido de que o art. 103-A da Constituição dispõe que essas súmulas, após seu regular trâmite, tem efeito vinculante “em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal”, cabendo ao Supremo “proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei”.

A interpretação desse ponto do caput leva nitidamente a não vinculação do próprio STF. Essa desvinculação, parece certo, está vinculada ao fato de que como esse Tribunal Superior, por decisão tomada por 2/3 (dois terços) dos seus membros, tem o poder de editar, revisar e cancelar o enunciado das súmulas vinculantes, em virtude de que não estaria vinculado ao texto em vigor.

Nada obstante a isso, em um raciocínio lógico, o STF não está autorizado a descumprir pura e simplesmente as suas súmulas vinculantes. Como compete a esse Tribunal editar, revisar e cancelar essas súmula, caso haja alguma desconformidade no texto com o entendimento predominante na Corte deveria, em tese, haver a revisão com o quorum necessário.


3 SÚMULA VINCULANTE Nº 13 E DECISÕES CONCERNENTES

Antes da edição da Súmula Vinculante em estudo, o nepotismo foi tratado em várias oportunidades pelo Supremo Tribunal Federal.

Dentre as decisões que antecederam a Súmula Vinculante nº 13, está o Mandado de Segurança - MS nº 23.780-5, impetrado por Terezinha de Jesus Cunha Belfort contra o Plenário do Tribunal de Contas da União - TCU e o Juiz Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região. Por meio dessa ação constitucional, a autora visava a anular ato que a exonerou de cargo em comissão e, consequentemente, objetivava a sua reintegração.

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A impetrante, servidora pública da Secretaria Estadual da Educação do Estado do Maranhão, havia sido colocada a disposição do Tribunal de Regional do Trabalho – TRF da 16ª Região em 1989 e, desde então, vinha exercendo cargos de confiança naquele TRF. A última nomeação da aludida servidora ocorreu em 13.10.1994, e o ato que a nomeou foi tido como ilegal pelo TCU, já que Terezinha é irmã do então vice-presidente do aludido Tribunal, Fernando José Cunha Belfort.

O MS teve como relator o Ministro Joaquim Barbosa e culminou na seguinte ementa, publicada em 3.3.2006:

MANDADO DE SEGURANÇA. NEPOTISMO. CARGO EM COMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. Servidora pública da Secretaria de Educação nomeada para o cargo em comissão do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região à época em que o vice-presidente do Tribunal era parente seu. Impossibilidade. A proibição do preenchimento de cargos em comissão por cônjuges e parentes de servidores públicos é medida que homenageia e concretiza o princípio da moralidade administrativa, o qual deve nortear toda a Administração Pública, em qualquer esfera de poder. Mandado de Segurança denegado. (STF – MS 23.780-5 - Maranhão)

O foco das discussões do Supremo nesse caso foi no rumo de que as orientações do Tribunal de Contas da União – TCU que obstavam as nomeações em órgãos da justiça trabalhista para “cargos em comissão, de cônjuges ou parentes consanguíneos ou afins, até o terceiro grau, de juízes em atividade ou aposentados há menos de cinco anos, exceto em se tratando de servidor titular de cargo público de provimento efetivo de juízo ou tribunal” eram legítimas, de modo que o mandamus foi denegado.

Nesses casos específicos, dos TRTs, as leis ordinárias que criaram esses tribunais previam a vedação dessas nomeações. Havia dispositivo legal vendando essa prática. O foco do STF, na oportunidade, foi então o de afastar os argumentos de que o TCU não seria apto a considerar ilegal nomeações de servidores a cargos comissionados e de confiança nos TRFs que caracterizassem nepotismo.

Porém, em outros casos não havia legislação própria vedando a nomeação de parentes. É o caso da nomeação de parentes para funções em comissão e para agentes políticos empossados por livre nomeação (cargos não eletivos).

Em virtude disso, veio a tona a linha de que seria necessária a edição de lei ordinária que tratasse e regulasse esse tema, de modo que, segundo essas teses, somente após a edição de uma lei nesse sentido é que se poderia, eventualmente, considerar ilegal essas nomeações.

Nesse contexto, chegou ao STF Ação Direta de Constitucionalidade - ADC nº 12, que teve como relator o então Ministro Carlos Ayres Britto. Essa causa foi proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil - AMB, em prol da Resolução nº 07/2005, do Conselho Nacional de Justiça. Tal resolução, por sua vez, "disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário e dá outras providências”. O julgamento desta Ação ocorreu na Sessão Plenária de 20.8.20088e foi no sentido de o Supremo, por unanimidade, julgar procedente a ação declaratória de constitucionalidade e, por maioria, emprestar interpretação conforme a Constituição para deduzir a função de chefia do substantivo “direção”, constante dos incisos II, III, IV e V do artigo 2º da Resolução nº 07, de 18/10/2005, do Conselho Nacional de Justiça9.

Na mesma sessão, foi julgado o RE nº 579.951, interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte10 o qual, confirmando decisão de primeiro grau proferida em ação civil pública declaratória de nulidade de ato administrativo, entendeu não existir inconstitucionalidade ou ilegalidade na nomeação de Elias Raimundo de Souza e Francisco Souza do Nascimento para o exercício, respectivamente, dos cargos em comissão de secretário municipal da saúde e de motorista, embora fossem há época, respectivamente, o primeiro, irmão de vereador, e, o segundo, do Vice-Prefeito do Município de Água Nova/RN.

Nesse caso, divergindo do primeiro e segundo graus do Rio Grande do Norte, o STF afastou a tese de que seria necessária legislação ordinária que regulasse a matéria, estabelecendo que a vedação de tais nomeações violavam diretamente o caput do art. 37 da Constituição Federal, que é autoaplicável.

O julgamento, que, como dito, ocorreu em 20.8.200811, teve a seguinte ementa:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VEDAÇÃO NEPOTISMO. NECESSIDADE DE LEI FORMAL. INEXIGIBILIDADE. PROIBIÇÃO QUE DECORRE DO ART. 37, CAPUT, DA CF. RE PROVIDO EM PARTE. I - Embora restrita ao âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça, a prática do nepotismo nos demais Poderes é ilícita. II - A vedação do nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática. III - Proibição que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal. IV - Precedentes. V - RE conhecido e parcialmente provido para anular a nomeação do servidor, aparentado com agente político, ocupante, de cargo em comissão. (STF - RE nº 579.951)

Assim, o STF nesse caso espancou a tese de que haveria a necessidade de edição legislativa que vedasse o nepotismo.

Porém, o Supremo, nesse Recurso, decidiu também que seria o caso de afastar tão-somente Francisco Souza do Nascimento do exercício motorista, mantendo no cargo de secretário municipal da saúde a pessoa de Elias Raimundo de Souza.

Tal deslinde teve origem no voto do Ministro Marco Aurélio, que divergindo inicialmente do relator Ricardo Lewandowski, trouxe ao plenário a discussão sobre aplicar-se ou não a vedação do nepotismo aos cargos políticos de livre nomeação.

Em virtude disso, a corte traçou uma distinção entre cargos e funções singelamente administrativas e cargos políticos:

Então, quando o artigo 37 refere-se a cargo em comissão e função de confiança, está tratando de cargos e funções singelamente administrativos, não de cargos políticos. Portanto, os cargos políticos estariam fora do alcance da decisão que tomamos na ADC 12, porque o próprio Capítulo VII é Da Administração Pública enquanto segmento do Poder Executivo. E sabemos que os cargos políticos, como, por exemplo, os de Secretário Municipal, são de agentes de Poder, fazem parte do Poder Executivo. O cargo não é em comissão, no sentido do artigo 37. Somente os cargos e funções singelamente administrativos – é como penso – são alcançados plea imperiosidade do artigo 37, com seus lapidares princípios. Então, essa distinção me parece importante para, no caso, excluir do âmbito da nossa decisão anterior os Secretários Municipais, que correspondem a Secretários de Estado, no âmbito dos Estados, e Ministros de Estados no âmbito federal. (Ministro Carlos Britto, inteiro teor do RE 579.951/RN, pg. 11)

Essa distinção foi consensual na Corte e resultou na exoneração somente do irmão motorista, que ocuparia cargo não político12.

Dessa forma, em uma única sessão, o STF julgou a ADC nº 12 e o RE 579.951/RN, que são dois dos parâmetros para a formulação da Súmula em estudo.

Foi ainda mais além o Supremo. Na mesma sessão plenária ordinária de 20.8.2008, em um momento histórico em que a Súmula Vinculante já existia em nosso País13, o Ministro Ricardo Lewandowski, baseado, dentre outras decisões a respeito14, no Mandado de Segurança – MS nº 23.780-515, na Ação Declaratória de Constitucionalidade - ADC nº 12 e no Recurso Extraordinário - RE nº 579.951, encaminhou proposta inicial de súmula vinculante ao plenário do STF, com o seguinte enunciado:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor do mesmo Órgão investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou ainda de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendendo ajuste mediante designações recíprocas, viola o art. 37, caput, da Constituição Federal.16

Na sessão do dia seguinte, de 21.8.2008, o texto foi discutido e aprovado, nesses moldes:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma Pessoa Jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Como se percebe da comparação entre a proposta e a redação aprovada, o debate entre os ministros cingiu-se a substituição dos termos “mesmo Órgão” e “viola o art. 37, caput, da Constituição Federal”, por, respectivamente, “mesma Pessoa Jurídica” e “viola a Constituição Federal”, além de realizar alguns ajustes quanto a pontuação.

Assim, em dois dias seguidos de trabalho, o STF, na sequência, analisou a ADC nº 12, o RE 579.951/RN e o texto da Súmula Vinculante nº 13.

Tal análise cronológica e contextual leva a uma conclusão inafastável a respeito da redação da Súmula Vinculante em pauta. A não inclusão expressa dos “agentes políticos” no corpo da súmula não passou desapercebida pelo crivo dos ministros.

Partindo desse ponto, cabe se tentar chegar a uma segunda premissa, bem mais difícil. Observar se o fato de não haver a expressão “agentes políticos” no corpo da Súmula significa que: seu texto aplica-se a todos os cargos de provimento sem concurso público, sem qualquer exceção; não se aplica aos agentes políticos de uma maneira geral17 ou se, em uma terceira hipótese, houve uma intencional omissão para que cada caso concreto pudesse ser analisado18.

Essa análise se torna bastante dificultosa porque as discussões que, propriamente ditas, culminaram na aprovação da Súmula Vinculante nº 13 não trataram da inclusão ou não do termo “agente político” no texto da súmula19.

Em face disso, a interpretação do intuito do Supremo em relação à matéria pauta-se basicamente análise das discussões ocorridas no julgamento do RE 579.951/RN e em decisões posteriores à vigência da súmula.

Essa matéria ainda é nebulosa no STF.

Atualmente o Supremo vem interpretando sua própria súmula, ora em um sentido ora em outro.

No julgamento do RE 579.951/RN não houve consenso entre os Ministros sobre se, objetivamente, o nepotismo não se aplica aos cargos políticos ou se, no entender da corte não se aplicaria de plano, mas seria necessária a análise caso de cada caso concreto.

Após, foi julgada pelo STF em 2008 a Reclamação 6.650-9/PR, proposta por Eduardo Requião de Melo e Silva contra decisão do juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, que, nos autos de uma ação popular, suspendeu sua nomeação para o cargo de secretário estadual de transportes.

O fundamento do juízo de primeira instância para o afastamento foi no sentido de que dita nomeação iria de encontro à Súmula Vinculante nº 13, pois Eduardo é irmão do então governador do Paraná, Roberto Requião de Mello e Silva.

O Ministro Cesar Peluso deferiu a liminar pleiteada, determinando a suspensão da decisão impugnada, fazendo menção genérica ao julgamento do RE 579.951/RN, referindo-se que nesse decisum a Corte teria se posicionado no sentido de que a Súmula não se aplica aos agentes políticos de livre nomeação.

Da decisão liminar, foi interposto Agravo Regimental, que teve como relatora a então Ministra Ellen Gracie. O agravo foi improvido, por maioria20, sob o argumento de que a súmula não se aplicaria ao agente político secretário de estado:

AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR EM RECLAMAÇÃO. NOMEAÇÃO DE IRMÃO DE GOVERNADOR DE ESTADO. CARGO DE SECRETÁRIO DE ESTADO. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE Nº 13. INAPLICABILIDADE AO CASO. CARGO DE NATUREZA POLÍTICA. AGENTE POLÍTICO. ENTENDIMENTO FIRMADO NO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 579.951/RN. OCORRÊNCIA DA FUMAÇA~DO BOM DIREITO. 1. Impossibilidade de submissão do reclamente Secretário Estadual de Transporte, agente político, às hipóteses expressamente elencadas na Súmula Vinculante nº 13, por se tratar de cargo de natureza política. 2. Existência de precedente do Plenário do Tribunal: RE 579.951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 12.9.2008. 3. Ocorrência de fumaça do bom direito. 4. Ausência de sentido em relação às alegações externadas pelo agravante quanto à conduta do prolator da decisão agravada. 5. Existência de equívoco lamentável, ante a impossibilidade lógica de uma decisão devidamente assinada por Ministro desta Casa ter sido enviada, por fac-simile, ao advogado do reclamante, em data anterior à sua própria assinatura. 6. Agravo regimental improvido. (STF – Ag.Reg.6.650-9/PR)

O mérito da reclamação ainda não foi julgado21.

Na sequência, ainda no ano de 2008, outra Reclamação chegou ao Supremo, a de número 6.702-5/PR.

Essa reclamação também foi ajuizada contra ato decisório do Juiz de Direito da 1ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba/PR, atacando decisão deste, em sede de ação popular, que manteve, no início daquela ação, a posse de Maurício Requião de Mello e Silva, também irmão do então Governador Roberto Requião de Mello e Silva, no cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Paraná, para o qual foi nomeado por decreto firmado pelo próprio Governador.

O pedido liminar foi indeferido pelo Ministro Relator Ricardo Lewandowski, que, na fundamentação fez menção genérica ao julgamento do RE 579.951/RN, referindo que naquele foi formada a distinção entre cargo estritamente administrativo e cargo político, não chegando a afirmar expressamente que a súmula pura e simplesmente não se aplicaria aos agentes políticos.

Dessa decisão que indeferiu a liminar, também foi interposto no Supremo Agravo Regimental, que foi provido sob o argumento, também do relator Ricardo Lewandowski, de que os conselheiros do Tribunal de Contas não são agentes políticos e que, naquele caso concreto, “o processo de nomeação de Maurício Requião de Mello e Silva, ao menos em primeira análise dos autos, sugere a ocorrência de vícios que maculam a sua escolha por parte da Assembleia Legislativa do Estado” (Rcl 6.702-MC-AgR/PR – inteiro teor – pg. 8).

Na sequência o Juízo curitibano reclamado prolatou decisão de mérito e julgou parcialmente procedente a ação popular para declarar a nulidade do Decreto Estadual 3.044/2008 “pelo qual o segundo requerido foi nomeado antes mesmo da existência de vaga para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado”, fato esse que culminou na perda superveniente de objeto da reclamação.

Adiante, já no ano de 2011, foi proposta no STF a Reclamação 12.478/RJ, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra nomeação de Lenine Rodrigues de Lima, para o cargo de Secretário de Educação daquela municipalidade, já que este é irmão do então Prefeito do Município de Queimados/RJ, Max Rodrigues Lemos. O reclamante sustentou que “a redação atual da Súmula Vinculante 13 não reconhece exceções relacionadas à nomeação de parentes para cargos de natureza política”. O relator, Ministro Joaquim Barbosa, deferiu a cautelar para determinar o afastamento do irmão do Prefeito do cargo de Secretário da Educação daquele Município, asseverando que:

Assim, em linha com o afirmado pelo reclamante, tenho que os acórdãos proferidos por este Supremo Tribunal Federal no RE 579.951 e na medida cautelar na Rcl 6.650 não podem ser considerados representativos da jurisprudência desta Corte e tampouco podem ser tomados como reconhecimento definitivo da exceção à Súmula Vinculante 13 pretendida pelo município reclamado. Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não prevê a exceção mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da situação concreta descrita nos autos, (…) (o grifo não consta no original)

Essas são as principais decisões que circundam a súmula vinculante e sua aplicação aos agentes políticos.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VEIGA, Marcio Gai. Súmula vinculante nº 13 e os agentes políticos – a grande omissão do Supremo Tribunal Federal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3966, 11 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28142. Acesso em: 22 dez. 2024.

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