Fraude de execução e a proteção ao terceiro de boa-fé.

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10/06/2014 às 10:10
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– Averbação da distribuição da execução.

7.1 – Art. 615-A do CPC.

O art. 615-A do CPC, também é uma inovação introduzida pela Lei 11.382/2006, e tem o condão de autorizar o exequente, por sua iniciativa, conta e risco, a proceder a averbação da distribuição da demanda à margem da matrícula do imóvel ou imóveis de propriedade do executado. Tal averbação pode ser realizada em vários registros públicos, conforme a natureza do bem. Por exemplo, tratando-se de imóveis à margem da matrícula, se veículos, no DETRAN, etc.

A disposição alude a “ajuizamento”, portanto, por tal deve-se entender a distribuição da pretensão de executar (art. 263), quer se trate de execução de título extrajudicial ou da Justiça por Tribunais que já utilizem o sistema da ‘penhora online’ deverão ser devolvidos ao Juízo de origem com a informação de que o respectivo Tribunal integra referido sistema e que, por conseguinte, a pesquisa ou a solicitação de certidão poderão ser feitas diretamente através de tal sistemática. Publique-se. São Paulo, 15 de dezembro de 2011.(a) MÁRIO DEVIENNE FERRAZ. Corregedor Geral da Justiça em exercício.

judicial, e antes mesmo de qualquer controle do órgão judiciário, ou seja, antes mesmo do juiz dizer se recebe a inicial e se esta preenche os requisitos do art. 282 do CPC.

A averbação da distribuição constitui medida preventiva, colocada à disposição do exequente, portanto é faculdade, não se trata de imposição legal, tanto que em não sendo realizada a averbação nenhum efeito acarretará ao processo executivo. Tem porém o objetivo de, em sendo realizada, impedir a alienação dos bens em fraude de execução, uma vez que a publicidade do ato, tem o condão gerar efeitos erga omnes.   

Para Araken de Assis, a averbação prevista no art. 615-A, tem como principal efeito, caracterizar como fraudulentos os negócios posteriormente realizados, sendo a hipótese de fraude de execução, o que resulta inequívoco da remissão ao art. 593 do CPC. E a presunção mencionada na regra, porque a averbação opera erga omnes, tem natureza absoluta. Por conseguinte , o art. 615-A antecipa efeito que, em princípio, decorreria da penhora averbada (art. 659, § 5º).[58]

Não obstante a averbação da distribuição se equiparar à averbação da penhora prevista no art. 659, § 4º, nenhum outro efeito inerente à penhora fica antecipado. Nenhum impedimento o ato erigirá aos negócios do executado, que continuará a deter a livre administração de seus bens, podendo deles dispor ou onerá-los. O que poderá ocorrer, posteriormente, é a declaração de ineficácia desses atos perante o exequente.

É passível da averbação, somente os bens passíveis de penhora. Ficam excluídos os bens impenhoráveis. Tratando-se de cumprimento de sentença (art. 475-J), o exequente pode requerer a Certidão de Objeto e Pé do processo a fim de proceder a averbação. Da mesma forma, nas demais espécies de execução (entrega de coisa e fazer), na presença de prestações pecuniárias, seja pela conversão da obrigação principal em dinheiro, seja porque há obrigação acessória em dinheiro. 

Assim, por sua iniciativa, conta e risco, de posse da certidão o exequente poderá realizar a averbação que deverá ser limitar a “tantos bens quantos bastem para o pagamento” do crédito (art. 659 caput), se responsabilizando por eventual excesso e prejuízo eventualmente acarretado aos negócios do executado.

Feita a averbação, o exequente deverá comunicar ao juízo a realização das averbações no prazo de 10 dias (art. 615-A, § 1º.), fluindo o prazo da “data da concretização” do ato, ou seja, da data da prenotação do documento (art. 182 da Lei 6.015/73).

O descumprimento do prazo pode gerar os efeitos decorrentes do § 4º, do art. 659, ou seja, a responsabilização por eventual prejuízo ao executado, mantida a eficácia da averbação, principalmente a presunção de fraude. Feita a penhora em bens excluídos da averbação, ou tão só em alguns dos bens envolvidos na averbação, o juiz determinará o cancelamento do excesso, sendo desnecessário nesse caso, a averbação da penhora, tratando-se de imóveis, porque a finalidade do Art. 615-A é a mesma do § 4º, do art. 659 do CPC, já se encontrando o exequente protegido contra eventuais atos fraudulentos.


8 - A Súmula 375-STJ

A preocupação da doutrina e jurisprudência com o terceiro adquirente de boa-fé, atribuindo presunção relativa (juris tantum) da fraude em seu favor, levou o legislador a alterar o § 4º do artigo 659, do CPC, introduzido pela Lei 8.953/94, passando a exigir do credor, a partir da Lei 10.444 de 07.05.2002, para presunção absoluta de conhecimento de terceiros, o registro da penhora no ofício imobiliário, mediante apresentação de certidão de inteiro teor do ato e independentemente de mandado judicial.

Em virtude das dificuldades apresentadas para o registro no ofício imobiliário, por conta da especificidade do registro que tem como princípio, a continuidade registraria, em 2006 por meio da Lei 11.382, de 6 de dezembro, o termo “registro” foi substituído por “averbação”, tornando assim, mais simples sua realização, adequando o termo à realidade pretendida, a  qual nada mais é que “dar publicidade” ao ato constritivo.   

Aos 30 de março de 2009, depois de reiteradas decisões no sentido de que o reconhecimento da fraude de execução só poderia ocorrer após a citação válida, a propósito de venda de bem penhorado - passou a prevalecer no STJ o entendimento de que a alienação do imóvel penhorado só poderia ser declarada ineficaz, quando registrada a penhora ou quando comprova a má-fé do terceiro adquirente, carreando a prova da má-fé para o devedor e para o exequente no caso de embargos de terceiro. 

Referido entendimento resultou na edição da Súmula 375-STJ de 30 de março de 2009, dispondo que "O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente."

A Súmula 375-STJ, foi relatada pelo ministro Fernando Gonçalves, fundamentada nos  precedentes (739.388-MG, 865.974-RS, 734.280-RJ, 140.670-GO, 135.228-SP., 186.633-MS e 193.048-PR) que tratavam de situações nas quais os credores buscavam o patrimônio do devedor por execução judicial distribuída antes da alienação do imóvel, porém, não havia penhora registrada quando da aquisição pelo terceiro. 

Dentre os precedentes, o REsp. 739.388-MG., a meu ver, merece destaque especial, razão pela qual faço a transcrição de parte do voto do Ministro LUIZ FUX, ipis literis:

“(...) O dispositivo tido como violado assim determina:

"Artigo 659, § 4º do CPC: "A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exequente, sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 669), providenciar, para presunção absoluta de conhecimento por terceiro, o respectivo registro no ofício imobiliário, mediante apresentação de certidão de inteiro teor do ato e independentemente de mandado judicial."

Deveras, a norma legal acima transcrita reclama o registro da penhora no cartório imobiliário, como requisito para configuração da má-fé dos novos adquirentes do bem penhorado, porquanto presume o conhecimento da constrição em relação a terceiros por meio da sua publicidade.

É cediço que o registro cartorário tem como finalidade social dar conhecimento erga omnes de certos atos, dentre os quais destacase a alienação de imóvel, consoante disposto no artigo 129, § 9º da Lei 6.015/73:

"Estão sujeitos a registro, no Registro de Títulos e Documentos, para surtir efeitos em relação a terceiros: § 9º Os instrumentos de cessão de direitos e de créditos, de sub-rogação e de dação em pagamento." Ademais, à luz do art. 530 do Código Civil sobressai claro que a lei reclama o registro dos títulos translativos da propriedade imóvel por ato inter vivos, onerosos ou gratuitos, posto que os negócios jurídicos em nosso ordenamento jurídico, não são hábeis a transferir o domínio do bem. Assim, titular do direito é aquele em cujo nome está transcrita a propriedade imobiliária.

A jurisprudência do STJ, sobrepujando a questão de fundo sobre a questão da forma, como técnica de realização da justiça, vem conferindo interpretação finalística à Lei de Registros Públicos.

Assim é que foi editada a Súmula 84, com a seguinte redação: 

"É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".

Num dos precedentes que deram origem à mencionada Súmula, afirmou o eminente Ministro Athos Carneiro: 

"Sr. Presidente, ao apreciar este tema impressiono-me, sobremodo, com as consequências, no plano social, dos nossos julgamentos. Sabemos que no nosso país, principalmente nas camadas pobres da população, um grande número de negócios, e até direi, a maior parte dos negócios, é efetuada de maneira menos formal, e até absolutamente informal. Compram-se e vendem-se pequenos terrenos, apartamentos e casas apenas mediante a emissão de recibos, sinais de arras e mesmo de promessas de compra-e-venda ou 'transferências de posse' redigidos de forma singela. E é muitíssimo comum que esses documentos não venham a ser registrados no Registro de Imóveis, inclusive porque com frequência os termos em que estão vazados não permitiriam o registro. Para o registro imobiliário é necessário que o contrato revista determinados requisitos, o que exige, frequentemente, a presença do tabelião ou do profissional do Direito.

Então, com extrema frequência, ocorre na vida judiciária termos alguém que é possuidor do seu terreno ou da sua casa há muitos anos, em inteira boa-fé, que já pagou a totalidade do preço há muitos anos, e de repente é surpreendido por uma penhora, em execução promovida contra aquele que lhe havia 'alienado' o imóvel; nos termos da aludida Súmula (Súmula 612 do STF), irá perder seus direitos à posse e à aquisição da propriedade.

Então vemos aqui os dois pratos da balança: de um lado, temos o direito do credor, direito pessoal; do outro lado o direito, também pessoal, do possuidor e promitente comprador. Geralmente, como no caso dos autos, o possuidor já mantinha o seu direito de posse e os direitos à aquisição decorrentes de sua promessa de compra-evenda desde antes do surgimento do crédito que origina a penhora.

Então se pergunta: entre as duas pretensões, a do credor, direito pessoal, e a do promitente comprador com justa posse, direito também pessoal, qual é aquela que merece maior tutela, maior proteção jurídica?

Tenho a impressão de que levar nosso raciocínio para o terreno do direito registral importará inclusive na aplicação das normas jurídicas dentre de um, digamos assim, tecnicismo exagerado. É certo que, num plano puramente registral, o domínio do imóvel penhorado ainda, tecnicamente, integra o patrimônio do promitente vendedor.

O promitente vendedor ainda é dono do imóvel, mas o é sob aquele 'minus' derivado das obrigações que assumiu, de outorga da escritura definitiva, em virtude do contrato, quitado ou não, de promessa de compra-e-venda. O patrimônio do cidadão não é constituído só dos seus direitos, mas também das suas obrigações. E o promitente vendedor tem a obrigação de garantir a posse transferida contratualmente ao promitente comprador, que a exerce em nome próprio.

Então, se dirá: mas o credor não sabia disso; o credor considerava que o imóvel era do promitente vendedor; emprestou-lhe dinheiro, ou com ele negociou, confiante de que aquele imóvel fazia parte, sem ônus, do seu patrimônio. Será que essa assertiva corresponde às realidades da vida? Será que o credor foi realmente averiguar no Registro Imobiliário? Não atentou para a circunstância de que naquele imóvel estaria morando alguém, às vezes há muitíssimos anos, comportando-se como dono? E a penhora, por sua vez, terá ela sido objeto de registro, de molde a ter eficácia perante terceiros?

Creio mais conforme com as necessidades atuais do comércio jurídica a interpretação pela qual, no choque de interesses de dois direitos eminentemente pessoais (a própria penhora não é direito real, mas ato processual executivo), direito pessoal tanto um quanto outro, deve prevalecer na via dos embargos de terceiro, o direito daquele que está na justa e plena posse do imóvel, como seu legítimo pretendente à aquisição, face ao direito do credor do promitente vendedor, dês que no caso ausente, por certo, qualquer modalidade de fraude a credores ou à execução. Esta orientação melhor se coaduna às realidades jurídico-sociais do nosso país, e impende sejamos sensíveis a estas realidades." (RESP 1.172/SP,Rel. Min. Athos Carneiro, DJ 16/04/90) 

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O princípio da Súmula 84, bem como as palavras do Ministro Athos Carneiro, aplicam-se inteiramente ao caso dos autos, porquanto evidenciada no acórdão recorrido a ausência de má-fé dos adquirentes do imóvel objeto da constrição.

Ressalte-se que a novel exigência do registro da penhora, muito embora não produza efeitos infirmadores da regra prior in tempore prior in jure, exsurgiu com o escopo de conferir à mesma efeitos erga omnes para o fim de caracterizar a fraude à execução.

Aquele que não adquire do penhorado não fica sujeito à fraude in re ipsa, senão pelo conhecimento erga omnes produzido pelo registro da penhora. Sobre o tema, sustentamos: 

"Hodiernamente, a lei exige o registro da penhora, quando imóvel o bem transcrito. A novel exigência visa à proteção do terceiro de boa-fé, e não é ato essencial à formalização da constrição judicial; por isso o registro não cria prioridade na fase de pagamento. Entretanto, a moderna exigência do registro altera a tradicional concepção da fraude de execução; razão pela qual, somente a alienação posterior ao registro é que caracteriza a figura em exame.

Trata-se de uma execução criada pela própria lei, sem que se possa argumentar que a execução em si seja uma demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência e, por isso, a hipótese estaria enquadrada no inciso II do art. 593 do CPC.

A referida exegese esbarraria na inequívoca ratio legis que exsurgiu com o nítido objetivo de proteger terceiros adquirentes. Assim, não se pode mais afirmar que quem compra do penhorado o faz em fraude de execução. 'É preciso verificar se a aquisição precedeu ou sucedeu o registro da penhora'. Neste passo, a reforma consagrou, no nosso sistema, aquilo que de há muito se preconiza nos nossos matizes europeus." (Curso de Direito Processual Civil, Luiz Fux, 2ª Ed., pp. 1298/1299),

Ora, a responsabilidade dessa terceira pessoa somente poderia advir ou de fraude de execução ou de fraude contra credores; a primeira a exigir prova de alienação ilícita in re ipsa e a segunda a reclamar ação pauliana com a prova do consilium fraudis. (grifos nossos)

No REsp. 865.974-RS., o ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI para decidir assim se manifestou em seu voto:

 “(...)  Toda a controvérsia gira em torno de se saber se o registro da penhora é ou não pressuposto indispensável à configuração de fraude na alienação do bem imóvel penhorado.

Em nossa lei processual, a determinação de registro da penhora de bem imóvel surgiu, formalmente, com a inclusão, pela Lei 8.953/94, do § 4º ao art. 659. Entretanto, mesmo antes disso, a jurisprudência já considerava que o registro constituía prova segura e suficiente para elidir a presunção de boa-fé do adquirente do bem imóvel penhorado. Nesse sentido, aliás, dispunha o art. 245 da Lei 6.015/73 (a inscrição da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior ).

A esse respeito, a jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que, ante a ausência do registro da penhora, para que seja caracterizada fraude à execução, impõe-se ao credor o ônus de provar que o adquirente tinha ciência da constrição que pesava sobre o imóvel.” (grifos nossos)

No REsp. 734.280-RJ., que tem como Relatora a ministra ELIANA CALMON, ressaltando que a alienação foi posterior ao ajuizamento da demanda, mas antes da penhora, assim decidiu:

“ (...)Verifica-se, pelo cotejo analítico feito pelo recorrente, que no paradigma, assim como no acórdão impugnado, a alienação foi posterior ao ajuizamento da execução, mas antes da existência de penhora. Aliás, na questão constante dos autos não havia sequer citação na execução.

Diversos arestos foram trazidos pelo recorrente, dos quais transcrevo mais um, proferido no AGReg. no AG nº 45871/SP, relatado pelo Ministro Luiz Fux, publicado no DJU de 19/12/2002:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ADQUIRENTE DE BOA-FÉ. ARTIGO 185 DO CTN. VENDA FEITA POR SÓCIO DA PESSOA JURÍDICA EXECUTADA.

1.             A presunção de fraude, artigo 185 do CTN, por si, não torna inexistente, nulo ou anulável o ato tido por fraudulento, competindo à parte exequente provar a ciência pelo terceiro adquirente de existência da demanda ou de constrição.

2.             A presunção ditada no artigo 185 do CTN não é de índole subjetiva, mas objetiva.

3.             Para que se possa presumir a fraude, não basta que a execução tenha sido distribuída, é necessário que o devedor tenha sido citado.

4.             Agravo regimental a que se nega provimento.

Restou demonstrado que a decisão impugnada está em total divergência com o entendimento desta Corte, razão pela qual dou provimento ao recurso especial pela alínea "c", para reformar o acórdão e julgar procedentes os embargos de terceiro, ficando invertida a sucumbência.” (grifos nossos)

No REsp. 140.670-GO., que tem como Relator o ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, assim se manifestou em seu voto:

 “(...) A orientação adotada pelo Tribunal a quo não se compatibiliza, portanto com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que a penhora, para valer contra terceiros, deve estar registrada no cartório competente e a ausência do registro impõe ao exequente o ônus de provar que o terceiro adquirente do imóvel não agiu de boa-fé e que tinha ciência da constrição, o que não ocorreu.” (grifos nossos)

No REsp. 135.228-SP., cujo Relator é o ministro NILSON NAVES, após constatar que os recorridos adquiriram o imóvel objeto da lide mediante escritura pública lavrada em 10 de maio de 1989 – de um terceiro que não os executados, os quais já haviam se desfeito do bem aos 19 de maio de 1987, antes da penhora só realizada em 17 de agosto de 1988, manteve o acordão cuja ementa é a seguir transcrita: 

“Fraude a execução. Penhora. Ausência de inscrição no registro imobiliário. Alienação do bem por terceiro, que não executado. Caracterização da boa-fé dos adquirentes. Fraude não configurada. Precedentes na jurisprudência. Embargos de Terceiro procedentes. Recurso improvido”.

No REsp. 186.633-MS., cujo relator é o ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA,  após ressaltar que “mesmo antes das inovações trazidas com a Reforma, para a caracterização da fraude de execução, ao exequente, que não providenciou o registro da penhora, cabe provar que o terceiro-adquirente tinha ciência do ônus que recaía sobre o bem em constrição judicial”, observando que, na espécie em exame, as instâncias de origem afirmaram a ausência do registro e a boa-fé do(s) terceiro(s) adquirente(s), a qual somente seria ilidida por prova, a cargo do exequente, de que ele(s) tinha(m) ciência da existência da demanda, decidiu pela ausência de fraude de execução com base nas anotações que lançou ao art. 593, CPC (Código de Processo Civil Anotado, Saraiva, 6º ed., 1996, pág. 418:

 “A “inscrição” (rectius, registro) gera publicidade e faz presumir, iuris et de iure, a ciência de terceiros. Inexistindo registro da citação (hipóteses dos incisos I e II do art. 593, CPC) ou do gravame judicial, ao credor cabe o ônus de provar a ciência, pelo terceiro, adquirente ou beneficiário, da existência da demanda ou do gravame”. (grifos nossos).

No REsp. 193.048-PR., cujo Relator é o ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, este, após transcrever parte do acórdão recorrido, que assinalava que o distrato da compra e venda que instrumentalizou a alienação supostamente fraudulenta, embora posterior ao ajuizamento da execução e mesmo posterior à citação dos devedores, foi inequivocamente anterior à penhora do imóvel questionado e, principalmente, foi registrado no Ofício Imobiliário antes do registro da penhora, afastou a hipótese de fraude de execução:

“(...) O distrato ocorreu em 04.07.95 e foi registrado em 24.10.95, enquanto que a penhora foi realizada em 28.08.95, mas só foi registrada depois que já estava registrado o distrato, apesar dos registros terem sido feitos no mesmo dia (24.10.95). (...) É dizer: quando foi registrada a penhora, o bem constrito já não integrava o patrimônio da empresa devedora, pois fora legitimamente adquirido pelos agravantes no dia anterior.” 

(...) Assim, não encontro ofensa aos arts. 593 e 263 do CPC, estando superada a divergência no âmbito desta Turma (Súmula 83), pelo que não conheço do recurso.” (grifos nossos).

Assim, o E. STJ consagrou a existência do pressuposto subjetivo, ou seja, a necessidade da existência da má-fé do terceiro adquirente, para a perfeita subsunção do instituto da fraude à execução. Portanto, aquele C. Sodalício concretiza a aplicação do princípio da boa-fé objetiva. Por outro lado, a retromencionada súmula cria uma presunção absoluta desta má-fé no caso da existência do registro da penhora. Nesse sentido, Didier Junior, aduz que, se, porém, a averbação tiver sido feita, há a presunção absoluta de que o terceiro adquirente tinha o conhecimento da litigiosidade da coisa.[59]

Não obstante o entendimento da Súmula 375 do STJ, prestigiar o Sistema Registral Imobiliário brasileiro e suas finalidades intrínsecas, primando pela necessidade da publicidade para gerar efeitos erga omnes, na edição da Súmula-84-STJ, o E. STJ fundamentado na ‘questão social’ adota interpretação contrária, ao considerar o compromisso de compra e venda não registrado, como hábil ao ajuizamento dos embargos de terceiro ao terceiro possuidor de boa-fé. Enquanto que na sistemática do Código Civil, o compromisso de compra e venda, para ser qualificado com um direito real, deverá ser firmado por instrumento público ou particular levado a registro no Cartório de Registro de Imóveis do qual não conste o direito de arrependimento (art. 1.417, CC/2002).

Não obstante a ressalva do direito pessoal considerado, o entendimento em um primeiro momento pode parecer justo, atendendo inclusive ao interesse social por não privar de patrimônio ou moradia os adquirentes que dificilmente vão conseguir reaver seu dinheiro de quem já é devedor e, portanto, executado. Contudo, ao buscar proteger a boa-fé, o Superior Tribunal de Justiça acredita em uma inocência pueril inexistente nos dias de hoje. Não é crível que quem vai adquirir um imóvel se contente em apenas avaliar a sua matrícula e fechar o contrato. É de conhecimento comum que, na investigação do vendedor, o comprador de imóveis busca o distribuidor judicial para encontrar eventuais ações propostas contra o alienante. Se não busca, então deveria fazê-lo, pois a informação está disponível para quem for diligente.

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Sobre a autora
Marly Vieira de Camargo

Advogada inscrita na OAB/SP sob o nº.86.687, é bacharel em direito pela Universidade de Ribeirão Preto-SP., pós graduada em Direito Empresarial pela EPD - Escola Paulista de Direito, e em Processo Civil, pela Escola Paulista da Magistratura.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Orientador: Dr. João Batista Amorim de Vilhena Nunes

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