Cooperativas de mão de obra.

O interesse público e a dupla importância dessas sociedades

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04/05/2014 às 16:42
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O presente artigo tem como objeto as sociedades cooperativas com ênfase nas de trabalho, e como objetivo identificar as características, desafios e benesses dessas corporações. Baseia-se na problematização do dever do Estado em estimular o cooperativismo.

INTRODUÇÃO

Por natureza, o ser humano é social e político1, buscando, continuamente, a união com outros indivíduos para conseguir executar algumas tarefas. Nesse contexto está inserida a figura da pessoa jurídica que, antes de jurídica, é, sobretudo, fruto da vontade do homem social, existindo então por causa deste e para este. Pela necessidade da união entre dois ou mais indivíduos para a realização de um determinado anseio ou projeto, surge a chamada pessoa jurídica.

Dentre as formas pelas quais os individuos podem se associar, existe a figura da sociedade cooperativa, a qual possui atributos jurídicos pertencentes às pessoas jurídicas. Além disso, apresenta determinadas características, como não poderia deixar de ser, inerentes à finalidade própria dessas sociedades que são formadas por motivos bem específicos, bem como têm exigências diferenciadas para sua manutenção.

De início, pode ser destacado que as sociedades cooperativas consistem na união de pessoas naturais, sem fins lucrativos, "de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados", conforme conceitua a Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, a qual "define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências".

Acontece que, como tudo nas ciências, existe um tratamento (ou ciência) atual dado a determinado conhecimento (ou instituto) e outro que melhor trataria o assunto diante das necessidades mais emergentes da sociedade, principalmente no ramo da economia, em que há um dinamismo intenso2. Nessa esteira, o regime jurídico brasileiro para o sistema cooperativista não atende à demanda econômica e social que as cooperativas precisam e têm a proporcionar.

A partir dessa problematização, se desenvolverá o presente artigo, sendo analisadas as sociedades cooperativas com ênfase nas espécies trabalhistas. Dessa forma, será estudado como elas são vistas hoje pelas leis e pelas políticas públicas, bem como identificados os pontos em que essa relação seria mais benéfica no caso de se dar outro tratamento.

Sabe-se que o Direito é a ciência humana que objetiva a promoção e a manutenção da paz social. Assim, se faz relevante a reflexão sobre a necessidade de voltar a atenção ao papel do Direito na prevenção de danos sociais, uma vez que se faz notável a superior velocidade dos acontecimentos em face do desenvolvimento científico, especialmente na área jurídica.

Em que pese ser utópico achar que a ciência consiga antever todos os problemas e necessidades do homem, é, ao mesmo tempo, frustrante não vislumbrar a distância entre os problemas e a resolução deles na sociedade em que se vive. O direito se vê, na maior parte do tempo, usando suas forças para desfazer injustiças pontuais no lugar de evitá-las.

Nota-se que os sujeitos sociais buscam, a todo tempo, encontrarem meios de resolverem questões cotidianas, como é o caso das sociedades. Todavia, esse desprendimento de esforços deve ser tratado da melhor forma possível pelo estado para que não haja prejuízos, tampouco limites que tornem a atividade humana sem sentido. Neste ponto, vale questionar: qual o papel do Direito e do estado na possibilitação/facilitação dos empreendimentos individuais na busca por uma vida melhor ou mais pacífica em sociedade?

Diante desse questionamento, o presente estudo tentará observar qual o limite da relação público/privado nesse contexto, e quais são as dificuldades, internas e externas, encontradas pelas sociedades cooperativas para sua formação, manutenção, alcance de seus objetivos e promoção do bem estar dos indivíduos.

Além disso, será referenciado o papel do estado e do direito para a resolução dos óbices encontrados por essas sociedades e até que ponto essas pessoas jurídicas, ou a vontade de grupos civis, merecem maior atenção e intervenção estatal. Nessa senda, propõe-se, ainda, analisar a comunicação entre a iniciativa privada e aquele objetivo fundamental da República do Brasil (portanto público) que almeja: "construir uma sociedade livre, justa e solidária" (art. 3º, I, da Constituição Federal).

Destaca-se o pensamento de Sennett apud Oliveira (2006) em obra erigida sobre as sociedades cooperativas e a cultura solidária, na qual é exposto que, à medida em que a sociedade se submete a normas de forma automatizada, sem uma consciência crítica dessas normas e sem uma participação mais direta, há uma degradação dessa sociedade. Ela se torna passiva e permissiva conquanto haja prejuízo a si e a seus indivíduos.

O tema abordado é relevante por suas fortes ligações com outros assuntos de grande importância, a exemplo da teoria anti-capitalista de Karl Marx3, da cultura solidária, da democracia, do bem estar social e da economia solidária4.

Ressalta-se que a OIT redigiu duas recomendações sobre o cooperativismo, a saber: Recomendações 127 e 193 / OIT. Além disso, tem destaque o tema na sociedade brasileira a partir da recente promulgação de diplomas legais e jurisprudências que vão de econtro àquelas recomendações e ao comando constitucional do art. 174, § 2º da Constituição Federal.

O método que se propõe no estudo das questões apresentadas é o da pesquisa bibliográfica na literatura do Direito Civil, Direito do Trabalho, Direito Constitucional, artigos científicos relacionados ao tema, além de sítios da internet e de títulos que falam sobre solidariedade, com ênfase na área econômica.


2 – ABORDAGEM PROPEDÊUTICA NORMATIVA E CONCEITUAL SOBRE AS COOPERATIVAS

Prima facie, as sociedades cooperativas são regidas principalmente pela Lei 5.764/71, que se trata de norma especial sobre a matéria, e pelo Código Civil de 2002, que é posterior à Lei 5.764. O Código Substantivo diz em seu artigo 1.093 que "A sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto no presente Capítulo, ressalvada a legislação especial". Assim, existem duas principais fontes jurídicas sobre as sociedades cooperativas.

A sociedade cooperativa se enquadra no grupo de pessoa jurídica conhecido como corporações. Nas palavras de Farias & Rosenvald (2010, p. 329), "as corporações são compostas por um grupamento de pessoas, ligadas por um sentimento comum (affectio societatis)".

Tais sociedades são formadas pelo conjunto de pessoas (e não por um patrimônio), que podem ser jurídicas também (é o que se depreende do art. 6º, II e III, e do art. 29, parágrafos 2º e 3º, da Lei 5.764/71), as quais, visualizando um objetivo, uma vontade em comum, se reúnem para executarem essa ideia de maneira mais fácil e prazerosa.

Conforme Farias & Rosenvald (2010, p. 329/330), as sociedades podem ser:

"simples – quando exercerem atividades econômica (sic), visando ao lucro, porém o seu objeto não disser respeito a uma atividade típica de empresário (CC, arts. 997 a 1038) -, ou assumir feição de sociedade empresarial – quando tender ao exercício de atividade mercantil, relacionada com atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens e serviços (CC, arts. 966 e 982)".

Todavia, as cooperativas são tratadas juridicamente sempre como sociedades não empresariais por expressa normatização dada pelo art. 982, parágrafo único do Código Civil.

Nesse ponto, vale destacar o texto da Lei 5.764 sobre o conceito de cooperativa. O art. 3º diz que "Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro" (grifo nosso), e o art. 4º da mesma leicomplementa: "As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados".

Interessante se faz a observação das expressões "atividade econômica" e "sem objetivo de lucro". É importante entender e distinguir tais termos: a atividade econômica propriamente dita, que é característica das sociedades e extrínseca às associações, está ligada à circulação de bens e serviços escassos, em termos econômicos.

A Lei 5.764/71, quando diz "lucro", expressa uma ideia de ágio, mais-valia ou aumento de capital da cooperativa em função de sua atividade econômica, e não de resultados, ou otimização de processos econômicos do cooperado que lhe proporcione uma melhora no saldo resultante da diferença entre ganhos e perdas, devida justamente à união dos esforços dos sócios. Neste patamar considera-se a acepção da palavra "resultados", a qual aparece no CC, art. 981: "Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados" (grifo nosso).

Acontece que as cooperativas existem em função dos cooperados e não de si mesma ou de um capital social. Além disso elas existem para a consecução de uma atividade econômica.

Sendo assim, a pessoa física ao conceber sua vontade de criar ou ingressar em uma cooperativa, é para melhorar alguma atividade econômica relacionada a ela, podendo essa atividade ser uma dentre as inúmeras necessidades econômicas humanas: habitação, consumo, trabalho, crédito, dentre outras.

Portanto esse indivíduo não espera outra coisa senão uma diminuição dos seus prejuízos ou melhor aproveitamento de seus recursos, o que não deixa de ser lucro (vantagem, benefeciamento) de certa forma, mas para o sócio cooperado e não para a cooperativa.

Em síntese, sobre o tema ora em apreço, a pessoa física potencialmente já iria exercer sua atividade econômica sozinha independentemente da existência da cooperativa, obtendo eventualmente lucros e prejuízos. Todavia, a figura da corporação cooperativa surge, não para ela mesma assumir as atividades de seu membro, mas para auxiliá-lo.

Não há de se falar em associação, uma vez que, pelo art. 53 do Código Civil, as associações têm fins não econômicos.

Vale ainda lembrar que, de acorodo com a Constituição Federal de 1988, "a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento" (art. 5º, inciso XVIII); "A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo" (art. 174, parágrafo 2º); além de serem afirmados, como objetivos da República Federativa do Braisl, dentre outros: "construir uma sociedade livre, justa e solidária" (art. 3º, inciso I) e "erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais" (art. 3º, inciso III).

Ressalta-se que, pelas características próprias e especiais das cooperativas, há uma gama de juristas que defendem a existência de um ramo na ciência do Direito dedicado ao tema: o Direito Cooperativo. É o caso da jurisperita Andrighi (2003, p. 03), que aduz:

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"O fato de se apresentarem como uma nova categoria de sociedade, que ensejou novos tipos de relações jurídicas com seus associados e com terceiros e, principalmente, sua atuação e operacionalidade distinta das sociedades tanto civis como comerciais, com objetivos singulares e características próprias, fez entender que as regras destinadas a reger as cooperativas não se enquadravam quer no campo do Direito Civil, quer no campo de Direito Comercial, Social ou Administrativo, fazendo surgir um novo ramo, qual seja, o do Direito Cooperativo".


3 – CARACTERÍSTICAS DAS SOCIEDADES COOPERATIVAS

As sociedades cooperativas são regidas por princípios próprios e de forte conteúdo axiológico que as diferenciam dos demais sistemas jurídicos. Atente-se para a doutrina de Andrighi (2003, p. 05):

Todavia, não obstante tratarem-se as sociedades cooperativas de entidades sui generis, receberam tratamento legal de natureza civil, de acordo com a Lei 5.764/71, ficando, pois, subordinadas às normas do Código Civil.

Tal eqüipolência, contudo, restringe-se a pontos prefixados da Lei, que, ademais, é contundente ao gizar as dissensões do sistema cooperativo em face das demais espécies de sociedades existentes na conjuntura atual. Cite-se, como elementos caracterizadores de referida distinção, o estatuído nos incisos do art. 4º da Lei das Sociedades Cooperativas, os quais delineiam um sistema concretamente autônomo e independente.

O art. 4º da lei supracitada trata exatamente das características próprias das cooperativas, que também são conhecidas como princípios do cooperativismo, inspirados naquilo que foi definido quando do surgimento da primeira cooperativa: a de Rochdale, em 1844. Merecem destaque: a) adesão livre; b) gestão democrática; c) distribuição das sobras líquidas; d) retomo proporcional às operações. e) taxa limitada de juros sobre o capital social; f) constituição de um fundo de educação para os cooperados e do público em geral; g) ativa cooperação entre os cooperativistas.

Na Recomendação 193 da OIT, estão ainda previstos os seguintes princípios: a) associação voluntária e acessível; b) controle democrático pelo associado; c) participação econômica do associado; e) autonomia e independência; f) educação, formação e informação; g) cooperação entre cooperativas e interesse pela comunidade. (grifo nosso).

Os princípos grifados comumente são deixados em segundo plano, em que pese a sua igual importância em relação aos outros, uma vez que é inviável a manutenção das cooperativas se não houver nas pessoas esse espírito cooperativista e as informações necessárias para participar de atividades econômicas em meio a uma competitividade acirrada que o capitalismo provoca.

Como elementos próprios de uma cooperativa, têm destaque os atos cooperativos, que são aqueles atos próprios de uma cooperativa e de seus associados (art. 74, da Lei 5.764/71) e que recebem tratamento tributário diferenciado (art. 146, III, c, CF).

São exemplos de atos cooperativos, dentre outros:

"a entrega de produtos dos associados à cooperativa, para comercialização, bem como o repasse efetuados pela cooperativa a eles, decorrentes dessa comercialização, nas cooperativas de produção agropecuárias; o fornecimento de bens e mercadorias a associados, desde que vinculadas à atividade econômica do associado e que sejam objeto da cooperativa nas cooperativas de produção agropecuárias; as operações de beneficiamento, armazenamento e industrialização de produto do associado nas cooperativas de produção agropecuárias". (RECEITA FEDERAL, 2010,p. 09).

Percebe-se que esses atos têm natureza própria ligada ao sistema cooperativista, não sendo, a princípio, regidos por regras de outros ramos do Direito, como o cilvil, tributário, ou trabalhista.


4 – ABORDAGEM SÓCIO-CULTURAL

Há unanimidade entre os especialistas de diversas áreas acerca da importância das sociedades cooperativas no contexto econômico, cultural e democrático: elas podem funcionar como um poderoso instrumento de diminuição de desigualdades, de interação humana, participação ativa das pessoas nas decisões políticas, e de solidariedade, sem mencionar outros.

Dessa forma, percebe-se a amplitude da importância das cooperativas não apenas sob a ótica econômica.

Aliás é assim que entende a OIT ao dar o conceito de cooperativa:

"associação autônoma de pessoas que se unem voluntariamente para atender a suas necessidades e aspirações comuns, econômicas, sociais e culturais, por meio de empreendimento de propriedade comum e de gestão democrática" (Recomendação 193 OIT, 3 de junho de 2002). (grifo nosso).

Especificamente sobre as cooperativas de trabalho, fica ainda mais evidente a poderosa utilidade dessas sociedades para combater o capitalismo, haja vista a união de profissionais, detentores dos meios de produção ou não, possibilitar uma oportunidade de melhor aproveitamento de seus esforços, de seu trabalho5, sem que isso se torne, por si só, fonte de renda para terceiros, como acontece na mais-valia que rende ao capitalista, conforme Marx (1996, p. 331):

"O segundo período do processo de trabalho, em que o trabalhador labuta além dos limites do trabalho necessário, embora lhe custe trabalho, dispêndio de força de trabalho, não cria para ele nenhum valor. Ela gera a mais-valia, que sorri ao capitalista com todo o encanto de uma criação do nada. Essa parte da jornada de trabalho chamo de tempo de trabalho excedente, e o trabalho despendido nela: mais-trabalho (surplus labour)". (grifo nosso).

Para visualizar a força que representa essa união, basta imaginar esse cenário ad infinitum, ou seja, imagine-se uma sociedade reunida de determinada classe que abranja simplesmente todos os seus profissionais, presentes e futuros. Essa é uma situação em que os capitalistas detentores dos meios de produção não estariam muito aptos a obter mais-valia da forma gananciosa que lhes é comum6.

Aliás, esse era um anseio de Marx (1996, p. 414):

"Como “proteção” contra a serpente de seus martírios, os trabalhadores têm de reunir suas cabeças e como classe conquistar uma lei estatal, uma barreira social intransponível, que os impeça a si mesmos de venderem a si e à sua descendência, por meio de contrato voluntário com o capital, à noite e à escravidão!"

É dizer, faz parte da natureza e da razão de ser das cooperativas os valores solidários, democráticos, humanos e de justiça, conforme está implícito na seguinte conceituação:

"são cooperativas de trabalho as organizações formadas por pessoas físicas, trabalhadores autônomos ou eventuais, de uma ou mais classes de profissão, reunidos para o exercício profissional em comum, com a finalidade de melhorar a condição econômica e as condições gerais de trabalho dos seus associados, em regime de auto-gestão democrática e de livre adesão, os quais, dispensando a intervenção de um patrão ou empresário, propõem-se a contratar e a executar obras, tarefas, trabalhos ou serviços públicos ou particulares, coletivamente por todos ou por grupo de alguns". (MAUAD apud PEREIRA, 2006, p. 122). (grifo nosso).

Já Martins (2008, p. 73), observa que

"A cooperativa tem fundamento na solidariedade entre as pessoas para a produção de um bem ou serviço para o mercado. Há uma comunhão de interesses. A reunião de esforços de todos os associados possibilita alcançar o fim comum almejado, que é o objeto da cooperativa. A ajuda mútua das pessoas leva ao fim por elas desejado. A solidariedade entre as pessoas na cooperativa não deixa de ser uma forma da aplicação de um dos objetivos da República Federativa do Brasil, que é construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3", I, da Constituição)"

Sendo ainda mais visionário: "Deve ser desenvolvida a educação, de forma que seja permitido que as pessoas adquiram os conhecimentos indispensáveis para a prática do cooperativismo". (MARTINS, 2008, p. 73).

Portanto, nessas sociedades, substitui-se a prática comum do domínio do mais fraco pelo mais forte, pois no modelo capitalista,

"o trabalhador sai do processo de produção diferente do que nele entrou. No mercado ele, como possuidor da mercadoria “força de trabalho”, se defrontou com outros possuidores de mercadorias, possuidor de mercadoria diante de possuidores de mercadorias. O contrato pelo qual ele vendeu sua força de trabalho ao capitalista comprovou, por assim dizer, preto no branco, que ele dispõe livremente de si mesmo. Depois de concluído o negócio, descobre-se que ele não era “nenhum agente livre”, de que o tempo de que dispõe para vender sua força de trabalho é o tempo em que é forçado a vendê-la, de que, em verdade, seu explorador não o deixa, 'enquanto houver ainda um músculo, um tendão, uma gota de sangue para explorar'". (MARX, 1996, p. 414).

Vê-se o importante papel que têm essas formas de economia solidária, que são as cooperativas, sobretudo no cenário em que se encontra a economia hoje. O que ocorre é o que se chama de precarização do trabalho: Segundo Singer (2004, p. 01),

"o emprego assalariado se tornou raro, a demanda por força de trabalho ficou muito abaixo da oferta. Para o trabalhador ficou muito caro recusar trabalho só porque não estava protegido de acordo com a lei. Com a cumplicidade dos trabalhadores desempregados, a precarização tornou-se ubíqua apesar dos esforços da fiscalização, da procuradoria e magistratura do trabalho. Ela assume inúmeras formas, uma das quais é a falsa cooperativa do trabalho.

Acabar com ela (se isso fosse possível) certamente não acabaria com a precarização, ela apenas assumiria outras formas, possivelmente mais insidiosas".

Estendendo-se no entendimento de Martins (2008, p. 83), em relação às cooperativas:

"São vantagens sociais: abolição do trabalho assalariado, justa divisão de rendimentos, participação dos trabalhadores na gestão, desaparecimento de luta de classes.

Sob o ponto de vista econômico, a utilização das cooperativas implica o desaparecimento do conflito entre o capital e o trabalho, abolição do lucro, operação em maior escala, redução de custos, conquista de novos mercados, diversificação, distribuição de sobras, venda a justo preço, democracia econômica[...]"

Além disso, conforme Oliveira (2006), a cooperativa é um ambiente potencializador para as interações pessoais em prol do desenvolvimento humano dos associados e da comunidade. Isso tem um valor imensurável, pois consiste na "construção" de uma cultura em conjunto, de "dentro para fora", portanto forte e capaz de gerar benefícios para nos mais variados aspectos das vidas dessas pessoas.

Tratam-se, pois, as cooperativas, de alavancadores dos valores humanos. Possibilitando de forma concreta e robusta a sedimentação de tais valores por meio de uma vivência em conjunto por seus associados, ao tomarem decisões por si mesmos, interagindo e contribuindo para o desenvolvimento da comunidade em que vivem.

Enfim, tais corporações são interessantes tanto para a economia de uma sociedade, promovendo uma independência dos trabalhadores e diminuindo a desigualdade social, bem como são benéficas às pessoas humanamente consideradas. Portanto, deve o governo dar ampla atenção e defesa ao cooperativismo.

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Sobre o autor
Guilherme Nunes

Advogado. Pós-graduado em Direito Processual Civil. Bacharel em Direito pela Universidade Estadual da Bahia – UNEB – Campus VIII – Paulo Afonso.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Artigo cientifico elaborado como requisito parcial de avaliação da disciplina de Direito do Trabalho II, do IV período do curso de Direito – UNEB – Paulo Afonso – BA (professora Joelma Bomfim). Premiado e citado em vários julgados e discussões acadêmicas: forumjuridico.org/threads/3-concurso-forum-juridico-de-artigos-cientificos.13461/ ltr.com.br/congressos/jornal/direito/jornal_direito.pdf jusbrasil.com.br/diarios/48864903/trt-17-08-08-2012-pg-282 ou https://trt-10.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24386606/recurso-ordinario-ro-887201101010000-df-00887-2011-010-10-00-0-ro-trt-10/inteiro-teor-24386607

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