RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo analisar os aspectos jurídicos da convalidação dos atos administrativos, quando praticados com vícios sanáveis. Abordar-se-ão as hipóteses em que a correção desses atos é possível, bem como aquelas em que não existe respaldo jurídico para sua manutenção.
PALAVRAS-CHAVE: Atos administrativos. Vícios. Convalidação. Anulação.
INTRODUÇÃO
Quando a Administração Pública pratica, por meio de seus agentes, atos administrativos viciados, há dois caminhos a serem seguidos em busca da boa prática administrativa: a convalidação, com o aproveitamento dos atos que contenham vícios superáveis, e correção dos seus defeitos; ou a anulação, situação em que a convalidação não será possível.
A convalidação, conforme se verá no presente texto busca materializar os princípios da legalidade, da segurança jurídica, da boa-fé das relações com os administrados, bem como da presunção de validade e legitimidade dos atos administrativos, fazendo-se a ponderação entre eles, quando necessário.
Nesse contexto, haverá hipóteses em que a anulação de um ato administrativo ferirá muito mais o interesse público que a sua manutenção. Cite-se, como exemplo, aquele ato cujo vício foi constatado muito tempo depois pela Administração, em momento em que a situação de fato e de direito já estava consolidada. A invalidação desse ato muito tempo depois de sua prática pode gerar uma insegurança na ordem jurídica muito maior que a sustentação dos seus efeitos.
Portanto, nesse artigo serão tratadas essas e outras questões, com o objetivo de esclarecer alguns pontos atinentes ao tema da convalidação dos atos administrativos.
1 CONVALIDAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
A convalidação é instituto previsto no art. 55 da Lei nº 9.784, de 1999 (Lei do Processo Administrativo – LPA), que assim preconiza, verbis:
Art. 55. Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria Administração.
De acordo com esse dispositivo, os atos administrativos emanados com vícios sanáveis estão sujeitos à convalidação. E esse instituto pode ser conceituado como “o processo de que se vale a Administração para aproveitar atos administrativos com vícios superáveis, de forma a confirmá-los no todo ou em parte”[1], com efeitos retroativos à data em que foi praticado o ato originário.
É o procedimento no qual a Administração emana um novo ato, com efeitos ex tunc, corrigindo um anterior praticado com defeito. A contrario sensu, se um ato não puder ser reproduzido validamente na atualidade, será “inconvalidável”[2]. Nesse sentido, confira-se o magistério de Celso Antônio Bandeira de Mello, verbis:
“A convalidação é o suprimento da invalidade de um ato com efeitos retroativos. Este suprimento pode derivar de um ato da Administração ou de um ato do particular afetado pelo provimento viciado.
Quando promana da Administração, esta corrige o defeito do primeiro ato mediante um segundo ato, o qual produz de forma consonante com o Direito aquilo que dantes fora efetuado de modo dissonante com o Direito. Mas com uma particularidade: seu alcance específico consiste precisamente em ter efeito retroativo. O ato convalidador remete-se ao ato inválido para legitimar seus efeitos pretéritos. A providência corretamente tomada no presente tem o condão de valer para o passado.”[3]
Importa agora saber quais são os defeitos sanáveis e, portanto, convalidáveis. Segundo a doutrina, os atos que possuam vícios de competência, de forma e de procedimento são, em regra, passíveis de convalidação[4]; ao passo que os defeitos insanáveis, aqueles que impedem o aproveitamento do ato, são os que apresentam imperfeições relativas ao motivo, à finalidade e ao objeto[5]. Portanto, se o ato estiver caracterizado por um vício insanável, não poderá ser convalidado.
Essa conduta da Administração, em aproveitar os atos já praticados, mas com vícios superáveis, prima pela economicidade que deve reger a prática administrativa, bem como o equilíbrio entre os princípios da legalidade, da segurança jurídica e da presunção de validade e legitimidade dos atos administrativos.
Um ato praticado pela Administração acometido de qualquer vício, sanável ou não, fere o princípio da legalidade. E as formas de a legalidade ser restaurada são pela invalidação ou convalidação. Sempre que o ato puder ser convalidado, esse procedimento se tornará obrigatório[6], salvo na hipótese de vício de competência em ato de conteúdo discricionário, como se abordará mais adiante.
O mesmo se dará no caso de a convalidação não ser possível, situação em que a Administração terá o dever de invalidar o ato, a fim de a legalidade da atuação do Poder Público ser restabelecida.
Vejamos as lições de Weida Zancaner sobre o tema, verbis:
“Em tese, poder-se-ia supor que o princípio da legalidade imporia sempre à Administração o dever de invalidar seus atos eivados de vícios, para restaurar a ordem jurídica por ela mesma ferida. A suposição, todavia, não procede, pois a restauração da ordem jurídica tanto se faz pela fulminação de um ato viciado quanto pela correção de seu vício. Em uma e outra hipóteses a legalidade se recompõe.
O princípio da legalidade visa a que a ordem jurídica seja restaurada, mas não estabelece que a ordem jurídica deva ser restaurada pela extinção do ato inválido.
Há duas formas de recompor a ordem jurídica violada em razão dos atos inválidos, quais sejam: a invalidação e a convalidação.
(...)
A Administração deve invalidar quando o ato não comportar convalidação. Deve convalidar sempre que o ato comportá-la.”[7]
Assim, pode-se concluir que a convalidação, quando presentes os pressupostos para o refazimento do ato praticado com ilegalidade, é atividade vinculada, não podendo se eximir o administrador desse dever. Ademais, é necessário manifestação expressa da Administração, não sendo possível convalidação tácita, ou mesmo, por decurso de tempo.
De acordo com essa tese são os ensinamentos de Juarez Freitas, que seguem, verbis:
“Melhor teria andado, no ponto, se tivesse reconhecido que situações há em que o dever de convalidar se apresenta superior ao de anular. É que não se admite o ato discricionário puro. Dessa maneira, presentes os pressupostos de incidência, como reconhece a melhor doutrina, a convalidação revela-se imperativa. Poder-se-á considera-la até, sob certo aspecto, ato vinculado, mas não é disso que se trata. Tem-se propriamente uma discricionariedade objetivamente vinculada ao sistema.” (Grifos no original).[8]
Nessa linha de entendimento, colaciona-se a seguir aresto do Superior Tribunal de Justiça, verbis:
“I - "Se não se nega à Administração a faculdade de anular seus próprios atos, não se há de fazer disso, o reino do arbítrio." (STF – RE 108.182/Min. Oscar Corrêa).
II - "A regra enunciada no verbete nº 473 da Súmula do STF deve ser entendida com algum temperamento: no atual estágio do direito brasileiro, a Administração pode declarar a nulidade de seus próprios atos, desde que, além de ilegais, eles tenham causado lesão ao Estado, sejam insuscetíveis de convalidação e não tenham servido de fundamento a ato posterior praticado em outro plano de competência. (STJ – RMS 407/Humberto).
III - A desconstituição de licitação pressupõe a instauração de contraditório, em que se assegure ampla defesa aos interessados. Esta é a regra proclamada pelo Art. 49, § 3º da Lei 8.666/93.
IV – A declaração unilateral de licitação, sem assegurar ampla defesa aos interessados ofende o Art. 49, § 3º da Lei 8.666/93.” (Grifo nosso).
(RESP 300116. Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, Primeira Turma, DJ de 25.2.2002, p. 222).
A doutrina, no entanto, ressalva a hipótese em que o ato tenha sido praticado com má-fé, situação em que a convalidação não será possível. Vejamos, nesse sentido, as lições de Juarez Freitas, verbis:
“Há, porém, uma ressalva de pronunciada importância: a má-fé – não importa qual a extensão do lapso de tempo – jamais convalida. A doutrina, com força idêntica, proclama a proteção convalidatória em homenagem à boa-fé e profliga a manutenção de situações jurídicas forjadas pela malícia ou pela astúcia esquiva. Numa frase: no direito administrativo da motivação consistente, a má-fé constitui vício insanável. A propósito, esse é o testemunho de Hartmut Mauer, ao pôr em realce que o caminho da convalidação deve ser interditado (a) quando o beneficiário da situação jurídica a provocou por malícia (= má-fé) e por meio desleal ou (b) quando conhecia a ilegalidade ou deveria, necessariamente, conhecê-la ou, ainda, (c) quando ele é o responsável direto pela ilegalidade cometida, notadamente quando pratica algum tipo de falsidade.”[9]
Todavia, concernentemente ao ato realizado com vício de competência, a obrigatoriedade de sua convalidação é relativa. Se ele for vinculado, e forem constatados os requisitos legais para a realização do ato, não há o que se discutir, deve ser convalidado, pois o agente competente, diante da mesma situação, não pode tomar outra decisão senão aquela determinada pelo ato normativo aplicável. Por outro enfoque, se os requisitos legais não se verificarem, o ato deve ser anulado.
Diferentemente ocorre quando o ato praticado por agente incompetente é discricionário. Aqui, a autoridade competente não pode ser compelida a concordar com o mesmo juízo de valor perpetrado pela autoridade incompetente[10]. Nada impede, porém, ao concordar com a avaliação feita, de convalidar o ato. Entretanto, estará em sua esfera de atribuições a decisão sobre a medida correta a ser adotada no caso concreto.
Nesse sentido, confiram-se os ensinamentos da Prof.ª Di Pietro, verbis:
“Tratando-se de ato vinculado praticado por autoridade incompetente, a autoridade competente não poderá deixar de convalidá-lo, se estiverem presentes os requisitos para a prática do ato; a convalidação é obrigatória, para dar validade aos efeitos já produzidos; se os requisitos legais não estiverem presentes, ela deverá necessariamente anular o ato. Se o ato praticado por autoridade incompetente é discricionário e, portanto, admite apreciação subjetiva quanto aos aspectos de mérito, não pode a autoridade competente ser obrigada a convalidá-lo, porque não é obrigada a aceitar a mesma avaliação subjetiva feita pela autoridade incompetente; nesse caso, ela poderá convalidar ou não, dependendo de sua própria apreciação discricionária.”[11]
E, também, de Weida Zancaner, verbis:
“Entretanto, como para nós a convalidação é um dever, e não mera faculdade, impende mais uma vez esclarecer que o dever de convalidar nos casos de vício de competência só se impõe nos atos emanados em decorrência de atividades vinculadas.
(...)
É claro que nada obsta a que o agente competente convalide, quando possível, ato discricionário exarado por agente incompetente; mas inexiste a obrigatoriedade de fazê-lo, por ser apenas ele o sujeito competente e titulado pelo Direito para dar concreção, mediante seu juízo subjetivo, ao disposto na hipótese ou no mandamento de uma norma jurídica que enseja discrição.”[12]
Ao decidir pela convalidação ou anulação, o administrador deve verificar, também, os princípios da segurança jurídica e da presunção de validade e legitimidade dos atos administrativos. O ato praticado com vício produziu efeitos jurídicos e, até a constatação do defeito, mantinha intacta a presunção de validade e legitimidade. Assim, a anulação de um ato muito tempo depois de sua prolação produz insegurança na ordem jurídica[13].
Nesse cenário está um dos fatores que demonstram a importância da convalidação, pois ela busca, além do restabelecimento do princípio da legalidade, a estabilidade das relações constituídas.
De acordo com esse posicionamento é o entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello, verbis:
“As asserções feitas estribam-se nos seguintes fundamentos. Dado o princípio da legalidade, fundamentalíssimo para o Direito Administrativo, a Administração não pode conviver com relações jurídicas formadas ilicitamente. Donde, é dever seu recompor a legalidade ferida. Ora, tanto se recompõe a legalidade fulminando um ato viciado, quanto convalidando-o. É de notar que esta última providência tem, ainda, em seu abono o princípio da segurança jurídica, cujo relevo é desnecessário encarecer. A decadência e a prescrição demonstram a importância que o Direito lhe atribui. Acresce que também o princípio da boa-fé – sobreposse ante atos administrativos, já que gozam de presunção de legitimidade – concorre em prol da convalidação, para evitar gravames ao administrado de boa-fé.”[14]
E, por isso, o princípio da legalidade não pode ser seguido de maneira tão rigorosa e formalista. Outros princípios também estão em jogo e devem ser sopesados a fim de o interesse público ser legitimamente seguido. Ou seja, a declaração de invalidade de um ato jurídico pode ser muito mais prejudicial à ordem jurídica que a sua manutenção, mas com correção de seus defeitos. Por oportuno, segue ensinamento de Seabra Fagundes, verbis:
“Se a invalidez do ato jurídico, como sanção à infringência à lei, importa conseqüências mais nocivas que as decorrentes de sua validade, é o caso de deixá-lo subsistir.”[15]
E nessa mesma linha segue a jurisprudência pátria. Confiram-se:
“DIREITO ADMINISTRATIVO. CONVALIDAÇÃO DE VÍCIO DE COMPETÊNCIA EM PROCESSO LICITATÓRIO.
Não deve ser reconhecida a nulidade em processo licitatório na hipótese em que, a despeito de recurso administrativo ter sido julgado por autoridade incompetente, tenha havido a posterior homologação de todo o certame pela autoridade competente. Isso porque o julgamento de recurso por autoridade incompetente não é, por si só, bastante para acarretar a nulidade do ato e dos demais subsequentes, tendo em vista o saneamento da irregularidade por meio da homologação do procedimento licitatório pela autoridade competente. Com efeito, o ato de homologação supõe prévia e detalhada análise de todo o procedimento, atestando a legalidade dos atos praticados, bem como a conveniência de ser mantida a licitação. Ademais, o vício relativo ao sujeito — competência — pode ser convalidado pela autoridade superior quando não se tratar de competência exclusiva.”
(REsp 1.348.472-RS, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 21.5.2013).
“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ISONOMIA SALARIAL CONCEDIDA PELO PODER PÚBLICO COM BASE EM PARECER DA PROCURADORIA-GERAL DO ESTADO DO ACRE. VERBA DE REPRESENTAÇÃO CONFERIDA AOS PERITOS CRIMINAIS DESDE 1993. SUPRESSÃO POR AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PREPONDERÂNCIA DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA RAZOABILIDADE. CONVALIDAÇÃO DOS EFEITOS JURÍDICOS. INTERREGNO DE MAIS DE DEZ ANOS. REDUTIBILIDADE SIGNIFICATIVA DOS PROVENTOS. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1. O poder-dever da Administração de invalidar seus próprios atos encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, pela evidente razão de que os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade originada do poder de autotutela do Estado, e na convalidação dos efeitos produzidos, quando, em razão de suas conseqüências jurídicas, a manutenção do ato atenderá mais ao interesse público do que sua invalidação.
2. A infringência à legalidade por um ato administrativo, sob o ponto de vista abstrato, sempre será prejudicial ao interesse público; por outro lado, quando analisada em face das circunstâncias do caso concreto, nem sempre a sua anulação será a melhor solução. Em face da dinâmica das relações jurídicas sociais, haverá casos em que o próprio interesse da coletividade será melhor atendido com a subsistência do ato nascido de forma irregular.
3. O poder da Administração, destarte, não é absoluto, na seara da invalidação de seus atos, de forma que a recomposição da ordem jurídica violada está condicionada primordialmente ao interesse público. O decurso do tempo ou a convalidação dos efeitos jurídicos, em certos casos, é capaz de tornar a anulação de um ato ilegal claramente prejudicial ao interesse público, finalidade precípua da atividade exercida pela Administração.
4. O art. 54 da Lei 9.784/99, aplicável analogicamente ao presente caso, funda-se na importância da segurança jurídica no domínio do Direito Público, estipulando o prazo decadencial de 5 anos para a revisão dos atos administrativos viciosos (sejam eles nulos ou anuláveis) e permitindo, a contrario sensu, a manutenção da eficácia dos mesmos, após o transcurso do interregno mínimo quinquenal, mediante a convalidação ex ope temporis, que tem aplicação excepcional a situações típicas e extremas, assim consideradas aquelas em que avulta grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento de responsabilidade pelo ato eivado de vício.
5. A efetivação do ato que reconheceu a isonomia salarial entre as carreiras de Perito Legal e Delegado de Polícia do Estado do Acre, com base apenas em parecer da Procuradoria-Geral do Estado, e o transcurso de mais de 5 anos, por inusitado que se mostre, consolidou uma situação fática para a qual não se pode fechar os olhos, vez que produziu conseqüências jurídicas inarredáveis. Precedente do Pretório Excelso.
6. Recurso Ordinário provido, para cassar o ato que suprimiu a verba de representação percebida pelos recorrentes.” (Grifo nosso).
(STJ, ROMS 24430. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta Turma, DJE de 30.3.2009).
“TRIBUTÁRIO. TERMO DE INFRAÇÃO NO TRÂNSITO. INCOMPETÊNCIA DO AGENTE. VÍCIO SANÁVEL DO AUTO DE INFRAÇÃO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO PELO PODER JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. ANÁLISE DE DIREITO LOCAL. SÚMULA Nº 280 DO STF. JUROS DE MORA. APRECIAÇÃO PREJUDICADA.
(...)
II - A doutrina moderna do direito administrativo tem admitido, mutatis mutandis, a aplicação das regras sobre nulidade dos atos jurídicos do direito privado nas relações de direito público, definindo os atos inválidos em nulos e anuláveis, a depender do grau de irregularidade. No caso da primeira espécie (nulos), o ato é insanável, não permitindo convalidação, podendo o vício ser reconhecido de ofício pelo Juiz. Quanto aos atos anuláveis, admite-se a convalidação, sendo possível o reconhecimento da invalidade apenas por provocação do interessado.
III - Na hipótese dos autos, de ato expedido por sujeito incompetente, a doutrina classifica como ato anulável, permitindo sua convalidação, que é o suprimento da invalidade do ato com efeitos retroativos, de sorte que o Tribunal de origem não poderia ter reconhecido de ofício a sua invalidade.
IV - Segundo o magistério de José dos Santos Carvalho Filho: "Nem todos os vícios do ato permitem seja este convalidado. Os vícios insanáveis impedem o aproveitamento do ato, ao passo que os vícios sanáveis possibilitam a convalidação. São convalidáveis os atos que tenham vício de competência e de forma, nesta incluindo-se os aspectos formais dos procedimentos administrativos".
V - Tendo o Tribunal estadual reconhecido, de ofício, vício que deveria ter sido argüido pela parte interessada, merece ser anulado o julgado recorrido, afastando-se a invalidação decretada. Os autos devem retornar àquela Corte, para que prossiga o julgamento da apelação interposta pela ora recorrida.
(...)
VII - Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.” (Grifo nosso).
(STJ, RESP 850270. Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 31.5.2007, p. 378).
“ADMINISTRATIVO. CELEBRAÇÃO DE CONVÊNIO ENTRE O PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM FILOSOFIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO – UFRJ E A FACULDADE DE FILOSOCIA DE CAMPOS. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO DAS REGRAS DE COMPETÊNCIA E PROCEDIMENTO. CONVALIDAÇÃO EM HOMENAGEM AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE, FINALIDADE E SEGURANÇA JURÍDICA.
1-) Mandado de segurança impetrado com vistas à anulação do ato da Reitora em exercício que declarou a inexistência do Convênio celebrado entre o Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Faculdade de Filosofia de Campos.
2-) A despeito da constatação de que o ato impugnado violou regra de competência e regra de procedimento, restou consignado pelo Procurador-Geral da Universidade que tais violações não conduziriam inexoravelmente à invalidação do Curso de Mestrado em Filosofia, podendo verificar-se a convalidação.
3-) Desconsiderado, outrossim, o fato de que o ato estaria produzindo efeitos e, tendo gerado reflexos benéficos para terceiros (os alunos e a própria Faculdade de Filosofia de Campos), só poderia ser desconstituído mediante processo em que assegurada a garantia do contraditório e da ampla defesa (Constituição da República, art. 5º, LV).
4-) Convalidação do ato em homenagem aos princípios da proporcionalidade, razoabilidade, da finalidade, da segurança jurídica, dentre outros, que devem permear a atividade administrativa.
5-) Aplicação à hipótese, outrossim, da regra estatuída no artigo 55 da lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, litteris: “Art. 55 – Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a terceiros os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria administração.”
6-) Apelação provida.” (Grifo nosso).
(TRF/2ª Região, AMS 2005.51.01.025137-2. Rel. Des. Federal Antônio Cruz Netto, Quinta Turma Especializada, DJU de 27.11.2008, p. 152).
Pode-se, assim, concluir que, desde que presentes os requisitos legais, convalidar um ato administrativo contaminado por um vício passível de correção será a concretização do princípio da segurança jurídica, em busca da materialização do princípio da legalidade.
Por fim, um último aspecto que também merece ser analisado diz respeito ao prazo disponível à Administração Pública para convalidar o ato administrativo viciado.
Confira-se, pois, o que prescreve o artigo 54 da Lei do Processo Administrativo Federal, verbis:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
De acordo com esse dispositivo, a Administração pode anular os atos administrativos, isto é, aqueles que contenham vícios de legalidade, e dos quais decorram efeitos favoráveis para os destinatários, em até 5 (cinco) anos da data em que foram praticados. Somente após esse prazo ocorrerá a preclusão administrativa, aquela que impede a própria Administração de anular um ato produzido por ela.
No entanto, relativamente à convalidação, a lei não fala em qualquer prazo. Porém, há entendimento de que o decurso do tempo é hábil a gerar a estabilidade do ato, tornando desnecessária a convalidação[16].
Outra linha também que pode ser adotada é a de que, se para a anulação do ato, o prazo para a Administração é de 5 (cinco) anos, com muito mais razão que o prazo para ela convalidar ato praticado anteriormente, mas com vício sanável, seja, também, de 5 (cinco) anos.