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Medidas protetivas no âmbito da Lei Maria da Penha e sua real eficácia na atualiadade

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17/08/2014 às 09:28
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3. AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

3.1. Aspectos gerais

Como visto nos capítulos anteriores, a criação da LMP foi, sem dúvidas, um marco histórico para o Brasil. A violência doméstica contra a mulher passou a ser crime, sendo tratada com maior atenção e respeito. Durante anos o assunto foi levado com imenso descaso pelas autoridades.

A sociedade brasileira sempre foi marcada pela dominância do homem perante a mulher, que se mantinha submissa, cuidando do lar e dos filhos, papel este que tal mulher acreditava ser naturalmente seu. Por diversas vezes violentadas, ficavam com medo, caladas, atormentadas, e, por serem dependentes economicamente de seus agressores, acabavam se tornando vítimas diárias da violência doméstica. As poucas que pediam recorriam a polícia e a justiça não logravam êxito, já que não se dava a devida atenção aos casos.

Com o advento da LMP, que trata da violência doméstica e familiar contra a mulher, a situação mudou para melhor. A Lei 11.340/2006, sancionada em 7 de agosto de 2006, ganhou o nome de Maria da Penha em homenagem à ilustre guerreira cearense Maria da Penha Maia, biofarmacêutica, que, após se casar com Marco Antônio Heredia Viveiros, viu sua vida se tornar um verdadeiro inferno. Maria sofreu muito e ficou tetraplégica em decorrência da maldade e crueldade de seu então marido. Porém, sempre se manteve viva, lúcida, forte e com sede de justiça. Lutou por cerca de vinte anos para ver a punição e condenação de seu agressor.

Indubitavelmente Maria não foi a única mulher a sofrer este tipo de violência, milhões sofreram e sofrem, mas sim, ela foi mais adiante e não se calou, não se deixou abater diante da lentidão da justiça brasileira, procurou ajuda internacional para pressionar nosso país a tomar providências e merecidamente teve resposta positiva.

Outro fato relevante que ajudou na criação da LMP foram os altíssimos índices de violência doméstica e familiar no Brasil, de acordo com o Relatório Nacional Brasileiro uma mulher é agredida a cada quinze segundos:

Quinze segundos é um período de tempo muito curto. Basta contar até 15 e pronto: já se passaram 15 segundos. Parece ser um lapso de tempo tão insignificante, durante o qual nada acontece, tanto que o período de 24 horas contém 5.760 vezes a fração 15 segundos. Talvez só fazendo essa singela operação aritmética é que se possa visualizar o quanto chocante é o dado que consta do Relatório Nacional Brasileiro, que retrata o perfil da mulher brasileira: a cada 15 segundos uma mulher é agredida, isto é, a cada dia 5.760 mulheres são espancadas no Brasil (DIAS, 2010, online).

A criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e as medidas protetivas de urgência foram as principais inovações trazidas pela LMP (BIANCHINI, 2008, p. 164). Sabe-se da importância dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, mas para fins deste estudo serão abordadas com amplitude apenas as medidas protetivas de urgência, foco deste trabalho científico.

Ao implantar uma nova Lei deve-se pensar na sua eficácia. Todos os meios possíveis e necessários devem ser colocados a disposição para que essa legislação seja cumprida. Não faz sentido criar uma lei para não ser cumprida. Mecanismos e articulações devem ser estabelecidos para garantir o cumprimento da norma regulamentadora. As medidas protetivas de urgência foram estabelecidas para garantir que a LMP fosse eficaz e protegesse realmente a vítima.

Alice Bianchini (2013, p. 165) destaca as principais características das medidas protetivas de urgência:

  • · Caráter primordial de urgência, devendo o juiz decidir em até 48 horas acerca das medidas aplicáveis (art. 18);

  • · A ofendida, o delegado e o Ministério Público podem requerer as medidas protetivas de urgência (art. 19);

  • · O juiz pode decretá-las de ofício (art. 20);

  • · Não há necessidade de manifestação prévia do Ministério Público, nem de audiência das partes, para a concessão das medidas (art. 19, §1º);

  • · As medidas podem ser aplicadas cumulativa ou isoladamente (art. 19, §2º);

  • · Pode haver a substituição de uma medida por outra, de acordo com o caso, sendo necessária que seja mais ou menos drástica, podendo essa mudança ocorrer a qualquer tempo, desde que sua eficácia não seja afetada (art. 19, §2º);

  • · As medidas protetivas de urgência se dividem em duas espécies: as que obrigam o agressor (art. 22) e as dirigidas à proteção da vítima e seus dependentes (arts. 23. e 24).

Como visto, as medidas protetivas de urgência são medidas cautelares de primordial relevância que visam garantir a segurança da mulher vítima de violência e de seus familiares após o registro da denúncia na delegacia. Elas possuem caráter preventivo e punitivo, e estão elencadas na LMP do art. 18. ao art. 24, e serão analisadas detalhadamente no próximo tópico, dividindo-se em medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor e medidas dirigidas à ofendida.

3.2. Espécies de medidas protetivas de urgência

3.2.1. Medidas que obrigam o agressor
3.2.1.1. Suspensão da Posse ou restrição do porte de armas

O art. 22, I, da LMP, regula a possibilidade de desarmamento do agressor:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;

Esta medida protetiva faz referência ao Estatuto do Desarmamento, a Lei 10.826/2003. Através dela o agressor terá a posse suspensa ou será restrito de portar a arma. Aplica-se esta medida nos casos em que o agressor possui a posse legal e regular de arma registrada (HERMANN, 2008, p. 184).

Sobre o tema, Dias declara:

Já que se está falando em violência, sendo esta denunciada à polícia, a primeira providência é desarmar quem faz o uso de arma de fogo. Trata-se de medida que se mostra francamente preocupada com a incolumidade física da mulher. Admite a Lei que o juiz suspenda a posse ou restrinja o porte de arma de fogo (art.22, I). Conforme o Estatuto do Desarmamento, tanto possuir como usar arma de fogo é proibido. Para se ter a posso de uma arma, ainda que no interior da casa, é necessário o respectivo registro, que é levado a efeito junto à Polícia Federal (2008, p. 82).

Caso o agressor possua a posse regular da arma, bem como autorização para usá-la, a suspensão ou restrição só pode ser feita em detrimento do requerimento da ofendida visando assegurar sua vida. Se o porte da arma ou seu uso forem irregulares, ilegais, caberá à autoridade policial tomar as devidas atitudes contra o infrator. Sendo deferido o pedido da vítima, deverá ser comunicada a decisão ao Sistema Nacional de Armas (SINARM) e a Polícia Federal (DIAS, 2008, p. 82).

3.2.1.2. Afastamento do Lar

É de se entender que a mulher, ao procurar a polícia e fazer a denúncia, esteja completamente abalada de todas as formas e o que menos ela deseja é estar no mesmo ambiente que seu agressor.

Buscando proteger a mulher agredida do violentador, o legislador estabeleceu um tipo de medida protetiva de urgência que obriga o agressor a se afastar da vítima e do lar, in verbis:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

Alice Bianchini analisa que o afastamento imediato do agressor objetiva garantir a integridade física e psicológica da vítima:

O afastamento do agressor do lar visa preservar a saúde física e psicológica da mulher, diminuindo o risco iminente de agressão (física e psicológica), já que o agressor não mais estará dentro da própria casa que reside a vítima. O patrimônio da ofendida também é preservado, uma vez que os objetos do lar não poderão ser subtraídos ou destruídos (BELLO-QUE, 2011, p. 311, apud BIANCHINI, 2013, p. 166).

A autora ainda afirma ainda sobre o tema que:

A retirada do agressor do interior do lar, ou a proibição de que lá adentre, além de auxiliar no combate e na prevenção da violência doméstica, pode encurtar a distância entre a vítima e a Justiça. O risco de que a agressão seja potencializada após a denúncia diminui quando se providencia para que o agressor deixe a residência em comum ou fique sem acesso franqueado a ela (BIANCHINI, 2013, p. 167).

Maria Berenice explica que para cessar a violência tanto a mulher ofendida como o homem agressor podem se retirar do domicílio ou do local de convivência, isso será feito de acordo com a necessidade de cada caso concreto:

Para garantir o fim da violência é possível a saída de qualquer deles da residência comum. Determinado o afastamento do ofensor do domicílio ou do local de convivência com a ofendida (art. 22, II), ela e seus dependentes podem ser reconduzidos ao lar (art.23, II). Também pode ser autorizada a saída da mulher da residência comum, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda de filhos e alimentos (art.23, III). A previsão justifica-se. Sendo casados os envolvidos, o afastamento com a chancela judicial, não caracteriza abandono de lar, a servir de fundamento para eventual ação de separação. Em qualquer das hipóteses, trata-se de decreto de separação de corpos (art.23, IV) decorrente de crime e não de outras questões de natureza exclusivamente civil (NUCCI, 2006, p. 879, apud DIAS, 2008, p. 84).

Esta medida protetiva é de total importância, assegurando maior conforto, proteção e tranquilidade e menor humilhação para a mulher vitimada, pois seu agressor não estará mais convivendo com ela sobre o mesmo domicílio, evitando assim que novas ameaças e agressões voltem a ser praticadas contra sua integridade mental e corporal (BIANCHINI, 2013, p. 166).

3.2.1.3. Proibição de aproximação

De acordo com o art. 22, inciso III, alínea a, o juiz pode proibir o agressor de se aproximar da vítima, de seus familiares e de testemunhas, fixando a distância mínima entre o estese o violentador, in verbis:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

Esta medida tem comum objetivo com a medida que afasta o agressor do lar. Ao ficar proibido de se aproximar da vítima, de seus parentes e das testemunhas, o agressor fica, em tese, incapacitado de agir contra qualquer um destes. O legislador buscou proteger a incolumidade física e psíquica da mulher agredida (BIANCHINI, 2013, p. 168).

Sobre a referida medida protetiva, Maria Berenice Dias destaca:

Outra forma de impedir o contato entre agressor e ofendida, seus familiares e testemunhas é fixar limite mínimo de distância de aproximação (art. 22,III, a). Para isso o juiz tem a faculdade de fixar, em metros, a distância a ser mantida pelo agressor da casa, do trabalho da vítima e do colégio dos filhos (DIAS, 2008, p. 85).

Alice Bianchini destaca um caso conhecido nacionalmente em que esta medida protetiva foi aplicada:

Esta medida protetiva ganhou notoriedade e divulgação nos meios de comunicação ao ser utilizada em conflito doméstico ocorrido entre os atores Dado Dolabella e Luana Piovani: em 2011, Dado foi condenado por ter agredido em 2008 a então Luana Piovani, quando o juiz determinou que o ator mantivesse distância mínima de 250 metros dela (BIANCHINI, 2013, p. 168).

Para entender melhor o caso é de grande relevância que se mostre os fatos. Segundo relatos da polícia e da imprensa, a briga entre os atores ocorreu em uma boate, no dia 22 de outubro de 2008, no Rio de Janeiro. As celebridades começaram a se desentender e houve uma briga. Luana caiu no chão e alegou que o ator Dado a agrediu com um tapa. Ainda, segundo a atriz, sua camareira também foi agredida, tendo machucado os punhos, ao tentar apartar a briga dos dois. Luana e sua camareira prestaram queixa contra Dado no dia seguinte e fizeram exame de corpo de delito. O motivo da briga teria sido ciúmes (BARBOSA, 2013, online).

Ao ter acesso as imagens das câmeras de segurança do estabelecimento, foi comprovado que realmente o ator havia empurrado Luana e sua camareira. O resultado do exame de corpo de delito feito por Luana também confirmou agressão. Em novembro do mesmo ano, o ator Dado Dolabella foi indiciado pelas agressões, por lesão corporal leve, tendo sido enquadrado na LMP (BARBOSA, 2013, online).

No ano seguinte, o ator é preso por descumprir a decisão judicial que determinava seu afastamento de Luana por no mínimo 250 metros. No entanto, em 2012, a justiça decidiu livrar o ator da acusação de ter desobedecido a ordem judicial de afastamento da atriz. O caso se arrasta no Judiciário carioca desde 2008 (BARBOSA, 2013, online).

Este caso gerou o conhecimento nacional do que seria a medida protetiva que proíbe o agressor de aproximação da vítima, mas também trouxe grande alvoroço, pois muito se discutiu acerca da intenção do ator em estar nos mesmos lugares em que Luana frequentava. O limite de 250 metros estabelecido pelo juiz também gerou discussão (BIANCHINI, 2013, p. 168).

3.2.1.4. Proibição de contato

Segundo art. 22, inciso III, alínea b, o agressor fica proibido de comunicar-se por qualquer meio com a vítima, seus parentes e as testemunhas:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

Para Alice Bianchini esta proibição “Atinge qualquer meio de comunicação, seja pessoal, direto, telefônico, mensagens eletrônicas, mensagens de bate-papo, etc” (BIACHINI, 2013, p. 168).

Completando sua linha de pensamento Alice destaca a intenção de garantir a integridade psíquica da ofendida, evitando novas ameaças com as possíveis tentativas de contato do agressor:

No mesmo sentido da medida de proibição de aproximação, a proibição de contato visa resguardar especialmente a integridade psíquica da mulher em situação de violência. O propósito é evitar que o agressor persiga a vítima, seus familiares e as testemunhas da causa penal, situação que evidentemente prejudica a colheita da prova na causa penal e gera grave risco às pessoas que dela participam ou que tem relação familiar com a ofendida (BELLOQUE, 2011, p. 312, apud BIANCHINI, 2013, p. 169).

A proibição de contato, ao impedir a interação do agressor com a ofendida, seus parentes e testemunhas, por quaisquer meios de comunicação, mostra-se como uma restrição extremamente fundamental e benéfica, pois gera a paz e tranquilidade mental da vítima (DIAS, 2008, p. 85).

3.2.1.5. Proibição de frequentar determinados lugares

Trata-se de mais uma medida protetiva para evitar o encontro da vítima e de seus familiares com o agressor. Os locais que são geralmente frequentados pela vítima e seus parentes devem ser proibidos para o agressor, buscando evitar confrontos, confusões, constrangimentos e escândalos públicos (BIACHINI, 2013, p. 169).

Esta medida protetiva esta prevista no art. 22, III, c:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: III - proibição de determinadas condutas, entre as quais: c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

Esta medida protetiva, além de proteger a vítima e garantir que sua vida continue com normalidade, visa garantir a harmonia social e dos estabelecimentos, impedindo desgastes públicos. Juliana Garcia Belloque afirma que nesse caso “a Lei Maria da Penha buscou proteger os espaços públicos nos quais a mulher vítima de violência desenvolve sua individualidade” (BELLOQUE, 2011, p. 312, apud, BIANCHINI, 2013, p. 169).

É de fundamental importância que a vítima aponte os locais que visita com frequência para que o agressor seja impedido de transitar em ambientes comuns aos da mulher agredida. O agressor certamente sabe quais são os lugares mais frequentados pela mulher e caso não seja banido destes locais ele irá aparecer neles e causará transtornos e confusão.

3.2.1.6. Restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores

Esta medida está garantida no art. 22, IV, in verbis:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

Além das outras medidas, o agressor também pode sofrer a restrição ou suspensão do direito de visitar seus filhos, tendo em vista o risco que os dependentes menores podem correr ao estarem lado a lado com o agressor de sua genitora.

Geralmente a medida protetiva de restrição ou suspensão de visitas vem junto com a proibição de frequentar os ambientes de convivência dos filhos (BIANCHINI, 2013, p. 169).

O artigo dispõe que a equipe de atendimento multidisciplinar deve ser ouvida, porém o juiz pode adotar esta medida mesmo que não tenha acesso de pronto ao parecer técnico e a oitiva da equipe. O magistrado não fica vinculado ao parecer técnico da equipe, ou seja, ele pode aplicar a medida de restrição ou suspensão de visitas nos casos em que julgar necessário, analisando se, além da mãe, os filhos também correm risco de ter sua integridade física e psicológica, abaladas (BIANCHINI, 2013, p. 169).

Alice Bianchini fala das possibilidades da concessão de visitas aos menores: “Em situações muito especiais, o juiz pode determinar que as visitas ocorram de forma supervisionada por especialistas e/ou em ambientes terapêuticos de forma a preservar a integridade da vítima sem afetar a convivência do agressor com os filhos” (DIAS, 2007, p. 86, apud BIANCHINI, 2013, p. 169).

Em concordância com Bianchini, Maria Berenice Dias afirma:

Flagrada a possibilidade de a segurança da vítima ser ameaçada, também pode o juiz suspender ou restringir as visitas do agressor aos filhos (art. 22, IV). A recomendação para que seja ouvida equipe de atendimento multidisciplinar bem revela a preocupação em preservar o vínculo de convivência entre pais e filhos. No entanto, já que se está em sede de violência doméstica, havendo risco à integridade quer da ofendida, quer dos filhos, é impositivo que a suspensão das visitas seja deferida em sede liminar. Não é necessário que o parecer técnico anteceda a decisão judicial (DIAS, 2008, p. 85).

O bem mais importante tutelado por esta medida é a integridade e o bem estar dos menores dependentes. Visa fazer com que a vida deles continue da maneira mais normal possível, evitando futuros e diversos problemas afetivos com os pais. Claro que se o companheiro for violento com o menor, ele deverá ser afastado ligeiramente, sem dúvida alguma. Porém, há casos em que o agressor é violento apenas com a companheira, sem afetar os menores, nessa situação o entendimento é que se deve analisar a possibilidade do pai continuar vendo seus filhos.

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3.2.1.7. Prestação de alimentos provisionais ou provisórios

A possibilidade da prestação de alimentos está prevista no art. 22, V, in verbis:

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: V – prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

Acerca do tema, Bianchini dispõe que este tipo de prestação deve guiar-se pelo que demanda o Código Civil:

A prestação de alimentos provisionais ou provisórios deve seguir as determinações do Código Civil (art.1.694 e ss.), observando-se o binômio possibilidade de alimentante/necessidade do alimentado, bem como a demonstração de relação de parentesco e de relação de dependência econômica (BIANCHINI, 2008, p. 170).

Sobre o assunto, Dias afirma que:

De um modo geral, a pretensão de alimentos quer provisórios, quer provisionais, é veiculada por meio de uma ação, intentada perante o juízo de família, estando a parte representada por advogado. Agora, diante de episódio de violência familiar, a pretensão pode ser buscada por meio da polícia. O registro de ocorrência e o pedido de concessão de medida protetiva de urgência leva a formação de expediente a ser enviado ao juiz que apreciará o pedido. Mesmo que indeferida a pretensão em sede de medida protetiva de urgência, nada impede que o pedido seja veiculado por meio da ação de alimentos perante o juízo cível (DIAS, 2008, p. 87).

Como se pôde analisar, para que essa medida garantidora seja aplicada é necessário que o agressor tenha condições de prestas tais alimentos, bem como deve ser comprovada a real necessidade dos dependentes e sua filiação, relação de parentesco entre estes e o agressor.

3.2.2. Medidas dirigidas à ofendida

Dependendo do caso concreto, as medidas protetivas dirigidas à ofendida podem ser aplicadas juntamente com outras. Estas medidas não possuem natureza criminal (BIANCHINI, 2013, p. 171).

3.2.2.1. Encaminhamento a programa de atendimento ou de proteção

A referida medida está prevista no art. 23, I, da LMP, que determina: “Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;”.

Este tipo de medida é classificada como de natureza cível. A ofendida pode requerer o encaminhamento na realização do registro da ocorrência ou o juiz pode determinar de ofício, ou em virtude do pleito do representante da Defensoria Pública, do Ministério Público ou Advogado (BIANCHINI, 2013, p. 171).

O grande problema enfrentado pelas autoridades e vítimas é a falta de postos de atendimento e proteção. Na maioria dos municípios brasileiros estes mecanismos inexistem por falta de estrutura, sendo difícil aplicar a supracitada medida protetiva. É possível afirmar que mais uma vez a legislação brasileira não pode ser cumprida em virtude da falta de compromisso dos governantes ao não aplicarem as verbas públicas onde deveriam. Tendo em vista a falta destes programas na maioria território nacional, o juiz pode determinar que a vítima frequente outros tipos de programas sociais similares oferecidos pelo poder Público (HERMANN, 2008, p. 197. e 198).

3.2.2.2. Recondução ao domicílio, após afastamento do agressor.

A recondução da vítima ao respectivo domicílio, após o afastamento do agressor, está prevista no art. 23, II: “Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;”.

Ocorrendo o afastamento do agressor do domicílio comum, pode o juiz determinar a recondução da vítima e de seus dependentes ao respectivo lar. A lei não fala explicitamente, mas é de se deduzir que a recondução seja feita com acompanhamento de oficial de justiça, bem como de ajuda policial, dependendo da situação (HERMANN, 2008, p. 198).

Ainda sobre o assunto, Leda Maria Hermann explica:

A providência legal é aplicável sempre que a mulher vítima expressar temor justificado de retorno do violador ou de qualquer retomada da violência pelo agente, mesmo que este tenha deixado o lar comum por vontade própria. O conjunto probatório, aliado se preciso a parecer técnico pela equipe multidisciplinar (artigo 30) ou laudo de especialista (artigo 31) constituem elementos concretos para formação do convencimento do julgador quando à necessidade ou não da medida (HERMANN, 2008, p. 198).

Alice Bianchini afirma:

Ela pode ser requerida diretamente na esfera cível, por meio da propositura de medida cautelar de afastamento temporário de um dos cônjuges da morada do casal (CPC, art. 888, IV), bem como diretamente no momento do registro de ocorrência junto à autoridade policial, devendo o expediente ser direcionado pela Delegacia de Polícia à Vara Criminal, no prazo de 48 horas (art.12, III) (BIANCHINI, 2013, p. 171).

A maneira mais rápida de se obter a medida é fazer o requerimento na hora do registro da ocorrência junto à Polícia. A concessão da medida protetiva pela propositura de medida cautelar, apesar de ser urgente, levaria mais tempo do que se o pedido fosse feito na Delegacia.

3.2.2.3. Afastamento da ofendida do lar

Como visto anteriormente, no tópico 3.2.1, no item “a”, dentre as medidas que obrigam o agressor está a medida que afasta o agressor do lar. Entretanto, essa medida também se aplica à mulher, trata-se do afastamento da ofendida do lar constante no art. 23, III, in verbis: “Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;”.

Na maioria dos casos o agressor é que fica afastado do lar, mas em alguns casos é a vítima que deixa o ambiente familiar para se proteger e não sofrer mais violência. O que esta medida busca é garantir o fim da violência, independente de quem se afaste do lar, podendo ser a mulher vitimada ou o violentador (NUCCI, 2006, p. 879, apud DIAS, 2008, p. 84).

Vale salientar que este afastamento da vítima será feito sem afetar seus direitos relacionados aos bens, guarda dos filhos e alimentos. Muitas mulheres violentadas são desinformadas e temem perder seus direitos e bens ao sair do domicílio comum, mas a legislação garante que isso não deve ocorrer (HERMANN, 2008, p. 199).

A ofendida pode requerer esta medida perante a polícia e também através de medida cautelar de afastamento, a ser proposta de forma direta no âmbito cível (BIANCHINI, 2013, p. 171).

3.2.2.4. Separação de corpos

A separação de corpos está garantida no art. 23, IV: “Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas: IV - determinar a separação de corpos”.

Este tema também é tratado no art. 1562. do Código Civil Brasileiro:

Art. 1.562. Antes de mover a ação de nulidade do casamento, a de anulação, a de separação judicial, a de divórcio direto ou a de dissolução de união estável, poderá requerer a parte, comprovando sua necessidade, a separação de corpos, que será concedida pelo juiz com a possível brevidade.

Apesar de o Código Civil relatar o procedimento do pedido de separação de corpos, vale lembrar que a mulher, ao registrar a ocorrência e visando proteção imediata, pode fazer o pedido diretamente a autoridade policial competente. Este método é bem mais célere do que o tratado pelo Código Civil (BIANCHINI, 2013, p. 172).

É importante salientar que a separação de corpos só poderá ser concedida pelo juiz do JVDF quando o pedido for fundamentado exclusivamente na violência doméstica sofrida pela vítima, não abrangendo pedidos com outros fundamentos da esfera cível (BIANCHINI, 2013, p. 172).

3.2.2.5. Medidas protetivas dirigidas à ofendida em relação ao patrimônio
I - Restituição de bens

“Recai sobre bem móveis que tenham sido indevidamente subtraídos da vítima pelo agressor ou estejam na iminência de sê-los” (BIANCHINI, 2013, p. 172).

Dias entende que a vítima tem o direito de restituição de seus bens:

No momento em que é assegurado à vítima o direito de buscar a restituição de seus bens, refere-se tanto aos bens particulares como aos que integram o acervo comum, pois metade lhe pertence. Assim, se um bem comum é subtraído pelo varão que passa a deter sua posso com exclusividade, significa dizer que houve a subtração da metade que pertence à mulher. O pressuposto para a concessão da medida protetiva é que tenham os bens sido subtraídos por quem a vítima mantém um vínculo familiar (DIAS, 2008, p. 88).

Evidencia-se aqui a intenção de garantir a posse e propriedade dos bens móveis da ofendida, impedindo que o agressor cause danos materiais à vítima.

II - Proibição temporária para a celebração de contratos e atos de compra, venda e locação de propriedade em comum

“Incide sobre bens móveis pertencentes ao patrimônio comum e possui caráter temporário, o que significa que poderá ser revista pelo juiz a qualquer tempo” (BIANCHINI, 2013, p. 172).

Seguindo nesta linha, Dias expõe sua análise sobre esta proibição:

Não só a venda cabe ser vedada. Também a esposa ou companheira têm o direito de se insurgirem contra a compra de bens. Ainda que os bens adquiridos por qualquer dos cônjuges ou companheiros passem a integrar o patrimônio comum, o negócio pode ser ruinoso aos interesses dela ou da família. Havendo esse temor, quando do registro da ocorrência de violência doméstica perante a autoridade policial, a mulher tem a possibilidade de requerer medida protetiva de urgência para que a compra do bem seja obstaculizada (DIAS, 2008, p. 89).

Para a locação de bens comuns, não é necessário que o contrato seja firmado pelo casal. Somente quando o prazo da locação for superior a 10 anos é necessária a vênia conjugal. Assim, bem andou o legislador em conceder à mulher a faculdade de buscar, em sede liminar e como medida protetiva de urgência, a proibição do varão locar bens comuns (DIAS, 2008, p. 90).

Deferida a proibição temporária de celebração de contratos de compra, venda e locação do patrimônio comum, deverá o juiz oficiar ao cartório competente para a devida averbação, qual seja o Cartório de Registro de Imóveis (art. 24, parágrafo único).

Como se vê, o propósito desta medida é assegurar o interesse da família e evitar a ruína dos bens materiais que pode ser causada pelo agressor propositalmente para prejudicar a vítima e seus descendentes.

III - Suspensão de procuração

Sobre a suspensão da procuração dada ao agressor, Bianchini preceitua: “A Lei Maria da Penha fala em suspensão da procuração, e não em revogação. Este último caso deve ser buscado em ação própria junto à vara cível” (2013, p. 172).

Maria Berenice Dias disserta que a lei se refere sobre a suspensão, entretanto, trata-se da revogação da procuração:

Talvez umas das mais providenciais medidas previstas na Lei seja a possibilidade de o juiz suspender procurações outorgadas pela ofendida ao agressor (art. 24, III), e isso em sede de liminar e no prazo de 48 horas após a vítima ter denunciado na polícia episódio de violência. Ainda que a lei fale em suspensão, a hipótese é de revogação do mandato, até porque “suspensão da procuração” é figura estranha em nosso ordenamento jurídico. De qualquer modo, seja suspensão, seja revogação, o fato é que o agressor não mais poderá representar a vítima (DIAS, 2008, p. 90).

Dias relata que muitas mulheres concedem procurações a seus parceiros por confiarem completamente e cegamente nele:

A total confiança que as mulheres depositam em seus cônjuges ou companheiros as leva a autoriza-los a tratar “dos negócios” da família. Para isso concedem procurações muitas vezes com plenos poderes, o que as coloca em situação de absoluta dependência a vontade do varão que passa a ter a liberdade de fazer o que quiser. Diante de um episodio de violência, muitas vezes surge o sentimento de vingança do homem, que pode levá-lo a tentar desviar o patrimônio, utilizando-se de tais procurações. Mister que haja a possibilidade de medida urgente que impeça tal de agir. Assim, ao invés de revogar a procuração, o que pode sujeita-la a algum risco, pois é necessário dar ciência ao mandatário, melhor mesmo que essa revogação ocorra por meio do juiz, em expediente que teve início perante a autoridade policial (DIAS, 2008, p. 90. e 91).

Esta possibilidade de revogar estende-se também ao mandato judicial conferido ao varão, na hipótese de ser ele advogado (DIAS, 2008, p. 91).

Quando houver a suspensão da procuração, o Cartório de Notas deverá ser informado para tomar as providências necessárias (DIAS, 2008, p. 90).

Evidentemente, recomenda-se às mulheres a não concessão de procurações aos seus companheiros, tendo por finalidade evitar futuros grandes problemas de ordem patrimonial.

IV - Prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais

A exigência de caução para garantir posterior pagamento de indenização (art. 24, IV), tem nítido caráter cautelar, até por determinar depósito de bens e valores. Trata-se de medida acautelatória, para garantir a satisfação de direito que venha a ser reconhecido em demanda judicial a ser proposta pela vítima. Aqui sabe a possibilidade de o magistrado deferir a medida por determinado prazo, ao menos até que a vítima intente a ação. Descabe permanecerem bens ou valores caucionados indefinidamente sem que a vítima busque a indenização que a caução vem assegurar (DIAS, 2008, p. 91).

Segundo Bianchini: “Condutas físicas, como também morais e psicológicas, encontram-se abrangidas pelo dispositivo”. A autora traz a ideia de sua colega: “Leda Maria Hermann inclui nas perdas ou danos materiais inclusive os lucros cessantes” (HEERDT, 2011, p. 232, apud BIANCHINI, 2013, p.173).

Bianchini preceitua que a medida visa garantir um direito posteriormente: “Tal medida visa acautelar a mulher, futuramente, garantindo a satisfação do de direito que venha a ser reconhecido em posterior demanda judicial” (2013, p. 173).

3.2.3. Da prisão preventiva como medida protetiva de urgência

A prisão preventiva pode ser decretada e utilizada como uma das formas de medida protetiva de urgência, assim preceitua a legislação:

Art. 20. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial. Parágrafo único. O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

Para a prisão preventiva ser decretada nas situações de ocorrência de violência doméstica e familiar contra a mulher não é exigido que a pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos seja cominada ao crime doloso. Esta exigência é feita em todos os outros casos, segundo art. 313, do Código de Processo Penal (BIANCHINI, 2013, p. 182).

A decretação da prisão preventiva como medida protetiva tem caráter excepcional:

A prisão preventiva como medida protetiva de urgência poderá ser decretada sempre que necessária, adequada e proporcional (proporcionalidade em sentido estrido). Ela está prevista no art. 20. da Lei Maria da Penha, bem como no Código de Processo Penal (arts. 282, § 4º, e 312, parágrafo único, 313, III) e sempre será exceção, devendo ser imposta em circunstâncias muito especiais (BIANCHINI, 2013, p.182).

Para Dias, a possibilidade de decretação da prisão preventiva como medida protetiva de urgência é bem-vinda:

A inovação é bem-vinda, pois vem atender às hipóteses em que a prisão em flagrante não é cabível. Cabe trazer o exemplo de Jayme Walmer de Freitas: o marido agride violentamente a esposa, que leva a notitia criminis à autoridade policial. O juiz determina seu afastamento do lar conjugal. Como a decisão é posterior ao fato, não se admite a custódia em flagrante. Igualmente, uma vez afastado do lar, se o varão retornar, descumprindo a execução da medida protetiva de urgência, admite-se sua prisão preventiva (2008, p. 102).

Ao contrário de Dias, Hermann afirma que não se trata de uma inovação e sim uma reafirmação de norma já existente:

A decretação de prisão preventiva em desfavor do agente violador não prescinde da incidência de uma das causas elencadas no art. 312. do Código de Processo Penal. É medida de exceção, só utilizável em situações fáticas que justifiquem sua decretação. O parágrafo único do artigo 20, acima descrito, evidencia esta vinculação. Não há, portanto, novidade legislativa. O dispositivo consiste em reafirmação da norma genérica, sendo esta, tão somente, sua função (HERMANN, 2008, p. 176. e 177).

Conclui-se que é de fundamental importância a possibilidade de aplicação da prisão preventiva nos casos excepcionais, objetivando o cumprimento das medidas protetivas.

3.3. O real impacto da Lei Maria da Penha sobre as ocorrências de violência doméstica contra a mulher

Neste tópico será analisada a real eficácia trazida pela LMP, e suas medidas protetivas, na vida das mulheres que sofrem algum tipo de violência doméstica e familiar. Basear-se-á nos índices de violência contra a mulher apontados nas pesquisas, a real situação das Delegacias, do Poder Judiciário, e sua respectiva fiscalização do cumprimento da lei.

3.3.1. A ineficácia das medidas protetivas de urgência no combate à violência doméstica contra a mulher

O legislador, ao elaborar a LMP, buscou mudar a situação de violência doméstica contra a mulher que em nosso país é altíssima. Com a LMP as mulheres agredidas, que antes apanhavam em silêncio e eram desamparadas pela Justiça, ficaram encorajadas a denunciar o agressor, que na maioria das vezes é seu marido ou companheiro. No entanto, a LMP apresenta falhas. Atualmente, não há como garantir a eficácia desta Lei.

O Estado e a Justiça encontram dificuldade para fiscalizar e aplicar as medidas protetivas de urgência, que são de fundamental importância em boa parte dos casos em que a mulher vive sobre constante violência e ameaça. Outro ponto importante é que apenas o juiz pode determinar a aplicação das medidas protetivas de urgência no prazo de no máximo 48 horas, porém, em muitas situações esse prazo se torna a causa de muitas mortes, já que a vítima fica desprotegida, a mercê do agressor, que está ainda mais violento depois de saber que foi denunciado.

Thayse Viana Portela, Bacharela em Direito pela Universidade Católica de Brasília, ao elaborar seu Trabalho de Conclusão de Curso em 2011, comprovou em pesquisa feita junto ao Juizado de sua Cidade, o 1º Juizado Cível e Criminal e de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Samambaia, que nos 17 processos estudados por ela, todas as vítimas solicitaram medidas protetivas de urgência e apenas 7 obtiveram êxito e tiveram parte das medidas requeridas deferidas. As outras 10 vítimas tiveram negadas todas as medidas protetivas (2011, p. 60).

A estudante ao analisar cada processo constatou que o juiz ao decidir não deu a devida atenção aos relatos das vítimas. Em 6 dos 10 casos em que o Magistrado indeferiu os pedidos de medidas protetivas, a decisão proferida foi exatamente igual, continha os mesmos fundamentos. O Ministério Público interferiu em 3 dos 10 casos de indeferimento e requereu a reconsideração das decisões. Após isso, o juiz modificou a decisão e concedeu as medidas protetivas às vítimas (PORTELA, 2011, p. 60).

A realidade dos fatos mostrou que quando as medidas são indeferidas pelo juiz, a vítima fica completamente desprotegida e desiste do feito. Das 17 ofendidas, 6 desistiram no meio do caminho. A desistência da representação só pode ser feita em juízo, na audiência. Outro ponto negativo é a demora na realização das audiências, que após a chegada dos autos no Juizado, demoram em média 40 dias para se realizarem (PORTELA, 2011, p. 67. e 68).

No entendimento de Thayse, o descaso do Judiciário é grande: “[...] Pelo que pude verificar nos 17 processos aos quais tive acesso, a atuação do judiciário é a de não levar adiante as medidas protetivas, pois, indeferindo, não é preciso controlar” (2011, p. 70).

Infelizmente o que o estudo feito por Thayse mostrou é a mais pura realidade brasileira. Apesar de estar entre as melhores do mundo no que diz respeito a prevenção e o combate à violência doméstica contra a mulher, e de ser aprovada por 80% dos brasileiros, a LMP encontra outros grandes problemas como a falta de Delegacias, Juizados, Casas de Abrigo, funcionários e fiscalização. Sem toda essa estrutura não é possível garantir a segurança das mulheres e a punição dos agressores (PRATEANO, 2012, online).

A problemática da ineficácia das medidas protetivas de urgência está ligada diretamente à fase inicial, quando a vítima procura atendimento policial, que é realizado de maneira precária em grande parte dos registros, tanto pela falta de profissionais como pela falta de estrutura física. As ofendidas ficam sujeitas a esperar horas para registrar a ocorrência (PRATEANO, 2012, online).

Segundo o Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM :

A Lei Maria da Penha pune com rigor a violência contra a mulher e iniciou uma mudança na arraigada cultura machista, mas ainda há muito o que ser feito. As falhas na aplicação da Lei começam nos registros imprecisos e desarticulados dos órgãos responsáveis por acolher as denúncias, passam pela falta de estrutura para atendimento das vítimas e culmina na ausência de uma rede de enfrentamento conjunto das instituições (IBDFAM ,online).

O Instituto ainda afirma que:

[...] a desarticulação das informações nos órgãos responsáveis pelo recebimento das denúncias leva ao desconhecimento e consequente falta de controle sobre as medidas tomadas. Ou seja, os registros não permitem verificar se a mulher que fez a denúncia, de fato, passou a ser protegida como manda a Lei” (IBDFAM ,online).

Constata-se que a Lei, apesar de prever combater rigorosamente a violência doméstica contra a mulher, apresenta falhas. Outro exemplo de ineficácia é a possibilidade de o agressor ser liberado da prisão após pagar a fiança. A ofendida, mesmo tendo uma medida protetiva de urgência concedida a seu favor, ao sofrer uma nova agressão informa a polícia, que terá a chance de prender o agressor em flagrante delito, porém sua liberação poderá ser feita em seguida mediante o pagamento da fiança. Assim, o violador fica despreocupado, pois sabe que após cometer outro ato de violência basta pagar para sair da prisão. Lembrando que a prisão o flagrante delito não cabe em toda situação de violência (MATIELLO; TIBOLA, 2013, online).

Não sendo caso de possibilidade de prisão em flagrante delito, verifica-se que, ao presenciar uma nova situação de violência contra a mulher, a autoridade policial, mesmo sabendo que o violador está descumprindo decisão judicial, se sente incapaz, pois não pode prender o agressor, tendo em vista que não há previsão legal para estes tipos de ocorrência específica (MATIELLO; TIBOLA, 2013, online).

Ressalta-se que o descumprimento de ordem judicial é tipificado como delito, sendo assim, não sendo possível realizar a prisão em flagrante delito, o policial pode deve realizar o procedimento pelo crime de desobediência a ordem judicial, mas, para isso, a autoridade policial tem que ter acesso aos processos e medidas já concedidas à vítima (MATIELLO; TIBOLA, 2013, online).

Outra importante crítica feita é acerca da prisão preventiva como forma de medida protetiva. Para que seja feita a prisão preventiva se exige o descumprimento da medida protetiva e havendo esse descumprimento é de se deduzir que a vítima sofra um novo tipo de violência por parte do agressor (MATIELLO; TIBOLA, 2013, online).

O Estado ainda não possui estrutura para garantir a segurança e vigilância pessoal da ofendida 24 horas por dia, mas isso seria o ideal. Uma das soluções para o grande índice de descumprimento das medidas protetivas de urgência seria o monitoramento eletrônico do agressor e da mulher vitimada, isso garantiria maior segurança e conforto às vítimas. Esse monitoramento eletrônico já está sendo utilizado por alguns poucos Estados do Brasil de maneira bastante tímida (MATIELLO; TIBOLA, 2013, online).

O monitoramento não traz a garantia absoluta de que o agressor para se cometer os atos violentos, porém, é dever do Estado buscar e utilizar meios que possibilitem maximamente a solução do problema (MATIELLO; TIBOLA, 2013, online).

Diante de todo o exposto, constataram-se diversas falhas como a falta de mecanismos e sistemática que garantam a aplicação e cumprimento das medidas protetivas de urgência. O que se pode ver na prática é a ineficácia destas medidas.

3.4. Possíveis soluções para a problemática

3.4.1. O monitoramento eletrônico
3.4.1.1. O monitoramento eletrônico do agressor

As medidas cautelares trazidas pela Lei nº 12.403/2011 também podem ser aplicadas aos casos de violência doméstica e familiar sofridos pelas mulheres. Entretanto, a aplicação destas medidas deve ser feita de forma adequada e proporcional a cada caso concreto (BIANCHINI, 2013, p. 175).

O monitoramento eletrônico é o principal mecanismo, a principal medida cautelar elencada na referida lei por ser bastante eficaz na vigilância dos agressores (BIANCHINI, 2013, p. 175).

Uma das maneiras encontradas para verificar se o agressor está realmente cumprindo as medidas protetivas é a aplicação do monitoramento eletrônico, feito através de tornozeleiras ou pulseiras, considerada pela legislação brasileira como medida cautelar de descarcerização e de controle de réus condenados. Com este mecanismo a autoridade saberá se o violentador está respeitando a ordem judicial de se afastar da vítima e de determinados lugares, se for o caso (BIANCHINI, 2013, p. 175. e 176).

Bianchini destaca a importância do monitoramento eletrônico:

A utilização desta tecnologia, de acordo com Diane Rosenfeld, advogada estadunidense que defende seu uso para casos de violência doméstica contra a mulher, é forma eficaz de atentar aos sinais de perigo que podem levas a novos episódios de violência, bem como meio de responsabilizar o agressor, e não a vítima, pelo afastamento (PÉCORA, 2010, online, apud BIANCHINI, 2013, p. 175).

Além disso, seria positivo o seu uso, pois reforçaria a necessidade de obediência à medida por parte do agressor, evitando sua prisão preventiva em caso de descumprimento da imposição judicial (art. 20), ou mesmo que seja acusado de crime de desobediência (CP, art. 330) (BIANCHINI, 2013, p. 176).

Outro ponto de destacado pela autora é a utilização do monitoramento eletrônico nos Estado Unidos e em Portugal:

Visando garantir a efetivação das medidas de afastamento em casos de violência doméstica, alguns países adotaram o monitoramento eletrônico. Por exemplo, nos Estados Unidos, 17 Estados o preveem. Também em Portugal há sua previsão, desde 2009, com o devido consentimento do agressor, como medida específica de afastamento do acusado ou condenado em contexto de violência doméstica (BIANCHINI, 2013, p. 176. e 177).

Ao aplicar as medidas protetivas de urgência previstas na LMP o juiz busca proteger a vítima, porém deve-se saber como será feita a fiscalização do cumprimento destas medidas protetivas. Não adianta o juiz estabelecer medidas que não serão cumpridas por falta de fiscalização. Infelizmente isto acontece muito em nosso país, pois falta muita fiscalização.

3.4.1.2. Monitoramento eletrônico da ofendida: “O botão do pânico”

O Botão do Pânico é uma ferramenta nova no tocante ao combate e prevenção da violência doméstica contra a mulher. Trata-se de um Dispositivo de Segurança Preventiva (DSP) que possibilita a gravação de áudios e a localização da portadora através de GPS. Foi lançado pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo no dia 15/04/2013 (SOUZA, 2013, online).

Com o intuito de melhorar o combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres de forma preventiva, bem como diminuir os seus índices, esta ferramenta eletrônica foi pensada e criada pela juíza Hermínia Maria Silveira Azoury, que também é coordenadora Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (CÂMARA MUNICIPAL DE SALVADOR, 2014, online).

A sistemática do dispositivo funciona de maneira simples. A mulher agredida, que registrar a ocorrência da Delegacia, e posteriormente obtém a concessão de uma medida protetiva, poderá receber o Botão do Pânico e ela sempre deverá andar com o dispositivo. O botão do pânico é pequeno, cabe na palma da mão. Ao sentir-se ameaçada com a presença do agressor em qualquer lugar, a ofendida aperta o Botão do Pânico, acionando imediatamente a polícia, que receberá na central de monitoramento a localização, fotos e os dados da vítima e do agressor, e deverá encaminhar as viaturas mais próximas ao local. O prazo para a devolução do dispositivo é indeterminado. Lucas Vieira, especialista em informática garante que “Além de transmitir o áudio ao vivo para o operador, ele também realiza a gravação para servir de prova”. A criadora da ferramenta, a desembargadora Hermínia Maria, defende que "Os homens sabem que a mulher tem o botão do pânico e ele nem sequer se aproxima. O homem tem medo de prisão. Em princípio uma prisão em flagrante que pode se transformar em prisão preventiva e isso dá temor” (BONELLA, 2013, online).

Álvaro Kalix, presidente do Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid) e juiz auxiliar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ao lançar o dispositivo eletrônico afirmou que “O botão poderá possibilitar mais eficácia às medidas protetivas. Uma vez acionado, imediatamente a Guarda Municipal será informada e poderá agir de forma a garantir a prevenção” (SOUZA, 2013, online).

Os resultados da implantação do Botão do Pânico são positivos, mas mesmo assim as vítimas ainda sentem medo. A estudante de direito Priscila Vieira relata seu caso de violência e sua experiência com a ferramenta:

Fui a um bloco e encontrei com ele. Já tinha recebido ameaças, mas não levei a sério, porque durante o namoro sempre foi tudo na boa. No bloco, ele quis conversar comigo, mas eu não quis voltar e ele me agrediu fisicamente e psicologicamente. Fui ao plantão, pedi a medida protetiva e na outra semana consegui. Com o processo caminhando, recebi o botão. Acho que isso inibiu um pouco a ação dele (PERIM, 2014, online).

A minha primeira reação foi de pânico mesmo. É desesperador. Eu tinha medo de sair e acontecer alguma coisa comigo. Saí do curso de inglês, fiquei um tempo fora da faculdade. Só comecei a sair depois que recebi o botão, mas nunca mais é a mesma coisa, a gente sempre tem receio de acontecer alguma coisa (PERIM, 2014, online).

As mulheres têm que denunciar, têm que ter coragem e buscar os meios que nos proporcionam. São alguns mecanismos que estão fazendo valer a lei. Só assim é possível inibir a ação deles [agressores]. Acredito que muitas vítimas acabam se sentindo impotentes, mas é pior quando não denunciamos (PERIM, 2014, online).

Como podemos constatar, após a utilização do mecanismo de monitoramento, Priscila, apesar de ainda sentir medo, conseguiu sair de casa e voltar a sua rotina normal de vida. A jovem de 21 anos destaca e finaliza: "Agora estou feliz, superei. Ainda vivo com um pouco de medo, de receio, mas temos que ter cuidado mesmo" (PERIM, 2014, online).

Outra novidade, trazida pelo presidente da Câmara Municipal de Salvador, o vereador Paulo Câmara (PSDB), é a criação do aplicativo do Botão do Pânico para celulares (VARELA NOTÍCIAS, 2014, online).

O vereador Paulo Câmara afirma:

É uma ferramenta tecnológica importante e inovadora no combate à violência contra a mulher. Através do aplicativo, a mulher que sofrer ameaças de seus maridos, ex-maridos e companheiros pode acionar a polícia com apenas um toque no celular. O aplicativo vai fornecer às autoridades competentes meios de combater com mais eficiência e agilidade os crimes contra a mulher no estado (VARELA NOTÍCIAS, 2014, online).

Trata-se de um projeto inovador apresentado no Estado da Bahia recentemente. Sua implantação ainda está em andamento e estudo, mas a previsão é que o aplicativo Botão do Pânico para celulares esteja disponível o mais breve possível (VARELA NOTÍCIAS, 2014, online).

3.4.1.3. O monitoramento eletrônico simultâneo do agressor e da ofendida

No Ceará, no dia 9 de abril do corrente ano, a Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado do (SEJUS-CE) lançou um novo projeto que vai testar nos agressores o uso de tornozeleiras localizadoras que pretendem mantê-lo afastado da ofendida. Além deste equipamento que será colocado no agressor, a mulher receberá um dispositivo, que integrado ao sinal da tornozeleira, avisará quando o violador estiver próximo, num raio de 200 metros. A polícia também receberá as informações e ficará atenta caso ocorra nova violação (SEJUS, 2014, online). Este mecanismo é similar ao Botão do Pânico que já está sendo utilizados em alguns Estados do Brasil.

Mariana Lobo, Secretária da justiça e Cidadania do Estado explica que:

Este projeto pretende assegurar que as medidas de segurança determinadas pela Justiça sejam efetivamente cumpridas, dando mais segurança à mulher já que ela mesma saberá quando o seu agressor está por perto. A Polícia também será acionada e ele poderá ser capturado antes de cometer qualquer novo delito (SEJUS, 2014, online).

Além de garantir a eficácia da medida protetiva, esse mecanismo alternativo poderá ocasionar a descarcerização dos presos, já que serão monitorados, poderão sair da prisão com o equipamento, mantendo-se sempre longe da agredida. Em Fortaleza cerca de 150 presos que infringiram a LMP estão na CPPL III (SEJUS, 2014, online).

Inicialmente, na fase de teste, serão disponibilizados apenas 12 equipamentos, número que pode ser aumentado de acordo com a eficácia e necessidade das ocorrências (SEJUS, 2014, online).

3.4.2. O Projeto de Lei 6.433/2013

Uma novidade em relação à LMP é o Projeto de Lei 6.433/2013, de autoria do Deputado Federal Bernardo Santana de Vasconcellos do PR/MG, que objetiva mudar os procedimentos e trâmites da LMP para garantir de forma célere a proteção da vítima (2013, online). A ementa do Projeto dispõe:

Pretende dar mais efetividade à proteção da mulher vítima de violência doméstica, no sentido de possibilitar que a autoridade policial tenha acesso aos processos judiciais e às medidas protetivas já deferidas judicialmente, haja vista que somente assim poderá, fora do horário de expediente forense, verificar se o agressor está incorrendo em transgressão à medidas protetivas, e, por consequência, praticando crime como desobediência, autorizando a sua prisão em flagrante (VASCONCELLOS, 2013, online).

As mudanças trazidas no projeto de lei são positivas. Uma delas possibilita que autoridade policial, o delegado, ao tomar ciência da violência doméstica contra a mulher, aplique, imediatamente, as medidas protetivas de urgência. Neste caso a Polícia deverá comunicar a aplicação das medidas à ofendida, ao juiz competente, ao Ministério Público e ao agressor, se possível. Destaca-se que o juiz poderá reaver as medidas concedidas pela autoridade policial a qualquer tempo (VASCONCELLOS, 2013, p. 1. e 2, online).

Além de poder aplicar prontamente algumas das medidas protetivas de urgência, a autoridade policial também poderá solicitar diversos serviços voltados à vítima e seus dependentes, como os de educação, saúde e de assistência social. Esta hipótese justifica-se pelas variadas necessidades das vítimas desde apoio psicológico imediato, atendimento médico ou abrigo (VASCONCELLOS, 2013, p. 2, online).

O projeto prevê, ainda, que a polícia tenha conhecimento e acesso às medidas projetivas de urgência já deferidas pelo juiz, mesmo que fora do horário de expediente. Isto possibilita que a autoridade policial, ao saber da existência de medidas já concedidas anteriormente, verifique se o violador incorre em transgressão às medidas. Havendo transgressão o agressor pratica crime de desobediência, situação na qual se autoriza a sua prisão em flagrante delito. Não sabendo de medidas anteriormente deferidas, a polícia não tem como punir o criminoso por crime de desobediência (VASCONCELLOS, 2013, online).

O Deputado Federal João Campos, relator da Comissão de Segurança Pública e combate ao Crime Organizado, analisa o Projeto de Lei e a real situação brasileiro no tocante a LMP, destacando em seu voto:

Após sete anos da entrada em vigor da Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006 –, os índices de crimes praticados no contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher não tiveram redução significativa, mantendo-se sem grandes alterações, o que tem demonstrando que as medidas trazidas pela novel legislação, embora salutares, ainda não conseguiram dar um resultado positivo efetivo. Não resta dúvida que as mais variadas realidades existentes dentro do Brasil, especialmente nas cidades do interior, tem tornado o procedimento de aplicação das medidas protetivas, que deveriam ser de urgência, em um procedimento moroso e ineficaz sob o ponto de vista da efetiva proteção da vítima (2013, p. 3, online).

Para Campos, após a mulher fazer o boletim de ocorrência nenhuma medida é tomada:

A regra nesse contexto é a mulher procurar a delegacia e sair com um boletim de ocorrência, nada mais. À autoridade policial, segundo a atual redação da lei, cabe apenas, fora da situação flagrancial, apenas o registro do fato e a remessa do requerimento de medida protetiva ao Poder Judiciário para que, só assim, após o transcurso de um tempo muitas vezes fatal para a vítima, esta possa receber uma resposta do Estado, qual seja uma medida protetiva que lhe garanta a integridade física, moral e patrimonial (2013, p. 3, online).

Campos afirma que diante de toda essa situação a autoridade policial fica de mãos atadas, sem poder garantir a segurança da vítima: “Uma realidade verdadeiramente paradoxal, já que a lei lhe permite prender um indivíduo em flagrante, mas não lhe autoriza deferir à mulher que está sofrendo risco atual e iminente de vida uma medida que garanta o afastamento do agressor” (2013, p. 4, online).

O Deputado João Campos finaliza:

Não se admite ainda hoje que a mulher vítima de violência doméstica saia da delegacia de polícia sem qualquer medida efetiva que lhe garanta o afastamento do agressor. É o mesmo que tornar letra morta todo o trabalho do legislador consubstanciado na Lei nº 11.340/2006, já que o tempo transcorrido entre o registro da ocorrência e a intimação do agressor pelo Poder Judiciário é suficiente para que a mulher seja duplamente vitimizada, uma vez que é dever do Estado lhe prestar uma proteção eficiente imediata, especialmente neste caso (2013, p. 4. e 5, online).

Enfim, são situações que têm colaborado para que a LMP não alcance todo o resultado esperado, razão pela qual é muito bem vinda a inciativa do projeto de lei em apreço que, em boa hora, serviu para apontar os problemas e indicar a solução para a ineficiência do sistema de medidas protetivas originalmente trazido pela Lei nº 11.340/2006 (CAMPOS, 2013, online).

Sendo aprovado o Projeto de Lei, a autoridade policial passa a ganhar competência e autorização para conceder algumas das medidas protetivas de urgência, sem a necessidade do consentimento prévio do juiz. O delegado poderá afastar de imediato o agressor da vítima, do domicílio conjugal e dos filhos, bem como poderá determinar que o violador mantenha-se afastado dos lugares frequentados pela vítima e seus parentes (CAMPOS, 2013, online).

Como sabemos o juiz tem o prazo de até 48 horas para apreciar o pedido de medidas protetivas. Levando em conta que a Delegacia faz a remessa dos expedientes ao Poder Judiciário, conclui-se que este prazo é muito longo, pois se trata de uma situação emergencial de violência. Enquanto o procedimento é encaminhado, a vítima fica desamparada por dias e até meses sem as medidas necessárias à sua proteção, de seus familiares e patrimônio. Esta mudança é de fundamental importância, pois, nos crimes ocorridos nos finais de semana ou em lugares distantes fica difícil aplicar as medidas com agilidade. A vítima fica esperando dias para que o encaminhamento do pedido seja feito, bem como também espera pelo deferimento do juiz. Neste lapso temporal a mulher fica completamente desprotegida, sendo alvo fácil do agressor (VASCONCELLOS, 2013, p. 3, online).

O agravante ocorre no fim de semana e fora do horário de expediente forense, quando muitas vezes os casos de violência acontecem e as vítimas ficam inertes, sem poder fazer, senão aceitar a agressão, fugir, se esconder ou procurar a delegacia mais próxima para fazer o boletim de ocorrência sem o conhecimento de seu agressor (VASCONCELLOS, 2013, p. 3, online).

A realidade é que após efetuar o registro da ocorrência, a vítima retorna para sua casa e passa a viver momentos de pânico, com medo de que o agressor volte a lhe agredir. Quando o autor toma ciência que a vítima o denunciou, ele se torna ainda mais violento, ficando a mulher em grave e iminente situação de risco de vida (VASCONCELLOS, 2013, online).

Vasconcellos conclui que: “A finalidade do projeto de lei é evitar que a morosidade estatal, a desarticulação entre as instituições responsáveis pela defesa da mulher e a sensação de impunidade estimulem o agressor a reiterar práticas deletérias de agressão contra a mulher” (2013, p. 4. online).

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARVALHO, Pablo. Medidas protetivas no âmbito da Lei Maria da Penha e sua real eficácia na atualiadade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4064, 17 ago. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29229. Acesso em: 5 nov. 2024.

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