3. Conclusão
A Lei 11.101/05 instituiu a recuperação judicial visando resguardar a economia dos efeitos deletérios da falência. Para tanto, previu o princípio da preservação da empresa plasmado no artigo 47 da Lei nº 11.101/2005, o qual inspira todo o conteúdo da norma. Visando adaptar o novo instituto da recuperação judicial às peculiaridades e garantias crédito público, foi instituída a necessidade de apresentação da certidão de regularidade fiscal quando da concessão da recuperação judicial (art. 57 da Lei nº 11.101/05) e a previsão da instituição do parcelamento específico para as empresas em recuperação judicial (art. 155-A do CTN).
O Judiciário, entretanto, vem conferindo a seguinte interpretação ao dispositivo acima exposto: enquanto não houver a instituição da lei específica de parcelamento para as empresas em recuperação, fica dispensada a apresentação da certidão. No entanto, tal interpretação rompe o equilíbrio do sistema traçado pela Lei nº 11.101/2005, afrontando diretamente dispositivo legal que assegura situação favorável aos créditos fiscais.
Não é viável sobrepor-se o princípio da preservação da empresa à regra insculpida no art. 57 da mesma lei, porquanto ostentam a mesma densidade normativa, ostentando igual hierarquia. Tais dispositivos legais estão numa relação de complementaridade e indissociabilidade, visando resguardar valores jurídicos diversos. Tais normas concorrem, pois, para conferir harmonia e lógica do sistema criado para as recuperações judiciais.
Tais decisões judiciais vulneram o princípio da separação dos poderes, pois ignoram escolhas políticas do legislador, ao afastar a aplicação dessas disposições legais com base em voluntarismos, subjetivismos ou preferências pessoais.
No regime democrático pressupõe-se como ideal a participação ampla e irrestrita da sociedade na elaboração de normas que devem reger as relações entre os indivíduos e entres esses e o Estado. Ao afastar dispositivos legais plenamente válidos, com base em presunções ou ilações voluntaristas, representa sério atentado ao postulado da separação dos poderes, conferindo ao juiz nítido poder legislativo, em franco atentado ao regime democrático.
Referências
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BRASIL. Lei 11.101/05. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Aceso em: 17 mai. 2014.
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COELHO, Fábio Ulhoa, Manual de direito comercial: direito de empresa. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010 p.375
STRECK, Lenio Luiz. O problema da decisão jurídica em Tempos pós-positivistas. Novos Estudos Jurídicos. Disponível em <http://siaiweb06.univali.br/seer/index.php/nej/article/view/1766>. Acesso em 17 mai. 2014.
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Notas
[1] BRASIL. Lei 11.101/05. Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11101.htm>. Aceso em: 17 mai. 2014.
[2] ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresa: de acordo com a Lei n. 11101/2005. 25 ed. São Paulo: Saraiva 2010 p. 305.
[3] COELHO, Fábio Ulhoa, Manual de direito comercial: direito de empresa. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010 p.375
[4] BRASIL. Lei Complementar nº 118/05. Altera e acrescenta dispositivos à Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, e dispõe sobre a interpretação do inciso I do art. 168 da mesma Lei. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp118.htm>Aceso em: 17 mai. 2014.
[5] “As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica.” Art. 6º, §7º, da Lei 11.101/05.
[6] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1187404/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/06/2013, DJe 21/08/2013.