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A ausência de limite mínimo de idade como requisito à aposentadoria por tempo de contribuição e a não configuração de risco social

07/10/2014 às 12:22
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O benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, distanciando-se dos demais, parece não englobar nenhum risco social a ser atendido pelo Estado, dado ao fato de inexistir idade mínima para a concessão do benefício referido.

RESUMO: Os benefícios previdenciários, gênero do qual faz parte a aposentadoria por tempo de contribuição, simbolizam o ideal protetivo buscado pelo atual estágio de desenvolvimento estatal (Estado do bem estar social), em decorrência do insucesso da vertente apenas liberal, mantenedora de liberdade negativa. Contudo, percebe-se que o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, distanciando-se dos demais, parece não englobar nenhum risco social a ser atendido pelo Estado, dado ao fato de inexistir idade mínima para a concessão do benefício referido. Assim, é escopo desse trabalho analisar se o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição destoa de todo o subsistema da previdência social, a ponto de enfraquecer o sistema de proteção, que tem como um de seus pilares o princípio da solidariedade.

Palavras-chave: Aposentadoria por tempo de contribuição – Idade mínima – Risco social.

ABSTRACT:Social security benefits, which is part of the genre retirement contribution time, symbolize the ideal protective sought by the current stage of development state (state welfare), due to the failure of liberal strand only, keeper of negative liberty. However, it is clear that the retirement benefit contribution time, away from the others, seems to encompass any social risk to be met by the state, given the fact inexistence minimum age for granting the said benefit. Thus, the scope of this work is to analyze whether the retirement benefit based on years of clashes whole subsystem of social security, to weaken the protection system, which has as one of its pillars the principle of solidarity.

Keywords: Retirement contribution time - Minimum Age - Risk social.


1 INTRODUÇÃO

A partir da natural evolução da sociedade e das constantes reivindicações populares, o Estado precisou modificar a sua postura de apenas garantidor da paz social (resguardando liberdades negativas), para assumir uma feição positiva, na medida em que, gradativamente, foi incumbido da efetivação de prestações na área econômica e social, a exemplo da saúde, assistência e previdência social.

Esta nova fisionomia estatal, voltada à proteção do conteúdo mínimo essencial, para a garantia de existência digna ao cidadão, visa prevenir ou amenizar riscos sociais, como a velhice, o desemprego, a doença, a incapacidade para o trabalho, dentre outros. Destarte, na perspectiva de atender a estes eventos, surgiu a seguridade social.

Dentro do sistema securitário social coexistem dois subsistemas, um de natureza contributiva, composto pela revidência social, e outro de vertente não contributiva, integrado pela saúde e pela assistência social.

Ao que interessa ao objeto de estudo desta pesquisa está o primeiro subsistema, o da previdência social, dado ao fato de que as contribuições sociais vertidas para o fundo previdenciário propiciam a cobertura dos supramencionados riscos sociais, mediante a concessão de benefícios em dinheiro, para as hipóteses em que o contribuinte não possa mais exercer atividades laborativas, como ocorre com o benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, por exemplo.

Tal benefício está previsto no artigo 201, §7º, inciso I, da Constituição Federal[2](redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998), com previsão legal entre os artigos 52[3]a 56 da Lei nº 8.213/91, cuja regulamentação, por sua vez, coube ao Decreto nº 3.048/99, nos seus artigos 56[4]a 63. De outro lado, é imperioso observar que nenhum dos dispositivos normativos transcritos, mesmo após a alteração promovida pela citada Emenda Constitucional, exigiu como requisito para a obtenção do benefício previdenciário em espécie, o tempo mínimo de idade que deverá ter atingido o segurado, a fim de que possa se aposentar pelo tempo de contribuição.

Desta forma, cumprido somente o tempo de contribuição exigido, com a possibilidade de o contribuinte ingressar na inatividade remunerada mesmo antes de se enquadrar como pessoa idosa, pode o risco social a ser coberto por este benefício previdenciário, qual seja a velhice, não estar sendo alcançado de fato, conforme a exposição que segue adiante.


2 DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

Antes de enfrentar a problemática atinente à existência ou não de risco social, cumpre apresentar o objeto de estudo, qual seja a aposentadoria por tempo de contribuição.

2.1 Enquadramento Normativo

Nos termos do artigo 201, caput, da Constituição Federal, a Previdência Social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. “O Regime Geral de Previdência Social (RGPS) é o regime jurídico-previdenciário aplicável a todos os trabalhadores da iniciativa privada” (CUNHA JR., 2011, p. 1247).

No âmbito do aludido regime, ao lado de outros benefícios devidos ao contribuinte, em virtude de este ter alçado um patamar etário que não comporte mais o exercício de atividade remunerada, há o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição. Mencionado benefício, por conseguinte, anteriormente à reforma promovida pela Emenda Constitucional nº 20/98, era denominado de aposentadoria por tempo de serviço. Nomenclatura, aliás, que permaneceu inalterada em sede infraconstitucional, conforme expõe Amado (2012, p. 520):

O estudo da aposentadoria por tempo de contribuição deverá ser iniciado pelos dispositivos constitucionais, haja vista que vários artigos da Lei 8.213/91 não foram adaptados à primeira reforma constitucional previdenciária, a começar pelo título do benefício, que permanece como aposentadoria por tempo de serviço.

Referido benefício será devido ao homem e a mulher quando atingirem, respectivamente, 35 e 30 anos de contribuição, nos termos do já referido artigo 201, §7º, inciso I, da Carta Federal de 1988. Além disso, como condição sine qua non para obter o benefício, deverá o segurado verter para o sistema 180 (cento e oitenta) contribuições, a titulo de carência.

2.2 Implicações do Instituto no Fundo Previdenciário

Com a elevação da expectativa de vida da população brasileira, esta atualmente em 73,4 anos, de acordo com os dados do IBGE para 2010, o pretendido equilíbrio financeiro e atuarial do regime está ameaçado, já que mais pessoas ingressarão na inatividade mais cedo, inclusive com a possibilidade de passarem mais tempo recebendo o benefício previdenciário do que aquele em que verteram contribuições ao sistema.

Antevendo a problemática e buscando desestimular a antecipada aposentadoria, isso, porque “a inclusão do critério da idade mínima para a obtenção de todo e qualquer tipo de aposentadoria foi rejeitada no Congresso Nacional durante o processo de discussão da Reforma Previdenciária de 1998” (DIEESE, 2008, p. 02), o governo federal editou a Lei nº 9.876/99, instituindo o fator previdenciário, que, de forma sintética, pressupõe a aplicação de um índice sobre a média dos 80% maiores salários de contribuição do segurado. Todavia, mesmo em face da manobra indireta adotada, o legislador não conseguiu impedir que o benefício de aposentadoria fosse concedido antes de o segurado atingir a faixa etaria de idoso, permanecendo, assim, a problemática para o sistema.


3 DA AUSÊNCIA DE RISCO SOCIAL NA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO

Sendo a Previdência Social um subsistema da Seguridade Social, tem aquele a finalidade de proteção social dos sujeitos a ele filiados, objetivando cobrir os riscos sociais a que estes estão submetidos quando do exercício de suas atividades de labor. Para alcançar este objetivo, o Estado, conforme mencionado na introdução, despe-se da roupagem de apenas garantidor de direitos, para criar uma cadeia de benefícios apropriada a fazer frente às necessidades dos segurados. “Cada risco social considerado relevante deve ser contemplado com um benefício previdenciário que garanta a sua cobertura, ou seja, o sistema deve atuar na desordem social” (BALERA, 2003, p. 13).

Tendo em vista o fato de que a aposentadoria por tempo de contribuição não demanda idade mínima, a doutrina abalizada tece severas críticas sobre o instituto, sob o argumento de que “nessas aposentações precoces, prega-se que inexiste risco social a ser coberto, pois antes dos sessenta anos de idade o segurado ainda não é sequer considerado idoso” (AMADO, 2012, p. 438).

 Ora, “o fato de o segurado ter contribuído por determinado número de anos não pressupõe, necessariamente, que ele não tenha mais condições de exercer a sua atividade” (KERTZMAN, 2011, p. 382).

 Observe-se, inclusive, que no multicitado artigo 201 da Carta Magna[5], onde estão listados os riscos sociais a serem atendidos pela previdência social, não consta o tempo de contribuição como um risco social. Não obstante, é inquestionável a existência deste benefício previdenciário, conforme proclama o inciso I, do §7º, do mesmo dispositivo constitucional[6].

 Em um regime de previdência público, como é o caso do Brasil, em que prevalece o ideal de proteção social, diferentemente do que ocorre nos regimes privados de previdência, onde o indivíduo paga pensando, exclusivamente, em seu futuro, não se pode alçar à categoria de risco social o tempo de contribuição. Contribuição esta, aliás, que não é obrigatória pelo simples fato de possuir natureza jurídica de tributo, mas, como afirma Zambitte (2003, p. 16), em razão de que, nesta perspectiva

os segurados contribuem para os regimes públicos de previdência devido ao caráter compulsório do sistema, que objetiva combater a miopia individual (pouca importância dos mais jovens ao futuro) e a solidariedade previdenciária, garantidora do pagamento de benefícios mesmo àqueles com cotização insuficiente.

Diante da situação apresentada, vozes pregam a extinção do benefício previdenciário da aposentadoria por tempo de contribuição, a exemplo de Kertzman (2008, p. 14): “Acreditamos que a aposentadoria por tempo de contribuição não esteja alinhada aos objetivos da previdência social, não representando qualquer risco social para os cidadãos, e, por isso, deve ser expurgada do nosso subsistema de previdência social”.

De outra banda, há quem pregue uma alteração efetiva do benefício, como o faz Amado (2012, p. 851): “Entende-se que o melhor caminho é a instituição de idade mínima para a aposentadoria por tempo de contribuição (60 anos e 55 anos de idade para homens e mulheres, respectivamente), com a consequente extinção do fator previdenciário”.


4 CONCLUSÃO

A aposentadoria por tempo de contribuição, assim como os demais benefícios previdenciários, surgiu em face da nova fisionomia adotada pelo Estado moderno, que deixou de lado a vertente liberal e assumiu o compromisso de intervir na seara social, em especial mediante a seleção de riscos sociais relacionados ao exercício de trabalho remunerado, os quais são acobertados pela concessão de prestações em dinheiro.

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De outro lado, ao passo em que se instituíam medidas cada vez mais voltadas à proteção dos trabalhadores, permitiu-se que institutos diversos e não correspondentes a riscos sociais fizessem parte da estrutura do subsistema de previdência social, como é o caso do tempo de contribuição.

Observou-se, de início, que a tentativa de instituir uma idade mínima para a concessão do benefício aludido não logrou êxito, tendo sido adotadas medidas paliativas pelo governo, como é o caso do citado instituto do fator previdenciário, que, por sua vez, longe de solucionar a pendenga, apenas criou regras mais severas para evitar a aposentação precoce, tornando-se, assim, um mal necessário.

O que ficou claro é que, de todos os riscos sociais selecionados pelo legislador constituinte, o tempo de contribuição não encontra abrigo e nem similar, de modo que a aposentadoria por tempo de contribuição coloca em risco o sistema previdenciário nacional, dado ao fato de alongar o período de inatividade dos seus filiados, além de atentar contra o princípio da solidariedade social, este alçado à posição de princípio norteador de todo o sistema de seguridade social brasileiro estabelecido pela Constituição Federal de 1988.


REFERÊNCIAS

AMADO, Frederico. Direito e Processo Previdenciário Sistematizado. 3. ed. Salvador: Juspodivm, 2012.

BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 3. ed. São Paulo: LTr, 2003.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 23 out. 2012.

______. Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3048compilado.htm>. Acesso em: 23 out. 2012.

______. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8213compilado.htm>. Acesso em: 23 out. 2012.

______. Lei nº 9.876, de 26 de novembro de 1999. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9876.htm>. Acesso em: 27 out. 2012.

______. Lei 10.741, de 01 de outubro de 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/L10.741compilado.htm>. Acesso em: 27 out. 2012.

CUNHA JR., Dirley. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. Salvador: Juspodivm, 2011.

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 3. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2003.

KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdenciário. 8. ed. Salvador: Juspodivm, 2011.

______. O Fim da Aposentadoria por Tempo de Contribuição. Disponível em: <https://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:ImS0l3RntDwJ:www.grupos.com.br/group/posprevidenciario2/Messages.html%3Faction%3Ddownload%26year%3D09%26month%3D6%26id%3D1244384805983590%26attach%3DO%2BFim%2Bda%2BAposentadoria%2Bpor%2BTempo%2Bde%2BContribui%25E7%25E3o%2BFinal.doc+O+fim+da+Aposentadoria+por+Tempo+de+Contribui%C3%A7%C3%A3o+Ivan+Kertzman&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESiqVWKV7sPQm7BU1NZwEk6E

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0UPZdDWhxh3s69DcOrFK1wKgKxsFRe2QE1oP6JpzWi2ha&sig=AHIEtbSnPnfXCj88MRlqyzt-eeQC_iBsDw>. Acesso em: 31 out. 2012.


Notas

[2]Art. 201. (...)

§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:

I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;

[3] Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30 (trinta) anos, se do sexo masculino.

[4] Art. 56. A aposentadoria por tempo de contribuição será devida ao segurado após trinta e cinco anos de contribuição, se homem, ou trinta anos, se mulher, observado o disposto no art. 199-A.

[5] Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:

I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;

II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;

III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;

IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;

V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.

[6]§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:

I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;

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Sobre o autor
Antonio Braz Rolim FIlho

Servidor de Carreira do Ministério Público da Paraíba. Especialista em Direito Previdenciário pelas Faculdades Integradas de Patos - FIP. Professor da Graduação e da Pós-graduação em Direito da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Cajazeiras - FAFIC. Advogado. Articulista em Diversos periódicos nacionais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROLIM FILHO, Antonio Braz. A ausência de limite mínimo de idade como requisito à aposentadoria por tempo de contribuição e a não configuração de risco social. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4115, 7 out. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29757. Acesso em: 22 dez. 2024.

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