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Cavidades: conservação ou preservação?

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04/08/2014 às 12:22
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 9. Conclusão

Por todo o exposto, podemos concluir que:

1.            As cavidades e o patrimônio espeleológico são bens de natureza jurídica distinta e, por isso, com regimes de proteção distintos;

2.            As cavidades terão tratamento jurídico distinto de acordo com seu grau de relevância, sendo as medidas preservacionistas restritas às cavidades de máxima relevância;

3.            A metodologia de relevância criada pela IN MMA 02/09 possui uma série de ilegalidades em face do Decreto nº 6.640/08, em especial, por criar novas formas de proteção de áreas não previstas na legislação;

4.            As áreas de influência das cavidades ficam preservadas somente às cavidades de máxima relevância e seu dimensionamento depende de estudos técnicos específicos independentes da avaliação de relevância da cavidade;

5.            O licenciamento ambiental que envolva cavidades e regido pela Resolução CONAMA 347/04 precisa ser adequado conforme a relevância das cavidades envolvidas;

6.            A compensação espeleológica é uma medida compensatória sobre impactos ambientais irreversíveis sobre cavidades, podendo ser ordinária ou extraordinária, devendo ser determinada pelo órgão ambiental licenciador;

7.            A regulamentação da compensação espeleológica extraordinária encontra-se dissociada com a natureza negocial desse ato administrativo, e impõe exigências sem a devida fundamentação legal.

8.            A recente regulamentação das atribuições do IBAMA e ICMBio para licenciamentos e compensações espeleológicas deve ser referência para os demais órgãos licenciadores do SISNAMA.


10. Referências

GRAU, Eros Roberto. Direito, Conceitos e Normas Jurídicas, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1988, p. 61-67 in ROZAS, Luiza Barros. Conceitos jurídicos indeterminados e discricionariedade administrativa. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1123, 29 jul. 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8715>. Acesso em: 15 nov. 2013.

LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 32ª. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 86.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de.  Discricionariedade e Controle Jurisdicional, 2ª ed, São Paulo, Malheiros, 1993.

PLATÃO, A República. Trad. Enrico Corvisieri. São Paulo: Nova Cultural, 2004.


Notas

[1] O Mito da Caverna: Livro VII da “República” de Platão

[2] VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

[3] Destacamos que as preocupações que circundam atividades econômicas em cavernas motivou a edição da Resolução CONAMA 05/87, que tratou do Programa Nacional de Proteção ao Patrimônio Espeleológico”, norma  que recomendou que o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) providenciasse a inclusão, no Código de Mineração, de disposição para que os “sítios arqueológicos”, os “depósitos fossilíferos” e as “cavernas” fossem regidos por legislação específica, que não foi publicada até a presente data.

[4] Do mesmo modo não há lugar para confusão entre arqueologia, assim entendido o estudo das sociedades por intermédio de seus restos materiais, a paleontologia, que é o estudo dos organismos mortos, os fósseis, e a espeleologia, que tem por objeto de pesquisa as cavidades subterrâneas.

[5] A Portaria IBAMA nº 887, de 15 de julho de 1990 também trouxe um conceito legal para cavidades, mas consideramos essa norma sem eficácia após a edição da Resolução CONAMA 347/04 e do Decreto Federal nº 6.640/08.

[6] Art. 2º, inciso III da Resolução CONAMA Nº 347, de 10 de setembro de 2004.

[7] Art.3º, inciso V da Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981

[8] Microbem ambiental é todo e qualquer elemento constituinte e integrante do meio ambiente. Os microbens, ao interagirem, é que formam o meio ambiente e, consequentemente, o macrobem ambiental. Por serem individualmente considerados, muitos possuem tratamentos legislativos próprios, tornando-os verdadeiros bens ambientais individuais. .

[9] Vale as lições de José Rubens Morato Leite “Por outro lado, reafirma-se que o meio ambiente pode ter uma concepção de microbem, relativamente à propriedade e a outros interesses a esta subjacentes. Este bem pode pertencer ao setor público ou privado, inclusive à pessoa física ou jurídica” (LEITE, José Rubens Morato. Dano Ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial p. 236)

[10] O Supremo Tribunal Federal esclareceu essa questão através da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4.218-DF, requerida pela Procuradoria-Geral da República, em face do Decreto nº 6.640, de 7 de novembro de 2008, que altera o Decreto nº 99.556, de 1º de outubro de 1990, que dispõe sobre a proteção das cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional.

[11] Essa confusão de patrimônio espeleológico e patrimônio cultural foi normativamente esclarecida com a edição do Decreto nº 6.640/08.

[12] Nos termos do Artigo 5-B do Decreto Federal nº 99.556/90, caberá à União, por intermédio do IBAMA e do Instituto Chico Mendes, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, no exercício da competência comum a que se refere o art. 23 da Constituição, preservar, conservar, fiscalizar e controlar o uso do patrimônio espeleológico brasileiro, bem como fomentar levantamentos, estudos e pesquisas que possibilitem ampliar o conhecimento sobre as cavidades naturais subterrâneas existentes no território nacional.

[13] Vide o Art. 18 da IN MMA 02/09 que determina:  “Constatada a presença de agentes patogênicos e vetores de doença nas cavidades estudadas, o fato deverá ser informado às autoridades de saúde pública.”

[14] § 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.

[15] Interessante destacar que os sítios arqueológicos denominados de abrigos sob rocha,  previstos no artigo 2º da Lei nº 3.924, de 26 de julho de 1961, não são definidos como cavidades nos termos do Decreto 99.556/90, sendo aqueles protegidos pelo IPHAN e essas pelas autoridades ambientais.

[16] Ecossistemas como Mata Atlântica, Zona Costeira e Pantanal Matogrosense.

[17] Art. 5º A metodologia para a classificação do grau de relevância das cavidades naturais subterrâneas, considerando o disposto no art. 2o, será estabelecida em ato normativo do Ministro de Estado do Meio Ambiente, ouvidos o Instituto Chico Mendes, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA e demais setores governamentais afetos ao tema, no prazo de sessenta dias, contados da data de publicação deste Decreto.

[18] Art. 2º caput do Decreto nº 99.556/90.

[19] Adotamos nesse artigo as premissas de conservação e preservação definidas pela Lei Federal nº 9.985/00, conforme o artigo 2º, inciso II - conservação da natureza: o manejo do uso humano da natureza, compreendendo a preservação, a manutenção, a utilização sustentável, a restauração e a recuperação do ambiente natural, para que possa produzir o maior benefício, em bases sustentáveis, às atuais gerações, mantendo seu potencial de satisfazer as necessidades e aspirações das gerações futuras, e garantindo a sobrevivência dos seres vivos em geral.

[20] Art. 3º  A cavidade natural subterrânea com grau de relevância máximo e sua área de influência não podem ser objeto de impactos negativos irreversíveis, sendo que sua utilização deve fazer-se somente dentro de condições que assegurem sua integridade física e a manutenção do seu equilíbrio ecológico.

[21] Art. 4º  A cavidade natural subterrânea classificada com grau de relevância alto, médio ou baixo poderá ser objeto de impactos negativos irreversíveis, mediante licenciamento ambiental.

[22] § 4º  Entende-se por cavidade natural subterrânea com grau de relevância máximo aquela que possui pelo menos um dos atributos listados abaixo:

I - gênese única ou rara;

II - morfologia única;

III - dimensões notáveis em extensão, área ou volume;

IV - espeleotemas únicos; V - isolamento geográficoVI - abrigo essencial para a preservação de populações geneticamente viáveis de espécies animais em risco de extinção, constantes de listas oficiais;

VII - hábitat essencial para preservação de populações geneticamente viáveis de espécies de troglóbios endêmicos ou relíctosVIII - hábitat de troglóbio raro;

IX - interações ecológicas únicas;

X - cavidade testemunho; ou

XI - destacada relevância histórico-cultural ou religiosa.

[23] Art.2º, §2º do Decreto 99.556/90.

[24] § 9º  Diante de fatos novos, comprovados por estudos técnico-científicos, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes poderá rever a classificação do grau de relevância de cavidade natural subterrânea, tanto para nível superior quanto inferior.

[25] Art. 13.  Os empreendimentos e atividades são licenciados ou autorizados, ambientalmente, por um único ente federativo, em conformidade com as atribuições estabelecidas nos termos desta Lei Complementar.

[26] Para execução de tal tarefa, foram convidados cinqüenta e dois profissionais e pesquisadores pertencentes a quinze instituições, entre elas Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ministério das Minas e Energia (MME), Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (IPHAN), Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), Instituto Carste, Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Universidades, entre outras. Nos dias 26 e 27 de janeiro de 2009, foi realizada uma oficina técnico- participativa quando estes profissionais reuniram-se em Brasília para iniciarem uma discussão a respeito do tema “metodologia para classificação do grau de relevância de cavidades naturais subterrâneas.” Além desta oficina, foram realizadas sete entrevistas direcionadas para o levantamento de informações e detalhamento das propostas. O CECAV realizou ainda quatro reuniões temáticas (aspectos bióticos, abióticos, jurídicos e sócio-econômicos) com especialistas para resolução de dúvidas e consolidação final do documento. Após este processo de construção conjunta, ocorreu em 17 de março de 2009 uma reunião final com a apresentação e avaliação da proposta metodológica. (http://www.icmbio.gov.br/cecav/cavidades-naturais-subterraneas/grau-de-relevancia.html)

[27] Constituição Federal, Art. 225 , §1º, inciso IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

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[28] Art. 7° Para efeito de classificação do grau de relevância de uma cavidade serão considerados de importância acentuada, sob enfoque local e regional, os atributos com pelo menos uma das seguintes configurações:

 III - Presença de táxons novos;

[29] Art. 17. O atributo referente à destacada relevância histórico-cultural ou religiosa de uma cavidade, previsto no inciso XI do § 4º do art. 2º  do Decreto no 99.556, de 1990, será objeto de avaliação pelo órgão competente.

[30] Esse comitê foi criado por meio da Portaria ICMBio nº 636, de 22 de Dezembro de 2010, publicada no Diário Oficial da União de 23 de dezembro de 2010.

[31] Esta revisão está a cargo de Comitê Técnico Consultivo criado pela Portaria ICMBIO 32/2012.

[32] Art. 3º  A cavidade natural subterrânea com grau de relevância máximo e sua área de influência não podem ser objeto de impactos negativos irreversíveis, sendo que sua utilização deve fazer-se somente dentro de condições que assegurem sua integridade física e a manutenção do seu equilíbrio ecológico.

[33] Art. 4º A cavidade natural subterrânea classificada com grau de relevância alto, médio ou baixo poderá ser objeto de impactos negativos irreversíveis, mediante licenciamento ambiental.

[34] As competências de licenciamento e autorizações sobre cavidades seguem os parâmetros da Lei Complementar 140/11, não havendo que se presumir como competência própria da União. Para melhor conhecimento, indicamos a jurisprudência do Processo nº 24374-44.2012.4.01.3800 em curso na 20ª Vara da Seção Judiciária de Minas Gerais.

[35] § 2º A área de influência sobre o patrimônio espeleológico será definida pelo órgão ambiental competente que poderá, para tanto, exigir estudos específicos, às expensas do empreendedor.

[36] § 3º Até que se efetive o previsto no parágrafo anterior, a área de influência das cavidades naturais subterrâneas será a projeção horizontal da caverna acrescida de um entorno de duzentos e cinqüenta metros, em forma de poligonal convexa.

[37] Art. 1o  Fica criado o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes, autarquia federal dotada de personalidade jurídica de direito público, autonomia administrativa e financeira, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de:

(...);

IV - exercer o poder de polícia ambiental para a proteção das unidades de conservação instituídas pela União;

[38] Art. 8º Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades considerados efetiva ou potencialmente causadores de significativa alteração e degradação do patrimônio espeleológico, para os quais se exija Estudo Prévio de Impacto Ambiental-EIA e respectivo Relatório de Impacto Ambiental ao Meio Ambiente-RIMA, o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e a manutenção de unidade de conservação, de acordo com o previsto no art. 36 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000.

[39] § 1o O IBAMA fará a avaliação definitiva da classificação do grau de relevância de cavidades naturais observadas as condicionantes específicas indicadas pelo Instituto Chico Mendes no âmbito da autorização para o licenciamento ambiental da atividade ou empreendimento.

[40] Artigo 4º, §1º e 2º do  Decreto nº 99.556/90.

[41] Artigo 4º, §3º do  Decreto nº 99.556/90.

[42] Parágrafo único do art. 12 da Portaria MMA nº 55/2014.

[43] Art. 12 da Portaria MMA nº 55/2014.

[44] Art. 13. O Instituto Chico Mendes definirá, em conjunto com o empreendedor, as outras formas de compensação, nos termos do § 3o do art. 4o do Decreto no 99.556, de 1990, com a redação dada pelo Decreto no 6.640, de 2008, e as informará ao IBAMA para elaboração de condicionante do licenciamento ambiental, no prazo de até 60 (sessenta) dias contados do recebimento das propostas de compensação.

[45] §4º do Artigo 4º da IN ICMBio 30, de 19 de setembro de 2012.

[46] (GRAU, Eros Roberto, Direito, Conceitos e Normas Jurídicas, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1988, p. 61-67 in  ROZAS, Luiza Barros. Conceitos jurídicos indeterminados e discricionariedade administrativa. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1123, 29 jul. 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/8715>. Acesso em: 15 nov. 2013.

[47] Discricionariedade e Controle Jurisdicional, 2ª ed, São Paulo, Malheiros, 1993, p. 29

[48] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo brasileiro. 32ª. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 86.

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Sobre o autor
Pedro Campany Ferraz

Advogado Especialista em Meio Ambiente e Regulatório. Mestre em Direito da Cidade pela UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Professor Universitário de diversos cursos de pós-graduação.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERRAZ, Pedro Campany. Cavidades: conservação ou preservação?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4051, 4 ago. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30576. Acesso em: 20 abr. 2024.

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