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Dignidade da pessoa humana, presunção de inocência e liberdade de expressão.

Efetivação da garantia constitucional e combate à estigmatização precoce do acusado

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03/03/2015 às 09:52
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não se pode afirmar, indiscriminadamente, que toda e qualquer atividade midiática que relacione-se a matéria criminal tenha cunho violador da presunção de inocência, da honra, intimidade ou à vida privada do acusado. Todavia, deve ser inadmissível, ao extremo, a exposição que concretize a condição de culpado do acusado, ao configurar abuso no exercício da liberdade de expressão e informação.

Deveras temerária, essa atuação sensacionalista da mídia é uma forma inconstitucional e disfarçada de se executar penas sem qualquer processo ou condenação. A cobertura da mídia em cima do fato criminoso e a forma de proceder dos veículos de comunicação promove uma ilegal e antecipada sentença condenatória do acusado.

Antes mesmo da instauração do devido processo legal, do exercício do contraditório e da ampla defesa, e do trânsito em julgado de uma sentença condenatória, o acusado já começa a cumprir a sua pena. Já foi execrado publicamente, teve sua intimidade e sua honra violados, foi estigmatizado, e, principalmente, teve seu direito a ser presumido inocente completamente rasgado. Ainda que absolvido, não há nada a recuperar. Ainda que condenado, não há mais o que ressocializar.

As consequências sobre a pessoa comum que é vítima de uma exacerbada atenção jornalística são, sem sobra de dúvidas, devastadores, pois essa repentina condição de “celebridade” afeta negativamente seu espírito, prejudica sua credibilidade e confiança, transforma seus familiares em alvos de humilhação e chacota, dentre vários outros óbvios motivos.

Tal situação fere de morte o ideal humanitários inscrito no preceito de presunção de inocência, assegurado após árdua batalha, tudo por se priorizar um anseio social de ser ver condenados bodes expiatórios escolhidos a dedo. Injustiças desse porte, ainda que reconhecidamente comprovadas, geram consequências de difícil reparação.

Nunca é demais dizer que a Constituição Federal garante ao mesmo tempo o direito à liberdade de expressão e de informação e o direito à presunção de inocência. Assim como a presunção de inocência tem suas limitações, ante à possibilidade de decretação de uma segregação cautelar, a liberdade de expressão e de informação também as deve ter. Informar e noticiar exigem seria responsabilidade.

E, como já exposto, o princípio da presunção de inocência impõe não só aos atores necessariamente envolvidos no processo penal – delegados de polícia, advogados, promotores, magistrados – como à própria mídia que nele interfere, o dever e obrigação de respeitar os direitos e garantias fundamentais já mencionados – a imagem do indivíduo, sua honra, intimidade e vida privada –, evitando-se, de qualquer forma, um julgamento fora do devido processo penal democrático, pois referido princípio a todos vincula.


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SOUZA, Artur César de. A decisão do juiz e a influência da mídia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Almeidinha. Dignidade da pessoa humana, presunção de inocência e liberdade de expressão.: Efetivação da garantia constitucional e combate à estigmatização precoce do acusado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4262, 3 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31266. Acesso em: 2 mai. 2024.

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