Os efeitos práticos da desaposentação no ordenamento jurídico brasileiro

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30/08/2014 às 14:38
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4 DESAPOSENTAÇÃO

Atualmente, o anseio pela desaposentação é notório no tocante aos servidores que continuam exercendo atividade empregatícia, com a finalidade de aumentar os proventos da aposentadoria, não podendo ser entendido de forma prática o pedido de desaposentação como forma ardilosa de burlar a incidência do fator previdenciário.

A desaposentação enquanto instituto surgiu para melhor regulamentar as demandas acendidas no campo do Direito Previdenciário, visando consolidar a justiça social e o bem-estar garantidos na Constituição Federal, funcionando como mecanismo fundamental à essa efetivação. Sobre o tema, Zambitte dispõe:

A desaposentação então, como conhecida no meio previdenciário, traduz-se na possibilidade do segurado renunciar à aposentadoria com o propósito de obter benefício mais vantajoso, no regime geral de previdência social ou em regime próprio de previdência, mediante a utilização de seu tempo de contribuição. O presente instituto é utilizado colimando a melhoria do status financeiro do aposentado. [12]

Esse fenômeno representa a abdicação das mensalidades percebidas da aposentadoria do contribuinte, continuando, entretanto, incólume o direito à aposentadoria. Baseia-se, de forma simples, na prática de utilização do tempo de contribuição da aposentadoria anterior para a posteridade, quando do recebimento de uma nova aposentadoria, desde que o segurado continue trabalhando, em outro regime previdenciário ou no mesmo do benefício anterior.

Excluindo a aposentadoria por invalidez, todas as demais modalidades de aposentadoria são passíveis de que o segurado possa continuar exercendo sua atividade empregatícia. Prova disso é o que vem exposto na Lei 8.213/91 a respeito da aposentadoria por idade, onde essa lei destrincha esse empecilho magistralmente:

Art.49. A aposentadoria por idade será devida:

I – ao segurado empregado, inclusive o doméstico, a partir:

1. de data do desligamento do emprego quando requerida até essa data ou até 90 (noventa) dias depois dela; ou

2. da data do requerimento quando não houver desligamento do emprego ou quando for requerido após o prazo previsto na alínea a;

II – para os demais segurados, da data da entrada do requerimento.

Com relação a essa questão, o STF declarou a inconstitucionalidade da cláusula existente no contrato de trabalho que previa o desligamento do segurado quando feito o requerimento de aposentadoria voluntária do mesmo, com respaldo nos parágrafos 1º e 2º do art. 453 da CLT, como já foi visto anteriormente. A desaposentação conceituada por Castro e Lazzari (2000, p. 488):

O ato de desfazimento da aposentadoria por vontade do titular, para fins do tempo de filiação em contagem para nova aposentadoria, no mesmo ou em outro regime previenciário.[13]

É de fundamental importância esclarecer que, não há impedimento jurídico que vede ao segurado desaposentar num ente federativo e se aposentar em outro ente federativo, uma vez que se promova o acerto de contas entre os dois RPPS, de acordo com Martinez[14]. Não é anulada, também, a hipótese de migração de um sistema para outro, como do RGPS para o RPPS e vice-versa. Ibrahim (2007, p. 35) sugere como objetivo principal para o ato de desaposentar:

Liberar o tempo de contribuição utilizado para aquisição da aposentação, de modo que este fique livre e desimpedido para averbação em outro regime ou mesmo para novo benefício no mesmo sistema previdenciário, quando o segurado tem tempo de contribuição posterior à aposentação, em virtude de continuidade laborativa.[15]

Ademais, a desaposentação caracteriza-se pelo ato de cancelar a primeira aposentadoria, sem renunciar com isso o tempo de contribuição usado para obter esse primeiro benefício, de um modo que venha a somar essas contribuições já contabilizadas com às novas, para que dessa junção encaminhe-se nova aposentadoria com valor financeiro superior à antiga.

4.1 PONTOS CONTROVERSOS

Atualmente, apesar da corrente favorável á desaposentação ser majoritária, ainda existem pontos não pacíficos sobre esse instituto dentro do ordenamento jurídico pátrio. São discutidas, de forma veemente, questões técnicas quanto ao alcance e ao limite desse direito, sobre as restrições, e principal e fervorosamente, quanto ao equilíbrio atuarial e financeiro que envolve os regimes previdenciários brasileiros.

Há duas formas de ensejo à desaposentação dentro do Regime Geral da Previdência Social e que se faz necessária a explicação de cada uma delas. A primeira diz respeito a possibilidade de aposentar-se proporcionalmente ao tempo de contribuição, onde o coeficiente de cálculo chega aos 70% do salário-benefício. Destaca-se que nesses casos, com o passar dos anos, as chances de se conseguir uma aposentadoria integral aumentam, visto que, esse valor é calculado sobre o valor integral do salário-benefício em conjunto com o fator previdenciário.

A segunda possibilidade de desaposentação dentro do RGPS dar-se-á através do fato mais característico ligado a esse instituto, que é o de o segurado aposentado continuar em sua atividade laboral ao longo dos anos e incidir em posterior fator previdenciário com maiores vantagens.

A renúncia que é citada quando a desaposentação é referida não enquadra-se na renúncia do direito adquirido quanto à aposentadoria, uma vez que esse direito é irrenunciável. O direito renunciado para que se possa desaposentar é o direito de receber as prestações mensais.

Martinez sustenta a ideia de que a desaposentação é a modalidade de desfazimento da aposentação, ou seja, desconstituição do estado jurídico de jubilado, retornando a pessoa à condição de não aposentado. O que pode vir a satisfazer aqueles que desejarem não mais estarem aposentados.[16] Nesses termos, desaposentar incidirá diretamente na renúncia de quem já aposentou, no mais comum dos casos (não o único), essa renúncia objetivará uma nova e melhor aposentação.

Ao segurado é resguardado o direito de desfazer-se de sua condição de aposentado no estado em que se encontra, para que possa pleitear nova condição jurídica de aposentação, de acordo com sua nova situação empregatícia, sem que a tutela a esse direito enseje em desrespeito a solidez dos princípios que regem a Previdência Social no Brasil.

Os dois tipos de situações mais comuns quanto a desencadear controvérsias e desacordos no tocante à desaposentação e que já foram mencionados anteriormente, referem-se a diminuição do fator previdenciário quando atrelado à progressão da idade do segurado, e também, quando a aposentadoria proporcional transforma-se em aposentadoria especial.

O fator previdenciário atua nessas questões quando, através de novo cálculo, a idade mais avançada e a menor expectativa de vida do segurado adicionada ao maior tempo de contribuição darão vazão a uma vantagem salarial, o que fará com que a Renda Mensal de Benefício do segurado desaposentado aumente.

A legislação brasileira não veda a desaposentação, também não regulamenta ou prevê esse instituto, que é visto como fenômeno controverso dentro e fora dos parâmetros previdenciários arguidos com solidez pela sociedade brasileira e toda a entidade jurídica nacional. Com veemência Zambitte afirma que a vedação à desaposentação deveria constar de Lei, e não havendo proibição direta e não contrariando leis e princípios, seria plenamente possível (2007, p. 66). A ausência de uma previsão legal que regulamente a desaposentação dificulta a análise da mesma, como aponta Marisa Ferreira dos Santos[17]. O princípio da legalidade, garantia fundamental, faz alusão exatamente a essa questão:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Hely Meirelles (2004, p. 88) explana, de forma sucinta, dois aspectos importantes para compreensão desse princípio, principalmente quando invocado na esfera previdenciária:

Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “pode fazer assim”, para o administrador público “deve fazer assim”.

Assim, quanto ao princípio da legalidade atuante na Administração Pública, o faz de acordo com o que dispuser a lei. Como não há empecilho ao ato de desaposentar dentro do ordenamento jurídico pátrio, a autorização para concretização do mesmo é presumida, visto que não consta proibição legal da mesma. Além de evocar o princípio da legalidade, Zambitte[18] alega que a não observância desse quesito na questão da desaposentação fere bruscamente a outro princípio constitucional, quando explica o seguinte:

Não se pode alegar ausência de previsão legal para o exercício das prerrogativas inerentes à liberdade da pessoa humana, pois cabe a esta, desde que perfeitamente capaz, julgar a condição mais adequada para sua vida, de ativo ou inativo, aposentado ou não aposentado. O princípio da dignidade da pessoa humana repulsa tamanha falta de bom senso, sendo por si só fundamento para a reversibilidade plena do benefício.

Ambos, defensores e opositores da desaposentação, fazem uso do princípio da legalidade como argumento. Para os que a admitem, com a aplicação desse princípio vem também a garantia dado ao segurado de realizar, a seu tempo e a seu modo, tudo o que a lei não coibir. Para os que são contrários a desaposentação, a inexistência de lei regulamentando impossibilita a concessão, visto que necessita de condição devidamente expressa em lei.

Segundo o entendimento do INSS renunciar a aposentadoria é impossível, visto que não existe previsão legal. Só existirá cessação do benefício com a morte do segurado ou quando essa concessão é fraudulenta. Assim, a única forma de conseguir desaposentar é por vias judiciais. Por vias administrativas é possível, apenas, renunciar ao benefício, antes mesmo até de ter recebido o primeiro pagamento do mesmo. Lembrando que direito renunciado é o direito à remuneração, não o tempo de contribuição do segurado.

O INSS refuta ainda que esse tipo de renúncia seja ilegítimo aos olhos da lei, alegando que a aposentadoria sendo ato jurídico perfeito, os princípios da segurança jurídica e da razoabilidade serão postos de lado ao renunciar o benefício, citando o artigo 181-B do Regulamento da Previdência Social, que prevê:

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(...) as aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela previdência social, na forma deste Regulamento, são irreversíveis e irrenunciáveis.

No entanto, partindo da premissa que o instrumento legal que caracteriza o decreto não é usado para os fins acima citados, o Poder Executivo não tem legitimidade suficiente para tornar um direito disponível ou não. Wladimir Novaes Martinez, de maneira simples e eficaz, desfaz o argumento sobre irrenunciabilidade da aposentadoria quando preceitua:

(...) a renúncia não põe fim ao direito à prestação, apenas suspende seu exercício como direito. Ela continuará produzindo efeitos jurídicos (o que é exatamente o que deseja o titular), entre os quais o seu arrependimento.[19]

Nesse sentido, a desaposentação surgiria como uma renúncia específica a aposentadoria, sem que renunciar implique diretamente na perda do direito de se aposentar. É como se o exercício desse direito ficasse suspenso temporariamente, para que venha a ser pleiteado posteriormente, caracterizando especificamente uma nova aposentação.

A desaposentação em si visa apenas desconstituir o ato administrativo que concedeu a primeira aposentadoria, vindo a cancelar o recebimento mensal das prestações decorrentes da mesma. Existe ainda, outro ponto bastante controverso no tocante à desaposentação. O art.18, §2º da Lei 8.213/91 consegue criar discussões relevantes a respeito, como se vê:

O aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado.[20]

Quanto a essa questão, indaga-se que, por existir previsão legal que dispunha claramente sobre quais tipos de benefícios o aposentado que retorna ou continua exercendo atividade laboral tem direito, subentende-se que renunciar a aposentadoria concedida a fim de requerer nova aposentadoria mais vantajosa não encaixa-se nos parâmetros, já que foram citados apenas o direito ao salário família e à reabilitação.

No entanto, o que se faz necessário entender é que, não houve intenção de vetar a possibilidade de renúncia a aposentadoria que daria vazão a desaposentação. O legislador, não neste caso e em nenhum outro dentro do ordenamento jurídico pátrio, fez alusão á vedação ou impedimento expresso da ocorrência desse fenômeno, fazendo com que exista real viabilização de acontecer, respeitando o que prega o princípio da legalidade.

Nesse aspecto entra em cena também a proibição acerca do recebimento de mais de uma aposentadoria, devidamente expressa no art.124, II da mesma Lei 8.213/90. Algumas opiniões contrárias ao tema defendem que a aceitação da desaposentação daria ensejo a uma derrocada do que vem exposto nesse dispositivo legal. Segue observação pertinente do advogado Júlio José Araújo Júnior:

A suposta proibição decorrente de previsão contida em decreto regulamentar (art. 181-B Dec. 3.048/99) não pode ser encarada como restrição a tal instituto, uma vez que o ato infralegal extrapola sua órbita de incidência ao pretender inovar no ordenamento,  prevendo norma não contida na Lei 8.213/91.[21]

Logo, fica entendido que, a desaposentação não traz consigo nenhum desrespeito à regra que veda a percepção de dois benefícios simultaneamente. Daí, essa norma serviria como impedimento para o segurado usufruir de artifícios ilícitos com relação às novas contribuições vertidas. Porém, para que o segurado possa desaposentar, o mesmo teria que renunciar ao vínculo previamente estabelecido, ou seja, para tanto, o aposentado teria que renunciar à sua primeira aposentadoria, podendo pleitear uma nova, seguindo devidamente os requisitos legais exigidos.

Existe decisão recente e esclarecedora do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, na data de 7 de maio de 2013, favorável á desaposentação, onde, segundo entendimento pacificado em nossos Tribunais, fundado na ausência de vedação no ordenamento jurídico brasileiro, ao segurado é conferida a possibilidade de renunciar á aposentadoria recebida, haja vista tratar-se de um direito patrimonial de caráter disponível, não podendo a instituição previdenciária oferecer resistência a tal ato para compeli-lo a continuar aposentado, visto carecer de interesse.[22]

Há grande divergência doutrinária quanto á devolução de valores já recebidos por parte do segurado desaposentado. A viabilidade atuarial nesse aspecto é levada em conta, visto que, o equilíbrio financeiro do sistema previdenciário brasileiro estaria em risco. A corrente doutrinária pungente ao ressarcimento desses valores acredita que a renúncia presumida à desaposentação requer o retorno ao status quo ante, ou seja, para que o segurado consiga deixar de ser aposentado ele precisa voltar ao estado em que se encontrava anteriormente a aposentação e para tanto, a devolução das parcelas é condição inerente ao desfazimento do ato jurídico perfeito, ora seja o ato concessivo da aposentadoria. Martinez (2009, 61) é favorável a esse pensamento quando afirma:

Olvidando-se o regime financeiro de repartição simples, que permeia o RGPS e o RPPS, de regra, para que a desaposentação seja sustentável do ponto de vista técnico do seguro social e atenda aos seus objetivos, é imprescindível o restabelecimento do status quo ante. De modo geral, não subsiste esse efeito gratuitamente; a relação jurídica aí presente não prescinde de fundamentos econômicos, financeiros e atuários de um plano de benefícios. Ainda que seja um seguro solidário, pensando-se individualmente se a Previdência Social aposenta o segurado, ela se serve de reservas técnicas acumuladas pelos trabalhadores, entre as quais as do próprio titular do direito ao benefício.[23]

Nesse diapasão, vale recordar que a aposentadoria possui natureza alimentar, o que por si só descaracterizaria de forma contundente o argumento sobre a devolução das parcelas recebidas. Essa restituição só poderia ser justificada, caso houvesse algum tipo de irregularidade, seja no ato de concessão do benefício, seja no recebimento, contando que tenha ocorrido situação que caracterize fraude. Além disso, a reversibilidade da aposentação possui efeitos ex nunc, o que em outras palavras, significa que os efeitos advindos do ato de desaposentar só ocorrerão a partir do momento em que ocorrida, como Ibrahim (2007, p. 61) sabiamente conduz:

A desaposentação não se confunde com a anulação do ato concessivo do benefício, por isso não há que se falar em efeito retroativo do mesmo, cabendo tão somente sua eficácia ex nunc. A exigência da restituição de valores recebidos dentro do mesmo regime previdenciário implica obrigação desarrazoada, pois se assemelha ao tratamento dado em caso de ilegalidade na obtenção da prestação previdenciária.

Ibrahim defende ainda que a desaposentação não afeta o equilíbrio atuarial preexistente, visto que, num sistema onde o pacto intergeracional de repartição simples é prevalente, a população economicamente ativa sustenta os benefícios dos inativos para que ocorra uma perpetuidade desse ciclo, como já fora explicado neste trabalho anteriormente. Desse modo, as contribuições são desvinculadas da cota real que o segurado receberá ao se aposentar.

O entendimento do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em 13 de março de 2013, esclarece, pertinentemente, à devolução dos valores já recebidos como injustificada, visto que, “O ato de renunciar a aposentadoria tem efeito ex nunc e não gera o dever de devolver valores, pois, enquanto perdurou a aposentadoria pelo regime geral, os pagamentos, de natureza alimentar, eram indiscutivelmente devidos (REsp 692628/DF, Ministro Nilson Naves, Sexta Turma, DJ 05.09.2005), não havendo que se falar, portanto, em violação do disposto no art. 96, III, da Lei 8.213/91.”[24] Para execrar de vez essa hipótese de devolução de valores, na data de 21 de maio de 2013, o STJ julgou como sendo desnecessária essa devolução:

(...) 3. Hipótese em que a Turma aplicou o entendimento reafirmado pela Primeira Seção, sob o regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008, de que "os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, prescindindo-se da devolução dos valores recebidos da aposentadoria a que o segurado deseja preterir para a concessão de novo e posterior jubilamento" (RESP 1.334.488/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, pendente de publicação). 4. Ressalva de meu entendimento divergente quanto à devolução dos valores da aposentadoria renunciada, esposado pormenorizadamente no Recurso Especial representativo da controvérsia precitado. (...)[25]

O STJ, ainda nessa mesma decisão, predispôs a decisão final da incursão da desaposentação no ordenamento jurídico através do julgamento de Recurso Extraordinário impetrado pelo INSS ás vistas do STF, como segue adiante:

(...) 5. A pendência de julgamento, no Supremo Tribunal Federal, de Recurso Extraordinário submetido ao rito do art. 543-B do CPC não enseja sobrestamento dos Recursos Especiais que tramitam no STJ. Nesse sentido: EDcl no REsp 1.336.703/PR, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 9.4.2013; AgRg no AREsp 201.794/DF, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 11.4.2013. 6. Não compete ao STJ, em julgamento de Recurso Especial e para fins de prequestionamento, apreciar alegação de afronta a dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do STF (art. 102, III, da CF/1988).[26]

Existem críticas pertinentes quanto a quantidade de vezes que o segurado pode requerer a desaposentação. Esse quesito, dependendo do número de vezes que for concedido, pode vir a gerar insegurança jurídica, o que chegaria a causar desordem ao âmbito jurídico e administrativo da questão. É possível prever que essa pretensão venha a existir variadas vezes, sempre que a situação do titular do benefício se modificar, seja em face de cumpridos novos requisitos legais, seja por meio de alcançar idade mais avançada.

A doutrina majoritária, dentre eles Zambitte, Martinez e Kertzman, apontam que a reedição desse pedido de desaposentação reiteradas vezes gerará elevados custos administrativos aos cofres públicos, além de prejudicar a celeridade do sistema em si. Para que essa questão não venha a amadurecer e, consequentemente, gerar danos mais profundos, fica proposto ao legislador ordinário prever os critérios de desaposentação, dentre eles a periodicidade mínima entre os pedidos, ou ainda um recálculo automático do benefício dos segurados que já possuem tempo de jubilamento e continuam inseridos no mercado de trabalho, como aponta Fábio Zambitte Ibrahim.

Há que se mencionar aqui a importância do princípio tempus regit actum, visto que a legislação que rege o benefício previdenciário é a legislação vigente à época do jubilamento, ou seja, a data que contará será àquela da contingência geradora da necessidade devidamente acobertada pela seguridade social, como bem explica Marisa Ferreira dos Santos [27]. A desaposentação trará consigo uma nova situação jurídica, que deverá ser regida pelas normas vigentes da época. Para o Direito Previdenciário, a norma vigente aplicada será aquela em tempo que se possam reunir todos os requisitos necessários para obtenção do benefício.

A divergência encontrada aqui é que, a desaposentação poderia ser usada como subterfúgio para que a legislação mais benéfica possa ser aplicada, havendo violação do princípio da isonomia, posto que, os que continuaram trabalhando e, por conseguinte, continuaram contribuindo até que obtidos requisitos legais exigidos para aposentadoria integral ou, ainda, para se obter fator previdenciário mais benéfico, tecnicamente seriam prejudicados, pois, dessa forma, receberiam menor valor se comparados com os que conseguiram desaposentar. Contudo, o enquadramento legal da nova aposentadoria concedida deverá, sob nenhuma forma de fugir a regra, respeitar a lei vigente, onde mais uma vez Zambitte explica:

Qualquer tentativa de incrementar o benefício já vigente com contribuições a posteriori, dentro da mesma regra legal, ainda que posteriormente alterada ou revogada, implicaria reconhecer-se direito adquirido a regime jurídico passado, o que é naturalmente inaceitável. [28]

Dessa forma, não poderá o segurado demandar do sistema o enquadramento de seu tempo total de contribuição antes e após a jubilação no regramento legal vigente à época da aposentação. Zambitte ainda arremata, ao afirmar que a desaposentação não garante direito adquirido ao regime jurídico vigente no que se refere à aposentadoria renunciada.

4.2 PROJETOS DE LEI REFERENTES AO TEMA

É inegável que a alavanca impulsionadora da inserção e adequação da desaposentação sob o Direito brasileiro, visando uma melhor compreensão desse instituto, de todos os seus limites e nuances surgiu a partir da doutrina. As primeiras idealizações, até mesmo a denominação, bem como os trâmites científicos desse fenômeno foram tomando forma a partir de reflexões doutrinárias acerca do referido tema. O advogado prevideciarista Wladimir Novaes Martinez é o exemplo mais claro de abertura do mundo jurídico para esse instituto, quando pioneiramente atribuiu o neologismo “desaposentação” para caracterizar o fenômeno:

Com efeito, pelo que sabemos, fomos os primeiros a considerar a hipótese da desaposentação no Brasil, ou, pelo menos, ter publicado os primeiros trabalhos sobre o assunto, criando o neologismo desaposentação, que se refere à revisão do ato de aposentação, cujo objeto é a aposentadoria.[29]

Nesses termos, a discussão sobre essa nova vertente passou a integrar a zona jurisprudencial, passando a ocorrer também dentro dos tribunais. A falta de uma legislação que disciplinasse o assunto foi sendo percebida cada vez mais, e essa lacuna passou a ensejar uma demanda de Projetos de Lei no Congresso a fim de que houvesse uma solução convergente e aceita de forma unânime para a desaposentação. Exemplo disso é o PL nº 1168/2011, que propõe em seu texto o acréscimo da possibilidade expressa da renúncia a aposentadoria no ordenamento jurídico pátrio. A redação proposta pelo PL molda-se da seguinte forma:

Não havendo vedação constitucional ou legal, a renúncia do benefício previdenciário é possível na aposentadoria, por ser este um direito patrimonial disponível. A renúncia é possível, vez que é para se alcançar situação mais favorável ao Segurado.

Um dos principais projetos de lei existentes e que ainda tramitam com caráter prioritário na Câmara dos Deputados é o PL 2.567/2011, que tem como autor o Senador Rodrigo Rollemberg, PSB/DF. O objetivo primordial desse PL é a alteração do dispositivo legal §2º do artigo 18 da Lei 8.213/91, supramencionado neste trabalho. Essa modificação visa ampliar os benefícios previdenciários de quem retorna ou continua a trabalhar mesmo depois se aposentar-se, como se vê:

O aposentado pelo Regime Geral da Previdência Social que permanecer em atividade sujeita a esse regime, ou a ele retornar, fará jus aos seguintes benefícios da Previdência Social, em decorrência do exercício dessa atividade: auxílio-doença, salário-família, auxílio-acidente, serviço social e reabilitação profissional, quando empregado.

Como já mostrado anteriormente, os dois únicos benefícios abarcados por esse dispositivo atualmente são o auxílio-doença e a reabilitação profissional. Além do PL 2.567/2011, existem outros 15 projetos tramitando no Congresso, que versam sobre melhorar as condições do aposentado que continua a exercer atividade empregatícia.

Sobre a iniciativa do legislativo em inserir matéria disciplinadora da desaposentação na legislação brasileira, Wladimir Novaes Martinez adianta-se ao fato e reitera seu posicionamento ao afirmar que, os projetos de regulamentação da desaposentação baseiam seus estudos e suas razões em consideração singela: se a desaposentação atende ao interesse público e não prejudica terceiros, não admiti-la representa retrocesso como técnica de proteção social (2009, p. 162).

Esse interesse em positivar o instituto da desaposentação vem para ampliar e desmistificar a natureza desse instituto dentro da sociedade jurídica brasileira, mostrando a viabilidade do mesmo, que tem por finalidade intrínseca dissolver qualquer injustiça causada pela cobrança da contribuição previdenciária ao aposentado ainda ativo, que não consegue renunciar a esse direito em busca de outro que lhe assegure mais vantagens, exatamente por tal direito não estar disciplinado em nenhum dispositivo legal que seja suficientemente capaz de lhe habilitar para tanto.

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Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) apresentado ao Curso de Direito da UFCG – Campus de Sousa/PB, em cumprimento às exigências para obtenção do grau de Bacharel em Direito sob a orientação do Professor Dr. Francivaldo Gomes Moura.

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