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O fornecimento de mão de obra como atividade sujeita ao ISSQN:

uma análise comparativa com o agenciamento de mão de obra e a terceirização de serviços

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24/02/2015 às 12:22

Resumo:


  • O estudo analisa a incidência do ISSQN sobre o fornecimento de mão-de-obra, destacando a diferença entre esta atividade e o agenciamento, recrutamento e seleção de pessoal, bem como a terceirização de serviços.

  • Discute-se a base de cálculo do ISSQN no fornecimento de mão-de-obra, com jurisprudência do STJ indicando a tributação sobre o valor total da operação, incluindo salários e encargos sociais dos trabalhadores.

  • Aborda-se o aspecto territorial do ISSQN, com o imposto sendo devido no município do tomador do serviço no fornecimento de mão-de-obra, e a sujeição passiva, onde o tomador pode ser responsabilizado pelo recolhimento do imposto.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

É incorreta a tributação dos serviços terceirizados como se fornecimento de mão de obra fosse, porquanto nesta modalidade de contrato o que as partem avençam não está relacionado diretamente à força laboral, mas sim à realização de determinado objeto.

RESUMO: O estudo busca elucidar pontos controversos da incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN sobre o de fornecimento de mão-de-obra, identificando quais situações preenchem os requisitos do item 17.05 da Lista de Serviços, diferenciando-as do agenciamento, recrutamento e seleção, atividade prevista no item 17.04 e de outros contratos de prestação de serviços, também conhecidos como terceirização de mão-de-obra, com os quais podem ocorrer confusões, propositais ou não, pelo sujeito passivo e mesmo pela autoridade administrativa no exercício da função de lançamento. Neste contexto, propõe-se a desvendar os aspectos material, subjetivo, quantitativo e territorial ou espacial, viabilizando assim a correta exigência tributária. 

Palavras-chave: ISSQN. Fornecimento de mão-de-obra. Trabalho temporário. Agenciamento. Recrutamento.  Seleção. Terceirização.


1 INTRODUÇÃO

O ISSQN sobre o serviço de fornecimento de mão-de-obra é questão pacificada quanto à incidência, no entanto, persiste inquietação sobre a respectiva base de cálculo.

Neste sentido, discute-se qual deve ser considerado o preço do serviço, se o total da operação ou o valor do diferencial entre a remuneração do empregado e o valor cobrado do tomador.

Outro ponto que suscita dúvida é o aspecto territorial ou espacial, que define a quem deve ser recolhido o tributo, porquanto a lei regente elegeu, para os serviços próprios de fornecimento de mão-de-obra, o município do tomador do serviço.

Deve-se considerar que não se confundem as figuras de tomador e contratante, embora possam ser, e na maioria das vezes é, a mesma pessoa.

Percebe-se que o esclarecimento destes pontos requer uma análise mais aprofundada da atividade de forma a desvendar quais são as operações efetivamente enquadráveis como fornecimento de mão-de-obra, e a partir deste entendimento, estabelecer com segurança os demais aspectos da tributação em conformidade com a legislação aplicável.

No Judiciário o tema é bastante recorrente, encontrando-se muitas decisões onde se discute principalmente o aspecto quantitativo. Pretendem os prestadores abater da base de cálculo os valores referentes aos salários e aos encargos sociais e os municípios visam manter todos os valores envolvidos na operação.

Correto ou não, o Superior Tribunal de Justiça mantém posicionamento consolidado, decidido em 2010 sob a égide do artigo 543-C do Código de Processo Civil.

A proposta deste artigo é, analisando o conceito e requisitos da atividade de fornecer mão-de-obra, identificar quais situações se inserem no contexto do item 17.05 da Lista de Serviços, diferenciando-as do item 17.04 e de outros itens, desvendando os aspectos material, subjetivo, quantitativo e territorial ou espacial, e viabilizando assim o correto lançamento e exigência tributária.

Para alcançar estes objetivos será analisada a legislação tributária e também trabalhista, além da doutrina e jurisprudência aplicável.


2 FORNECIMENTO DE mão-de-obra – ASPECTOS CONCEITUAIS E DIFERENCIAIS

A caracterização do trabalho temporário, os requisitos da contratação e as características das empresas envolvidas são importantes para que o Fisco possa saber identificar aquelas operações em que efetivamente ocorre o fornecimento de mão-de-obra, diferenciando-as das outras operações que com ela se confundem.

2.1 FORNECIMENTO DE mão-de-obra

As operações de fornecimento de mão-de-obra são também impropriamente chamadas de locação de mão-de-obra e muitas vezes são confundidas com terceirização de serviços e também com agenciamento, recrutamento e seleção.

Lembra Tauil (2014) que:

[...] nos tempos atuais a expressão “locação” só pode ser atribuída a coisas, nunca a pessoas. Não se aluga pessoas; pessoas prestam serviços. Não se admite mais, felizmente, equiparar o trabalho humano às coisas locadas, o que era comum em passado distante.

Fornecer implica em entregar, colocar à disposição de outra pessoa mão-de-obra contratada pelo próprio fornecedor, numa operação triangular, que envolve o contratante tomador do serviço, o contratado empregador e seu empregado.

Confira-se que de acordo com a mais balizada doutrina, são requisitos essenciais do contrato de trabalho a continuidade, a subordinação, a onerosidade, a pessoalidade e a alteridade.

Martins (2013, p. 107-108) ensina que o requisito da continuidade é contraposto pela eventualidade, não sendo empregado aquele que presta serviços eventualmente; quanto à subordinação, ensina o autor que o obreiro exerce sua atividade com dependência ao empregador, sendo por ele dirigido; a pessoalidade determina que o contrato de trabalho seja realizado exclusivamente com pessoa natural, certa e determinada, sendo infungível em relação ao trabalhador; e a alteridade do contrato significa que o empregado sempre presta serviços por conta alheia, sem a assunção de qualquer risco, podendo participar dos lucros, porém jamais poderá arcar com qualquer prejuízo do seu empregador.

O fornecimento de mão-de-obra, onde o empregador cede força laboral por si contratada para terceiro, que exercerá parcialmente os poderes daquele sobre o empregado, somente é possível para atender demanda transitória, ou seja, dentro do chamado regime de trabalho temporário, disciplinado pela Lei no 6.019, de 1974, regulamentada por sua vez pelo Decreto no 73.841, do mesmo ano.

É o que define o Enunciado nº 331, inciso I, do Tribunal Superior do Trabalho – TST:

A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). TST Enunciado nº 331 - Revisão da Súmula nº 256 - Res. 23/1993, DJ 21, 28.12.1993 e 04.01.1994 - Alterada (Inciso IV)  - Res. 96/2000, DJ 18, 19 e 20.09.2000 - Mantida - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

A Lei no 6.019, de 1974 define o trabalho temporário como “aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente ou à acréscimo extraordinário de serviços” (Art. 2º).

Registre-se que o contrato de trabalho temporário pode ser realizado diretamente pela empresa que necessita da mão-de-obra com o empregado, sem intermediários, ou através de empresa especializada.

A empresa especializada no fornecimento de mão-de-obra temporária é nominada pela Lei no 6.019/1974 empresa de trabalho temporário, e definida no artigo 4º:

Art. 4º - Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos.

A lei também impõe à empresa de trabalho temporário, para seu regular funcionamento, registro específico junto ao Ministério do Trabalho e Previdência Social, hoje Ministério do Trabalho e Emprego - MTE (Art. 5º).

São então pressupostos do trabalho temporário, que sejam prestados por pessoa natural (física) a uma empresa, com o fim exclusivo de atendimento de:

§ necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente da empresa, por exemplo, em licenças médicas, auxílio maternidade, etc.; ou,

§ acréscimo extraordinário de serviços, por exemplo, aqueles ocasionados por demandas sazonais (camareiras em hotéis em cidades focadas em turismo de temporada, vendedores em período que antecede o Natal, etc.).

Como antes dito, o direito brasileiro não permite a locação permanente de mão-de-obra, prática conhecida como “marchandage”.

 A Justiça do Trabalho tem condenado a prática, julgando-a fraude à legislação trabalhista e declarando vínculo empregatício direto com o tomador do serviço. É o que se depreende da decisão a seguir, escolhida dentre muitas com o mesmo conteúdo:

TERCEIRIZAÇÃO E MARCHANDAGE. ILICITUDE DA CONTRATAÇÃO DE EMPREGADO POR EMPRESA INTERPOSTA PARA REALIZAÇÃO DE ATIVIDADES BANCÁRIAS. (...) As únicas relações triangulares, legalmente estabelecidas, em que se autoriza que uma empresa possa receber diretamente a força de trabalho de um empregado contratado por outra empresa, utilizando-se da atividade e da energia do trabalhador em seu próprio proveito, ocorre nos casos das contratações temporárias (Lei nº 6.019/74); da vigilância bancária (Lei nº 7.102/83) e das hipóteses de aprendizagem (art. 428 e segs. da CLT), já que a intermediação de mão-de-obra ou marchandage é expressamente repudiada pelo direito internacional e pelo pátrio, pois o homem e sua energia não podem ser objetos de comércio interempresas. 02. Na terceirização lícita, a relação interempresarial ocorre com absoluta independência na execução das atividades realizadas, de modo totalmente autônomo entre uma e outra empresa, pois o -objeto do comércio- é sempre um bem ou serviço especializado prestado por ente que detém total independência funcional; o labor não se integra às necessidades rotineiras e nem se apresenta em regime de conexão funcional com as atividades recíprocas. A relação é sempre trilateral, pois não há interpenetração dos contratos de emprego (entre o trabalhador e seu empregador) com o de prestação de serviços (entre as empresas tomadora e prestadora de serviços). (...).

(TRT-1 - RO: 00007419520125010283 RJ, Relator: Evandro Pereira Valadao Lopes, Data de Julgamento: 04/09/2013, Sétima Turma, Data de Publicação: 27/11/2013) (grifa-se)

Somente ocorrerá a contratação lícita de força de trabalho de forma indireta, quando a pessoa física ou jurídica urbana, especializada e devidamente registrada junto ao Ministério do Trabalho, colocar trabalhadores à disposição de outras empresas, tendo por fundamento a Lei no 6.019, de 1974, ou seja, observando os requisitos do trabalho temporário: necessidade transitória de substituição ou acréscimo extraordinário de serviço.

As únicas exceções à regra, admitidas pela Justiça do Trabalho, correspondem à vigilância bancária regulada pela Lei nº 7.102/83 e à aprendizagem tratada pelos artigos 428 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.

O assentamento deste entendimento é essencial para não se confundir fornecimento de mão-de-obra com o respectivo agenciamento e com a terceirização de serviços.

Relembrando, o fornecimento de mão-de-obra implica em uma operação triangular onde a empresa interessada na força de trabalho, por necessidade transitória de substituição de seu pessoal ou acréscimo extraordinário de serviço, contrata a mão-de-obra, não diretamente em seu quadro de pessoal, mas através de empresa especializada. Interessante notar que o objeto contratado é o fornecimento temporário de mão-de-obra, com base na lei nº 6.019/1974.

Exemplificando, o tomador (A) contrata empresa registrada junto ao MTE (B) para que esta disponibilize trabalhador ou conjunto de trabalhadores (C). O contrato de trabalho será firmado entre B e C. Entre A e B é firmado contrato de fornecimento de mão-de-obra.

Registre-se que as diretrizes e orientações sobre a realização do trabalho é da empresa tomadora do serviço (A), embora esta não tenha o poder de punir ou demitir o empregado (C), poderes estes que permanecem com o empregador direto (B).

Os contratos entre as partes envolvidas são igualmente regulados pela lei nº 6.019/1974, que estabelece os respectivos requisitos.

Entre a empresa de trabalho temporário e a tomadora de serviço, o contrato deve ser escrito e dele deve constar expressamente o motivo justificador da demanda de trabalho temporário, assim como as modalidades de remuneração da prestação de serviço (Art. 9º).

Já o contrato de trabalho celebrado entre empresa de trabalho temporário e cada um dos assalariados colocados à disposição de uma empresa tomadora deve também ser escrito e dele devem constar os direitos conferidos aos trabalhadores (Art. 11).

2.2 AGENCIAMENTO, RECRUTAMENTO E SELEÇÃO OU COLOCAÇÃO DE mão-de-obra

No agenciamento, recrutamento e seleção ou colocação de mão-de-obra, aquele que necessita da força de trabalho (A) contrata agência especializada (B) para buscar no mercado os talentos visados (C) para posterior contratação diretamente por (A) mediante contrato individual de trabalho.

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O serviço empresarial contratado é unicamente de recrutamento e seleção pelo qual a agência se compromete em buscar no mercado os empregados a serem contratados diretamente pela empresa interessada na mão-de-obra.

Neste caso não importa se os serviços a serem desenvolvidos sejam relacionados a atividades fins da contratante ou não, tampouco se o contrato for por prazo determinado ou indeterminado.

2.3. TERCEIRIZAÇÃO

A terceirização, por sua vez, consiste na contratação de serviços entre empresas legalmente constituídas, onde a contratante transfere para a contratada uma determinada atividade, buscando aumento de produtividade e da qualidade, além da redução de custos.

No contrato empresarial de prestação de serviços, notadamente uma terceirização, a empresa contratada é especializada na realização do objeto contratado, os serviços e respectivo preço são definidos por uma determinada quantidade, caracterizando uma empreitada.

Segundo Lima Neto (2006, pág. 279-280):

Não obstante a escassez de outros regulamentos e as limitadas possibilidades formalmente reconhecidas, o fenômeno da terceirização vem se expandindo de tal modo que passou a ser incorporado ao cotidiano das relações de trabalho. Antes poderia ser simbolizado apenas pelos serviços de limpeza e conservação, mas nas últimas décadas, a contratação triangular passou de exceção à regra e hoje constitui a forma comum das práticas trabalhistas nos mais variados segmentos empresariais.

Não se pode perder de vista então que na terceirização o que se contrata é a realização de determinado serviço pela empresa contratada, sem envolver diretamente os trabalhadores e sem levar em conta diretamente a remuneração destes, que representa apenas um dos elementos que compõem o custo da execução do contrato.

Quem admite, remunera, fiscaliza, pune e demite o empregado é sempre a prestadora dos serviços, que por sua vez, também não tem registro específico junto ao Ministério do Trabalho como fornecedora de mão-de-obra, por não ser este o seu objetivo social.

 Além disso, não existe subordinação nenhuma entre os empregados da terceirizada e a empresa tomadora, sequer em relação à forma de realização do serviço. Ainda que possam ocorrer intervenções no sentido de ajustar o trabalho aos termos contratados, isso normalmente se dá através de pessoas responsáveis pela coordenação da execução das tarefas, não diretamente com o operador.

 O objeto contratado não se refere à força laboral, mas à realização de determinada tarefa, que pode ser qualquer atividade lícita, desde serviços de limpeza, vigilância, segurança, até atividades de industrialização para terceiros, como o beneficiamento, recondicionamento, acondicionamento, pintura, lavagem, secagem, tingimento, corte, recorte, polimento, etc.

A Justiça do Trabalho entende que pode ser objeto de terceirização apenas a atividade-meio do tomador de serviços, conforme o já citado Enunciado nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho – TST:

II - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.) (TST Enunciado nº 331 - Revisão da Súmula nº 256 - Res. 23/1993, DJ 21, 28.12.1993 e 04.01.1994 - Alterada (Inciso IV)  - Res. 96/2000, DJ 18, 19 e 20.09.2000 - Mantida - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003). (grifa-se)

Existente a pessoalidade e a subordinação direta com o tomador de serviços, fica configurada fraude à legislação trabalhista com a declaração de vínculo de emprego entre o empregado e o tomador dos serviços.

Porém, não cabe ao Fisco, ao analisar os fatos geradores do ISSQN, decidir acerca da conformidade ou não das contratações com a legislação trabalhista. Cabe sim conhecer os contratos de prestação de serviços de forma a identificar qual o respectivo enquadramento na lista de serviços, para poder na sequência homologar os recolhimentos efetuados pelo sujeito passivo ou lançar o tributo eventualmente devido em conformidade com os requisitos do lançamento, em especial a perfeita delimitação do fato gerador e do fundamento da exigência fiscal.


3 O TRATAMENTO TRIBUTÁRIO DAS DIFERENTES ATIVIDADES

As três atividades analisadas neste estudo estão sujeitas ao ISSQN, merecendo análise detalhada o seu enquadramento na lista de serviços, essencial que é à fundamentação jurídica do lançamento e ao deslinde das demais questões aqui propostas.

Da mesma forma, o aspecto quantitativo, especialmente a base de cálculo a ser considerada, merece análise no campo fático à luz do que vem decidindo a jurisprudência.

3.1. MATERIALIDADE E FORMAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO

A mais simples das situações analisadas com certeza é o agenciamento, recrutamento e seleção de mão-de-obra.

A previsão na Lista de Serviços é literal e cristalina, conforme se depreende da leitura do item “17.04 - Recrutamento, agenciamento, seleção e colocação de mão-de-obra”.

Nesta operação somente interessa para fins de tributação pelo ISSQN o preço avençado pelo trabalho da agência, não importando a remuneração do trabalhador.

Ou seja, a base de cálculo será o valor cobrado pela intermediação e aproximação das partes, sem nenhuma dedução nem acréscimos.

A terceirização, por sua vez, receberá o tratamento tributário conforme a atividade realizada. Cada operação deve ser tributada de acordo com a sua natureza, suas características próprias.

Dentre as terceirizações que não se confundem com a atividade fim do tomador do serviço, são costumeiros os serviços de vigilância e segurança (item 11.02 – Vigilância, segurança ou monitoramento de bens e pessoas) e limpeza do ambiente de trabalho (item 7.10 – Limpeza, manutenção e conservação de vias e logradouros públicos, imóveis, chaminés, piscinas, parques, jardins e congêneres).

Porém, qualquer outro serviço contratado com terceiro sofrerá a tributação pelo imposto municipal, observando-se em cada caso qual o enquadramento na lista de serviços.

Desde 2008 o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado no sentido da incidência do ISSQN sobre a também chamada “industrialização por encomenda”. É neste sentido a decisão a seguir transcrita do então Ministro do STJ, Luiz Fux:

A "industrialização por encomenda" constitui atividade-fim do prestador do aludido serviço, tendo em vista que, uma vez concluída, extingue o dever jurídico obrigacional que integra a relação jurídica instaurada entre o "prestador" (responsável pelo serviço encomendado) e o "tomador" (encomendante): a empresa que procede ao corte, recorte e polimento de granito ou mármore, de propriedade de terceiro, encerra sua atividade com a devolução, ao encomendante, do produto beneficiado. [...]

Destarte, a "industrialização por encomenda", elencada na Lista de Serviços da Lei Complementar 116/2003, caracteriza prestação de serviço (obrigação de fazer), fato jurídico tributável pelo ISSQN, não se enquadrando, portanto, nas hipóteses de incidência do ICMS (circulação de mercadoria - obrigação de dar - e prestações de serviço de comunicação e de transporte transmunicipal).

(REsp 888.852/ES, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 01/12/2008) (grifa-se)

Importante registrar mais uma vez que a tributação da atividade terceirizada deve encontrar fundamento específico na lista de serviços tributáveis, conforme é o caso analisado na decisão acima, onde os serviços são previstos no item 14.05.

Insiste-se nisto porque certamente fadado ao fracasso o tratamento tributário da operação como fornecimento de mão-de-obra.

Como visto anteriormente, o fornecimento de mão-de-obra exige que seja aperfeiçoado por critérios jurídicos bem definidos, que podem ser resumidos na contratação com fundamento na Lei no 6.019, de 1974. Qualquer operação realizada fora deste arquétipo jurídico não poderá ser com ele confundida.

A atividade de fornecimento de mão-de-obra é prevista na atual Lista de Serviços, aprovada pela Lei Complementar 116, de 2003, no item 17.05 – Fornecimento de mão-de-obra, mesmo em caráter temporário, inclusive de empregados ou trabalhadores, avulsos ou temporários, contratados pelo prestador de serviço.

Em retrospecto, registra-se que a antiga lista de serviços, aprovada pela LC 56/87, também continha a previsão no item 84, porém de forma unificada com o serviço de recrutamento, agenciamento e seleção: “84. Recrutamento, agenciamento, seleção, colocação ou fornecimento de mão-de-obra, mesmo em caráter temporário, inclusive por empregados do prestador do serviço ou por trabalhadores avulsos por ele contratados”.

Assim, inexistente qualquer dúvida quanto ao aspecto material, caracterizada que é a atividade com expressa previsão na lista de serviços, resta perquirir quanto ao aspecto quantitativo da tributação, questão esta que tem se apresentado de forma recorrente ao Judiciário, tanto que em 2010 o Superior Tribunal de Justiça decidiu sob a sistemática dos recursos repetitivos[1]ser incidente o ISSQN sobre o valor total da operação praticada pelas empresas fornecedoras de mão-de-obra, sem possibilidade de dedução do valor dos salários e encargos sociais pagos aos trabalhadores. A decisão vem sendo indistintamente aplicada desde então, nos seguintes termos:

[...] nos termos da Lei 6.019, de 3 de janeiro de 1974, se a atividade de prestação de serviço de mão-de-obra temporária é prestada através de pessoal contratado pelas empresas de recrutamento, resta afastada a figura da intermediação, considerando-se a mão-de-obra empregada na prestação do serviço contratado como custo do serviço, despesa não dedutível da base de cálculo do ISS.[...]

Destarte, a empresa recorrida encarta prestações de serviços tendentes ao pagamento de salários, previdência social e demais encargos trabalhistas, sendo, portanto, devida a incidência do ISS sobre a prestação de serviços, e não apenas sobre a taxa de agenciamento.

12. Recurso especial do Município provido, reconhecendo-se a incidência do ISS sobre a taxa de agenciamento e as importâncias voltadas para o pagamento dos salários e encargos sociais dos trabalhadores contratados pelas prestadoras de serviços de fornecimento de mão-de-obra temporária (Lei 6.019/74). Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.

(REsp 1138205/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 01/02/2010) (grifa-se)

Por mais culta e prestigiada que seja, defende-se que há uma impropriedade nesta decisão, na medida em que a empresa que fornece mão-de-obra temporária não executa um serviço específico, determinado e especializado como é o caso das terceirizações, mas atua como uma intermediária entre o trabalhador temporário e o tomador da mão-de-obra, desde que existentes os pressupostos da necessidade de substituição de pessoal ou acréscimo extraordinário de serviço desta.

A empresa que fornece a mão-de-obra não é especializada em executar determinada tarefa como são as empresas de limpeza e de segurança, assim como as que trabalham com quaisquer outros serviços que possam ser objeto de terceirização. Sua especialidade é exclusivamente fornecer mão-de-obra por si contratada para atender demanda temporária dos seus clientes.

Os trabalhadores, embora firmem contrato de trabalho com a empresa fornecedora, obedecem a ordens diretas da empresa tomadora e tem sua remuneração disciplinada pela normativa desta, conforme disciplina a Lei no 6.019/1974, no Art. 12, alínea a:

Art. 12 - Ficam assegurados ao trabalhador temporário os seguintes direitos:

a) remuneração equivalente à percebida pelos empregados de mesma categoria da empresa tomadora ou cliente calculados à base horária, garantida, em qualquer hipótese, a percepção do salário mínimo regional; [...] (grifa-se)

A questão assim colocada permitiria, havendo dispositivo regulador na legislação, a não tributação dos valores representativos da remuneração dos empregados e demais verbas e encargos trabalhistas, considerando corresponder ao preço do serviço exclusivamente o valor do diferencial.

A doutrina defende fervorosamente a tributação exclusiva do valor do diferencial, não se computando na base de cálculo o valor da remuneração e respectivos encargos, ainda que colida frontalmente com a determinação que emana da decisão do STJ antes citada.

Assim concluído, obedecendo à decisão consolidada e considerando também que a Lei Complementar no 116, de 2003, reguladora do ISSQN no âmbito nacional e que teria competência para dirimir a questão[2], silenciou e não estabeleceu nenhuma exceção aplicável ao caso, conclui-se que o serviço de fornecimento de mão-de-obra deve ser tributado sobre a integralidade do valor cobrado da empresa tomadora, incluindo a remuneração dos empregados temporários e demais verbas e encargos trabalhistas.

3.2. ASPECTO TERRITORIAL DO FATO GERADOR

Determina a LC no 116, de 2003, art. 3º, inciso XX, que o serviço do item 17.05 considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento tomador do serviço.

Diante da clareza da lei, merece alguma consideração tão somente o que deve ser entendido como estabelecimento tomador.

Estabelecimento tomador do fornecimento de mão-de-obra não pode ser outro senão aquele onde forem alocados os trabalhadores, pouco importando se é deste estabelecimento que provém a remuneração paga à empresa prestadora e por consequência o próprio trabalhador.

Por exemplo, se uma empresa sediada em São Paulo contrata fornecimento de mão-de-obra para atuar em estabelecimento filial que mantém em cidade do interior, é este estabelecimento do interior onde a mão-de-obra é empregada que deve ser tido como tomador e, por consequência, em sua sede é que se materializa a hipótese de incidência tributária, com a consolidação do poder de tributar naquele município.

Note-se que a própria lei no 6.019/1974 trata o contratante da mão-de-obra como empresa tomadora ou cliente, obviamente referindo-se ao emprego da força laboral temporária que disciplina.

No agenciamento, recrutamento e seleção de mão-de-obra, serviço previsto no item 17.04 da Lista de Serviços, nenhuma dúvida persiste quanto ao aspecto espacial, sendo devido o imposto ao município sede do estabelecimento prestador dos serviços.

A Lei Complementar no 116/2003 assim definiu estabelecimento prestador:

Art. 4º Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas. (grifa-se).

Do conceito legal, extrai-se que não é qualquer local que poderá ser considerado estabelecimento prestador, para fins de definir a competência tributária, devendo ser observado no mínimo o seguinte: deve ser o local onde o contribuinte execute a prestação dos serviços, sendo irrelevante se de modo permanente ou temporário, porém este local deve necessariamente configurar uma unidade econômica ou profissional do prestador.

Configura unidade econômica ou profissional a permanência ou ânimo de permanecer, ainda que temporariamente, em determinado mercado consumidor, oferecendo serviços ao mercado, indistintamente, não apenas a um determinado contratante.

Quanto aos serviços terceirizados, que podem encontrar enquadramento em qualquer item da Lista de Serviços, defende-se que deve ser observada a disciplina da Lei Complementar no 116/2003 disposta em seu Art. 3º, respectivos incisos e parágrafos.

Nos exemplo citados, de limpeza e manutenção (item 7.10), vigilância, segurança e monitoramento (item 11.02), ambos têm o aspecto territorial definido respectivamente pelo local onde se concretizar a execução da limpeza ou onde estiverem os bens ou pessoas guardadas ou monitoradas. Estes locais podem ou não coincidir com o domicílio do contratante do serviço.

Na industrialização por encomenda (item 14.05) o imposto será devido no estabelecimento prestador, antes conceituado.

3.3. SUJEIÇÃO PASSIVA

Considerando que a sujeição ativa já foi delimitada quando da análise do aspecto territorial do fato gerador, resta verificar a sujeição passiva.

A legislação define que o contribuinte direto do ISSQN é o prestador do serviço (Art. 5° da LC no 116/2003), no entanto, podem os entes tributantes, mediante lei, atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, desde que vinculada ao fato gerador da obrigação, fazendo nascer assim a figura do responsável tributário[3].

A legislação municipal poderá determinar a responsabilidade do terceiro de duas formas distintas[4]: excluindo a responsabilidade do contribuinte ou mantendo a responsabilidade do contribuinte em caráter supletivo.

A diferença essencial entre as duas formas permitidas está na exclusão ou não do contribuinte natural (aquele que praticou o fato tributável) da relação jurídico tributária.

Na primeira hipótese, o contribuinte sai da relação, sendo substituído pelo responsável tributário. E na segunda hipótese, o contribuinte não sai completamente da relação jurídico tributária, ficando obrigado pelo recolhimento do tributo e acréscimos, na hipótese de o responsável não cumprir a obrigação.

A despeito dos municípios poderem atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a terceiros, a LC 116/2003, em seu Art. 6° e § 2o, já definiu ser responsável pelo ISSQN:

Art. 6°[…]

§ 2o Sem prejuízo do disposto no caput e no § 1o deste artigo, são responsáveis: [...]

II – a pessoa jurídica, ainda que imune ou isenta, tomadora ou intermediária dos serviços descritos nos subitens 3.05, 7.02, 7.04, 7.05, 7.09, 7.10, 7.12, 7.14, 7.15, 7.16, 7.17, 7.19, 11.02, 17.05 e 17.10 da lista anexa. (grifa-se)

Então, no serviço de fornecimento de mão-de-obra (item 17.05), deve o tomador responsabilizar-se pelo tributo, realizando o recolhimento ao município onde a mão-de-obra for empregada.

Da mesma forma, na terceirização de serviços de limpeza e conservação (item 7.10), a empresa tomadora será responsável pelo recolhimento.

Os demais serviços deverão observar exclusivamente as regras das respectivas legislações municipais às quais se submetem.

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Sobre a autora
Márcia Zilá Longen

Auditora Fiscal Tributária do Município de Blumenau/SC, Atua como Julgadora da Unidade de Julgamento Singular - Contencioso Administrativo Tributário,Pós-Graduação em Gestão Pública

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LONGEN, Márcia Zilá. O fornecimento de mão de obra como atividade sujeita ao ISSQN:: uma análise comparativa com o agenciamento de mão de obra e a terceirização de serviços. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4255, 24 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32397. Acesso em: 23 dez. 2024.

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